Herança partilhada e sem complicações

Conheça as etapas do processo de transmissão de bens após a morte de um parente e como proceder quando há dívidas a serem inventariadas

Receber uma herança nem sempre é um processo fácil, assim como nem sempre ela vale a pena do ponto de vista financeiro, ainda mais quando foram deixadas dívidas. Nesses casos, é preciso quitá-las antes de começar a partilha dos bens entre os herdeiros.

A família de Teresa, que preferiu não ser identi­ficada, teve várias complicações na hora de receber a herança deixada pelo pai dela, falecido há três anos. “Nem todos os herdeiros concordaram com a distribuição e, além disso, meu pai tinha dívidas, como impostos atrasados, contas, cartão de crédito e até com alguns conhecidos. A gente teve muito problema para ver quem resolveria tudo, juntar os documentos”, explica. Além disso, Teresa conta que nem todos os herdeiros queriam que os pagamentos fossem realizados antes da partilha, algo previsto por lei, e tentaram entrar até com uma ação. “Claro que não deu certo, mas atrasou muito o processo”, conta.

Apesar de ser obrigatório realizar os pagamentos antes de partilhar os bens, se o patrimônio for menor que a dívida o débito não é repassado aos herdeiros. “Os filhos não são obrigados a tirar valores do seu próprio patrimônio para pagar o espólio. O que ultrapassar o valor dos bens deixados pela herança fica sem pagamento”, explica Carlos Ruzyk, doutor em Direito e advogado do escritório Fachin, que atua na área de família. Por isso, pessoas que não receberam o pagamento de dívidas do falecido não podem exigir que os filhos paguem, por exemplo, depois do dinheiro da herança já ter sido usado para outras dívidas.

Além disso, segundo Ruzyk, existe uma ordem específica para o pagamento das dívidas. “Existe o concurso de credores, que cria a ordem de quais devem se pagos antes, com prioridade. Dívidas trabalhistas, por exemplo, têm preferência de pagamento”, exemplifica. Depois de iniciado o processo do inventário, o advogado e o juiz devem orientar o pagamento das dívidas.

Duração

É difícil determinar a duração de um processo de herança. Tudo começa com a abertura do inventário, que lista os bens e dívidas deixadas pelo falecido, ou então o testamento, quando existir. Nos casos em que os herdeiros concordam com divisão de bens e são capazes perante a lei, todo o processo pode ser resolvido no cartório. Quando ocorre algum problema, o caso é encaminhado a um juiz. Em ambas as situações, o processo deve ser acompanhado por um advogado.

Segundo a professora de Direito da Universidade Federal do Paraná Ana Carla Harmatiuk Matos, o processo depende da organização da própria família. “Nos casos mais simples, quando todos estão de acordo e conseguem juntar os documentos necessários rapidamente, o processo pode levar apenas dois ou três meses. Quando existem outros problemas, o trâmite pode demorar anos”, esclarece.

Fonte: Gazeta do Povo | 21/02/2014.

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STJ: Quarta Turma garante transmissão de bens a herdeiros de fideicomissário morto

Em decisão unânime, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a legalidade da transmissão dos bens de fideicomissário, falecido antes da fiduciária, a seus herdeiros diretos. A decisão levou em consideração a vontade e os termos impostos pela fideicomitente, em testamento. 

A avó dos herdeiros, mãe do fideicomissário, distribuiu a parte disponível de seu patrimônio entre os dois filhos. Das ações e cotas de que era titular em sociedades mercantis, deixou 50% à filha (testamenteira) e, em fideicomisso, 25% para o filho e 25% para a filha, que também foi nomeada fiduciária dos bens. 

O filho fideicomissário, entretanto, morreu antes da irmã, fiduciária. Os herdeiros, então, ajuizaram ação declaratória de extinção do fideicomisso contra a tia, para que os bens que compunham a cota de seu pai na herança lhes fossem transmitidos. 

Caducidade

A tia dos herdeiros contestou. Alegou que, falecido o fideicomissário, antes de realizado o termo imposto pela fideicomitente, a propriedade se consolidou em nome dela, fiduciária. 

