CINDIBILIDADE: RI deve ressalvar no título que o registro não foi integral. Veja a decisão do CSM/SP.

Acórdão – DJ nº 0002464-95.2012.8.26.0480 – Apelação Cível 

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0002464-95.2012.8.26.0480, da Comarca de Presidente Bernardes, em que é apelante BANCO DO BRASIL S/A, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE PRESIDENTE BERNARDES.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, COM OBSERVAÇÃO, V.U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores RENATO NALINI (Presidente), EROS PICELI, GUERRIERI REZENDE, ARTUR MARQUES, PINHEIRO FRANCO E RICARDO ANAFE.

São Paulo, 24 de junho de 2014.        

ELLIOT AKEL

RELATOR

Apelação Cível nº 0002464-95.2012.8.26.0480

Apelante: Banco do Brasil

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Presidente Bernardes

Voto nº 34.021

REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA – REGISTRO DE ESCRITURA DE COMPRA E VENDA COM CONFISSÃO E ASSUNÇÃO DE DÍVIDA E PACTO ADJETO DE HIPOTECA – DESNECESSIDADE DE CANCELAMENTO DE HIPOTECA ANTERIOR PARA AVERBAÇÃO DE NOVA GARANTIA – IMPOSSIBILIDADE, NO ENTANTO, DE MANUTENÇÃO DE CLÁUSULAS DE IMPENHORABILIDADE, VISTO QUE SE TRATA DE CONTRATO ONEROSO – INTELIGÊNCIA DO ART. 11 DA LEI COMPLEMENTAR N. 93/98 – POSSIBILIDADE DE REGISTRO DA ESCRITURA, DESCONSIDERADAS AS CLÁUSULAS, EM FACE DO PRINCÍPIO DA CINDIBILIDADE – RECURSO PROVIDO.

O Banco do Brasil interpôs recurso administrativo contra sentença que manteve recusa de registro de escritura de compra e venda com confissão, assunção de dívida e pacto adjeto de hipoteca.

A negativa do registro deu-se por dois fundamentos. Entendeu, o Oficial, que seria necessário o cancelamento da hipoteca de primeiro grau, inscrita no R. 02 da matrícula, para a constituição de nova garantia e que não poderiam prevalecer as cláusulas décima nona e vigésima da escritura, instituidoras de impenhorabilidade, por se tratar de negócio oneroso.

O recorrente aduz que houve mera assunção do contrato por novo mutuário e que o ônus da garantia hipotecária foi transferido a ele. E, no que diz respeito à impenhorabilidade, ela decorre da inteligência do art. 11 da Lei Complementar n. 93/98, que prescreve a inalienabilidade.

Em primeiro grau, o Ministério Público opinou pela improcedência da dúvida mas nesta instância o Parquet se manifestou pelo desprovimento do recurso.

Intervieram, na dúvida, os compradores, ora mutuários, na condição de interessados.

É o relatório.

O recurso comporta provimento.

Quanto à exigência de cancelamento da hipoteca inscrita no R. 02 e registro de nova hipoteca, o Oficial entendeu que, alienado o imóvel do mutuário originário para os novos mutuários, o Banco do Brasil deveria fornecer instrumento de quitação ao primeiro, cancelando a hipoteca e instituindo nova garantia, em face dos segundos.

Desse raciocínio, data venia, se diverge. O que ocorreu, no caso em tela, foi a cessão da posição contratual. O mutuário originário, com anuência do credor hipotecário – o Banco do Brasil – e da União, cedeu sua posição contratual aos novos mutuários, que assumiram a dívida pendente e a transferência do gravame hipotecário que, em virtude da sequela, seguiu o bem imóvel.

Como anota Caio Mário da Silva Pereira, o proprietário “não está inibido de alienar o imóvel hipotecado, porque não perde o ius disponendi. Ao adquirente, porém, transfere-se o ônus que o grava, não lhe valendo de escusa a alegação de ignorância, que não prevalece contra o registro, nem lhe socorrendo para libertá-lo de qualquer cláusula de sua escritura, ou compromisso assumido pelo devedor hipotecário. A alienação transfere o domínio do imóvel; mas este passa ao adquirente com o ônus hipotecário – transit cum onere suo”(Instituições de Direito Civil, vol. IV, 18ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 386).

A situação, aqui, afigura-se ainda mais simples. A existência do gravame era de conhecimento dos novos mutuários, que a ele acederam. E a cessão da posição contratual deu-se, ademais, com anuência do credor hipotecário e da União.

A conclusão evidente é que se transferiu o ônus da hipoteca, nos termos da cláusula primeira, alínea ‘e’, da escritura. Não há nenhuma razão ou necessidade de cancelamento da hipoteca para a constituição de nova garantia.

