Tenho união estável, mas não filhos; quem herda meus bens?

Dúvida: Moro com uma companheira há dois anos, mas não somos casados no civil. Temos apenas uma declaração de união estável lavrada em cartório. Não temos filhos juntos, apenas ela tem um filho de uma relação anterior. Antes de passarmos a morar juntos eu havia comprado um apartamento e um carro. Caso eu me separe, haverá algum tipo de partilha dos meus bens com ela, ou de indenização? E se eu falecer, quem herda o meu patrimônio? Ela ou meus pais, uma vez que eu não tenho meus próprios filhos? Como faço para garantir que meus pais sejam meus herdeiros, é possível?

Resposta de Rodrigo da Cunha Pereira*:

Na união estável em que não houver contrato que estabeleça regime diverso, aplicam-se as regras da comunhão parcial de bens. Ou seja, os únicos bens que são partilháveis em caso de dissolução do vínculo são aqueles adquiridos onerosamente na constância da união e os frutos de quaisquer outros bens, originados durante a convivência, como, por exemplo, eventuais aluguéis desse apartamento que você tinha antes do seu relacionamento. Assim, o apartamento e o carro são somente seus e, com o fim da convivência, ela não terá direito a qualquer indenização ou fração desses bens.

De acordo com o art. 1.790 do Código Civil, caso você faleça antes de sua companheira e o único patrimônio seja o apartamento e o carro, ela não terá qualquer direito hereditário, pois o companheiro sobrevivente só participa da partilha dos bens adquiridos onerosamente na vigência da União Estável. Assim, esse patrimônio ficará com os seus pais.

Por fim, caso à época da sua morte seus pais ou irmãos estejam vivos, sua companheira receberá, a título de meação, 50% dos bens adquiridos onerosamente na constância da União Estável e dos frutos desses seus bens particulares (carro e apartamento) percebidos durante o relacionamento. Ainda nesse caso, ela receberá adicionalmente um terço da outra metade desses bens. Caso você queira excluí-la do recebimento deste um terço, é possível fazê-lo por meio de testamento, uma vez que ela não é herdeira necessária.

________________________

* Rodrigo da Cunha Pereira é advogado, mestre e doutor em direito civil e presidente do Instituto Brasileiro do Direito da Família (IBDFAM).

Fonte: Site Exame I 29/10/2013.

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Reconhecimento de união estável paralela ao casamento e outra união estável

TJ|RS: Apelação cível – Reconhecimento de união estável paralela ao casamento e outra união estável – União dúplice – Possibilidade – Partilha de bens – Meação – “Triação” – Alimentos.

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL PARALELA AO CASAMENTO E OUTRA UNIÃO ESTÁVEL. UNIÃO DÚPLICE. POSSIBILIDADE. PARTILHA DE BENS. MEAÇÃO. “TRIAÇÃO”. ALIMENTOS. A prova dos autos é robusta e firme a demonstrar a existência de união estável entre a autora e o réu em período concomitante ao seu casamento e, posteriormente, concomitante a uma segunda união estável que se iniciou após o término do casamento. Caso em que se reconhece a união dúplice. Precedentes jurisprudenciais. Os bens adquiridos na constância da união dúplice são partilhados entre a esposa, a companheira e o réu. Meação que se transmuda em “triação”, pela duplicidade de uniões. O mesmo se verificando em relação aos bens adquiridos na constância da segunda união estável. Eventual período em que o réu tiver se relacionado somente com a apelante, o patrimônio adquirido nesse período será partilhado à metade. Assentado o vínculo familiar e comprovado nos autos que durante a união o varão sustentava a apelante, resta demonstrado os pressupostos da obrigação alimentar, quais sejam, as necessidades de quem postula o pensionamento e as possibilidades de quem o supre. Caso em que se determina o pagamento de alimentos em favor da ex-companheira. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (TJRS – Apelação Cível nº 70022775605 – Santa Vitória do Palmar – 8ª Câmara Cível – Rel. Des. Rui Portanova – DJ. 19.08.2008).

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, dar parcial provimento à apelação.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores DES. CLAUDIR FIDÉLIS FACCENDA E DES. JOSÉ ATAÍDES SIQUEIRA TRINDADE.

Porto Alegre, 07 de agosto de 2008.

DES. RUI PORTANOVA – Relator.

RELATÓRIO

DES. RUI PORTANOVA (Relator):

Ação de reconhecimento e dissolução de união estável proposta por ALDA em face de CARLOS.

A sentença hostilizada referiu que, durante o período da união estável, Carlos era casado e após o final do casamento manteve uma união estável como uma terceira mulher. Em função da concomitância da união estável com o casamento do varão, a sentença julgou improcedente o pedido da autora.

