Jurisprudência mineira – Agravo de Instrumento – Inventário – Reconhecimento do direito de a companheira sobrevivente herdar tão somente os bens adquiridos onerosamente durante a união estável

AGRAVO DE INSTRUMENTO – INVENTÁRIO – DIREITOS SUCESSÓRIOS DO COMPANHEIRO – APLICAÇÃO DO ART. 1.790, INCISO III, DO CÓDIGO CIVIL – CONSTITUCIONALIDADE – RECONHECIMENTO PELO ÓRGÃO ESPECIAL DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DIREITO DE A COMPANHEIRA SOBREVIVENTE HERDAR TÃO SOMENTE OS BENS ADQUIRIDOS ONEROSAMENTE DURANTE A UNIÃO ESTÁVEL, EM CONCORRÊNCIA COM OS PARENTES COLATERAIS DE SEGUNDO GRAU, EXCLUÍDOS, PORTANTO, OS BENS PARTICULARES – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO

– O Órgão Especial deste Tribunal reconheceu a constitucionalidade do art. 1.790, quando do julgamento do Incidente de nº 1.0512.06.0322313-2/002, por entender que o ordenamento jurídico constitucional não impede que a legislação infraconstitucional discipline a sucessão para os companheiros e os cônjuges de forma diferenciada, visto que respectivas entidades familiares são institutos que contêm diferenciações.

– A teor do inciso III do art. 1.790 do Código Civil, na falta de descendentes e ascendentes, o companheiro faz jus tão somente a um terço dos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável a título de herança, pois concorre com os colaterais até quarto grau, devendo ser excluída sua participação como herdeiro dos bens particulares do de cujus.

Agravo de Instrumento Cível nº 1.0024.13.112456-2/001 – Comarca de Belo Horizonte – Agravante: A.S.P. – Agravado: Espólio de M.A.L.O. – Relator: Des. Bitencourt Marcondes

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em negar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 5 de junho de 2014 – Bitencourt Marcondes – Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES. BITENCOURT MARCONDES – Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por A.S.P. contra decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito Maurício Torres Soares, da 3ª Vara de Sucessões e Ausências da Capital que, nos autos do inventário dos bens deixados pelo falecimento de M.A.L.O., reconheceu que a Chácara nº 10, da quadra 72, caberá tão somente aos herdeiros colaterais, por direito próprio ou por representação, assim como 2/3 (dois terços) do restante da herança.

Requer a reforma da decisão, em suma, ao argumento de que tanto a doutrina quanto a jurisprudência vêm reconhecendo o direito do companheiro supérstite ao recebimento da totalidade da herança diante da ausência de ascendentes ou descendentes, haja vista a equiparação, pela Constituição, da união estável ao casamento.

O recurso foi recebido apenas no efeito devolutivo, consoante decisão de f. 116/117v-TJ.

Informações prestadas pelo Juízo a quo à f. 121-TJ.

Instada a se manifestar, a Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de f. 123-TJ, aduz desinteresse no feito.

Conheço do recurso, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade.

Do objeto do recurso.

Cinge-se a questão acerca do direito hereditário do companheiro, em relação aos bens comuns e particulares deixados pela de cujus, levando-se em consideração que deixou parentes sucessíveis, no caso, colaterais de 2º e 3º graus (irmãos e sobrinhos). 

O regime de bens a ser considerado para a união estável, no caso, é o da comunhão parcial de bens, pois não celebrado contrato escrito estabelecendo regramento diverso.

O Código Civil de 2002 dispensou-lhe tratamento próprio, diferente daquele direcionado ao cônjuge, conforme se infere do art. 1.790, in verbis:

“Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:

I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;

II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;

III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;

IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.”

Embora tenha entendimento no sentido da inconstitucionalidade do inciso III do art. 1.790 do Código Civil, certo é que tal questão já fora afastada pelo Órgão Especial deste Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento do incidente de inconstitucionalidade nº 1.0512.06.0322313-2/002, devendo, portanto, tal entendimento ser aplicado ao caso em tela. Importante registrar, contudo, que o Supremo Tribunal Federal ainda não se posicionou acerca da questão, tendo apenas determinado, quanto aos processos que chegaram àquela Corte, discutindo a matéria, o retorno dos autos para fins de cumprimento da Súmula Vinculante nº 10, bem como do art. 97 da Constituição da República. Confira-se:

“[…]

2. Muito bem. Observo que a Oitava Câmara Cível afastou a aplicação do inciso III do art. 1.790 do Código Civil de 2002 no caso concreto. E o fez sem a observância do disposto no art. 97 da Carta Magna.

