O Protesto da Sentença

* Sérgio Luiz José Bueno

O protesto de títulos e outros documentos de dívida, como hoje é visto e tratado pelo ordenamento brasileiro, depois de evoluir de maneira sensível e positiva, teve seu procedimento alçado a meio rápido, seguro e eficaz de satisfação de obrigações e prevenção de litígios, com importante influência no desafogo do Poder Judiciário e, consequentemente, na concretização dos ideais de uma Justiça célere e eficaz.

Lavrado o protesto, é certo, materializa-se sua clássica função probatória – aquela expressa no artigo 1º da Lei 9.492/97. No entanto, a finalidade do procedimento desenvolvido pelo Tabelião de Protesto vai muito além da simples comprovação da falta de pagamento, aceite ou devolução do título ou documento de dívida. O ponto culminante dessa atuação é, sem dúvida, o pagamento, como regra, o fim almejado por aqueles que apresentam os títulos e documentos.

Com a ampliação do rol dos documentos protestáveis (Lei 9.492/97, art. 1º) e com o crescimento da publicidade dada ao protesto, o percentual de títulos e documentos apresentados e pagos no tabelionato aumentou, de tal forma que hoje a quantidade de pagamentos é muito maior que a de protestos.

Dentre os documentos protestáveis, figura a sentença transitada em julgado, título executivo judicial que retrata obrigação líquida, certa e exigível (Código de Processo Civil, artigos. 475-N e 586). Pela protestabilidade decidiram, inclusive, o Superior Tribunal de Justiça1 e o Conselho Nacional de Justiça2.

E que não se desqualifique o protesto da sentença pelo fato de ser ele desnecessário para a execução. Está claro que o protesto no caso em estudo não se justifica por sua necessidade formal, o que não afasta sua obrigatoriedade social e moral, além da possibilidade jurídica plena. O autor da ação, por estar assoberbado o Judiciário, não raramente aguarda durante anos a solução do litígio e, muitas vezes, sofre privações materiais e morais severas. No final, com a sentença definitiva, acredita que receberá o que lhe é devido, mas normalmente o devedor emprega todos os meios de que dispõe para frustrar a execução.

Não se pode ignorar, contudo, que vigem em nosso ordenamento, hoje positivados nos incisos XXXV e LXXVIII, do artigo 5º, da Constituição Federal, os princípios da celeridade e da efetividade da prestação jurisdicional, esta, segundo Marinoni3, direito fundamental do qual depende a efetivação dos demais direitos.

Não basta a prolação da sentença definitiva, mas é necessário que esta seja cumprida integralmente, ou como leciona o Ministro Teori Albino Zavascki, que tenha “potencial de atuar eficazmente no plano dos fatos”4. Essa eficácia pode ser potencializada com segurança pela apresentação a protesto.

Algumas anotações pertinentes devem ser feitas, sempre com espírito de fomentar reflexões sobre o assunto. Não encontramos óbice legal à apresentação a protesto da sentença tão logo transite em julgado. O encaminhamento a protesto, independentemente de provocação, a propósito, é medida recomendável, sobretudo se a condenação tiver por objeto direito indisponível mensurado em pecúnia pelo julgado.

Há outro importante aspecto a considerar. Temos que o protesto – e não a singela inscrição em banco de dados mantidos por entidades de proteção ao crédito – ,inegavelmente, é dotado de maior segurança, com a vantagem de ser apto à obtenção do pagamento em três dias úteis. Todo o procedimento para protesto, incluindo a intimação do devedor, segue sob a forma de serviço público prestado, mesmo que em caráter privado, por quem recebeu a outorga de delegação conferida pelo Estado, o que lhe dá conotação oficial.

