Modelo alemão de mediação é tema de palestra promovida pela Enfam

Uma espécie de mediador privado de conflitos entre bancos e seus clientes com poderes para obrigar instituições financeiras a cumprir o que foi acordado e, se for o caso, até mesmo depositar o que devem na conta do reclamante. Essa figura existe na Alemanha desde 1992 e lá é chamada de ombudsman. A fim de debater a experiência alemã, o Diretor da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), Ministro João Otávio de Noronha, juntamente com o Ministro Sidnei Beneti convidaram o ex-diretor do Instituto Max Planck para Direito Privado Internacional e ex-professor titular da Universidade de Hamburgo, na Alemanha, Klaus Hopt, para proferir palestra sobre o tema “Ombudsman de Bancos e Desjudicialização”. A palestra será realizada no dia 18 de fevereiro próximo, na Sala de Conferências do STJ, das 10 às 12 horas.

O evento é voltado não apenas a magistrados, mas a profissionais que atuam em departamentos jurídicos das instituições bancárias e financeiras, agências reguladoras e demais operadores do Direito. As inscrições são gratuitas e podem ser feitas no link http://www.cjf.jus.br/cjf/eventos/palestra-ombudsman.

O termo “ombudsman” tem origem no idioma sueco, tendo na Alemanha adquirido o sentido de “mediador” ou “advogado particular”. O Ministro Beneti conta que conheceu o sistema quando visitou o “Verband der deutschen privaten Banken”, em Berlim, uma espécie de “Febraban” alemã. Essa associação de bancos privados mantém um escritório do ombudsman, encarregado da composição de conflitos extrajudiciais entre bancos e clientes. “A grande vantagem está tanto no tipo de conciliação quanto no tipo de solução de conflitos”, afirma o ministro.

De acordo com ele, o caso começa com uma reclamação do cliente feita mediante preenchimento de formulário disponível nas agências bancárias. Caso a reclamação não seja solucionada pelo departamento de atendimento aos clientes do banco, ela é enviada ao escritório central do ombudsman, em Berlim. O ministro ressalta que o tipo de conciliação feito pelo ombudsman, nesses casos, dispensa a necessidade de chamar as pessoas a um fórum, não movimenta qualquer estrutura administrativa e, principalmente, não tem qualquer ônus para o Estado.

O ombudsman, que, em geral, é um juiz aposentado de um tribunal superior ou professor universitário, redige sua decisão, “em poucas páginas e em linguagem mais clara possível”, destaca. Se a decisão reconheceu o direito do reclamante e corresponder a quantia não for superior a 5 mil euros (equivalente no Brasil a R$ 16 mil), o banco é obrigado a depositá-la na conta bancária do reclamante. “Tem que pagar sem processo de execução e sem processo judicial”, observa o ministro. Mas se o banco foi o vencedor, o reclamante tem direito a entrar com ação em juízo e o prazo de prescrição é aumentado em seis meses. Outra vantagem, segundo Beneti, é que, mesmo nas causas superiores a 5 mil euros, o cliente pode abrir mão do restante, finalizando o conflito.

A importância desse modelo para o Brasil, de acordo com o ministro, está na possibilidade de diminuir consideravelmente as ações judiciais de consumidores contra os bancos. Ele exemplifica que no Brasil, somente as causas judiciais contra os bancos, relativas aos planos econômicos, representam mais de dois milhões de processos. Ele estima que 40% do número de recursos que chegam à mesa de trabalho de cada um dos ministros da Seção de Direito Privado do STJ tratam de questões envolvendo conflitos entre bancos e clientes.

Esse modelo de ombudsman que, de acordo com Beneti, é seguido por diversos países da União Europeia, não se aplica apenas aos bancos, podendo ser utilizado para prestações de serviços em geral, contratos de seguro, planos de saúde e diversas outras modalidades de relações de consumo.

Palestra

Em sua palestra, Klaus Hopt falará sobre as experiências com o ombudsman dos bancos privados na Alemanha, de 1992 a 2012, o processo de conciliação privada na Alemanha e na Europa, as vantagens do modelo, a regulamentação da conciliação em 2009 e um panorama da resolução alternativa de litígios e da mediação na União Europeia.

