CSM/SP: Registro de imóveis – Usucapião de servidão – Ausência de indicação no título judicial do prédio serviente – Aquisição originária e unilateral impeditiva da utilização de elementos constantes de registros imobiliários anteriores – Necessidade de atendimento ao princípio da especialidade objetiva com a correta indicação dos elementos estruturais do direito real de servidão no título judicial – Recurso não provido.

Apelação Cível nº 1003295-95.2018.8.26.0099

Apelantes: Alberto José Pompeo, Oswaldo Pompeu Filho, Sonia Maria Angeli Pompêo e Ana Lucia Luppe Pompeo

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de Bragança Paulista

VOTO Nº 37.799

Registro de imóveis – Usucapião de servidão – Ausência de indicação no título judicial do prédio serviente – Aquisição originária e unilateral impeditiva da utilização de elementos constantes de registros imobiliários anteriores – Necessidade de atendimento ao princípio da especialidade objetiva com a correta indicação dos elementos estruturais do direito real de servidão no título judicial – Recurso não provido.

Trata-se de apelação interposta por Alberto José Pompeo e outros contra r. sentença que julgou procedente a dúvida e manteve a recusa do registro de usucapião de imóvel e servidão de água por violação ao princípio da especialidade objetiva.

Os apelantes sustentam a regularidade do título e o cabimento do registro porquanto a servidão de água foi objeto da ação de usucapião e existe de longa data, como consta do registro imobiliário (fls. 131/139).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 167/171).

É o relatório.

A natureza judicial do título apresentado não impede sua qualificação registral quanto aos aspectos extrínsecos ou aqueles que não foram objeto de exame pela Autoridade Jurisdicional.

O item 119, do Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça é expresso acerca do dever do Oficial do Registro de Imóveis a tanto, como se constata de sua redação:

119. Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais.

Essa questão é pacífica nos precedentes administrativos deste órgão colegiado, entre muitos, confira-se trecho do voto do Desembargador Manuel Pereira Calças, Corregedor Geral da Justiça à época, na apelação n. 0001561-55.2015.8.26.0383, j. 20.07.17:

A origem judicial do título não afasta a necessidade de sua qualificação registral, com intuito de se obstar qualquer violação ao princípio da continuidade (Lei 6.015/73, art. 195).

Nesse sentido, douto parecer da lavra do então Juiz Assessor desta Corregedoria Geral de Justiça, Álvaro Luiz Valery Mirra, lançado nos autos do processo n.º 2009/85.842, que, fazendo referência a importante precedente deste Colendo Conselho Superior da Magistratura (Apelação Cível n.º 31.881-0/1), aduz o que segue:

“De início, cumpre anotar, a propósito da matéria, que tanto esta Corregedoria Geral da Justiça quanto o Colendo Conselho Superior da Magistratura têm entendido imprescindível a observância dos princípios e regras de direito registral para o ingresso no fólio real – seja pela via de registro, seja pela via de averbação – de penhoras, arrestos e seqüestros de bens imóveis, mesmo considerando a origem judicial de referidos atos, tendo em conta a orientação tranqüila nesta esfera administrativa segundo a qual a natureza judicial do título levado a registro ou a averbação não o exime da atividade de qualificação registral realizada pelo oficial registrador, sob o estrito ângulo da regularidade formal (Ap. Cív. n. 31.881-0/1).”

A servidão predial, conforme Orlando Gomes (Direitos reais. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 281), é o direito real sobre a coisa imóvel, que lhe impõe um ônus em proveito de outra, pertencente a diferente dono.

Desse modo, a estrutura do direito real de servidão envolve os prédios serviente e dominante, aquele é gravado e este tem sua utilidade ampliada.

Os artigos 1.378 e 1.379 do Código Civil prescrevem:

Art. 1.378. A servidão proporciona utilidade para o prédio dominante, e grava o prédio serviente, que pertence a diverso dono, e constitui-se mediante declaração expressa dos proprietários, ou por testamento, e subseqüente registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Art. 1.379. O exercício incontestado e contínuo de uma servidão aparente, por dez anos, nos termos do art. 1.242, autoriza o interessado a registrá-la em seu nome no Registro de Imóveis, valendo-lhe como título a sentença que julgar consumado a usucapião.

Parágrafo único. Se o possuidor não tiver título, o prazo da usucapião será de vinte anos.

Nessa perspectiva, é possível a constituição da servidão por usucapião, contudo deve haver descrição dos prédios serviente e dominante.

No âmbito dos registros públicos, o Princípio da Especialidade Objetiva, contido no art. 176 da Lei n. 6.015/73, exige a identificação do imóvel como um corpo certo objetivando sua localização física.

No presente caso, competia descrição exata do prédio serviente no título judicial, com detalhada indicação da servidão.

A usucapião é modo originário de aquisição da propriedade imóvel, destarte, os registros imobiliários anteriores da área usucapida não tem relevância para inscrição da servidão adquirida por usucapião ante ao caráter unilateral da aquisição.

