CGJ/SP: REGISTRO DE IMÓVEIS – Compromisso de compra e venda de imóvel loteado – Possibilidade do registro com efeito translativo da propriedade, desde que acompanhado de prova da quitação – Inteligência do art. 26, §6º, da Lei n. 6.766/79 – Interpretação restritiva, que não deve prevalecer – Manutenção do atual entendimento do CSM sobre o tema.

PROCESSO Nº 2014/35956 – SÃO PAULO – COLÉGIO NOTARIAL DO BRASIL – SEÇÃO SÃO PAULO.

(124/2014-E)

REGISTRO DE IMÓVEIS – Compromisso de compra e venda de imóvel loteado – Possibilidade do registro com efeito translativo da propriedade, desde que acompanhado de prova da quitação – Inteligência do art. 26, §6º, da Lei n. 6.766/79 – Interpretação restritiva, que não deve prevalecer – Manutenção do atual entendimento do CSM sobre o tema.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça, O Colégio Notarial do Brasil – Seção de São Paulo interveio, como amicus curiae, em grau de recurso, na Dúvida de n. 9000012-75.2012.8.26.0506, postulando, incidentalmente, a revisão do posicionamento estampado na Apelação Cível de n. 0012160-45.2010.8.26.0604.

No julgamento dessa apelação, entendeu o Colendo Conselho Superior da Magistratura que “o §6º, do art. 26, da Lei nº 6.766/79 não se limita a loteamentos populares, autorizando o registro da propriedade do lote com base no compromisso de compra e venda, nas cessões e promessas de cessão, desde que acompanhados de prova da quitação.

O Colégio Notarial insiste em que o §6º, do art. 26, seja interpretado restritivamente, dispensando-se a forma solene da escritura pública apenas para os casos de aquisição de lotes populares.

Passo a opinar.

Em primeiro lugar, é necessário assentar que foram extraídas cópias dos autos em que interveio o Colégio Notarial apenas para fins de estudo do tema pela Corregedoria Geral da Justiça. Uma efetiva mudança de posicionamento dependeria de votação concreta, em caso paradigma, pelo Colendo Conselho Superior da Magistratura.

Dito isso, após análise da manifestação do Colégio Notarial, a equipe do extrajudicial não vislumbrou, salvo melhor juízo de Vossa Excelência, qualquer razão para alteração do posicionamento atualmente adotado sobre o tema.

A declaração de voto vencedor na Apelação Cível de n. 0012160-45.2020.8.26.0604, da lavra do Eminente Desembargador Fernando Antônio Maia da Cunha, permanece irrepreensível, não havendo motivo para acrescentar algo a ela, mas, apenas, para reproduzi-la (na parte que interessa ao presente parecer):

O cerne da dúvida consiste na interpretação do art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79, cujo teor vale transcrever:

‘Os compromissos de compra e venda, as cessões e as promessas de cessão valerão como título para o registro da propriedade do lote adquirido, quando acompanhados da respectiva prova de quitação’.

A orientação deste Colendo Conselho Superior da Magistratura sempre foi de que o dispositivo legal deve ser interpretado restritivamente, por se tratar de exceção à regra geral segundo a qual se exige a forma solene da escritura pública para a transferência da propriedade. Sustenta-se que o parágrafo 6º foi introduzido pela Lei nº 9.785/1.999, juntamente com os parágrafos 3º, 4º e 5º, do mesmo artigo, o que justifica a interpretação sistemática para apenas autorizar o registro dos compromissos de compra e venda firmados para a aquisição de lotes populares.

Ocorre que, salvo melhor juízo deste Egrégio Conselho, a interpretação não convence.

Pela leitura do art. 26, § 6º, percebe-se que não houve menção do legislador a loteamentos populares, tratando-se de norma genérica, aparentemente dirigida ao registro da propriedade de qualquer lote. A redação é clara, sem ambiguidades, o que, em tese, dispensaria maior esforço hermenêutico.

Tanto assim que sequer foi cogitada interpretação diversa pelos doutrinadores que comentaram as inovações legislativas introduzidas pela Lei nº 9.785, de 29/01/1999, logo após sua edição. MARCELO BERTHE, em artigo intitulado “As alterações das leis federais 6.015/73 e 6.766/79 e do dec-lei federal 3.365/41.

Algumas notas sobre os reflexos no registro imobiliário”, comenta que o § 6º, do art. 26, envolve matéria de grande relevância, “porque se refere não só às cessões de posse, mas também aos compromissos de compra e venda em geral, tratados no art. 26 da lei 6.766/79, bem como às respectivas cessões e promessas de cessão” (sublinhei) (Revista de Direito Imobiliário nº 46, janeiro-junho de 1999, ano 22, p. 50).

