Apelação – Alienação fiduciária – Bem imóvel – Registro de imóveis – Devedores fiduciários intimados para realizarem a purga da mora – Prazo que transcorreu em branco – Consolidação da propriedade em nome do credor ficudiário – Posterior purgação da mora – Pretensão do credor fiduciário de que a averbação seja cancelada administrativamente pelo oficial – Impossibilidade – Inocorrência de vício – Recurso improvido – É incontroverso que não existe vício na averbação da consolidação da propriedade que autorize a incidência do disposto nos art. 248 e 250, da LRP – Os devedores, a pedido do credor fiduciário, foram intimados para pagamento das prestações vencidas – Decorrido o prazo, houve consolidação da propriedade do imóvel em favor do credor fiduciário – A purgação da mora é plenamente possível após a consolidação da propriedade plena em mãos do credor fiduciário – Todavia, torna necessário o registro de uma nova transferência imobiliária, sob pena de ofensa ao princípio da continuidade.


  
 

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1018608-59.2019.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante BANCO BRADESCO S/A, é apelado 9º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE SÃO PAULO – SP.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 31ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso, nos termos que constarão do acórdão. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores FRANCISCO CASCONI (Presidente) e JOSÉ AUGUSTO GENOFRE MARTINS.

São Paulo, 10 de novembro de 2019.

Assinatura Eletrônica

ADILSON DE ARAUJO

RELATOR

Apelação nº 1018608-59.2019.8.26.0100 (DIGITAL)

Comarca : São Paulo Foro Central 1ª Vara Cível

Juiz (a): Denise Cavalcante Fortes Martins

Apelante: BANCO BRADESCO S/A (autor)

Apelado: 9º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE SÃO PAULO SP (réu)

Voto nº 29.820

APELAÇÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. BEM IMÓVEL. REGISTRO DE IMÓVEIS. DEVEDORES FIDUCIÁRIOS INTIMADOS PARA REALIZAREM A PURGA DA MORA. PRAZO QUE TRANSCORREU EM BRANCO. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DO CREDOR FICUDIÁRIO. POSTERIOR PURGAÇÃO DA MORA. PRETENSÃO DO CREDOR FIDUCIÁRIO DE QUE A AVERBAÇÃO SEJA CANCELADA ADMINISTRATIVAMENTE PELO OFICIAL. IMPOSSIBILIDADE. INOCORRÊNCIA DE VÍCIO. RECURSO IMPROVIDO. É incontroverso que não existe vício na averbação da consolidação da propriedade que autorize a incidência do disposto nos art. 248 e 250, da LRP. Os devedores, a pedido do credor fiduciário, foram intimados para pagamento das prestações vencidas. Decorrido o prazo, houve consolidação da propriedade do imóvel em favor do credor fiduciário. A purgação da mora é plenamente possível após a consolidação da propriedade plena em mãos do credor fiduciário. Todavia, torna necessário o registro de uma nova transferência imobiliária, sob pena de ofensa ao princípio da continuidade.

BANCO BRADESCO S/A ajuizou ação de cancelamento de averbação em face do 9º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE SÃO PAULO –SP.

A ilustre Magistrada a quo, por r. sentença de fls. 79/82, cujo relatório adoto, julgou extinto o processo, sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, VI do CPC, dada a ilegitimidade passiva da parte. Condenou o autor no pagamento das custas, despesas processuais e verba honorária avoatícia arbitrada em R$ 1.000,00, com fundamento no art. 85 do CPC.

Irresignado, insurge-se o autor com pedido de reforma, argumentando que está clara a legitimidade do apelado para configurar no polo passivo, porque foi ele quem se negou a proceder administrativamente o cancelamento da averbação. O art. 250 da Lei nº 6.015/1973 (Registros Públicos), em seus incisos II e III, permite que o cancelamento da averbação seja realizado administrativamente, sem necessidade de processo judicial. Foi apresentado ao apelado requerimento assinado pelo apelante (credor fiduciário) e devedores fiduciários, com firmas reconhecidas, bem como demais documentos, porém o réu se recusou a praticar o ato. Apesar da averbação da consolidação ter natureza meramente declaratória, não há justificativa plausível a embasar a impossibilidade de se averbar o cancelamento da consolidação mediante requerimento do interessado, sob a afirmação de que se os requisitos legais foram preenchidos. A Lei de Registros Públicos não delimita a possibilidade de cancelamento apenas dos atos de natureza constitutiva. Não há ofensa ao princípio da continuidade, pois na matrícula do imóvel haveria o registro da alienação fiduciária, a averbação da consolidação e a averbação de cancelamento da anterior. Prequestiona a matéria (fls. 84/88).

O réu ofertou contrariedade alegando que o oficial registrador não tem legitimidade para figurar no polo passivo da ação em que a pretensão é de cancelamento da averbação. Embora defenda a legalidade da recusa do cancelamento, o resultado da ação nenhuma repercussão terá em sua vida, em seu patrimônio e em seus interesses. Na espécie, não se trata de nulidade. O fundamento do pedido do apelante é a perda da eficácia da consolidação pelo posterior pagamento da dívida pelos fiduciantes. A consolidação da propriedade só foi averbada porque requerida pelo apelante, credor fiduciário. O ato não foi praticado de ofício pelo registrador. O apelante não alegou qualquer irregularidade no procedimento da averbação. Implicitamente, reconheceu que o ato foi praticado de acordo com todas as disposições legais e administrativas aplicáveis ao procedimento previsto na Lei nº 9.514/97 (fls. 93/108).