Contra essa sentença apelou ALDA. Alegou que, mesmo o réu sendo casado, manteve relacionamento estável com o apelado, o qual lhe supria em todas suas necessidades básicas. Referiu que, durante o tempo em que mantiveram a união, sempre auxiliou o companheiro nas tarefas agrícolas inerentes à área rural que o varão possui. Assevera que ficou provado nos autos a existência de uma relação duradoura, pública, notória e com coabitação. Refere que a jurisprudência desse Tribunal tem se mostrado sensível ao reconhecimento de relações paralelas. Requereu, ao final, o provimento do apelo para que seja reconhecida a união estável que manteve com o requerido, ainda que paralela ao casamento dele, com a respectiva conseqüência na partilha de bens e verba alimentar.

O apelado ofereceu contra-razões (fls. 215/225).

Nesse grau de jurisdição, o Ministério Público lançou parecer opinando pelo não provimento do apelo.

Registro que foi observado o disposto nos artigos 549, 551 e 552, do Código de Processo Civil, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTOS

DES. RUI PORTANOVA (Relator):

O caso versa sobre um pedido de reconhecimento de união estável, formulado por ALDA, paralela ao casamento e a uma segunda união estável (que se seguiu ao casamento) de CARLOS.

A autora ALDA alega que manteve união estável com CARLOS por um período de 35 anos, desde os idos de 1975 até 2005. Referiu que ajudava Carlos na sua atividade rural e que, no período da união, Carlos sempre proveu seu sustento, custeando suas despesas gerais mais água, luz e IPTU, as quais eram debitadas diretamente na conta corrente do requerido.

Pelo que ressalta dos autos, o caso apresenta uma hipótese de união estável concomitante ao casamento, situação essa que a jurisprudência dessa Corte tem nominado como união paralela ou dúplice.

Registrado isso, tem-se duas tarefas pela frente.

Por primeiro, é necessário demonstrar a viabilidade da pretensão de reconhecimento da união estável paralela ao casamento ou a outra união estável, considerando a existência de vedação legal nesse sentido.

Por segundo, é necessário verificar se a relação que existiu entre as partes, de fato, caracteriza uma união estável. E, em caso afirmativo, analisar os efeitos dessa relação, mormente no que tange à partilha de bens e alimentos.

Vejamos então.

UNIÃO DÚPLICE.

Não é de hoje, que tenho entendido possível o reconhecimento das uniões paralelas ou uniões dúplices.

Tenho sustentado que, se a partir do cotejo dos elementos específicos que o caso concreto apresenta, restarem evidenciados os requisitos caracterizadores da união estável (art. 1.723 do CC), considero o reconhecimento da segunda união, em concomitância ao casamento, ser a medida mais adequada à realidade e ao estágio atual de convivência entre as pessoas em nossa sociedade.

O contrário disso, é fechar os olhos a uma realidade que cada vez mais tem batido à porta do Judiciário, não sendo possível o Estado deixar de dar a devida tutela a toda uma história de vida das pessoas envolvidas no litígio, sob pena de causar uma grave injustiça.

Nesse sentido, a título de contribuição para o entendimento ora defendido, interessante colacionar as palavras da Desa. Maria Berenice Dias, em voto proferido no julgamento da AC nº 70017045733, in verbis:

“O ordenamento civil, consubstanciado no princípio da monogamia, não reconhece efeitos à união estável quando um do par ainda mantém íntegro o casamento (art. 1.723, §1º, do Código Civil). Certamente, esse é o ideal da sociedade: um relacionamento livre de toda a ordem de traições e, se possível, eterno até que “a morte os separe”.

Contudo, a realidade que se apresenta é diversa, porquanto comprovada a duplicidade de células familiares. E conferir tratamento desigual a essa situação fática importaria grave violação ao princípio da igualdade e da dignidade da pessoa humana. O Judiciário não pode se esquivar de tutelar as relações baseadas no afeto, não obstante as formalidades muitas vezes impingidas pela sociedade para que uma união seja “digna” de reconhecimento judicial.”

Não menos importante, é o destaque no sentido de que esse Tribunal, a partir de recentes julgamentos, vem sinalizando a possibilidade de reconhecimento de união estável paralela a outro vínculo preexistente de um do par, seja ele casamento ou união estável. Senão, vejamos ementário que segue:

APELAÇÃO CÍVEL.

1)UNIÃO ESTÁVEL PARALELA A OUTRA UNIÃO ESTÁVEL. RECONHECIMENTO. O anterior reconhecimento judicial de união estável entre o falecido e outra companheira, não impede o reconhecimento da união estável entre ele e autora, paralela àquela, porque o Direito de Família moderno não pode negar a existência de uma relação de afeto que também se revestiu do mesmo caráter de entidade familiar. Preenchidos os requisitos elencados no art. 1.723 do CC, procede a ação, deferindo-se à autora o direito de perceber 50% dos valores recebido a título de pensão por morte pela outra companheira.