3. A parte agravante, a seu turno, alega afronta ao art. 5º e ao § 3º do art. 226 da Constituição Federal. Sustenta que ‘deveria o colegiado ter remetido a apreciação da declaração de inconstitucionalidade do dispositivo (Art. 1.790, III) para julgamento perante o Pleno do Tribunal de Justiça do ERGS’ (f. 153).

4. Tenho que a insurgência merece acolhida. Isso porque, no caso, é de incidir a Súmula Vinculante nº 10 do Supremo Tribunal Federal. Súmula cuja dicção é a seguinte:

‘Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta a sua incidência no todo ou em parte.’ Isso posto, e frente ao § 1º-A do art. 557 do CPC, dou provimento ao recurso. O que faço para cassar o acórdão recorrido e determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem a fim de que se proceda a novo julgamento, nos termos do art. 97 da Constituição Federal” (STF. RE 597.952/RS, Rel. Min. Ayres Britto, DJ de 04.08.2009).

No presente caso, o magistrado a quo reconheceu ao agravante, companheiro supérstite, o direito apenas à terça parte da herança, excetuando-se a Chácara nº 10, da quadra 72 – haja vista que adquirida pela finada antes do período em que havida a união estável -, atribuindo o restante dos bens aos colaterais de 2º e 3º graus (irmãos e sobrinhos, por direito de representação).

Não vislumbro razões para a reforma da decisão.

Isso porque, a teor do art. 1.790, inciso III, do Código Civil, o agravante concorre com os demais irmãos da de cujus, que não deixou descendentes ou ascendentes, fazendo jus, portanto, tão somente, a 1/3 (um terço) dos bens adquiridos onerosamente durante a união estável com a falecida, sem prejuízo à meação. Deve ser excluído, assim, o bem particular acima referido, pois integrado ao patrimônio da companheira morta anteriormente ao relacionamento havido.

Conclusão.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

Custas, ex lege.

É como voto.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Alyrio Ramos e Rogério Coutinho.

Súmula – NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.

Fonte: Recivil – DJE/MG | 21/07/2014.

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Casamento ou união estável? Escolha afeta divisão da herança

União estável nem sempre será melhor do que o casamento civil quando casal quer se desvincular de regras da partilha de herança; entenda por quê

São Paulo – O tipo de contrato firmado pelo casal para formalizar sua união pode ter inúmeras implicações legais. Sabendo disso, alguns têm optado por firmar um contrato de união estável, em vez do casamento civil, para evitar obrigações que teriam em relação à herança no caso da morte de um dos companheiros. Ocorre que, além de a união estável também atrelar os companheiros a uma série de regras sobre herança, algumas questões ainda não estão muito bem definidas e a Justiça pode ter diversas interpretações sobre a questão. Por isso, decidir entre casamento e união estável é muito mais complexo do que parece à primeira vista e nem sempre a união estável será o melhor caminho. 

A união estável

Na união estável, seja namorando ou casando apenas no religioso, não há mudança no estado civil do casal. Esta união também não exige formalidade para ser desfeita ou constituída. Em função disso, há espaço para uma larga discussão sobre o momento exato em que a união estável de fato começou. Isso pode ser crucial, por exemplo, quando um companheiro falece e o outro tenta provar na Justiça que tinha uma união estável, para obter sua parte na herança. 

Rodrigo Barcellos, sócio do escritório Barcellos Tucunduva Advogados, explica que a definição de quando começa a união estável é o que no âmbito jurídico se chama de matéria de fato, quando algo não é definido a partir da Lei, mas a partir de um histórico que deve ser narrado quando os direitos são pleiteados. “Quando a pessoa deixa de ficar e passa a namorar? Cada um terá uma resposta. O mesmo se dá com a união estável. Alguns falam que deixa de ser namoro para ser união estável quando a pessoa mora junto, mas outros falam que a união estável não ocorre só quando os companheiros coabitam, por isso, a questão vai ser definida caso a caso, é matéria de prova”, diz.

Segundo ele, em alguns casos pode ser fácil comprovar a existência da união estável, como quando o casal faz uma festa de casamento, mas em outros o processo pode ser mais complexo. 

Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) explica que a união estável também pode ser oficializada por meio de uma escritura feita em cartório e existe a possibilidade de definição de um regime de bens pelo casal. "Ao fazer o contrato de união estável, se o casal quiser, ele pode definir o regime de comunhão de bens, comunhão parcial de bens ou de separação de bens", afirma.

