STJ: Terceira Turma mantém ato de pai que deixou de incluir um dos filhos em doação de imóvel

Em decisão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso especial que buscava invalidar a doação de imóvel feita por um pai, já falecido, apenas aos filhos do primeiro casamento e em acordo de separação homologado judicialmente. 

Durante o processo de inventário do pai, decisão interlocutória declarou a nulidade da doação feita a dois filhos do primeiro casamento, por considerar que ela violou os direitos dos herdeiros necessários, já que um terceiro filho, fruto de outra relação, não foi contemplado. 

A decisão, entretanto, foi reformada no agravo de instrumento interposto pelos dois filhos beneficiados, que conseguiram o reconhecimento da legalidade do ato. 

Eficácia idêntica 

A discussão chegou ao STJ em recurso especial, no qual, além da inoficiosidade da doação, também foi questionada sua validade, já que foi homologada apenas em juízo, sem a transferência de propriedade por escritura pública. 

Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi, relatora, considerou todo o procedimento válido. Destacou que já é “posicionamento cristalizado” na Terceira Turma que a existência de sentença homologatória de acordo, em separação judicial, pela qual o antigo casal doa imóvel aos filhos, tem idêntica eficácia da escritura pública. 

A ministra observou ainda que o caso não trata de “promessa de doação, fórmula repelida pelo ordenamento jurídico, porquanto o que não existiu foi a formalização cartorial do ato, que pode ser suprida, quando a doação estiver inserida em acordo de separação judicial”. 

Divisão desigual

Em relação à doação inoficiosa, por ter sido o terceiro filho preterido, a ministra lembrou que o direito brasileiro admite a possibilidade de os pais privilegiarem filhos em detrimento de outros, desde que seja preservada a legítima, ou seja, a parte da herança reservada legalmente aos herdeiros necessários. 

A ministra explicou que, na situação julgada, podiam ser doados para os dois descendentes até aproximadamente 83,3% do patrimônio total – 50% da parte disponível acrescidos das correspondentes frações da legítima, que importavam em cerca de 33,2% . 

“Como a doação não atingiu 57% do patrimônio existente à época, doação inoficiosa não houve, cabendo, agora, apenas trazer o bem doado à colação, para fins de equilibrar ou igualar a legítima”, disse a relatora. 

“O instituto da colação irá, por primeiro, assegurar que os não contemplados com a doação possam, ainda assim, ter resguardado o seu quinhão na legítima, mesmo que seja por redução na doação e, de outra banda, garantir que a vontade do doador seja respeitada no limite da possibilidade legal”, concluiu a ministra.

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 1198168.

Fonte: STJ I 17/09/2013.

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Sucessões – Recurso Especial – Meação – Ato de disposição em favor de herdeiros – Doação – Ato inter vivos – Forma – Escritura Pública

EMENTA

SUCESSÕES. RECURSO ESPECIAL. MEAÇÃO. ATO DE DISPOSIÇÃO EM FAVOR DOS HERDEIROS. DOAÇÃO. ATO INTER VIVOS. FORMA. ESCRITURA PÚBLICA. 1. Discussão relativa à necessidade de lavratura de escritura pública para prática de ato de disposição da meação da viúva em favor dos herdeiros. 2. O ato para dispor da meação não se equipara à cessão de direitos hereditários, prevista no art. 1.793 do Código Civil, porque esta pressupõe a condição de herdeiro para que possa ser efetivada. 3. Embora o art. 1.806 do Código Civil admita que a renúncia à herança possa ser efetivada por instrumento público ou termo judicial , a meação não se confunde com a herança. 4. A renúncia da herança pressupõe a abertura da sucessão e só pode ser realizada por aqueles que ostentam a condição de herdeiro. 5. O ato de disposição patrimonial representado pela cessão gratuita da meação em favor dos herdeiros configura uma verdadeira doação, a qual, nos termos do art. 541 do Código Civil, far-se-á por Escritura Pública ou instrumento particular, sendo que, na hipótese, deve ser adotado o instrumento público, por conta do disposto no art. 108 do Código Civil. 6. Recurso especial desprovido. (STJ – REsp nº 1.196.992 – Mato Grosso do Sul – 3ª Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – DJ 22.08.2013)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília (DF), 06 de agosto de 2013 (data do julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI – Relatora.

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):

Cuida-se de Recurso Especial interposto por MARIA JOSÉ D SOUZA, com base no art. 105, III, “c”, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJ/MS).

Ação: arrolamento sumário dos bens deixados por BIANOR ALVES PEREIRA, em razão de seu falecimento.

Decisão: indeferiu o ato de disposição da integralidade da meação pela viúva MARIA JOSÉ DE SOUZA, nos autos do arrolamento, por entender que não se trata de herança, mas de patrimônio particular da meeira, perfazendo ato não afeto ao juízo sucessório, sendo, portanto, necessária a lavratura de escritura pública para sua efetivação.

Acórdão: manteve a decisão unipessoal que negou provimento ao recurso de agravo de instrumento interposto por MARIA JOSÉ DE SOUZA, para reafirmar a necessidade de escritura pública que a viúva disponha da sua meação em favor dos herdeiros, o que não pode ser feito por termo nos autos do inventário, por se tratar de ato de disposição patrimonial inter vivos, nos termos da seguinte ementa (e-STJ fls. 86/92):

EMENTA – AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO – DECISÃO QUE NEGOU SEGUIMENTO DE PLANO AO RECURSO – AGRAVO REGIMENTAL QUE NENHUM ELEMENTO NOVO TROUXE QUE LEVASSE O RELATOR A SE RETRATAR DA DECISÃO PROLATADA – RECURSO NÃO PROVIDO. Mantém-se a decisão que nega seguimento de plano, se no agravo regimental o recorrente nenhum elemento novo trouxe, que pudesse levar o relator a se retratar da decisão prolatada.

