CSM/SP: Registro de Imóveis – Carta de Adjudicação – Suposta quebra do princípio da continuidade – Fraude à Execução – Ineficácia da doação declarada expressamente nos mesmos autos da execução em que ocorrida a arrematação – Desnecessidade de cancelamento da averbação da penhora – Ausência de quebra da continuidade – Desnecessidade de averbação da construção – Recurso desprovido.


  
 

Apelação Cível n.º 1003666-75.2018.8.26.0223

Apelante: Ministério Público do Estado de São Paulo

Apelado: Walquiria Franco Simão

VOTO Nº 37.823

Registro de Imóveis – Carta de Adjudicação – Suposta quebra do princípio da continuidade – Fraude à Execução – Ineficácia da doação declarada expressamente nos mesmos autos da execução em que ocorrida a arrematação – Desnecessidade de cancelamento da averbação da penhora – Ausência de quebra da continuidade – Desnecessidade de averbação da construção – Recurso desprovido.

Cuida-se de recurso de apelação interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, em face da r. sentença de fls. 59/64, que julgou improcedente dúvida suscitada pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Guarujá, permitindo, assim, o registro de carta de arrematação referente ao imóvel da matrícula nº 64.811 daquela serventia.

O apelante sustenta a impossibilidade do registro, pois o imóvel não era de propriedade do executado constante na carta de arrematação, sendo ainda preciso o prévio cancelamento de penhora inscrita, por não produzir efeitos perante terceiros a declaração de ineficácia.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 131/134).

É o relatório.

Presentes pressupostos legais e administrativos, conheço do recurso.

No mérito, respeitado o entendimento do Parquet, a r. Sentença deve ser confirmada.

Em 14 de fevereiro de 2018, foi prenotada Carta de Arrematação expedida pela 1ª Vara do Trabalho do Guarujá, em 7 de fevereiro de 2017, nos autos do processo nº 00122000919955020301, extraída da ação trabalhista ajuizada por Maria Tereza de Jesus contra Borelli & Martins – Comércio de Refeições Ltda.

Conforme reiterados precedentes deste Eg. Conselho Superior da Magistratura, a natureza judicial do título apresentado não impede sua qualificação registral quanto aos aspectos extrínsecos ou aqueles que não foram objeto de exame pela Autoridade Jurisdicional.

O Item 119 do Capítulo XX do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, é expresso acerca do dever do Oficial do Registro de Imóveis a tanto, como se constata de sua redação:

“119. Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.

Também deve ser anotado que a arrematação não é modo originário de aquisição de propriedade.

Embora essa tese tenha prevalecido neste C. Conselho Superior da Magistratura por um breve período, já se retomou o entendimento consolidado de que a arrematação é modo derivado de aquisição da propriedade.

Nesse sentido:

“REGISTRO DE IMÓVEIS CARTA DE ARREMATAÇÃO MODO DERIVADO DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE Ferimento dos Princípios da Continuidade e da Especialidade Objetiva – Recurso Desprovido” (Apelação nº 9000002-19.2013.8.26.0531, Rel. Des. Elliot Akel, j. em 2/9/2014).

A alienação forçada em processo judicial encerra, assim, transmissão derivada do direito de propriedade do imóvel, por envolver manifestação de vontade do adquirente e do Estado, pressupondo relação jurídica anterior, donde emerge o caráter bilateral da aquisição, apesar da ausência de manifestação de vontade do titular do direito real.

No caso em exame, nada obstante a possibilidade de qualificação de título judicial em alienação forçada, não haverá ofensa à continuidade, uma vez que existe declaração expressa de ineficácia relativa à alienação feita a Viviane Costa Martins e Jussara Costa Martins, a título de doação, conforme R. 8 (fls. 19/24).

A declaração de ineficácia ocorreu nos próprios autos em que houve a arrematação, processo nº 0122/1995 (00122000919955020301), movida por Maria Tereza de Jesus em face de João Bernardino Borelli Martins e sua esposa. (Av. 11), de 5 de fevereiro de 2015, de modo que, quanto ao arrematante, tal doação é ineficaz.

São reiterados os precedentes desse Eg. Conselho Superior da Magistratura:

“REGISTRO DE IMÓVEIS DÚVIDA PRETENSÃO DE REGISTRO DE CARTA DE ADJUDICAÇÃO Negativa, Em Razão De Quebra Do Princípio Da Continuidade – Fraude À Execução Ineficácia Da Renúncia Ao Direito De Propriedade Declarada Expressamente Pelo Juízo Da Execução Desnecessidade De Cancelamento Da Averbação Ausência De Quebra Da Continuidade Recurso Provido. (Apelação Cível nº 0005288-85.2013.8.26.0223, Des. ELLIOT AKEL)”.

A declaração de ineficácia que resulta da fraude à execução tem limites objetivos e subjetivos, restritos ao processo no qual tal declaração ocorreu.

Na hipótese, ela ocorreu nos mesmos autos em que reconhecida a fraude, sendo possível o ingresso do título, já que a ineficácia do negócio jurídico aproveita justamente o arrematante.

Da mesma forma, desnecessário o cancelamento da penhora antecedente no caso de alienação forçada, pois a sua existência não obstam o registro da carta de arrematação:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Carta de arrematação – Cancelamento direto de penhoras estranhas à do processo onde ocorrida a alienação judicial – Desnecessidade – Cancelamento indireto oriundo do pretendido registro – Indisponibilidades legais (art. 53, § 1.º, da Lei nº 8.212/1991) desprovidas de força para obstaculizar a alienação forçada do bem imóvel e seu respectivo registro – Retificação prévia prescindível – Princípio da cindibilidade – Exigências afastadas – Dúvida improcedente – Recurso procedente, com observação. (Apelação Cível n. 9000001-36.2015.8.26.0443, Des. MANOEL PEREIRA CALÇAS)”.

Por fim, não há óbice ao registro da arrematação do terreno, ficando postergado, oportunamente, por iniciativa do interessado, a averbação da construção.

Resta assim confirmada integralmente a r. Sentença.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: DJe/SP de 02.09.2019

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