A sentença foi pelo julgamento de procedência do pedido da tia. O juízo de primeiro grau apoiou-se nas regras dos artigos 1.735, 1.738, 1.739 e 1.740 do Código Civil de 1916 e concluiu que o fideicomisso caducou quando o fideicomissário faleceu antes da fiduciária. 

Apesar de existir no testamento cláusula que determinava a substituição dos fideicomissários falecidos por seus herdeiros, esta foi considerada nula. O juiz entendeu que a disposição contrariava regras de ordem pública do Código Civil. 

Fideicomisso extinto

O Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) aplicou entendimento diferente. O acórdão deu provimento à apelação dos herdeiros para julgar procedente o pedido e declarar extinto o fideicomisso. Para o TJPE, com a morte do fideicomissário, os bens que a este caberiam em razão do fideicomisso passariam a ser titularizados por seus herdeiros, a fim de fazer prevalecer a vontade expressa da testadora. 

No caso, foi estabelecido no testamento o termo de 20 anos ou, no caso de morte do fideicomissário, a data em que o mais jovem sucessor deste atingisse a maioridade – disposição que, para o TJPE, está de acordo com as regras pertinentes do Código Civil. 

A tia recorreu ao STJ, mas a relatora do processo, ministra Isabel Gallotti, entendeu que o acórdão se manifestou corretamente sobre a validade das disposições testamentárias referentes à instituição fideicomissária. 

Última vontade

Gallotti destacou que é dado ao testador regular termos e condições da herança, procedimento que se insere no poder de disposição do particular. Como o mais jovem herdeiro do fideicomissário morto atingiu a maioridade, condição estabelecida pela testadora, a ministra ratificou a extinção do fideicomisso. 

“Veja-se que o artigo 1.738 do Código Civil de 1916 (atual artigo 1.958), que dispõe sobre a caducidade do fideicomisso em caso de premoriência do fideicomissário com relação ao fiduciário, remete ao artigo 1.735 (atual artigo 1.955). Este último prevê que, caducando o fideicomisso, a propriedade do fiduciário deixa de ser resolúvel, se não houver disposição contrária do testador. Não se cuida, portanto, de regra legal cogente, mas, ao contrário, dispositiva, segundo texto expresso de lei”, concluiu a relatora.

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 1221817.

Fonte: STJ | 06/02/2014.

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Planejamento sucessório: a curadoria especial de patrimônio legado a menor

*Camila Morais Martins

É crescente a preocupação dos sócios de empresas familiares com o destino das sociedades após a abertura de sua sucessão mortis causa, sobretudo considerando que nem sempre os herdeiros têm o devido preparo para enfrentar os percalços do mundo dos negócios empresariais. Na mesma proporção incrementam-se as demandas jurídicas (societárias e sucessórias) por estruturas de planejamento sucessório que possam ser adotadas a fim de que, ainda em vida, tais sócios viabilizem a transmissão deste patrimônio societário de modo a minimizar os riscos envolvidos nesta sucessão, tanto no âmbito da pessoa física quanto no da pessoa jurídica.

Na legislação brasileira quase não há liberdade para que as pessoas físicas estabeleçam em vida a destinação de seu próprio patrimônio para depois de sua morte. O princípio da autonomia privada é tolhido pelas vedações de disposições patrimoniais estabelecidas pela legislação civil, tal como a contratação da herança de pessoa viva (artigo 426 do CC), bem como a destinação aos herdeiros necessários de, no mínimo, a metade do patrimônio do falecido – a denominada legítima, de tal forma que é nula a transmissão gratuita que ultrapasse este percentual (artigo 549 do CC) ou a disposição testamentária que a viole (artigo 1.857, §1º do CC).

No âmbito de proteção constitucional ao direito de herança (artigo 5º, XXX, CF) o artigo 1.784 do CC determina que a herança seja transmitida aos herdeiros desde o momento da abertura da sucessão. Trata-se do princípio da saisine, segundo o qual a integridade (posse, propriedade, domínio e direitos reais e pessoais) do patrimônio hereditário é transmitida aos herdeiros no momento do falecimento do autor da herança, sendo assegurado aos herdeiros necessários, no mínimo, a metade do patrimônio hereditário (legítima).