No Estado de São Paulo, grife-se, o vencedor da ação pode requerer o protesto sem qualquer custo, uma vez que as despesas e emolumentos são suportados pelo devedor. Além disso, lavrado o protesto, um de seus efeitos é a inscrição do devedor em todo órgão de proteção ao crédito, por meio do fornecimento das certidões em forma de relação. Assim, o protesto estaria aliando segurança, agilidade, e alcançaria publicidade ainda maior que aquela decorrente da inscrição em um único banco de dados de proteção ao crédito, inclusive por meio da informação de existência de protesto na base de consulta gratuita do portal www.pesquisaprotesto.com.br. E tudo sem ônus para o apresentante, no caso do Estado de São Paulo.

O protesto da sentença condenatória pode versar sobre o valor da condenação acrescido dos demais encargos impostos pelo juiz e pela lei, como correção monetária e juros moratórios ou compensatórios. Também as chamadas verbas de sucumbência podem ser incluídas no valor a protestar, como custas, despesas processuais e honorários advocatícios. O protesto da sentença, no tocante aos honorários, tanto pode ser lavrado por apresentação da parte vencedora, como de seu advogado. Se requerido pela parte, o protesto da sentença em relação aos honorários pode ser cumulado com o valor da condenação e demais encargos. De qualquer forma, sempre que o valor a protestar for diverso do constante na parte dispositiva do julgado, deve ser apresentada planilha de cálculo elaborada em conformidade com ela.

Mesmo a sentença de improcedência pode ser objeto de protesto, com a inclusão das verbas de sucumbência.

Em termos procedimentais, a apresentação da sentença a protesto deve dar-se, alternativamente e a critério do credor ou do juiz que encaminhar o documento, no lugar de domicílio do devedor, ou na comarca de tramitação do processo. Se o protesto for solicitado pelo credor, a sentença pode ser apresentada em cópia autenticada extraída dos autos e, nesse caso, também devem ser entregues cópias autenticadas da folha que contenha a certidão de trânsito em julgado e de peça dos mesmos autos que indique a qualificação das partes.

É possível, ainda, que a sentença seja representada por certidão extraída dos autos em que foi prolatada e que contenha seu dispositivo, além de menção ao trânsito em julgado. A certidão indicará a qualificação das partes.

Para evitar o protesto indevido e até mesmo pagamento a quem não é o credor, o apresentante a protesto deve ser o autor da ação, pessoalmente ou representado por procurador bastante, uma vez que qualquer pessoa pode obter certidão ou cópia dos autos que não versem sobre processo protegido pelo segredo de justiça.

Se o próprio juiz realizar o encaminhamento a protesto, basta que remeta os documentos mencionados, por ofício dirigido ao tabelião ou, onde houver mais de um, ao serviço de distribuição.

Conclui-se, portanto, que o protesto da sentença tem procedimento simples e, a um só tempo, atende aos anseios da sociedade pela efetivação do mandamento jurisdicional e pela celeridade da justiça, sempre em conformidade com os ditames legais e fundamentos constitucionais do Estado de Direito.

Conheça os serviços que os Cartórios de Protesto prestam a você e procure o Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil – Seção São Paulo pelo portal http://www.ieptb.com.br/sp/portal/. Para saber mais sobre cartórios, acesse: http://www.castoriosp.com.br.

Notas:

1    STJ – Resp. 750.805/RS – Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 14.02.1008, DJE 16.06.2009.

2    CNJ – Pedido de Providências N° 200910000041784 – Relatora Conselheira Morgana Richa.

3    MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos. São Paulo: RT, 2004, p.184-185.

4          Revista de Informação Legislativa, v. 31 – abril- junho de 1994, p. 291-196.

Fonte: Jornal Carta Forense I 03/10/2013. 

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Paternidade intrauterina

* Eudes Quintino de Oliveira Júnior e Pedro Bellentani Quintino de Oliveira

O feto surge como agente de tutela estatal em várias oportunidades. A Declaração dos Direitos da Criança, promulgada pela Assembleia Geral da ONU, preconiza que a criança, em razão de sua imaturidade física e mental, necessita de proteção legal apropriada, tanto antes como depois do nascimento. O ECA acrescenta ainda o direito de proteção à vida e à saúde, proporcionando um nascimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência. Já não se pode limitar o direito do nascituro apenas ao de nascer. E sim ampliá-lo e agregar a ele o nascer com dignidade, com saúde, com a proteção Estatal necessária, extensiva à sua mãe, de quem é dependente na vida pré-natal. A assertiva é de fácil constatação e a esse respeito foi proposto um projeto de lei para considerar o embrião como dependente para fins de dedução na base de cálculo do imposto de renda, mas não vingou em razão do aborto provocado pelo legislador.