A servidão tem de constar no título judicial com indicação dos prédios dominante e serviente, o que não ocorre.

A simples indicação na exordial da ação judicial ou em escritura pública não tem o condão de superar essa situação.

A mera manifestação do Oficial de Registro de Imóveis na ação de usucapião, bem como a procedência genérica da ação não supre os requisitos referidos para o atendimento do princípio da especialidade objetiva.

A descrição do prédio serviente tem de constar no título e não em matrícula imobiliária ante ao caráter originário da aquisição por usucapião.

A qualificação registral negativa não implica na extinção da servidão.

Nestes termos, não é possível o ingresso do título judicial como se encontra por força do não atendimento ao princípio da especialidade objetiva.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: DJe/SP de 05.08.2019

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CSM/SP: Registro de imóveis – Ofensa ao princípio da especialidade objetiva – Possibilidade de retificação do registro anterior para abertura de matrícula e posterior ingresso do título, se o caso – Dúvida julgada procedente – Recurso não provido.

Apelação Cível n.º 1102183-96.2018.8.26.0100

Apelante: Luciana Pereira dos Santos

Apelado: 12º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

VOTO N.º 37.806

Registro de imóveis – Ofensa ao princípio da especialidade objetiva – Possibilidade de retificação do registro anterior para abertura de matrícula e posterior ingresso do título, se o caso – Dúvida julgada procedente – Recurso não provido.

Trata-se de apelação interposta contra a r. sentença[1] proferida pela MM.ª Juíza Corregedora Permanente do 12º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, que julgou procedente dúvida suscitada para o fim de manter a recusa a registro de escritura de compra e venda de imóvel, por ausência de elementos referentes à descrição do imóvel.

Em síntese, afirma a apelante que os documentos apresentados permitem a retificação da matrícula, sendo suficientes para sanar a omissão ou o erro relativo à descrição do imóvel, certo que as medidas laterais não constam dos registros anteriores. Entende que, por se tratar de erro simples, não há óbice ao ingresso do título no fólio real com base no memorial descritivo apresentado[2].

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso[3].

É o relatório.

O dissenso versa sobre a registrabilidade da escritura de venda e compra lavrada em 27 de novembro de 2013, referente ao lote 5 da quadra 30, Vila Burgo Paulista, Distrito de Ermelino Matarazzo. Em sua nota devolutiva, o registrador apresentou óbices relativos à ausência de medidas laterais e divergência entre a área total do imóvel mencionada na escritura pública e a planta arquivada na serventia.

Ora, o título apresentado não pode mesmo ser registrado, porquanto o imóvel objeto da escritura de compra e venda em análise está descrito sem as medidas laterais que, ademais, não podem ser retificadas de ofício ante a divergência da metragem total do lote[4] e a planta arquivada em cartório[5]. Veja-se que o formato irregular do imóvel, que apresenta 8,5m de frente e 8m de fundos, impede a apuração das medidas laterais e, por conseguinte, da área total por meros cálculos aritméticos.

Como é sabido, incumbe ao Oficial, quando da qualificação do título, com apoio nas normas e princípios registrários, proceder ao exame de sua regularidade formal e extrínseca. De seu turno, o Princípio da Especialidade Objetiva, contido no art. 176 da Lei n. 6.015/73, exige a identificação do imóvel como um corpo certo objetivando sua localização física, tornando-o singular perante os demais. Na lição de Afrânio de Carvalho: “o princípio da especialidade significa que toda inscrição deve recair sobre um objeto precisamente individuado” e que “o requisito registral da especialização do imóvel, vertido no fraseado clássico do direito, significa a sua descrição como corpo certo, a sua representação escrita como individualidade autónoma, com o seu modo de ser físico, que o torna inconfundível e, portanto, heterogéneo em relação a qualquer outro. O corpo certo imobiliário ocupa lugar determinado no espaço, que é abrangido por seu contorno, dentro do qual se pode encontrar maior ou menor área, contanto que não sejam ultrapassadas as reais definidoras da entidade territorial” (“Registro de Imóveis”, Editora Forense, 4ª ed.).

Considerado a descrição do imóvel contida na serventia imobiliária, o título apresentado não permite registro, sob pena de violação do princípio da especialidade objetiva ante a diversidade das descrições quando confrontadas. Uma das principais finalidades do registro imobiliário é a segurança jurídica, obtida por meio do perfeito diálogo da inscrição dos imóveis, dos títulos e direitos a ele relacionados, de maneira que possibilite uma compreensão isenta de dúvidas. Conforme Ricardo Dip: “o fini qui do registro predial abrange imóveis, pessoas e títulos jurídicos, o que explica e justifica as exigência de determinação e especialidade tabulares objetiva (ou, da base imobiliária), subjetiva e do fato inscritível, meios para consecução da segurança jurídica” [“Registro de imóveis (princípios)”. t. I, Descalvado: PrimVs, 2017, p. 29].