É o relatório.

O autor mostra-se inconformado com o desfecho de sua pretensão de cancelamento de averbação pelo OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE SÃO PAULO SP.

Sustenta ter solicitado ao oficial do 9º Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo/SP a intimação dos devedores fiduciários Cristiane Santiago Novaes e seu cônjuge Valdir Tavares, nos termos do art. 26 e seguintes da Lei 9.514/97; transcorrido o prazo de 15 dias, houve a consolidação da propriedade em seu favor. Entretanto, depois da consolidação, os devedores procuraram o autor e pagaram as parcelas atrasadas, conforme Instrumento Particular de Confissão de Dívida. Desse modo, houve a purgação da mora. Assim, defende que é imperiosa a repristinação do contrato, com o cancelamento da averbação e consequente retorno do contrato ao seu curso normal.

Ocorre que a instituição financeira requereu o cancelamento da averbação, mas o 9º Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo/SP, que se recusou a realizá-lo.

Com a recusa administrativa, ajuizou pretensão judicial, extinta, sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, VI do CPC. Inconformado o Banco interpôs o presente recurso.

Analisado todo o acervo probatório, o recurso não comporta provimento.

Coforme a teoria da asserção, para ser parte legítima na relação jurídica processual, que diz respeito à verificação da pertinência abstrata das partes para com o direito material controvertido, basta que uma pessoa se afirme titular de um direito e impute à outra, na petição inicial, o envolvimento no conflito de interesses e esta possa suportar, em tese, os efeitos da sentença.

No caso em julgamento, considerada a alegação do autor de que requereu o cancelamento da averbação, mas o 9º Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo/SP recusou-se a realizálo, considero, a princípio, pertinente a legitimidade do réu para figurar no polo passivo.

O oficial registrador responde pessoalmente pelos atos administrativos que pratica e possam acarretar eventuais prejuízos a terceiros, nos termos das disposições do art. 22 da Lei nº 8.935/94.

Apenas na análise do mérito constatasse que a pretensão formulada é improcedente.

É incontroverso que não existe vício na averbação da consolidação da propriedade que autorize a incidência do disposto nos art. 248 e 250, da LRP.

Os devedores, a pedido do credor fiduciário, foram intimados para pagamento das prestações vencidas. Decorrido o prazo, houve consolidação da propriedade do imóvel em favor do credor fiduciário.

Com efeito, a purgação da mora é plenamente possível após a consolidação da propriedade plena em mãos do credor fiduciário. Todavia, torna necessário o registro de uma nova transferência imobiliária, sob pena de ofensa ao princípio da continuidade.

Neste sentido:

“APELAÇÃO CÍVEL REGISTRO DE IMÓVEIS AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER AVERBAÇÃO DE CONSOLIDAÇÃO DE PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL Pretensão ao cancelamento da averbação rejeitada pelo Oficial de Registros. Improcedência da ação em Primeiro Grau de Jurisdição. Inconformismo do autor. Não acolhimento. Consolidação da propriedade em mãos do credor fiduciário ocorre de pleno direito em razão da constituição em mora do fiduciante, por força artigo 26, caput, da Lei nº 9.514/97, sendo a subsequente averbação prevista no § 7º do mesmo artigo meramente declaratória e não constitutiva. Impossível o simples cancelamento da averbação com a pretendida finalidade do retorno da propriedade resolúvel com violação ao princípio da continuidade, inaplicáveis para tanto, e por tais razões, os artigos 248 e 250, II, da lei de Registros Públicos, notadamente no presente caso em que após a purgação da mora o fiduciante tornou à inadimplência. Sentença mantida. Recurso improvido.” (Apelação nº 1004302-11.2016 .8.26.0482 6ª Câmara de Direito Privado – Relator Desembargador Dimitrios Zarvos Varellis Julgado em 29/03/2019

Ademais, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, ao decidir caso semelhante, salientou que “os prejuízos advindos com a posterior purgação da mora são suportados exclusivamente pelo devedor fiduciante, que arcará com todas as despesas referentes à ‘nova’ transmissão da propriedade e também com os gastos despendidos pelo fiduciário com a consolidação da propriedade (ITBI, custas cartorárias, etc)” (REsp nº 1.462.210/RS – 3ª Turma – Relator Mininstro Ricardo Villas Bôas Cueva Julgado em 18/11/2014).

Levando em consideração o trabalho adicional em grau recursal, elevo os honorários advocatícios em favor do patrono do réu para R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), com suporte no art. 85, §§ 8º e 11 do CPC.

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso e levando em consideração o trabalho adicional em grau recursal, elevo os honorários advocatícios em favor do patrono do réu para R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), com suporte no art. 85, §§ 8º e 11 do CPC.

Assinatura Eletrônica

ADILSON DE ARAUJO

Relator – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1018608-59.2019.8.26.0100 – São Paulo – 31ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Adilson de Araujo – DJ 12.11.2019

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito”.