TJMG reconhece paternidade socioafetiva

A 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) decidiu, por unanimidade, manter sentença que julgou procedente o pedido em ação de reconhecimento de paternidade socioafetiva.

Em primeira instância, o juiz de Itumirim (MG) foi favorável ao pedido de reconhecimento de paternidade socioafetiva póstuma ajuizado por J.A de S. J e C. T de S para que fossem considerados filhos de sua tia e de seu esposo, que os  criaram. Pediram também que fossem excluídos do registro de nascimento os nomes de seus pais biológicos e avós paternos.
 
Os autores da ação alegaram que, ainda crianças, foram entregues pelos pais biológicos aos pais socioafetivos, ambos já falecidos, e que “sempre gozaram do status de filhos, sem qualquer restrição”. Fotografias e testemunhas ouvidas em juízo comprovaram a duradoura relação entre os autores e os pais socioafetivos. “As testemunhas em juízo foram unânimes em confirmar a existência da paternidade socioafetiva”.
 
Os autores apresentaram, ainda, vários documentos que comprovaram a relação paterno-filial entre eles, o convite de casamento de um dos autores, onde apenas os pais socioafetivos são mencionados e o testamento do pai socioafetivo que diz, “que não tendo ascendentes e nem descendentes, viúvo de M. V. T deixa por ocasião de sua morte para os legatários, sobrinhos de sua esposa e criado por ele desde tenra idade como filhos”.
 
De acordo com o desembargador Kildere Carvalho, relator do caso, em seu voto, a paternidade biológica, para o Direito, transformou-se em verdade real, ou seja, incontestável. Porém, tendo a doutrina e a jurisprudência adotado um novo conceito, o da paternidade socioafetiva, o conceito biológico tem perdido espaço na vida prática, “eis que o conceito moderno sobre a paternidade tem se baseado no afeto da relação existente entre pai e filho, onde imperam os laços afetivos e amorosos, ficando para trás o critério sanguíneo, por ora, irrelevante”, disse.
 
O magistrado citou os ensinamentos do jurista Rolf Madaleno, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), em que diz “O afeto é a mola propulsora dos laços familiares, para se dar sentido e dignidade à existência humana. Nos vínculos de filiação e parentesco, a afetividade deve estar sempre presente, pois os vínculos consanguíneos não se sobrepõem aos liames afetivos, ao contrário, a afetividade pode sobrepor-se aos laços consangüíneos”.
 
Kildere Carvalho lembrou também a lição da advogada Maria Berenice Dias, vice-presidente do Ibdfam, sobre afeto e filiação socioafetiva, de que “o afeto não é fruto do sangue, pois os laços afetivo e de solidariedade derivam da convivência familiar” e ainda que “a paternidade passou a ser reconhecida pela identificação da posse do estado de filho. Essa nova verdade fez surgir  nova figura jurídica: a filiação sócioafetiva, definida como a relação afetiva, íntima e duradoura, em que uma criança é tratada como filho por quem cumpre todos os deveres inerentes ao poder familiar”.
 
Para o jurista Luiz Edson Fachin, diretor nacional do Ibdfam e um dos propulsores do conceito, o sentido da socioafetividade aplicada às relações de família se revela na ideia segundo a qual uma posição jurídica em família não pode ser apenas um dado, deve ser um construído. “A paternidade se faz; o filho mais se faz filho na construção da filiação. Esse significado não desbiologiza necessariamente a paternidade, como já se sustentou, mas, a rigor, sem aniquilar a verdade do sangue, põe num patamar de igual ou superior valor jurídico a verdade do coração”, disse.
 
Nos tribunais, a disputa entre sangue e afeto- Segundo Fachin, as cortes superiores e os tribunais estaduais vêm aos poucos acolhendo sentenças que são fiéis aos fatos e não apenas às formalidades. A diferença entre pai e ascendente genético tem sido compreendida e acolhida no Judiciário. Entretanto, pondera o jurista, a posição majoritária ainda se mostra leal ao pensamento jurídico da primeira metade do século passado, de acordo com os ensinamentos daquela época em que a instituição da família se sobrepunha à felicidade e ao real interesse de pais e filhos.
 
“Muitos passos foram dados, mas faltam muitas pontes a  construir e caminhos a percorrer para entender que o vínculo biológico pode somente, em numerosos casos concretos, oferecer uma segurança jurídica formal. E o que se almeja é a segurança jurídica material, aquela que, dentro do sistema jurídico, encontra espaço adequado para construir  soluções  corretas e justas”, reflete Fachin.
 
Para ele, a decisão do TJMG abriu as portas do direito para a “vida verdadeira”, vivida na prática, dia-a-dia. “Ademais, a decisão se fundamentou em literatura jurídica contemporânea, sintonizada com a nova família do direito, bem como na hermenêutica adequada do Código Civil, especialmente do artigo 1.593, e da Constituição da República brasileira (nomeadamente art. 227, parágrafo sexto), além da atilada jurisprudência do STJ da lavra da Ministra Fátima Nancy Andrighi”.
 