Pode o feto, desta forma, pela projeção alcançada, figurar como autor em ação de alimentos, investigação de paternidade e outros direitos compatíveis com sua condição de concebido, mas não nascido.

Pois bem. A lei 11.804/08, conhecida como “alimentos gravídicos”, melhor seria se fosse “alimentos do nascituro” em apertado resumo, confere direito à mulher gestante, não casada e que também não viva em união estável, de receber alimentos, desde a concepção até o parto. Para tanto, deverá ingressar com o pedido judicial em desfavor do futuro pai. O juiz decidirá, no âmbito de uma cognição sumária, com base nos indícios de paternidade, a obrigação alimentar do suposto pai, que poderá contestar, mas em restrito núcleo cognitivo também. Os alimentos fixados permanecerão até o nascimento com vida, quando serão convertidos em pensão alimentícia e, a partir deste marco, poderão ser revistos pelas partes.

Trata-se, como se percebe, de uma de uma decretação provisória de paternidade, calcada somente em indícios. Eventual contestação pugnando pela realização de exame excludente da alegada paternidade será analisada após o nascimento da criança. É uma situação de incerteza que obrigará o suposto pai a arcar com a verba alimentar, não se afastando da finalidade da medida que é atingir uma procriação responsável, com o comprometimento integrado e solidário dos genitores, numa verdadeira guarda compartilhada intrauterina.

Feitas tais considerações, é de se concluir pela dificuldade da determinação da paternidade, que trabalha somente com indícios, elementos circunstanciais que gravitam em torno do fato principal sem, contudo, apresentar uma prova inconcussa. A não ser a colheita do líquido amniótico da gestante a partir de 14 semanas, que carrega risco de provocar o abortamento, por se tratar de procedimento invasivo.

Agora, no entanto, em razão evolução da engenharia genética, já é possível a realização no Brasil de exame não invasivo consistente na procura do DNA fetal circulante na mãe e compará-lo com o material fornecido pelo pretenso pai. O avanço científico é tamanho que, além do objetivo da paternidade, carrega precisão quase que incontestável no sentido de demonstrar que o feto seja portador de síndromes de Down, Edwards, Patau, Turner, Klinefelter e Triplo X.

Permanece sim a proibição de selecionar sexo ou qualquer outra característica biológica do futuro filho, mas não se questiona a realização do exame para diagnóstico pré-implantatório e testes genéticos visando verificar se o embrião é portador de alterações cromossômicas ou genéticas. Se a constatação for positiva, admite-se o procedimento corretivo1.

A regra da paternitas incerta est cai por terra diante da precisão de referido exame e pode se dizer que a até então imutável afirmativa de que maternitas semper certa est também não resiste quando se tratar de inseminação artificial heteróloga, prevista no artigo 1597, inciso III do CC.

Se Machado de Assis vivesse nestes novos tempos quando escreveu Dom Casmurro, não deixaria o leitor tão ansioso a respeito da paternidade de Ezequiel, filho de Capitu. Apontaria a paternidade com toda segurança a Bentinho ou Escobar.

Mas também o romance perderia a riqueza do relato psicológico de cada personagem e a crucial pergunta se a “cigana oblíqua e dissimulada” traiu Bentinho.

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1 – Resolução Conselho Federal de Medicina, nº 1957/2010, item VI.

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* Eudes Quintino de Oliveira Júnior é promotor de Justiça aposentado e advogado; Pedro Bellentani Quintino de Oliveira é advogado.

Fonte: Migalhas I 08/10/2013.

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