Recurso especial: interposto por MARIA JOSÉ DE SOUZA com base na alínea “c” do permissivo constitucional (e-STJ fls. 97/105), alega a existência de dissídio jurisprudencial entre o acórdão recorrido e o acórdão proferido pelo TJ/SP, no agravo de instrumento n.º 468.409-4/5-00, em sede do qual teria sido reconhecida a possibilidade de renúncia à meação por termo dos autos, não se fazendo necessária a lavratura de escritura pública perante o Tabelião.

Exame de admissibilidade: o recurso foi admitido na origem pelo TJ/MS (e-STJ fls. 118/120).

É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):

Cinge-se a controvérsia a analisar a possibilidade da viúva renunciar sua meação em favor dos herdeiros, por termo nos autos de inventário, dispensando-se a lavratura de escritura pública.

I – Das formalidades relacionadas ao ato de disposição da meação do cônjuge em favor dos herdeiros.

O acórdão recorrido afirma a necessidade de escritura pública porque a “disposição da meação do cônjuge supérstite é ato de iniciativa inter vivos e não se confunde com a sucessão causa mortis. Ademais, a escritura pública é a forma prescrita pela lei como condição essencial para validade de alguns atos, e para tais, torna-se ele imprescindível, nos termos do art. 108 do CC” (e-STJ fl. 90).

Aduz a recorrente, todavia, que não tem condições de arcar com o pagamento dos emolumentos cartorários necessários à lavratura de instrumento público para dispor da meação em favor dos herdeiros, e que há jurisprudência do TJ/SP admitindo a cessão da meação por termo judicial nos autos do inventário.

O acórdão paradigma apontado pela recorrente, de fato, reconheceu a possibilidade da cessão da meação se dar por termo nos autos, ao equipará-la, de certa maneira, à renúncia da herança.

Para corroborar sua conclusão, o TJ/SP faz remissão à lição de Euclides Benedito de Oliveira e Sebastião Luiz Amorim, no sentido de que “embora inconfundível com a renúncia à herança, dela se aproxima ao ponto em que implica efetiva cessão de direitos, de modo que utilizáveis os mesmo instrumentos para sua formalização. Com efeito, o direito de cada herdeiro, a título de posse ou propriedade, sobre sua parte ideal na herança, antes da partilha é juridicamente equivalente ao do cônjuge sobrevivo sobre a metade ideal do patrimônio a partilhar” (Inventários e Partilhas – Direito das Sucessões , 16ªed., Leud: São Paulo, 2003, p. 64/65) (e-STJ fl. 19) (sem destaque no original).

Embora o art. 1.806 do Código Civil, de fato, admita que a renúncia à herança possa ser efetivada por instrumento público ou termo judicial , é relevante apontar uma sensível diferença entre os institutos: enquanto na herança, a posse ou propriedade dos bens dode cujus transmite-se aos herdeiros quando e porque aberta a sucessão (princípio do saisine ), na meação, o patrimônio é de propriedade da viúva em decorrência do regime de bens do casamento, independe da abertura da sucessão, e pode ser objeto de ato de disposição pela viúva a qualquer tempo, seja em favor dos herdeiros ou de terceiros.

Em síntese, a renúncia da herança pressupõe a abertura da sucessão e a condição de herdeiro, situações que não se aplicam à viúva-meeira. Nas palavras de Francisco José Cahali e Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka:

Representando abdicação do direito à herança, só se admite a renúncia quando da abertura da sucessão, oportunidade em que nasce o direito hereditário. O repúdio prematuro, ou promessa de renúncia, ainda que formal, promovidos antes do falecimento, não tem validade jurídica, até porque implicariam em ilegal pacto sucessório” (Direito das Sucessões, 4ªed., São Paulo: RT, 2012, p. 89).

Assim, na hipótese, o ato de disposição patrimonial da recorrente, caracterizado como a renúncia da sua meação em favor dos herdeiros, não pode ser equiparada renúncia da herança.

Da mesma forma, ele não se confunde com a cessão de direitos hereditários, prevista no art. 1.793 do Código Civil, porque esta também pressupõe a condição de herdeiro do cedente. Note-se, por oportuno, que a própria cessão de direitos hereditários exige a lavratura de escritura pública para sua efetivação, não havendo porque se prescindir dessa formalidade no que tange à cessão da meação.

Com efeito, verifica-se que ato de disposição patrimonial pretendido pela recorrente, representado pela cessão gratuita da sua meação em favor dos herdeiros do falecido, configura uma verdadeira doação, inclusive para fins tributários, como, aliás, já foi consignado por esta Corte, no Ag 1165370, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 18.09.2009.

E a doação, por sua vez, nos termos do art. 541 do Código Civil, far-se-á por Escritura Pública ou instrumento particular, sendo que, na hipótese, deve ser adotado o instrumento público, por conta do disposto no art. 108 do Código Civil.

Embora seja compreensível a dificuldade da recorrente em arcar com o pagamento dos custos necessários à lavratura de uma escritura pública, perante o Tabelião, para poder transferir aos seus filhos a propriedade da metade do imóvel inventariado, que lhe pertence em razão da meação, não há possibilidade de se prescindir das formalidades expressamente previstas na legislação civil.

Forte nestas razões, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial.

Brasília (DF), 06 de agosto de 2013 (data do julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI – Relatora

Fonte: Colégio Notarial do Brasil/SP – Diário Oficial I 28/08/2013.

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