2)RESSARCIMENTO DE DANOS MATERIAIS E EXTRAPATRIMONIAIS. Descabe a cumulação de ação declaratória com ação indenizatória, mormente considerando-se que o alegado conluio, lesão e má-fé dos réus na outra ação de união estável já julgada deve ser deduzido em sede própria. (SEGREDO DE JUSTIÇA) Apelação parcialmente provida. (Apelação Cível Nº 70012696068, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 06/10/2005)

APELAÇÃO. UNIÃO DÚPLICE. UNIÃO ESTÁVEL. PROVA. MEAÇÃO. “TRIAÇÃO” . SUCESSÃO. PROVA DO PERÍODO DE UNIÃO E UNIÃO DÚPLICE A prova dos autos é robusta e firme a demonstrar a existência de união entre a autora e o de cujus em período concomitante a outra união estável também vivida pelo de cujus. Reconhecimento de união dúplice. Precedentes jurisprudenciais. MEAÇÃO (TRIAÇÃO) Os bens adquiridos na constância da união dúplice são partilhados entre as companheiras e o de cujus. Meação que se transmuda em ¿triação¿, pela duplicidade de uniões. DERAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. POR MAIORIA. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível Nº 70011258605, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 25/08/2005)

UNIÃO ESTÁVEL. RECONHECIMENTO. DUPLICIDADE DE CÉLULAS FAMILIARES. O Judiciário não pode se esquivar de tutelar as relações baseadas no afeto, inobstante as formalidades muitas vezes impingidas pela sociedade para que uma união seja “digna” de reconhecimento judicial. Dessa forma, havendo duplicidade de uniões estáveis, cabível a partição do patrimônio amealhado na concomitância das duas relações. Negado provimento ao apelo. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível Nº 70010787398, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Berenice Dias, Julgado em 27/04/2005)

UNIÃO ESTÁVEL. RECONHECIMENTO. CASAMENTO DE PAPEL UNIÃO DÚPLICE. Caso em que se reconhece a união estável da autora-apelada com o de cujus apesar de até o falecimento o casamento dela com o apelante estar registrado no registro civil. NEGARAM PROVIMENTO, POR MAIORIA, VENCIDO O RELATOR. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70006046122, OITAVA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: RUI PORTANOVA, JULGADO EM 23/10/2003)

APELAÇÃO. CASAMENTO E CONCUBINATO. UNIÃO DÚPLICE. EFEITOS. Notório estado de união estável do de cujus com a apelada, enquanto casado com a apelante. De se reconhecer o pretendido direito ao pensionamento junto ao IPERGS. NEGARAM PROVIMENTO. POR MAIORIA. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70006936900, OITAVA CÂMARA CIVEL, REL. DES. RUI PORTANOVA, J. 13/11/2003).

Em resumo, conferir conseqüências jurídicas distintas a duas situações fáticas semelhantes (duas células familiares), importaria violação ao princípio da igualdade e da dignidade da pessoa humana.

Seria, do ponto de vista daquele que pleiteia o reconhecimento de sua relação, em muitos casos, dizer que a pessoa não viveu aquilo que viveu, que é uma pessoa “menor” do que aquelas que compõe a relação protegida pelo Estado, circunstância que, evidentemente, configura uma indignidade.

Nesta linha, é o ensinamento de Ingo Sarlet, “nem mesmo o interesse comunitário poderá justificar ofensa à dignidade individual, esta considerada como valor absoluto e insubstituível de casa ser humano”.

Reproduzindo o pensamento de Castanheira Neves, continua o eminente constitucionalista gaúcho:

“A dimensão pessoal postula o valor da pessoa humana e exige o respeito incondicional de sua dignidade. Dignidade da pessoa a considerar em si e por si, que o mesmo é dizer a respeitar para além e independente dos contextos integrantes e das situações sociais em que ela concretamente se insira. Assim, se o homem é sempre membro de uma comunidade, de um grupo, de uma classe, o que ele é em dignidade e valor não se reduz a esses modos de existência comunitária ou social. Será por isso inválido, e inadmissível, o sacrifício desse seu valor e dignidade pessoal a benefício simplesmente da comunidade, do grupo, da classe. Por outras palavras, o sujeito portador do valor absoluto não é a comunidade ou classe, mas o homem pessoal, embora existência e socialmente em comunidade e na classe. Pelo que o juízo que histórico-socialmente mereça uma determinada comunidade, um certo grupo ou uma certa classe não poderá implicar um juízo idêntico sobre um dos membros considerado pessoalmente – a sua dignidade e responsabilidade pessoais, não se confundem com o mérito e o demérito, o papel e a responsabilidade histórico-sociais da comunidade, do grupo ou classe de que se faça partes” (in Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais, p. 137).

