CGJ|SP: PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – SUPOSTA SIMULAÇÃO CONTRATUAL, COMO FORMA DE VIOLAR DIREITOS SUCESSÓRIOS

Procedimento Administrativo Disciplinar – Suposta simulação contratual, como forma de violar direitos sucessórios – Não cabe ao Sr. Oficial fazer análise minudente das declarações de vontade dos contratantes – Eventual simulação há de ser alegada em vias ordinárias, não se podendo impor ao Sr. Oficial que obstasse o registro – Recurso Desprovido.

Processo nº 0012232-84.2014.8.26.0606

Parecer 174/2016-E

S.

L. F.

Procedimento Administrativo Disciplinar – Suposta simulação contratual, como forma de violar direitos sucessórios – Não cabe ao Sr. Oficial fazer análise minudente das declarações de vontade dos contratantes. Eventual simulação há de ser alegada em vias ordinárias, não se podendo impor ao Sr. Oficial que obstasse o registro. Recurso Desprovido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Cuida-se de recurso interposto em face de r. sentença que entendeu pela ausência de falta disciplinar do Xº Tabelião de Notas e Protestos de Letras e Títulos de S.. Alega a recorrente que seus direitos sucessórios teriam sido violados por seus avós e tios, que, mancomunados com terceiros, teriam simulado dois contratos de compra e venda do mesmo imóvel, escondendo efetiva doação. Os contratos de compra e venda dos avós a terceiros e, depois, dos terceiros aos tios, teriam sido lavrados em dias consecutivos, a evidenciar a simulação.

Defendeu-se o Sr. Tabelião, sustentando ter atuado nos estreitos limites legais e refutando a prática de falta disciplinar.

O Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

À luz do item 1.3, Capítulo XIV, Tomo II, das NSCGJ:

“1. O Tabelião de Notas, profissional do direito dotado de fé pública, exercerá a atividade notarial que lhe foi delegada com a finalidade de garantir a eficácia da lei, a segurança jurídica e a prevenção de litígios.

1.3. É seu dever recusar, motivadamente, por escrito, a prática de atos contrários ao ordenamento jurídico e sempre que presentes fundados indícios de fraude à lei, de prejuízos às partes ou dúvidas sobre as manifestações de vontade.”

A recusa à prática dos atos é, por óbvio, exceção. E, como tal, essencial que haja fundados indícios de fraude à lei, prejuízo às partes, ou dúvidas sobre as manifestações de vontade. Frise-se não bastar a subjetiva suspeita do Sr. Tabelião. De rigor, para obstar o ato notarial, a verificação de “fundados indícios” de que alguma das situações arroladas tenha ocorrido.

Na hipótese dos autos, a recorrente sustenta ter havido simulação na sucessiva transferência de titularidade do imóvel, vendido por seu avô a terceiros e, no dia seguinte, pelos terceiros aos tios da recorrente. O encadeamento contratual teria servido, pelos argumentos recursais, para que o imóvel fosse doado, pelos avós, aos tios da recorrente, por interpostas pessoas, como forma de burlar direitos sucessórios.

E, deveras, não se há de descartar a possibilidade de vício do consentimento. Todavia, descabe, nesta sede, inclusive pelos parcos elementos probatórios havidos nos autos, qualquer análise mais aprofundada acerca da questão.

Aqui, há de se estudar, exclusivamente, a ocorrência de eventual falta funcional perpetrada pelo Sr. Oficial. Pretendendo obter decisão judicial que reconheça a simulação aventada e invalide os contratos, a interessada há de promover, como parece já ter feito, demanda cível.

Neste passo, inviável que o Sr. Tabelião obstasse, per si, a lavratura do contrato de compra e venda. O só fato de terem sido firmados em dias consecutivos não basta a configurar “fundados indícios” de fraude à lei. E as vontades manifestadas em ambos os contratos de compra e venda são claras. Os respectivos teores não dão margem a dúvidas interpretativas. Não se descarta, frise-se, a possibilidade de ter havido simulação. Porém, não compete ao Sr. Oficial investigar elementos subjetivos inerentes à formação do título.