O palestrante destaca que, além de ser mais ágil e menos oneroso à máquina administrativa, o modelo doombudsman conferiu maior transparência à relação entre bancos e clientes, aumentando a confiabilidade dessas instituições.

Quanto à regulamentação da conciliação, o palestrante abordará os seguintes tópicos: pedido, admissibilidade do processo, exame preliminar, conciliação, cooperação com conciliações estrangeiras, prescrição, custas, liberdade advocatícia, confidencialidade e relatório.

No panorama da resolução alternativa de litígios na União Europeia, Hopt dissertará sobre a Diretiva Europeia sobre resolução alternativa de litígios em questões de consumidores, o Decreto Europeu sobre a plataforma on line de resolução alternativa de litígios em questões de consumidores, e a Diretiva Europeia sobre aspectos da mediação em matéria civil e comercial. 

Fonte: CJF I 11/02/2014.

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Pontos positivos e negativos da unificação do registro civil de pessoas jurídicas

* Vitor Frederico Kümpel

Em continuação à artigo, em que nos debruçamos sobre as pessoas jurídicas de direito privado existirem a partir do registro (art. 45 do Código Civil) nos Ofícios de Registro Civil das Pessoas Jurídicas (simples) e nas Juntas Comerciais (empresárias), nesta oportunidade discorreremos sobre a unificação de ambas numa única estrutura administrativa.

Naquela oportunidade, encerramos o artigo deixando em aberto a questão da unificação, posto ser da essência da sociedade pós-moderna ampliar o acesso a todo aparato burocrático do Estado, para facilitar a vida do cidadão no que toca principalmente a procedimentos operacionais.

O objetivo deste artigo é justamente fazer essa análise, dos pontos positivos e negativos que decorrem de uma possível unificação do registro de pessoas jurídicas de direito privado. A finalidade desta análise é lançar algumas ideias, sem fechar a questão, até porque o tema é complexo e envolve uma série de interesses jurídicos e econômicos.

Comecemos então pelos benefícios, pelos pontos positivos, que uma unificação das atividades realizadas pela Junta Comercial e pelo Ofício de Registro de Pessoas Jurídicas traria para o cidadão, e para facilitar o acesso ao sistema.

O primeiro item, que não pode deixar de ser mencionado, é o benefício da uniformidade. É muito mais fácil regular uma atividade, e mesmo normatizá-la, quando tal regulamentação e tais normas deverão ter sua aplicação observada em apenas um aparato burocrático. A otimização dos procedimentos, ainda que com certas peculiaridades, traria maior facilidade a contadores, a operadores jurídicos e também a todos os controladores do sistema. A existência de duas estruturas burocráticas diferentes e desvinculadas uma da outra, realizando uma atividade de natureza assemelhada gera contradições desnecessárias e de difícil sanação.

Citando como exemplo a Junta Comercial do Estado de São Paulo (JUCESP), observa-se um órgão sujeito às especificações da lei complementar estadual 1.187/2012 e da lei Federal 8.934/1994, que dispõe sobre os Serviços de Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins. A JUCESP é um órgão subordinado ao Departamento Nacional de Registro do Comércio (DNRC) e, portanto, responde a este na realização de suas atividades1.

Já os ofícios de Registro Civil de Pessoas Jurídicas estão regulamentados, primeiramente, pelo artigo 236, da Constituição Federal, e pelas leis 6.015/1973 e 8.935/94, estando subordinados à Corregedoria Geral da Justiça e, indiretamente, ao Conselho Nacional de Justiça.

Percebe-se, então, que ambas as instituições responsáveis pelo registro de pessoas jurídicas no estado de São Paulo são regulamentadas por leis diferentes e estão subordinadas a diferentes órgãos administrativos. Essas diferenças dificultam, e até por vezes confundem, aqueles que se utilizam do serviço. A unificação tornaria mais fácil a fiscalização e a uniformidade do serviço prestado, sendo este o primeiro benefício da junção do registro civil de pessoas jurídicas.