Assim, resta demonstrada a viabilidade jurídico-constitucional quanto ao reconhecimento das uniões paralelas, uma vez presentes os pressupostos da segunda união, previstos no art. 1.723 do CC.

O CASO CONCRETO.

Inicialmente, é bem de ver que o juízo originário reconheceu a existência de um relacionamento estável entre a apelante ALDA e o apelado CARLOS.

É o que se depreende da fundamentação da sentença, precisamente à fl. 201 dos autos, que destaca: “Portanto, apesar da farta documentação trazida pela autora demonstrando o relacionamento amoroso que teve com réu, diante do impedimento legal, posto que era casado, não há como reconhecer a alegada união estável. ”

Com efeito, o julgador originário manifestou-se pela existência de uma relação afetiva, pública e duradoura pois, rigorosamente, a prova dos autos é robusta e firme no sentido de demonstrar que esse foi o tipo de relação existente entre a autora e o requerido.

Tal afirmação se comprova em razão das fotos de fls. 14/17, donde se conclui que a relação do casal era pública, figurando o par em eventos públicos como batizados e aniversário de 15 anos.

Na mesma linha são os vários bilhetes e cartões de datas comemorativas que o casal se trocava, deixando clara a relação de afeto sólido que mantinham (fls. 18/30).

Contudo, talvez a prova documental que melhor demonstre a intenção de constituição de família do casal seja as contas de água e luz da residência da autora, as quais estão em nome de CARLOS (fls. 31/37).

Não fora esses elementos, os requisitos caracterizadores da união estável estão também retratados na prova testemunhal, conforme os depoimentos que seguem.

A testemunha Tânia Mara Araújo (fl. 138), que é vizinha da autora, relatou que esta “mantinha com o requerido um relacionamento público e notório (…) como se matrimônio fosse (…) que esse relacionamento durou mais de vinte anos (…) que toda vizinhança tinha o réu como marido da autora, porém confirma a depoente que Carlos era casado na ocasião e isso era de conhecimento público.”

No mesmo sentido, Jorge Pereira Rodrigues (fl. 140), que também era vizinho da autora: “Confirma que na ocasião em que residiu próximo da autora o réu freqüentava a casa dela habitualmente, sendo que a vizinhança o tinha como companheiro de Alda (…) Em que pese a autora desempenhasse a função de manicure, tomou conhecimento de que o réu mantinha as despesas dela, pagando as suas contas. (…) Afirma que o relacionamento das partes era notória e pública, ainda que o réu estivesse mantendo paralelamente seu casamento. Soube por terceiros que o relacionamento da autora e do réu teve início nos anos setenta (…)Quando a autora mudou de endereço, em 2002, o réu ainda freqüentava a casa da autora.”

A testemunha Vera de Fátima Chaves Pereira Coitinho (fls. 139): “Confirma que a autora e réu tinham comportamento de marido e mulher. (…) O marido da depoente também tinha a autora como esposa, companheira do réu.”

Diante do contexto probatório, resta demonstrado que Alda e Carlos mantiveram uma união pública, contínua, duradoura e estabelecida com objetivo de constituição de família (art. 1.723 do CC).

Por outro lado, também é certo que, durante a união estável com Alda, Carlos não deixou de conviver com sua primeira esposaValcina bem como, após o término do matrimônio (em 1999 – verso fl. 60), passou a conviver, em união estável, com Eva. Nesse sentido, significativa é a escritura pública de pacto de convivência feita entre Carlos e Eva (fl. 61), dando conta que o requerido conviveu em união estável com Eva “há mais de (7) sete anos” (a data da escritura é de dezembro de 2005).
Todavia, como justificado no tópico anterior, à luz de uma interpretação baseada no princípio/fundamento constitucional dadignidade da pessoa humana, a existência concomitante com o casamento – ou união estável – não impede o reconhecimento de uma segunda união estável, configurando o que a jurisprudência convencionou chamar de união paralela ou união dúplice.

Verificado, então, a existência de união estável paralela ao casamento e, posteriormente, paralela à união estável que se seguiu ao casamento, impõe-se sua declaração, restando, agora, identificar seu período de existência.

Marcos temporais.

Nesse rumo, tem-se que Alda alega que a união estável iniciou-se em 1973.

Contudo, nenhum respaldo há nos autos no sentido de demonstrar que a união, realmente, iniciou-se naquela data.

Veja-se que dentre os vários cartões e fotos de fls. 14/30, a data mais antiga ali contida é referente a uma foto do casal, em uma viagem para o Uruguai, onde consta uma anotação de próprio punho da autora indicando a data de “1979/80” (fl. 14).

Documentalmente, não há mais nenhum indício de que a relação tenha se iniciado antes dessa data, haja vista que a grande maioria das cartas, cheques e contas de água e luz, são datadas da década de 80 em diante.