No que diz respeito às cláusulas décima nona e vigésima, que instituem a impenhorabilidade, a situação é diferente. Elas não podem subsistir.

O recorrente afirma que o art. 11, da Lei Complementar n. 93/98, que instituiu o Fundo de Terras e da Reforma Agrária e criou o Banco da Terra, ao prever a inalienabilidade (“Os beneficiários do Fundo não poderão alienar as suas terras e as respectivas benfeitorias no prazo do financiamento, salvo para outro beneficiário enumerado no parágrafo único do art. 1º e com a anuência do credor”) prescreveu também a impenhorabilidade. Daí a legalidade da cláusula.

Da leitura desse dispositivo, vislumbra-se, com clareza, que ele não trata de inalienabilidade. Prova maior disso é que o próprio artigo permite a alienação, condicionando-a, tão somente, à anuência do credor. Aliás, foi exatamente o que ocorreu aqui.

O que o legislador pretendeu ressaltar, no referido artigo, foi a necessidade da anuência, não a inalienabilidade, que não existe. Trata-se da mesma regra do Sistema Financeiro da Habitação. Permite-se a alienação, condicionando-a, contudo, à anuência do credor hipotecário.

Ressalte-se, ainda, que as cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade, por limitarem o direito de propriedade, são cabíveis, tão somente, em atos graciosos. Elas são restritas a atos de mera liberalidade, como doação e testamento.

Assentado que o art. 11 da Lei Complementar 93/98 não retrata hipótese de inalienabilidade, da mesma maneira não poderia ser inserida na escritura cláusula de impenhorabilidade. Afinal, a segunda – impenhorabilidade – não pode decorrer da primeira – inalienabilidade – se essa não existe.

A escritura pode ser registrada, em suma, extirpando-se as cláusulas décima nona e vigésima, levando-se em consideração o princípio da cindibilidade.

Conforme decidido em voto da lavra do Des. Maurício Vidigal (Apelação Cível nº 0024268-85.2010.8.26.0320), em que se discutia a possibilidade de registro de escritura de doação, com cláusula de impenhorabilidade, “a falta de justa causa compromete apenas a validade da cláusula restritiva, não da doação. Há muito este Egrégio Conselho Superior da Magistratura vem aplicando a regra da cindibilidade do título, pelo qual autoriza-se o registro daquilo que possa ingressar no fólio real, e nega-se o daquilo que não possa, permitindo-se extrair do título apenas aquilo que comporta o registro. A doação é hígida e foi livremente celebrada entre os contratantes. Apenas a cláusula de impenhorabilidade padece de vício, por afronta ao art. 1848, “caput”, do Código Civil. Admissível, portanto, o registro da escritura de doação, desconsiderando-se a cláusula de impenhorabilidade nele inserida.

Em caso similar, este Egrégio Conselho Superior decidiu:

“Há, contudo, um único vício no instrumento de compra e venda do imóvel adquirido pela apelante que impede o seu ingresso no registro, na forma como elaborado. Diz respeito à cláusula de incomunicabilidade inserida na escritura. Com efeito, quando a interveniente Maria Helena doou a importância de R$ 120.000,00, representada pelo apartamento do edifício Príncipe de Liverpool, no. 63, transmitindo-o a seguir aos vendedores Edmundo Antonio e sua mulher, fez constar que a doação se fazia com exclusividade, em caráter incomunicável, como adiantamento de sua legítima. A disposição constante do título é nula, porque afronta o disposto no art. 1848 do Código Civil … Todavia a nulidade ora apontada se restringe apenas à cláusula inserida no título e não importa na invalidade deste, mas somente na sua cindibilidade, a fim de que se torne viável o seu registro a seguir” (Ap. Civ. 440-6/0, de 06 de dezembro de 2005, Rel. Des. José Mário Antonio Cardinale).”

Possível, então, o ingresso do título no registro imobiliário, com a desconsideração das cláusulas restritivas de impenhorabilidade nele inseridas.

É preciso consignar, porém, importante advertência feita por Mário Guerra Serra e Monete Hipólito Serra:

“Devemos ressaltar por fim que, caso se aplique o princípio da cindibilidade, o registrador deve deixar bem claro no título que somente parte dos direitos foram registrados, especificando-os. Isto tendo em vista que a regra é o registro integral do título, e, como estamos aqui tratando de uma exceção, devemos tomar todos os cuidados para evitar que terceiros possam ser induzidos em erro” (Registro de Imóveis, vol. I, parte geral, São Paulo: Saraiva, 2013, p. 141)

Nesses termos, pelo meu voto, à vista do exposto, dou provimento ao recurso, com a observação acima.

HAMILTON ELLIOT AKEL

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: TJ/SP | 11/07/2014.