Fachin esclarece que há, no ordenamento jurídico brasileiro, lei, doutrina e jurisprudência que autorizam o reconhecimento da paternidade socioafetiva. De acordo com o jurista, há no Código Civil diversas regras que indicam tal direção. No campo da literatura jurídica, a última década foi pródiga em revelar tratados, livros, capítulos de livros, teses, dissertações e ensaios sobre o tema. E a jurisprudência, paulatinamente, vai se firmando no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e em alguns Tribunais estaduais nessa mesma direção. “Sempre à luz do caso concreto”, ressalta Luiz Edson Fachin.
 
Em março deste ano, O Supremo Tribunal Federal (STF) admitiu o Ibdfam como Amicus Curiae (amigo da corte) no Agravo do Recurso Extraordinário (ARE) 692186-PB, ação que vai decidir a prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica. Fachin reflete que, ao apresentar-se nessa posição processual em demanda de grande envergadura, o Instituto realiza sua importante função político-institucional, propondo e defendendo teses que sejam coerentes com a família verdadeira, aquela que se edifica no afeto e não apenas nos vínculos formais.
 
Fachin diz ainda que, “ao admitir o seu ingresso no feito, o Supremo Tribunal Federal procedeu de modo adequado, tanto com os ditames que tratam da matéria em termos procedimentais quanto com a posição notoriamente proeminente ocupada no Brasil pelo IBDFAM”.
 
O diretor nacional do Ibdfam expressa sua expectativa quanto ao resultado do julgamento da ação, que poderá abrir precedente aos demais Tribunais “Espera-se que da Corte Constitucional advenha fundamentada decisão no sentido de reconhecer o valor jurídico da socioafetividade. Ao assim proceder e decidir de modo vinculante, o Supremo dará mais um passo para concretizar o que a cidadania pode chamar de verdadeira justiça” finalizou.
 
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM I 28/08/2013.
 
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Reconhecimento de Filho e o Provimento nº. 16 do Conselho Nacional de Justiça

Por Raquel Silva Cunha Brunetto e Karine Maria Famer Rocha Boselli

O Reconhecimento de Filho consiste em instrumento jurídico que define o vinculo parental entre alguém e sua prole por meio de declaração voluntária (reconhecimento espontâneo) ou judicial (reconhecimento coativo).

Aplica-se, normalmente, aos filhos havidos fora do casamento, uma vez que sobre eles não incide a presunção de paternidade decorrente do art. 1.597 do Código Civil. No entanto, é preciso esclarecer que o reconhecimento de filho independe do estado civil dos genitores ou de eventual parentesco entre eles.

O ato de Reconhecimento pode ocorrer a qualquer tempo, podendo preceder ao nascimento da prole ou ocorrer após o seu falecimento, desde que o reconhecido tenha deixado descendentes.

O Reconhecimento Voluntário, também denominado de Perfilhação, é, em regra, unilateral, salvo no caso do filho maior, em que se exige seu consentimento. Nada impede, contudo, que, no futuro, o filho menor reconhecido venha a impugnar o reconhecimento no prazo de quatro anos após atingir a maioridade.

A Perfilhação se dará por ocasião do registro de nascimento, mediante comparecimento do reconhecedor, bem como por manifestação de vontade expressa em escritura pública, testamento ou escrito particular com firma reconhecida do signatário, ou ainda manifestação direta e expressa perante juiz ainda que de forma incidental.

Em havendo o reconhecimento por ocasião da lavratura do assento (no próprio termo de nascimento), o nascimento lavrado pelo Oficial de Registro Civil conterá dados relativos à paternidade ou maternidade reconhecida, sem que se faça qualquer menção ao reconhecimento. Nesta hipótese, o item 40, do Capítulo XVII, das Normas de Serviço Extrajudicial da Corregedoria Geral do Estado de São Paulo estabelece que a declaração poderá se realizar pelo comparecimento:

a) de ambos os genitores, pessoalmente, ou por intermédio de procurador com poderes específicos, ao Registro Civil das Pessoas Naturais, para efetuar o assento, do qual constará o nome dos genitores e dos respectivos avós;

b) da genitora, exclusivamente, minuda da declaração de reconhecimento ou anuência do pai à efetivação do registro; ou

c) do pai, apenas, munido da Declaração de Nascido Vivo (DN), ou declaração médica que confirme a maternidade, com firma reconhecida.

Diferentemente, nas hipóteses em que o reconhecimento derive de ato posterior à lavratura do registro de nascimento, será ele implementado mediante averbação à margem do assento de nascimento do filho reconhecido, não devendo constar qualquer menção, nas respectivas certidões em breve relatório, acerca da existência de referida averbação, tudo em respeito ao princípio da igualdade da filiação prevista no art. 227, par. 6o, da Constituição Federal.

Com o objetivo de facilitar todo o procedimento de Reconhecimento de Filiação e assim cumprir o princípio constitucional da Paternidade Responsável, o Conselho Nacional de Justiça editou, em 17 de fevereiro de 2012, o Provimento n. 16, cuja análise se fará adiante.