Por outro lado, a prova testemunhal também não ampara a alegação de que união tenha se iniciado em 1973.

Vejamos o que dizem as testemunhas da autora.

Tânia (fl. 138) diz que o relacionamento durou mais vinte anos (a data da audiência foi 28/08/2007).

Vera (fl. 139) diz que conhece a autora há vinte e sete anos, mas não esclarece desde quando sabe que as partes mantêm união estável.
Jorge (fl. 140) confirma que foi vizinho da autora desde 1984 e “que soube por terceiros que o relacionamento da autora e do réu teve início nos anos setenta”.

A luz desses elementos, penso que não há subsídio seguro para identificar que a união estável tenha se iniciado no ano sustentado pela autora. O fundamento para tanto é a fartura de fotos e correspondências, todas datadas dos anos oitenta e nenhuma dos anos setenta. Por isso, ainda que a prova testemunhal refira indiretamente que a união se iniciou na década de setenta, tenho que fixar o início em 1973 é demasiado.

Fixo, portanto, o marco inicial da união no ano de 1978.

Tocante ao termo final do relacionamento há prova de que tenha se mantido até 2005 como alegado pela apelante.
Nesse sentido são as contas de água e luz da casa da autora, que estão em nome do réu datadas de novembro de 2005 à maio/2006 (fls. 31/37).
A partir dessas balizas, considerando que a inicial, bem como o recurso de apelação, limita-se ao pedido de reconhecimento da união estável, o apelo de ALDA vai provido para reconhecer a união estável, paralela ao casamento e à segunda união estável do varão, pelo período compreendido entre janeiro de 1978 até novembro de 2005.

Reconhecida a união, passemos à análise de seus efeitos.

EFEITOS

Partilha de bens – Meação “Triação”

A apelante requereu na inicial a meação dos bens adquiridos na constância da união com o requerido.

Não há dúvida que se comunicam os bens adquiridos no curso da união entre Alda e Carlos, a teor da combinação das normas do artigo 1.658 e 1.725, do Código Civil de 2002:

Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.

Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.

No caso, há duas uniões dúplices.

Ou seja, num primeiro momento houve casamento e união estável concomitantes e, após o término do matrimônio, duas uniões estáveis concomitantes.

É que ficou bem retratado nos autos que, terminado o casamento com a primeira esposa Valcina (separação judicial em 1999 – verso da fl. 60) o requerido passou a conviver, em união estável, com Eva (escritura pública de pacto de convivência feita entre Carlos e Eva – fl. 61).

Por isso, o patrimônio terá que ser dividido em três, quando o réu apresentar concomitância de relacionamentos e em dois, quando em eventual intervalo entre as uniões paralelas, no caso de o réu ter se relacionado somente com a apelante.

À similitude:

APELAÇÃO. UNIÃO DÚPLICE. UNIÃO ESTÁVEL. POSSIBILIDADE. A prova dos autos é robusta e firme a demonstrar a existência de união entre a autora e o de cujus em período concomitante ao casamento de “papel”. Reconhecimento de união dúplice. Precedentes jurisprudenciais. Os bens adquiridos na constância da união dúplice são partilhados entre a esposa, a companheira e o de cujus. Meação que se transmuda em “triação”, pela duplicidade de uniões. DERAM PROVIMENTO, POR MAIORIA, VENCIDO O DES. RELATOR. (Apelação Cível Nº 70019387455, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 24/05/2007)

APELAÇÃO. UNIÃO DÚPLICE. UNIÃO ESTÁVEL. PROVA. MEAÇÃO. “TRIAÇÃO” . SUCESSÃO. PROVA DO PERÍODO DE UNIÃO E UNIÃO DÚPLICE A prova dos autos é robusta e firme a demonstrar a existência de união entre a autora e o de cujus em período concomitante a outra união estável também vivida pelo de cujus. Reconhecimento de união dúplice. Precedentes jurisprudenciais. MEAÇÃO (TRIAÇÃO) Os bens adquiridos na constância da união dúplice são partilhados entre as companheiras e o de cujus. Meação que se transmuda em “Triação”, pela duplicidade de uniões. DERAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. POR MAIORIA. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível Nº 70011258605, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator Vencido: Alfredo Guilherme Englert, Redator para Acordão: Rui Portanova, Julgado em 25/08/2005)

Logo, a partilha de bens/meação requerida pela apelante (companheira) corresponde a 1/3 do patrimônio formado no período concomitante em cada uma das uniões (casamento e união estável).

Ou metade do patrimônio, em eventual intervalo entre as uniões paralelas, caso venha a ser demonstrado que o requerido relacionou-se somente com a apelante em determinado período.

Portanto, a apelante não tem direito à meação em relação aos bens adquiridos antes do início da sua união (janeiro/1978) bem como após o término da relação, em novembro/2005.