De seu turno, observa Narciso Orlandi Neto que: “As regras reunidas no princípio da especialidade impedem que sejam registrados títulos cujo objeto não seja exatamente aquele que consta do registro anterior. E preciso que a caracterização do objeto do negócio repita os elementos de descrição constantes do registro. Quando se tratar, por exemplo, de alienação de parte de um imóvel, necessário será que a descrição da parte permita localizá-la no todo e, ao mesmo tempo, contenha todos elementos necessários à abertura da matrícula (conf. Jorge de Seabra Magalhães, ob. cit., p. 63)” (“Retificação do Registro de Imóveis”, Ed. Juarez de Oliveira, 2ª ed., 1999, p. 68).

Acrescente-se que o lançamento fiscal noticiado nos autos é insuficiente para oportunizar o registro perseguido, eis que o interesse tributário não se confunde com os princípios e as regras registrais orientadores do assento requerido.

Assim, caberá à apelante requerer a retificação do registro – o que poderá ser feito inclusive na via extrajudicial, se assim desejar – para abertura de matrícula de acordo com a real metragem e correta descrição do imóvel adquirido, de forma que, posteriormente, possa pleitear o registro do título em questão. Ou seja, uma vez promovida a retificação e aberta a matrícula, será desnecessária a alteração da escritura pública que identifica o imóvel a partir do número do lote e quadra, ante o disposto no art. 213, inciso II, § 13, da Lei n. 6.015/73.

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator


Notas:

[1] Fls. 67/69.

[2] Fls. 78/87.

[3] Fls. 105/107.

[4] Fls. 10/13.

[5] Fls. 34.


Fonte: DJe/SP de 05.08.2019

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CNJ: Presença de advogado em solução consensual não é obrigatória

Projeto de lei já aprovado na Câmara visa alterar o Estatuto da OAB para estabelecer a obrigação.

O CNJ vai enviar nota técnica ao Senado com orientações pela não aprovação do PL 80/18, que pretende estabelecer a obrigatoriedade da participação do advogado na solução consensual de conflitos, como a mediação e conciliação. Decisão se deu durante 294ª sessão Ordinária do CNJ, realizada na última terça-feira, 6.

Apesar de a proposta, que visa alterar o Estatuto da OAB (lei 8.906/94), já ter sida aprovada na Câmara dos Deputados, os conselheiros do CNJ decidiram, por maioria, que seria importante enviar uma nota ao Senado para que seja conhecida a orientação do Conselho sobre a política de soluções consensuais de conflito, enquanto a matéria ainda está em tramitação. O pedido de parecer foi feito pelo Fonamec – Fórum Nacional de Mediação e Conciliação.

De acordo com o relatório da conselheira Cristiana Ziouva na nota técnica nº 0010642-32.2018.00.000, o CNJ editou a resolução 125, fundamentada no “tratamento adequado dos problemas jurídicos e conflitos de interesses especialmente mediante conciliação e mediação (…) com a redução da judicialização excessiva, transformando-se o conceito de acesso à Justiça em acesso à ordem jurídica justa”. Nesse sentido, a norma reforça a atuação dos Cejuscs – Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania, nos quais atuam os conciliadores, mediadores e demais facilitadores de solução de conflitos.

Segundo dados do Relatório Justiça em Números 2018, em 2014 haviam 362 Cejuscs na Justiça estadual e esse número vem avançando significativamente, tendo alcançado no final do ano de 2017, 982 unidades. O estudo também indica crescimento no número de sentenças homologatórias de acordo, as quais representaram 12,1% comparativamente ao total de sentenças e decisões terminativas no ano de 2017.

Em outras decisões, o CNJ já havia se pronunciado pela inexigibilidade de advogado em fase pré-processual, incentivando o diálogo e consenso entre as partes, bem como a dispensabilidade da participação do advogado nos centros.

A decisão do mérito foi acompanhada pelos conselheiros Aloysio Correa da Veiga, Maria Tereza Uille, Iracema do Vale, Daldice Santana, Márcio Schiefler, Luciano Frota e pelo presidente do CNJ e do STF, ministro Dias Toffoli.

Divergências

Foi analisado ainda voto do conselheiro Fernando Matos pelo envio ao Congresso Nacional, além da nota contrária ao projeto, pareceres e precedentes a fim de instruir o processo do Parlamento. A posição foi seguida pelos conselheiros Arnaldo Hossepian, Valtércio de Oliveira e Humberto Martins.

Já o conselheiro André Godinho, que tinha o processo sob vista regimental, questionou a competência do Fonamec para solicitar a nota técnica, divergindo, de acordo com ele, com norma que estabelece que a nota somente pode ser solicitada pelos demais Poderes. Nesse sentido, o conselheiro votou pelo não conhecimento do pedido, sendo seguido pelos conselheiros Henrique Ávila e pelo presidente Toffoli.

O plenário do Conselho, no entanto, votou, em sua maioria, pelo conhecimento da matéria e posterior aprovação do envio da nota técnica.

  • Processo: 0010642-32.2018.00.000

Fonte: CNJ

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