A intangibilidade da legítima configura-se como um princípio norteador do direito das sucessões brasileiro. É certo que o CC de 2002 abrandou esta intangibilidade ao permitir que o testador grave a legítima com cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade mediante atribuição de uma justa causa. Todavia, na ponderação dos princípios norteadores do CC, o princípio da intangibilidade da legítima prevalece ao da autonomia privada na disposição patrimonial no que diz respeito à parcela legítima.

No âmbito da autonomia privada, os artigos 1.693, III e 1.733 do CC em vigor autorizam o testador a nomear curador especial para administrar a herança ou legado de bens que beneficiem menores em testamento, mesmo com a existência de tutor que responda pela administração dos bens destes menores.

A curadoria patrimonial de menor instituída em testamento é uma forma sui generis de curadoria que envolve o afastamento do pai (ou da mãe) ou do tutor da administração e do usufruto do patrimônio hereditário deixado a menor em testamento mediante a nomeação de um terceiro administrador (o denominado curador especial).

Importante destacar que a nomeação de um curador especial não colide com o exercício do poder familiar ou da tutoria dos menores, pois ao curador especial cabe apenas a administração dos bens ou parcela ideal de bens especificados em testamento (ou no contrato de doação), sem qualquer intervenção no exercício do poder familiar ou da tutoria.

Assim sendo, a curadoria especial pode ser utilizada como uma forma de planejamento sucessório testamentário de grande importância aos empresários, pois possibilita a estes a escolha de um gestor de sua confiança com as aptidões que julgar necessárias à boa governança do patrimônio societário legado. Esta curadoria é especialmente significativa nos recorrentes casos em que apenas um dos cônjuges participa da gestão dos negócios, não gozando o outro cônjuge que exerce o poder familiar sobre os filhos da mesma expertise, ou nos casos de pais separados ou divorciados que quebraram a relação de confiança com o ex cônjuge ou companheiro.

Questão polêmica importante envolve a curadoria dos bens da parcela legítima destinada a menores herdeiros necessários já que o texto legal não estabelece qualquer especificidade quanto a qualidade dos bens deixados (apenas discriminando a possibilidade de ser parcela ideal do patrimônio – herança ou bem específico – legado).

Vale ressaltar que, de acordo com os princípios da saisine e da intangibilidade da legítima, a posse e a propriedade dos bens da herança pertence aos herdeiros desde o momento da abertura da sucessão. Assim sendo, os menores beneficiados poderiam exigir (representados pelo pai/mãe sobrevivente ou tutor) a plena posse e propriedade dos bens da legítima que se encontra em curadoria especial de terceiro nomeado em testamento?

A instituição de curador especial sobre os bens da legítima não viola os princípios supra mencionados, nem a reserva legal (legítima), posto que ao menor pertencerá a herança deixada. Porém, em razão de sua incapacidade para administrar o patrimônio herdado, é atribuído a terceiro que não o pai/mãe ou tutor, sem, contudo, violar o pleno gozo da parcela legítima de sua herança por parte dos menores.

Justo pelo contrário, é com a pretensão de proteger e assegurar a legítima deixada aos menores na forma de legado societário que o testador nomeia gestor patrimonial para assegurar o bom andamento dos negócios empresariais dos herdeiros beneficiários. Antes de ser uma violação ao seu pleno acesso, trata-se de uma proteção à legítima dos menores legatários instituída por testamento.

Portanto, a curadoria especial estabelecida em testamento configura-se como uma forma de planejamento legítima e muito viável para os detentores de participações societárias, posto possibilitar a preservação do patrimônio empresarial de forma íntegra aos herdeiros destes sócios.

* Camila Morais Martins é advogada do escritório Velloza & Girotto Advogados Associados.

Fonte: Migalhas | 17/01/14

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