Dito isso, como não veio aos autos relação de bens a serem partilhados, o apelo de Alda vai provido somente para declarar o direito de Alda à partilha dos bens, a ser feita em liquidação de sentença, nos moldes aqui definidos.

Alimentos.

Uma vez reconhecida a entidade familiar, procede a pretensão da apelada em receber alimentos do ex-companheiro, diante do vínculo de companheirismo que se estabelece (art. 1.694 do CC).

Resta, portanto, a análise do binômio (ou trinômio) alimentar – proporção entre necessidades e possibilidades – o que passo a fazer em conjunto.
Na inicial, Alda pede que os alimentos sejam fixados em 1,4 salários mínimos (fl. 05).

Por um lado, restou muito bem comprovado que durante o período de convivência Carlos proveu o sustento da requerente. Nesse sentido são os cheques do requerido que ele repassou à autora para o custeio de suas despesas (fls. 09/13), bem como as contas de água e luz da apelante que estavam em nome do varão.

Na mesma toada, a prova testemunhal sustenta a alegação da autora de que o varão era o responsável por seu sustento.

Nesse sentido a testemunha Tânia (fl. 138): “Durante os anos em que a autora esteve com o réu, ele mantinha o sustento dela.”

A testemunha Vera (fl. 139): “Diz que a autora ajudava na campanha, trabalhando na horta, com o gado, entre outras atividades.”

A testemunha Jorge (fl. 140): “em que pese a autora desempenhasse a função de manicure, tomou conhecimento de que o réu mantinha as despesas dela, pagando as suas contas”.

Não fora esses elementos, não perco de vista que, ainda em cognição sumária, foram fixados alimentos provisórios em favor da autora em um salário mínimo (fl. 45), contra os quais foi interposto agravo de instrumento, mantendo-se o pensionamento provisório (decisão de fl. 78/80).

Só a partir dessas constatações, já é possível identificar os pressupostos da obrigação alimentar. Ou seja, por um lado Alda necessita da verba alimentar, pois foi sustentada pelo varão ao longo de 27 anos de união estável, bem como possui ele possibilidade de fornecer pensão alimentícia à mulher.

Sendo assim, tocante aos alimentos, vai provido parcialmente o apelo de Alda para determinar que Carlos lhe pague alimentos em 25% do salário mínimo, a ser pago pelo demandado até o quinto dia útil de cada mês, a contar da data dessa decisão.

Sucumbência.

Considerando a alteração na sucumbência, em função do parcial provimento do apelo de Alda, as custas judiciais e honorários advocatícios, fixados na sentença, ficarão a cargo do réu.

ANTE O EXPOSTO, dou parcial provimento à apelação para:

a) declarar a união entre Alda e Carlos compreendida entre janeiro de 1978 até novembro de 2005;

b) declarar seu direito à meação, que equivalerá a um terço do patrimônio adquirido pelo casal, em período em que o réu apresentar relacionamentos concomitantes e metade do patrimônio adquirido em eventual período em que o requerido tiver se relacionado somente com a apelante, nos termos acima expostos, definindo-se a partilha em liquidação de sentença e

c) fixar alimentos em favor da apelante no valor de 25% do salário mínimo, a ser pago pelo réu no quinto dia útil de cada mês, a partir dessa decisão.

Sucumbência conforme a fundamentação.

DES. CLAUDIR FIDÉLIS FACCENDA (REVISOR) – De acordo.

DES. JOSÉ ATAÍDES SIQUEIRA TRINDADE – De acordo.

DES. RUI PORTANOVA – Presidente – Apelação Cível nº 70022775605, Comarca de Santa Vitória do Palmar: “DERAM PARCIAL PROVIMENTO. UNÂNIME.”

Fonte: Blog do 26 I 04/10/2013.

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União estável – Pressupostos – Affectio maritalis – Coabitação – Publicidade da relação – Prova – Sucessão do companheiro – Diferença de trato legislativo entre união estável e casamento – Inexistência de violação a preceitos ou princípios constitucionais