Conforme os magistérios de Narciso Orlandi:

“Problemas relativos ao consentimento das partes dizem respeito ao título, tanto quanto sua representação e a elaboração material do instrumento. Assim, se houve fraude, se a assinatura do transmitente foi falsificada, se o instrumento público não consta dos livros de nenhum notário, se a procuração que serviu na representação de uma das partes é falsa, se o consentimento do alienante foi obtido com violência, são todos problemas atinentes ao título. Podem afetar o registro, mas obliquamente. Só podem determinar o cancelamento do registro, em cumprimento de sentença que declare a nulidade do título e, em conseqüência, do registro.” (Retificação do Registro de Imóveis, Ed. Oliveira Mendes, pág. 192).

Nem se olvide que apenas o segundo contrato de compra e venda, havido entre terceiros e os tios da recorrente, foi lavrado perante o recorrido. O primeiro contrato de compra e venda, em que são vendedores os avós da recorrente e compradores, os terceiros, foi lavrado perante o Xº Tabelião de Notas e Protestos de Letras e Títulos de S., outro elemento a enfraquecer a tese de flagrante indolência do recorrido.

Em síntese, ao Sr. Oficial não compete investigar a sanidade das declarações de vontade dos contratantes. Suposto vício do consentimento, se é que houve, não poderia ser de pronto verificado. Não se há falar, pois, em falta funcional, reiterando-se ser dado à interessada buscar as vias ordinárias para pleitear judicialmente a nulidade dos contratos em voga.

Por todo o aduzido, o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de se negar provimento ao recurso administrativo, mantendo-se a bem lançada sentença de primeiro grau.

Sub censura.

São Paulo, 8 de agosto de 2016.

Iberê de Castro Dias
Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO

Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso administrativo.

Publique-se.

São Paulo, 9 de agosto de 2016.

PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça

(DJe de 12.09.2016 – SP)

Fonte: Colégio Notarial do Brasil – DJE/SP | 19/10/2016.

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Brecha na legislação faz com que mulheres sejam obrigadas a mudar nome após casamento

A Lei do Divórcio, criada em 1977, garante à mulher o direito de permanecer com o sobrenome do ex-marido, mesmo em casos de dissolução conjugal. Com o novo Código Civil (2002), a igualdade entre homens e mulheres foi reafirmada, e atualmente, ambos os cônjuges podem adotar o sobrenome do outro. Apesar disto, quando há o fim do casamento, muitas mulheres ainda são pressionadas pelos ex-maridos, na Justiça, a retirarem o sobrenome de casadas.

Para tentar solucionar esse problema, a deputada federal, Ana Perugini (PT), pediu à Câmara dos Deputados a elaboração de um projeto de lei que restringe a hipótese do atual artigo 1.578 do Código Civil, que diz “declarado culpado na ação de separação perde o direito de usar o sobrenome do outro, desde que requerido pelo inocente”. Segundo Zeno Veloso, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), o nome do cônjuge integra o complexo de direitos da personalidade e a mulher pode renunciar ao uso desse sobrenome a qualquer tempo. Leia a entrevista com Zeno Veloso ao fim da matéria.

Ao solicitar o projeto de lei, a deputada lembrou que a legislação reforça o caráter personalíssimo do nome e demonstra sua importância na vida das pessoas. Para ela, o nome é patrimônio pessoal, construído em anos de história e que carrega experiências que a lei já garante que sejam mantidas. De acordo com Márcia Fidelis, tabeliã e membro do IBDFAM, a lei impõe restrições à possibilidade de modificação do nome com o fim da sociedade conjugal ou do próprio casamento.

“Como atributo da personalidade, se o nome (que para muitos autores é, inclusive, protegido pelo princípio da autonomia da vontade), pode ser alterado pela livre manifestação de vontade de cada indivíduo ao se casar, deveria também poder ser alterado ou mantido pela vontade de seu portador. O fato de ter sido alterado, não tira do nome o fato de ser atributo da personalidade. E como tal, sua alteração com o fim do casamento tem que ser decisão pessoal do seu portador, independentemente de qualquer condição, se culpado ou inocente”.