Outro benefício seria a uniformização da qualificação das pessoas que trabalham com esses registros. Garantir que as pessoas registradoras das sociedades civis também saibam sobre a regulamentação do registro das sociedades comerciais e empresariais, traria mais segurança aos que se servem dos serviços de registro de pessoas jurídicas, no sentido de que estariam sendo atendidos por pessoas que, certamente, entendem o funcionamento de todo o sistema e não apenas de um setor específico. Portanto, a qualificação registral seria assemelhada, e respeitadas as peculiaridades haveria uma uniformidade das exigências de ambas as pessoas jurídicas. As rotinas de trabalho seriam semelhantes e solúveis por meio do procedimento da dúvida registral, passando o Poder Judiciário a dar a última palavra em todos os atos de registro.

Ainda, outro ponto positivo estaria na incidência das Normas de Serviço da Corregedoria Geral, tanto para pessoas jurídicas civis quanto empresárias. Portanto, haveria uma única normatização, também com suas especificações; e, por conseguinte, um único sistema de controle, desvinculado da burocracia administrativa do Estado, e sem qualquer injunção política. Neste sentido é bom lembrar que o Código Civil atual (lei 10.406/02) revogou parte do Código Comercial unificando as pessoas jurídicas de Direito privado.

Já um ponto negativo, de uma possível unificação das funções de registro das pessoas jurídicas, poderia ser, preliminarmente, a dificuldade prática de transferir todo o acervo, documentação, responsabilidades e atribuições das Juntas Comerciais para os Ofícios de Registro Civil de Pessoas Jurídicas. Considerando que, atualmente, as serventias não têm a obrigação de registrar as pessoas jurídicas de natureza comercial/empresarial, seriam necessários: um treinamento, uma adaptação, e uma normatização específica para todos os prepostos e demais funcionários da serventia, passando a ter familiaridade na observância das rotinas específicas.

Tal treinamento seria oneroso, sob o ponto de vista econômico e jurídico para as serventias, e isto demandaria certo tempo. Havendo, então, a necessidade de transferência do acervo da Junta Comercial para o Registro de Pessoas Jurídicas, bem como a relotação de serventuários para outras atividades burocráticas do Estado.

Ultrapassada a dificuldade prática, surge outra dificuldade: a falta de especialização. Hoje há a especialização graças à separação na realização dos serviços. Sem sombra de dúvida, a especialidade e a especificidade das rotinas facilitam a consecução dos atos, na medida em que as rotinas são distintas, para qualificar as pessoas empresariais em relação às pessoas jurídicas simples ou civis.

A seguinte pergunta deve ser feita quando analisada a possibilidade de unificação do Registro Civil de Pessoas Jurídicas: é possível aproveitar a estrutura que os Ofícios de RCPJ já proporcionam e incorporar, à tais serventias, os serviços realizados nas Juntas Comerciais? Fica claro que, frente à ocorrência de uma possível unificação, barreiras práticas deverão ser transpostas, treinamentos e especializações deverão ser realizados, etc.

Contudo parece-nos que uma vez ultrapassadas as dificuldades práticas impostas à unificação do registro de pessoas jurídicas, os benefícios trazidos por ela superariam, e em muito, os prejuízos. A dificuldade de implementação de uma proposta, e a concretização de um trabalho não deve obstaculizar os benefícios e as vantagens que podem decorrer da unificação, uma vez empreendida.

A qualificação das pessoas, oficiais e prepostos, abrangendo o registro das pessoas jurídicas de forma geral, só tem a garantir um serviço mais bem prestado e que gera mais facilidade e conveniência para aqueles que se utilizam de tal serviço. A pergunta que sobrepaira é a seguinte: Se em nenhuma outra serventia há desmembramento de atribuição, por que deveria acontecer em relação ao registro de pessoas jurídicas de direito privado?

Diante do mencionado quadro, o que é possível concluir com certeza absoluta é que a celeridade, operabilidade, uniformidade, publicidade e eticidade devem estar sempre à frente dos interesses pessoais na consecução de qualquer serviço público, de qualquer natureza.

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1Site da JUCESP.

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* Vitor Frederico Kümpel é juiz de Direito em São Paulo, doutor em Direito pela USP e coordenador da pós-graduação em Direito Notarial e Registral Imobiliário na EPD – Escola Paulista de Direito.

Fonte: Migalhas I 05/11/2013.

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