EMENTA

UNIÃO ESTÁVEL. PRESSUPOSTOS. AFFECTIO MARITALIS. COABITAÇÃO. PUBLICIDADE DA RELAÇÃO. PROVA. SUCESSÃO DO COMPANHEIRO. DIFERENÇA DE TRATO LEGISLATIVO ENTRE UNIÃO ESTÁVEL E CASAMENTO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO A PRECEITOS OU PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. 1. A união estável assemelha-se a um casamento de fato e indica uma comunhão de vida e de interesses, reclamando não apenas publicidade e estabilidade, mas, sobretudo, um nítido caráter familiar, evidenciado pela affectio maritalis. 2. Comprovada a relação de companheirismo e configurada a intenção de constituir um núcleo familiar, a procedência da ação se impõe. 3. A companheira tem direito à metade dos bens adquiridos na constância da vida em comum, pouco importando qual a colaboração prestada por ela para a aquisição do patrimônio, pois a união estável é regida pelo regime da comunhão parcial de bens. Inteligência do art. 1.725 do CC. 4. O art. 226 da Constituição Federal não equiparou a união estável ao casamento civil, apenas admitiu-lhe a dignidade de constituir entidade familiar, para o fim de merecer especial proteção do Estado, mas com a expressa recomendação de que seja facilitada a sua conversão em casamento. 5. Tratando-se de institutos jurídicos distintos, é juridicamente cabível que a união estável tenha disciplina sucessória distinta do casamento e, aliás, é isso o que ocorre, também, com o próprio casamento, considerando-se que as diversas possibilidades de escolha do regime matrimonial de bens também ensejam seqüelas jurídicas distintas. 6. O legislador civil tratou de acatar a liberdade de escolha das pessoas, cada qual podendo escolher o rumo da sua própria vida, isto é, podendo ficar solteira ou constituir família, e, pretendendo constituir uma família, a pessoa pode manter uma união estável ou casar, e, casando ou mantendo união estável, a pessoa pode escolher o regime de bens que melhor lhe aprouver. Mas cada escolha evidentemente gera suas próprias seqüelas jurídicas, produzindo efeitos, também, no plano sucessório, pois pode se submeter à sucessão legal ou optar por fazer uma deixa testamentária. Recurso desprovido. (TJRS – Apelação Cível nº 70055524748 – Osório – 7ª Câmara Cível – Rel. Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves – DJ 03.09.2013)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento ao recurso.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, as eminentes Senhoras DES.ª LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO E DES.ª SANDRA BRISOLARA MEDEIROS.

Porto Alegre, 28 de agosto de 2013.

DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES – Relator.

RELATÓRIO

DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES (Relator):

Trata-se da irresignação da SUCESSÃO DE LINDOMAR M.S, representada pelos seus herdeiros, com a r. sentença que julgou procedente a ação de reconhecimento de união estável que lhe move TEREZINHA G.J.S. no período de 1º de janeiro de 2000 a 23 de setembro de 2012.

Sustentam os recorrentes inexistir prova suficiente para o reconhecimento da alegada união estável, ponderando que o falecido convivia com a sua esposa Cecília e com seus filhos até a data da sua morte. Dizem que eles ainda eram casados e que a esposa era sua dependente no IPERGS. Afirmam que a prova dos autos é insuficiente para agasalhar o reconhecimento da união estável entre a recorrida e o falecido. Pretendem seja a ação julgada a improcedente. Pedem o provimento do recurso.

Intimada, a recorrida ofereceu contra-razões afirmando que a prova coligida demonstrou cabalmente a união estável e pede o desprovimento do recurso.

Com vista dos autos, a douta Procuradoria de Justiça lançou parecer opinando pela confirmação da sentença.

Foi observado o disposto no art. 551, § 2º, do CPC.

É O RELATÓRIO.

VOTOS

DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES (Relator):

Estou confirmando a douta sentença pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.

Com efeito, observo que, inequivocamente, houve um relacionamento amoroso entre o casal, e, embora nem todo o relacionamento amoroso constitua união estável, há que se atentar para as peculiaridades do relacionamento entretido entre a autora e o falecido.

Assim, para que uma relação possa ser qualificada como união estável, que é entidade familiar, é imperioso que se verifiquem, de forma clara e insofismável, as suas características peculiares postas no art. 1.723 do Código Civil, que são (a) a diversidade de sexos, (b) a convivência pública, contínua e duradoura, (c) estabelecida com o objetivo de constituição de uma família.

Pode-se afirmar que a união estável corresponde a um casamento de fato. Enquanto a entidade familiar que inicia com o casamento é comprovada pela mera exibição da certidão respectiva, a união estável reclama cuidadosa apuração dos fatos, mercê dos gravíssimos efeitos jurídicos dela resultantes. E, para que uma relação seja reconhecida como união estável, é imprescindível a cabal demonstração de todos os seus requisitos.

POR ESSA RAZÃO, É QUE O PRÓPRIO LEGISLADOR CONSTITUINTE APRESSOU-SE EM APONTAR NO ART. 226, §3º, QUE “PARA EFEITO DE PROTEÇÃO DO ESTADO, É RECONHECIDA A UNIÃO ESTÁVEL ENTRE O HOMEM E A MULHER COMO ENTIDADE FAMILIAR, DEVENDO A LEI FACILITAR A SUA CONVERSÃO EM CASAMENTO”.

Ora, assim como ocorre com o casamento, também a união estável reclama um período anterior de aproximação, que vai do conhecimento, passa pelo namoro, configura um pré-compromisso e, enfim, se estabelece a própria entidade familiar, a partir da efetiva comunhão de vida, valendo gizar que lei não trata de proteger o amor, nem os amantes, mas sim a família resultante dessa relação.