Ainda segundo Márcia Fidelis, a nova visão de família brasileira está voltada às relações de afeto, objetivando o pleno desenvolvimento do indivíduo. Diferente do que ocorria na família patriarcal, não se obriga um cidadão a se manter casado com alguém para a manutenção do núcleo familiar. Sendo assim, basta a vontade de um para se romper o vínculo conjugal. O afeto e a vontade de constituir família há de ser recíproco, do contrário, não há família.

“O fato de o cônjuge, que queira manter o nome de casado, ter cometido crime, não pode lhe impor a pena de perder parte de seu nome, uma vez que o sobrenome acrescido ao seu nome de solteiro passou a compor o seu novo nome e, assim, seus direitos da personalidade”, diz Márcia Fidelis. A ideia de propor o projeto surgiu durante um encontro de mulheres, em Hortolândia (SP), onde, segundo afirma a deputada Ana Perugini, muitas mulheres estão sofrendo com essa lacuna na legislação.

ENTREVISTA

1 – A Deputada Federal Ana Perugini apresentou à Câmara dos Deputados um projeto de lei que restringe a hipótese do atual artigo 1.578 do Código Civil, sugerindo uma alteração que elimina os parâmetros “culpado” e “inocente” e estabelece como critério o fato de o cônjuge que queira ficar com o nome de casado só perder esse direito caso tenha cometido crime. Qual a sua opinião sobre o tema?

Zeno Veloso: No Tratado de Direito das Famílias, publicado pelo IBDFAM, escrevi o capítulo denominado “Nome Civil da Pessoa Natural” e analisei o art. 1.565, § 1º, do Código Civil, que diz: “Qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro”. Por sua vez, o art. 1.578 do Código Civil mencionava que o cônjuge declarado culpado na ação de separação judicial perde o direito de usar o sobrenome do outro, desde que expressamente requerido pelo cônjuge inocente e se a alteração não acarretar as consequências previstas nos três incisos do aludido artigo.

No projeto de Lei que apresentou, a deputada Ana Perugini quer eliminar os parâmetros “culpado” e “inocente” e estabelecer como critério para a perda do direito de usar o sobrenome do outro cônjuge o fato de ter praticado crime. Penso que o projeto de lei pretende estabelecer o que já existe. Com o advento da histórica Emenda Constitucional nº 66/2010 foi abolida a separação de direito – judicial e administrativa -, bem como excluída a questão de culpa na solução das crises familiares.

O nome do cônjuge integra o complexo de direitos da personalidade. Se, por exemplo, a mulher adotou o sobrenome do marido, ela não está usando o “sobrenome do marido”, mas o seu próprio sobrenome, que passou a ser elemento fundamental de sua identificação, e ela poderá renunciar ao uso desse sobrenome a qualquer tempo.

2 – Segundo a deputada, a mulher não pode ser obrigada a abrir mão de sua personalidade cada vez que encerrar um ciclo da vida. Qual a visão do IBDFAM sobre esta temática?

Zeno Veloso: Penso que a maioria dos integrantes do IBDFAM entende que a mulher – que sempre é a vítima nessas questões – não pode ser obrigada a abrir mão do uso do sobrenome de seu marido por ter falido o casamento. Tal nome não é dele, mas dela própria, estando integrado à sua personalidade. Ela tem a faculdade de resolver sobre o assunto, conforme seus interesses e conveniência. O patriarcado acabou, o machismo caiu de moda. Viva a igualdade.

3 – O senhor concorda com a afirmação da deputada de que a legislação atual vem se mostrando confusa, já que os adjetivos “culpado” e “inocente” abrem precedentes e levam a discussões subjetivas, gerando constrangimentos às mulheres que contraíram matrimônio antes do novo Código Civil?

Zeno Veloso: Estou de acordo, sim, de que os adjetivos “culpado” ou “inocente” geram confusão e discriminam. Além do mais, são equívocos. Não há um só “culpado” quando o casamento submerge, nem um heroico “inocente” quando dá tudo certo, falando pela via ordinária, no geral dos casos.