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Jurisprudência STJ- Direito Civil e Processual Civil. Legitimidade para pleitear declaração de nulidade em doação inoficiosa.

O herdeiro que cede seus direitos hereditários possui legitimidade para pleitear a declaração de nulidade de doação inoficiosa (arts. 1.176 do CC/1916 e 549 do CC/2002) realizada pelo autor da herança em benefício de terceiros. Isso porque o fato de o herdeiro ter realizado a cessão de seus direitos hereditários não lhe retira a qualidade de herdeiro, que é personalíssima. De fato, a cessão de direitos hereditários apenas transfere ao cessionário a titularidade da situação jurídica do cedente, de modo a permitir que aquele exija a partilha dos bens que compõem a herança. REsp 1.361.983-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/3/2014.

Fonte: Recivil – STJ.

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Questão esclarece acerca da natureza do ato a ser praticado quando da cessão da posição do credor-fiduciário (alienação fiduciária).

Alienação fiduciária. Credor-fiduciário. Cessão. Natureza do ato.

Questão esclarece acerca da natureza do ato a ser praticado quando da cessão da posição do credor-fiduciário.

Para esta edição do Boletim Eletrônico a Consultoria do IRIB selecionou questão acerca da natureza do ato a ser praticado quando da cessão da posição do credor-fiduciário. Veja como a Consultoria do IRIB se posicionou acerca do assunto, valendo-se dos ensinamentos de Melhim Namem Chalhub e Sérgio Eduardo Martinez:

Pergunta
Na alienação fiduciária, a cessão da posição do credor-fiduciário é ato de registro ou de averbação?

Resposta
Não obstante sabermos que o item 8, do inciso II, do art. 167, da Lei dos Registros Públicos, já indica, de forma clara, que o ato de cessão fiduciária de direitos sobre imóveis deve ingressar no Registro de Imóveis, como ato de averbação, de importância observar que sua inserção como norma legal, ocorreu por engano do legislador, uma vez que ela faz parte do texto original da referida LRP ( ano de 1973), quando ainda não havia qualquer legislação cuidando de seu ingresso nos assentos dos Serviços Imobiliários.

Em que pese tal situação, podemos, em um primeiro momento, defender a base legal dessa averbação com suporte no referido item 8, cujo proveito pode ser sustentado pelo que temos na Lei 9.514, de 1997, que passou a admitir a alienação fiduciária sobre imóveis, bem como a cessão de seus direitos e obrigações, tanto do fiduciante, como do fiduciário.

Além desse dispositivo, temos também base legal para o ato de averbação no "caput", do art. 246 c.c. o citado art. 167, inciso II, item 5 (parte final), ambos da Lei Federal n. 6.015/73.

Neste sentido, vejamos o que nos ensina Melhim Namem Chalhub:

“A averbação da cessão é indispensável, não só para a validade contra terceiros, mas também perante o fiduciante, pois o fiduciário deve estar formalmente investido dos seus direitos para legitimar-se aos procedimentos de cobrança, constituição do fiduciante em mora, consolidação da propriedade em seu nome e implementação da ação de reintegração de posse”. (CHALHUB, Melhim Namem. “Negócio Fiduciário”, Ed. Renovar, Rio de Janeiro – São Paulo – Recife, 2009, p. 243).

Não é outro o entendimento de Sérgio Eduardo Martinez:

“A cessão deverá ser averbada no registro de imóveis para valer não só contra terceiros, mas também contra o próprio devedor fiduciante, ainda que dispensável a notificação do devedor da cessão (art. 35)29, excepcionando a regra do art. 290 do Código Civil30, para que o cessionário possa exercer todos os direitos inerentes à cobrança do crédito de que agora é titular, como a constituição em mora do devedor, a consolidação da propriedade em seu nome e a ação de reintegração de posse.

(…)

_____________________________________

29 Art. 35 da Lei nº 9.514/97: ‘Nas cessões de crédito a que aludem os arts. 3.º, 18 e 28, é dispensável a notificação do devedor.’

30 Art. 290 do Código Civil: ‘A cessão de crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.”’ MARTINEZ, Sérgio Eduardo. “Alienação fiduciária de imóveis”, in “Novo Direito Imobiliário e Registral” Organizadores: Cláudia Fonseca Tutikian; Luciano Benetti Timm e João Pedro Lamana Paiva. São Paulo: Quartier Latin, 2008, pág. 500).

Finalizando, recomendamos sejam consultadas as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça de seu Estado, para que não se verifique entendimento contrário ao nosso. Havendo divergência, proceda aos ditames das referidas Normas, bem como a orientação jurisprudencial local.

Fonte: IRIB | www.irib.org.br.

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