JOÃO BAPTISTA GALHARDO, após transcrever o teor do § 6º e consignar a validade dos compromissos de compra e venda, cessões e promessas de cessão, como títulos para o registro da propriedade, ressalva apenas que a validade limita-se à primeira transferência, do loteador para o primeiro adquirente, valendo transcrever:

“Esse parágrafo aplica-se uma única vez com referência ao lote, ou seja, quando o domínio houver de ser transferido do loteador para o comprador” (Aspectos registrários da aplicação da lei federal nº 9.785, de 29.01.1999, in Revista de Direito Imobiliário nº 46, janeiro-junho de 1999, ano 22, p. 38), sem qualquer alusão ou restrição da aplicabilidade do dispositivo a loteamentos populares.

Nesse contexto, respeitosamente, é possível afirmar que a interpretação restritiva acolhida por este Colendo Conselho Superior da Magistratura não se coaduna com a literalidade do texto legal e com a ideia inspiradora da norma acima mencionada.

Cumpre então enfrentar a questão sob o enfoque da interpretação sistemática e teleológica.

Alega-se que o § 6º, do art. 26, deve ser interpretado à luz dos §§ 3º, 4º e 5º do mesmo dispositivo, que trata das cessões de posse de parcelamentos populares, tratando-se de dispositivo voltado a realizar uma função social em benefício da população de baixa renda.

Ocorre que, salvo melhor juízo, a função social na lei de parcelamento do solo não se limita aos loteamentos populares, estendendo-se ao regramento do tema em geral. Isso porque o parcelamento do solo está diretamente ligado ao crescimento das cidades, à destinação de áreas para uso residencial, comercial e industrial, e à criação de áreas públicas como ruas e praças, envolvendo o interesse público na organização e aproveitamento dos espaços, em benefício da coletividade. Daí afirmar-se que:

“O registro predial, em matéria de parcelamento do solo, não atua tão-somente como tábua da propriedade e de suas mutações. Ele figura como instrumento de controle urbanístico e protetivo-social” (BEATRIZ AUGUSTA PINHEIRO SAMBURGO, CLÁUDIA HELENA TAMISO E JOSÉ CARLOS DE FREITAS. Comentários à Lei 9.785, de 29.01.1999, sobre as alterações introduzidas na Lei 6.766/79, in Revista de Direito Imobiliário nº 46, janeiro-junho de 1999, ano 22, p. 11).

Nessa esteira, o argumento calcado na função social não se afigura suficiente para limitar o alcance do § 6º aos lotes populares, haja vista que a função social refere-se à lei de parcelamento do solo como um todo, não se resumindo a proteger a população de baixa renda:

“As leis sobre loteamento são leis protetivas, de ordem pública, com forte conteúdo social” (JOSÉ OSÓRIO DE AZEVEDO JÚNIOR. A dispensa de escritura na venda de imóvel loteado. Crítica da orientação do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo. In Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo. Ano 10,nº 20, jul-dez/2007, p. 161).

Por fim, cabe acrescentar um derradeiro argumento de cunho interpretativo.

A regra do art. 5º, da Lei de Introdução ao Código Civil, determina que, na aplicação da lei, o juiz deve atender aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

Ora, a simplificação da primeira transferência da propriedade, do loteador ao adquirente, independentemente da natureza do lote, acaba por facilitar a inserção do bem no mercado, contribuindo para a segurança jurídica e para a circulação de riqueza, coadunando-se como o bem comum e com o fim social de zelar pela juridicidade do parcelamento.

Daí porque, como conclui o Desembargador JOSÉ OSÓRIO DE AZEVEDO JR, “a interpretação que se impõe, a meu ver, é uma só: esse preceito do § 6º, em matéria de loteamento urbano, é genérico, e portanto aplicável a qualquer loteamento e não apenas aos especialíssimos “parcelamentos populares” (A dispensa de escritura na venda de imóvel loteado. Crítica da orientação do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo. Ano 10, nº 20, jul-dez/2007, p. 159).

Assim, por todo o exposto, a conclusão a que se chega é a de que o § 6º, do art. 26, da lei nº 6.766/79, não se limita a loteamentos populares, autorizando o registro da propriedade do lote com base no compromisso de compra e venda, nas cessões e promessas de cessão, desde acompanhados da prova de quitação.

Repito: não há qualquer fato novo, trazido pelo Colégio Notarial, que indique a conveniência ou necessidade da mudança desse entendimento. Opino, pois, respeitosamente, por sua manutenção, sugerindo a publicação desse parecer no D.J.E., em três dias alternados, dada a relevância do tema.

Sub censura.

São Paulo, 22 de abril de 2014.

(a) Swarai Cervone de Oliveira

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, mantenho o atual entendimento a respeito do tema. Dada sua relevância, publique-se no D.J.E. em três dias alternados. São Paulo, 23 de abril de 2014. (a) HAMILTON ELLIOT AKEL, Corregedor Geral da Justiça. (D.J.E. de 06.05.2014 – SP)

Fonte: DJE/SP | 06/05/2014.