4 –  A EC nº 66/2010 que instituiu o divórcio direto, acabou com a discussão da culpa pelo fim do casamento e união estável. Na sua opinião, seria uma afronta ao princípio da vedação ao retrocesso social essa legislação?

Zeno Veloso: A EC nº 66/2010, como tenho afirmado, acabou com a possibilidade de discussão sobre a culpa pelo fim do casamento, que tantos males e transtornos causou à sociedade brasileira. Voltar a esse tema, insistir nesse assunto, sem dúvida, é um retrocesso, um pulo para trás.

5 – Como ficaria em casos de união estável?

Zeno Veloso: Na união estável, mutatis mutandis, aplicam-se os mesmos princípios. Estamos testemunhando – e cada vez mais – uma equiparação entre casamento e união estável. E isso, por um lado é muito bom; por outro lado, péssimo. Mas este é outro tema, para nova entrevista.

Fonte: IBDFAM | 19/10/2016.

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“Lei do parto anônimo evita aborto e protege vida da criança abandonada”, diz especialista

O abandono de crianças é um problema muito sério e frequente nos noticiários do Brasil. Nesta semana, uma capitã da Polícia Militar do Rio de Janeiro chamou a atenção ao publicar uma foto, nas redes sociais, em que amamentava um recém-nascido, que havia sido deixado pela mãe, em uma igreja da comunidade do Terreirão. O caso ganhou repercussão e, com ele, a institucionalização do parto anônimo voltou a ser discutida.

Conforme o Cadastro Nacional de Crianças acolhidas em abrigos (CNCA) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), atualmente cerca de 46.000 mil crianças estão em acolhimento institucional no país. Além disso, apenas 7 mil estão aptas para serem adotadas. De acordo com a vice-presidente da Comissão de Ensino Jurídico de Família do IBDFAM, Fabíola Albuquerque Lôbo, para compreendermos a questão do parto anônimo, devemos contextualizar as mazelas sociais que enfrentamos na realidade brasileira.

“Infelizmente não temos políticas públicas voltadas para a informação, acesso aos métodos contraceptivos e educação sexual para o planejamento familiar. Há um alarmante número de abortos clandestinos e uma enorme quantidade de recém-nascidos abandonados em locais inóspitos, colocando em risco a própria vida da criança” alerta. Ainda segundo Fabíola Lôbo, o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) defende a lei do parto anônimo, pois a enxerga como meio humanizador.

“De um lado ela evita o aborto e protege a integridade física da mãe e, de outro, por mais paradoxal que seja, é um meio de resguardar a vida daquela criança abandonada. No projeto de Lei 3220/2008, que foi encaminhado pelo IBDFAM, a mulher que externasse a intenção de não ficar com o filho seria acompanhada durante toda a gravidez por profissionais habilitados, que tentariam, ao menos, impedir o aborto ou o abandono da criança”, explica.

A institucionalização do parto anônimo recebe críticas de pessoas que temem o comprometimento do direito à identidade genética. Mas, para Fabíola, a criança nascida de parto anônimo estabeleceria vínculos de parentesco (filiação) com a família socioafetiva que a adotasse e não com a genitora. “Em cada caso concreto, estaríamos diante da ponderação entre o direito a conhecimento, a origem genética e o direito ao anonimato. Hoje, é muito tranquila esta distinção entre o estado de filiação (direito de família) e o direito à origem genética (direito da personalidade)”, esclarece.

A advogada explica ainda que o projeto isentaria a mulher de qualquer responsabilidade penal, salvo na hipótese de infanticídio. Como a criança não seria civilmente registrada, dispensaria a propositura da ação de destituição de poder familiar, o que tornaria mais célere a adoção. O menor teria a possibilidade de inserção numa família substituta, com condições de estabelecer vínculos de filiação, convivência familiar solidária e democrática, de modo a realizar o melhor interesse da criança.

Fonte: IBDFAM | 19/10/2016.

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