Nos termos deste Provimento, há duas situações de reconhecimento previstas: a) Suposto Pai; e b) Reconhecimento Espontâneo.

No primeiro caso, quando da lavratura do assento ou em momento posterior, poderá o interessado ou sua mãe, durante sua menoridade, comparecer perante o Oficial de Registro em que tiver sido lavrado seu assento de nascimento ou em diverso e apontar o suposto pai.

O Oficial, neste caso, providenciará o preenchimento de Termo de Indicação de Paternidade, colhendo as assinaturas dos requerentes e zelando pela obtenção do maior número de elementos para identificação do genitor, especialmente o nome, a profissão e o endereço. Ao Termo deverá ser anexada cópia da certidão de nascimento do filho a ser reconhecido.

Esta documentação será autuada, protocolada e encaminhada ao Juiz Corregedor Permanente ou ao magistrado competente que, se possível, ouvirá a mãe sobre a paternidade alegada e mandará notificar o suposto pai para se manifestar acerca da paternidade atribuída.

Caso o suposto pai compareça e confirme a paternidade, será lavrado Termo de Reconhecimento, cuja certidão será remetida ao Oficial de Registro competente para que se proceda à averbação do reconhecimento de paternidade à margem do assento de nascimento.

Se o suposto pai não comparecer em juízo ou negar a alegada paternidade, o juiz remeterá o procedimento ao representante do Ministério Público ou da Defensoria Pública para que se promova a respectiva investigação de paternidade.

Destaca-se que o maior de idade poderá igualmente valer-se do procedimento do Suposto Pai.

No que concerne ao Reconhecimento Espontâneo de filho, poderá ele ocorrer a qualquer tempo perante Oficial de Registro Civil que melhor convier ao reconhecedor, mediante apresentação de documento escrito ou preenchimento do Termo de Reconhecimento de Filho. Neste último caso, o Oficial, providenciará o preenchimento de Termo de Reconhecimento, colhendo a assinatura do requerente e zelando pela obtenção do maior número de elementos para identificação do genitor, especialmente o nome, a profissão e o endereço.

Em se tratando de reconhecimento de menor, este dependerá da anuência de sua genitora e, se o ato de reconhecimento referir-se a filho maior, exigir-se-á sua aceitação.

Ao Termo de Reconhecimento deverá ser anexada cópia da documentação identificadora do interessado, assim como certidão de nascimento do reconhecido.

Caso o genitor compareça à serventia na qual fora lavrado o nascimento de seu filho, o Oficial, após o recebimento da documentação, o protocolo do procedimento de reconhecimento e a qualificação positiva dos documentos apresentados, procederá à averbação do reconhecimento à margem do assento de nascimento, independentemente de manifestação do Ministério Público ou de decisão judicial.

Por sua vez, se o interessado comparecer em serventia diversa daquela onde fora registrado o filho a ser reconhecido, o Oficial de Registro deverá remeter o procedimento de reconhecimento ao Oficial competente, acompanhado de cópia da certidão de nascimento do reconhecido, quando apresentada, assim como da qualificação completa do reconhecedor. Neste caso, o Oficial processante poderá requerer o depósito prévio dos emolumentos relativos à averbação e despesas de correio.

Cabe salientar que, em conformidade à orientação da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo (Arpen-SP), o encaminhamento da via do Termo de Reconhecimento, acompanhado de cópia dos documentos apresentados, poderá ser feito igualmente pela própria parte interessada.

Uma vez recebido o procedimento, incumbirá ao Oficial proceder à averbação do reconhecimento à margem do assento.

No tocante aos emolumentos, o procedimento de reconhecimento de filiação será cobrado como ato único, englobando, nos termos de inúmeras decisões da Egrégia Corregedoria Geral de Justiça, a respectiva averbação.

Na hipótese do procedimento de reconhecimento se processar em serventia diversa daquela do registro de nascimento, à primeira caberão os emolumentos relativos ao procedimento de reconhecimento, enquanto que à segunda caberão os emolumentos decorrentes da respectiva averbação.

É preciso esclarecer, ademais, que o procedimento simplificado de Reconhecimento de Paternidade do Provimento n. 16 também deverá ser aplicado no âmbito do Registro de Nascimento Tardio. Para tanto, o recente Provimento n. 28 do CNJ disciplinou que o estabelecimento da filiação poderá ser feito por meio de reconhecimento espontâneo dos genitores, aplicando-se aos registros de nascimento lavrados de forma tardia, tanto para o reconhecimento da paternidade como para o da maternidade, as regras do Provimento n. 16 do CNJ.

Como se pode verificar, do acima exposto, as novas regras sobre o Reconhecimento de Filho estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça tiveram como objetivo facilitar toda a sistemática do reconhecimento e do estabelecimento da filiação, sendo uma manifestação clara do processo de desjudicialização e do incremento da atuação da atividade dos Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais.

Autoras:

Raquel Silva Cunha Brunetto – Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas de São Paulo

Karine Maria Famer Rocha Boselli – Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabeliã de Notas de Luiz Antônio

Fonte : Assessoria de Imprensa da ARPEN/SP. Publicação em 24/06/2013.

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