Discussões 

Uma das maiores discussões sobre as diferenças da união estável e do casamento civil é a questão da partilha da herança.

Segundo o artigo 1.790 do Código Civil: “A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente [que foram comprados] na vigência da união estável […]”. Ou seja, o companheiro terá parte na herança dos bens comuns comprados durante a união, mas não dos bens particulares, adquiridos pelo companheiro antes do casamento. “O Código Civil tratou o cônjuge de um jeito e o companheiro de outro no que diz respeito à herança”, diz Barcellos.

Fonte: Exame I 18/10/2013.

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STJ: Viúva que era casada em comunhão parcial entra apenas na herança dos bens comuns

O cônjuge sobrevivente que era casado sob o regime da comunhão parcial de bens não concorre com os descendentes na partilha de bens particulares do falecido, mas, além de ter direito à meação, não pode ser excluído da sucessão dos bens comuns, em concorrência com os demais herdeiros. O entendimento é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). 

Na ação de inventário que deu origem ao recurso especial, o juízo de primeiro grau considerou que uma viúva que fora casada em regime de comunhão parcial, além da meação a que tinha direito (metade do patrimônio conjunto adquirido durante o casamento), deveria entrar na divisão dos bens particulares do marido (aqueles que ele tinha antes de casar), concorrendo na herança com os descendentes dele. 

A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Diante disso, o espólio do falecido recorreu ao STJ para pedir a exclusão da viúva na partilha dos bens particulares. 

Os ministros decidiram o caso com base na interpretação do artigo 1.829, inciso I, do Código Civil de 2002 (CC/02), segundo o qual, “o cônjuge supérstite casado sob o regime da comunhão parcial de bens integra o rol dos herdeiros necessários do de cujus, quando este deixa patrimônio particular, em concorrência com os descendentes”. 

Bens exclusivos

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial, lembrou que, antes da Lei do Divórcio, o regime natural de bens era o da comunhão universal, “que confere ao cônjuge a meação sobre a totalidade do patrimônio do casal, ficando excluído o consorte da concorrência à herança”. 

A partir da vigência da Lei 6.515/77, o regime natural passou a ser o da comunhão parcial, “segundo o qual se comunicam os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, consideradas as exceções legais”, afirmou. 

Segundo a ministra, essa mudança, que foi confirmada pelo CC/02, fez surgir uma preocupação, porque seria injustificável passar do regime da comunhão universal, no qual todos os bens presentes e futuros dos cônjuges são comunicáveis, para o regime da comunhão parcial – sem dar ao cônjuge sobrevivente o direito de concorrer com descendentes e ascendentes na herança.

Por essa razão, o cônjuge passou a ser considerado herdeiro necessário. Para Andrighi, “o espírito dessa mudança foi evitar que um consorte fique ao desamparo com a morte do outro”. 

Apesar disso, ela considera que, na comunhão parcial, os bens exclusivos de um cônjuge não devem ser partilhados com o outro após a sua morte, “sob pena de infringir o que ficou acordado entre os nubentes no momento em que decidiram se unir em matrimônio” (artigos 1.659 e 1.661 do CC). 

Para a relatora, a interpretação mais justa do artigo 1.829, inciso I, do CC é aquela que permite que o sobrevivente herde, em concorrência com os descendentes, a parte do patrimônio que ele próprio construiu com o falecido, “porque é com a respectiva metade desses bens comuns que ele pode contar na falta do outro, assim na morte como no divórcio”. 

Melhor interpretação

Em seu entendimento, a interpretação de parte da doutrina de que o cônjuge herda, em concorrência com os descendentes, tanto os bens comuns quanto os particulares, representa “a transmutação do regime escolhido em vida”. Além disso, para ela, essa interpretação conflita com os princípios da dignidade da pessoa humana, autonomia privada, autorresponsabilidade, confiança legítima, boa-fé e eticidade. 

Por fim, a ministra ressaltou que “afastar o cônjuge da concorrência hereditária no que toca aos bens comuns, simplesmente porque já é meeiro, é igualar dois institutos que têm naturezas absolutamente distintas”: a meação e a herança. 

Andrighi disse que a meação já é do viúvo em virtude da dissolução do casamento pela morte, enquanto a herança “é composta apenas dos bens do falecido, estes sim distribuídos aos seus sucessores, dentre os quais se inclui o consorte sobrevivente”. 

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 1377084.

Fonte: STJ I 16/10/2013.

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