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TJ/SP: DIREITO REGISTRÁRIO É ASSUNTO DO PROGRAMA ‘DIÁLOGO COM A CORREGEDORIA’

A Corregedoria Geral da Justiça realizou na terça-feira (29) palestra do Programa – Diálogo com a Corregedoria com a presença do juiz assessor da CGJ Swarai Cervone de Oliveira, sobre o tema ‘A necessidade do correto processamento das ações de adjudicação compulsória para a formação de título hábil ao registro’. O encontro ocorreu na sede administrativa da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis).        

À mesa com o juiz assessor da Corregedoria Rodrigo Colombini, o palestrante abordou aspectos que devem ser observados na ação de adjudicação compulsória, que visa à obtenção da propriedade do imóvel pelo autor. No entanto, em razão da especificidade do direito registrário, operadores do direito deixam de atentar para alguns fatores. “Muitas ações são oriundas de negócios feitos há muito tempo, o que pode ensejar problemas quanto à legitimidade passiva. O juiz precisa entender uma matrícula de imóvel e os instrumentos de compra e venda para verificar a formação do polo passivo”, explicou.        

Servidores e registrários de comarcas de todo o Estado assistiram à aula pelo site da Apamagis e enviaram questões, entre eles funcionários dos fóruns de Caconde e Franca.

Fonte: TJ/SP | 30/04/2014.

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Questão esclarece acerca da dispensa da autorização do Incra para aquisição, pela mesma pessoa estrangeira, de fração ideal no mesmo imóvel rural com área total inferior a 3 MEIs.

Imóvel rural. Aquisição por estrangeiro. Fração ideal no mesmo imóvel. Incra – dispensa.

Para esta edição do Boletim Eletrônico a Consultoria do IRIB selecionou questão acerca da dispensa da autorização do Incra para aquisição, pela mesma pessoa estrangeira, de fração ideal no mesmo imóvel rural com área total inferior a 3 MEIs. Veja como a Consultoria do IRIB se posicionou acerca do assunto, valendo-se dos ensinamentos de Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza:

Pergunta: A segunda aquisição, pela mesma pessoa estrangeira, de fração ideal no mesmo imóvel rural com área total inferior a 3 MEIs (Módulo de Exploração Indefinida) depende de autorização do Incra?

Resposta: Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza, em trabalho publicado pelo IRIB, intitulado “Coleção Cadernos IRIB – vol. 7 – Os Imóveis Rurais Na Prática Notarial e Registral – Noções Elementares”, p. 34-35, abordou este tema com muita propriedade. Vejamos o que ele nos ensina:

“Aquisição de mais de uma fração ideal no mesmo imóvel: conforme já exposto no primeiro capítulo, para fins registrários, deve-se entender por ‘imóvel rural’ aquele descrito em matrícula individualizada, pois cada matrícula representa uma unidade imobiliária. Desta forma, a segunda aquisição de fração ideal sobre o mesmo imóvel não necessita de autorização do Incra se a área total adquirida for inferior a 3 MEIS, porque é considerada como aquisição de um imóvel em etapas, e não segunda aquisição.

Nesse sentido, o entendimento da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo no Processo CG nº 85.020/1988:
‘Não se vê, porém, por que a hipótese dos autos importaria em vulneração daquela disposição do Dec. 74.965/74. O estrangeiro adquiriu, em duas etapas, a propriedade sobre único imóvel rural com superfície inferior ao tresdobro do módulo. Poderia, é certo, ter adquirido em momento único a gleba toda, com 24,20 hectares, sem que para tanto necessitasse de autorização ou licença da autoridade competente. Não se cuidou, ao contrário do que deixa entrever a representação, de aquisição de mais de um imóvel, ou de duas glebas com 24,20 ha cada qual. Ainda que se aceite que o alcance do citado art. 7º, § 3º, Dec. 74.965/74, inclua as alienações de frações ideais do mesmo imóvel já titulado em parte pelo alienígena, ou de imóvel diverso, não resta dúvida de que a espécie em exame não justifica opção pela drástica senda do cancelamento dos registros aquisitivos. Inexistiu transgressão aos dispositivos da legislação agrária aplicáveis, uma vez que o estrangeiro, por força das duas transcrições questionadas, adquiriu, ao fim e ao cabo, único imóvel rural, com superfície inferior ao limite fixado em lei.’

Essa situação, portanto, não caracteriza a aquisição de ‘mais de um imóvel rural’, mas apenas o aumento da participação do condômino nas cotas-partes de um mesmo bem imóvel.”

Finalizando, recomendamos que sejam consultadas as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça de seu Estado, para que não se verifique entendimento contrário ao nosso. Havendo divergência, proceda aos ditames das referidas Normas, bem como a orientação jurisprudencial local.

Fonte: IRIB (www.irib.org.br).

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