Na união estável, o relacionamento marital passa a ser reconhecido quando o casal exterioriza insofismavelmente a intenção de constituir uma família com uma plena comunhão de vidas.

Por serem as uniões estáveis fatos da vida, com múltiplas peculiaridades, as relações não observam necessariamente um modelo paradigmático. Cada relação é única e, por essa razão, cuida-se de examinar os sinais externos, isto é, a projeção do relacionamento no contexto social, ou seja, a convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituição de uma família.

Por essa razão é que o fato da coabitação, evidenciada pela moradia comum, sob o mesmo teto, constitui fortíssimo indicativo da união estável, assim como, o fato do casal não residir sob o mesmo teto constitui também evidente indicativo de que o casal não pretende constituir uma família… É que, se o casal não estabelece o ninho, a sede da família, a base material do casamento, tudo indica que inexistia a intenção de constituir um núcleo familiar.

Do exame da prova coligida (fls. 10/16 e 111/112), verifica-se que, efetivamente, o relacionamento amoroso envolvendo a autora e o falecido configurou uma união estável, pois era pública e notória a convivência deles como um casal, inclusive perante os familiares, vizinhos e amigos.

Com tais considerações, estou acolhendo, os argumentos postos no parecer do Ministério Público, de lavra do eminente PROCURADOR DE JUSTIÇA RICARDO VAZ SEELIG, que peço vênia para transcrever, in verbis:

No mérito, entende o Signatário que o recurso merece ser desprovido.

Ao contrário do alegado, os elementos probatórios trazidos ao feito não deixam dúvidas de que o relacionamento havido entre Lindomar e Teresinha Goreti preenchia os requisitos legais, pois acompanhado de convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituir família.

Os depoimentos prestados em juízo, bem como a prova documental juntada com a inicial corrobora a tese da demandante, no sentido de que o relacionamento perdurou por, aproximadamente, 12 anos. Ademais, não há nenhum outro elemento nos autos que contraponha a versão sustentada pela demandante.

Os apelantes, por sua vez, embora inconformados com a sentença, não apresentaram motivo suficiente para sua reforma. Ao longo da instrução do feito, ainda que tivesse oportunidade, não lograram comprovar a inexistência do direito alegado pela apelada. O fato de o de cujus não ter se separado judicialmente, por si só, não impossibilita o reconhecimento da união vivida com Teresinha, porquanto restou amplamente demonstrado nos autos que Lindomar estava separado de fato de Cecília, sua primeira esposa.

Nessa linha, cumpre transcrever alguns trechos da bem lançada sentença da lavra da Juíza de Direito, Dra. Letícia Bernardes da Silva, assim expressos:

“(…) Em suma, o conjunto probatório deixa evidente que a relação estabelecida entre a autora e o falecido Lindomar, do ano de 2000 até a morte deste, ocorrida em 23 de setembro de 2012, efetivamente, possuiu affectio maritalis”.

Com efeito, restou claramente comprovado pelo contexto probatório a manutenção, entre o falecido Lindomar e a demandante Teresinha Goreti, motivo pelo qual constato que o relacionamento por eles mantido possui contornos maiores do que o de um namoro ou de um caso extraconjugal.

(…) Além das fotografias colacionadas pela autora, o documento das fls. 10/12 demonstra que Maria Goreti e Lindomar eram titulares que uma conta-poupança conjunta, o que corrobora a existência da alegada vida em comum.

Neste mesmo sentido, ainda, a certidão da fl. 12, em que o casal fora testemunha de um enlace matrimonial, bem como documento da fl. 14, o qual demonstra que Lindomar autorizou a requerente a movimentar seu crediário na loja Bazar Cinderela.

Outrossim, a prova oral também consubstanciou a existência da união estável entre a autora e o falecido Lindomar. (…)” (fls. 111-112)

Sendo assim, correto o Juízo a quo, ao declarar a existência da união estável havida entre Teresinha Goreti e o de cujusLindomar, visto que a autora/apelada desincumbiu-se do ônus que lhe cabia de comprovar a existência do relacionamento no período alegado.

4. DIANTE DO EXPOSTO, o Ministério Público manifesta-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

ISTO POSTO, nego provimento ao recurso.

DES.ª LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO (REVISORA) – De acordo com o(a) Relator(a).

DES.ª SANDRA BRISOLARA MEDEIROS – De acordo com o(a) Relator(a).

DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES (PRESIDENTE E RELATOR) – Presidente – Apelação Cível nº 70055524748, Comarca de Osório: "NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME."

Fonte: Grupo Serac – Boletim Eletrônico INR nº 6045 I 23/9/2013.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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