Registro de Imóveis – Cancelamento de usufruto – Comprovação do recolhimento do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e de Doação-ITCMD incidente na diferença entre o valor total do imóvel e o valor que serviu como base de cálculo para a aquisição da nua-propriedade pela donatária – Hipótese de incidência não prevista na Lei Estadual nº 10.705/2000 – Ausência de transmissão da propriedade no cancelamento do usufruto – Precedentes da Corregedoria Geral da Justiça – Recurso provido.


  
 

Número do processo: 1005326-72.2020.8.26.0114

Ano do processo: 2020

Número do parecer: 410

Ano do parecer: 2020

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1005326-72.2020.8.26.0114

(410/2020-E)

Registro de Imóveis – Cancelamento de usufruto – Comprovação do recolhimento do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e de Doação-ITCMD incidente na diferença entre o valor total do imóvel e o valor que serviu como base de cálculo para a aquisição da nua-propriedade pela donatária – Hipótese de incidência não prevista na Lei Estadual nº 10.705/2000 – Ausência de transmissão da propriedade no cancelamento do usufruto – Precedentes da Corregedoria Geral da Justiça – Recurso provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso interposto por Maria Aparecida Stahl Cortez contra r. decisão que manteve a recusa da averbação do cancelamento do usufruto que incide sobre o imóvel objeto da matrícula nº 102.085 do 2º Registro de Imóveis da Comarca de Campinas porque o valor do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e de Doação – ITCMD recolhido em razão da doação do imóvel teve como base de cálculo a parcela correspondente à nua-propriedade, sem abranger a parcela equivalente ao usufruto.

A recorrente arguiu a nulidade da r. decisão que deixou de seguir precedente da Corregedoria Geral da Justiça sem, porém, demonstrar a distinção do precedente com o caso em julgamento, ou a superação do entendimento. Alegou, no mais, que a Lei Estadual nº 10.705/2000 não prevê a incidência do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e de Doação – ITCMD no cancelamento do usufruto. Por sua vez, o Decreto Estadual nº 46.655/2002, que regulamentou o ITCMD, violou o princípio da legalidade ao prever nova hipótese de incidência tributária. Requereu a anulação da r. Decisão, ou, alternativamente, o provimento do recurso para que seja promovida a averbação do cancelamento do usufruto (fl. 130/154).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fl. 172/176).

É o relatório.

Opino.

Na r. decisão recorrida foram expostos, de forma suficiente, os fundamentos adotados para a manutenção da recusa da averbação, consistentes no dever legal do Oficial de Registro de Imóveis fiscalizar o recolhimento dos tributos devidos por força dos atos que lhe forem apresentados em razão do ofício e na inadequação da via administrativa para a declaração da não incidência do imposto (fl.100/102).

Além disso, a r. decisão que rejeitou os embargos de declaração afastou a adoção do precedente invocado pela recorrente por considerar que não tem força normativa e, portanto, efeito vinculante:

“É o que ocorre no presente caso, mormente porque o entendimento citado às fls. 114 e seguintes não é vinculante, não se olvidando, na atualidade, da diversa composição do E. Conselho Superior da Magistratura” (fl.123).

Por essas razões, não há nulidade pela ausência de fundamentação.

Ademais, cuida-se de procedimento de natureza administrativa, voltado exclusivamente à análise da insurgência quanto aos motivos da recusa da averbação, não se justificando a anulação da r. decisão porque o recurso devolve a qualificação do título por inteiro, o que permite a nova apreciação de toda a matéria que, de qualquer modo, também é realizada com base no princípio da autotutela da Administração Pública.

A recusa da averbação do cancelamento do usufruto que incide sobre o imóvel objeto da matrícula nº 102.085, decorrente do falecimento dos usufrutuários (fl. 12/15 e 23/24), teve como fundamento o art. 31, inciso I, alínea “c”, § 3º, nºs 1 a 3 do Decreto Estadual nº 46.655/2002 que prevê que o Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e de Doação – ITCMD incidente sobre a parcela do imóvel correspondente ao usufruto será recolhido quando do seu cancelamento, salvo se a base de cálculo utilizada para a doação da nua-propriedade tiver correspondido ao valor total da propriedade.

Ocorre que essa hipótese de incidência não decorre da Lei Estadual nº 10.705/2000 que em seu art. 9º, § 2º, nº 4, prevê que na transmissão não onerosa da nua-propriedade a base de cálculo do ITCMD corresponderá a 2/3 (dois terços) do valor do bem:

Artigo 9º – A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo).

(…)

§ 2º – Nos casos a seguir, a base de cálculo é equivalente a:

1. 1/3 (um terço) do valor do bem, na transmissão não onerosa do domínio útil;

2. 2/3 (dois terços) do valor do bem, na transmissão não onerosa do domínio direto;

3. 1/3 (um terço) do valor do bem, na instituição do usufruto, por ato não oneroso;

4. 2/3 (dois terços) do valor do bem, na transmissão não onerosa da nua-propriedade”.

Ausente previsão legal específica para a sua incidência, e não constituindo o cancelamento do usufruto transmissão do domínio do imóvel, os precedentes da Corregedoria Geral da Justiça são no sentido de que a averbação do cancelamento do usufruto, pelo falecimento do usufrutuário, independe de nova declaração e recolhimento do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e de Doação – ITCMD tendo como base de cálculo valor correspondente a um terço da propriedade. Nesse sentido, cabe citar o r. parecer apresentado pelo MM. Juiz Assessor da Corregedoria, Dr. Paulo Cesar Batista dos Santos, no Processo nº 1120534- 20.2018.8.26.0100 que foi acolhido pelo então Corregedor Geral da Justiça, Desembargador Geraldo Francisco Pinheiro Franco, em que se verifica:

“Respeitado o entendimento do recorrente, o recurso não comporta provimento.

Isso porque há reiterados precedentes desta Eg. Corregedoria Geral da Justiça no sentido de que a fração tributária não é devida, como bem destacado na r. sentença recorrida.

Embora a tese de cabimento da exação, face ao recolhimento diferido, seja substancial do ponto de vista jurídico, apta a ensejar debates sobre a possibilidade de seu afastamento pela via administrativa, fato é que devem ser mantidos os precedentes administrativos reiterados ao longo dos anos, até para que haja estabilidade e previsibilidade no exercício da qualificação registral.

Tal entendimento fora inaugurado na lição do Des. LUIZ ELIAS TÂMBARA, em Parecer da lavra do MM. Juiz Álvaro Luiz Valery Mirra, Processo CG nº 38.005/2009, que restou assim ementado:

‘REGISTRO DE IMÓVEIS – Cancelamento de usufruto – Apresentação de guia comprobatória do recolhimento do ITCMD – Desnecessidade – Usufruto extinto em virtude do falecimento da usufrutuária – Ausência de transmissão de bem ou direito ao nu-proprietário – Não incidência do ITCMD reconhecida na Decisão Normativa CAT – 10, de 22.06.2009 – Averbação do cancelamento do usufruto que se impõe (art. 1.410, ‘caput’, do CC) – Recurso provido’ (g.n).

Trago, a título exemplificativo, os seguintes precedentes mais recentes, sempre no mesmo sentido da não exigência do referido tributo, quando do cancelamento do usufruto:

‘REGISTRO DE IMÓVEIS – Averbação de cancelamento de usufruto, pela morte da usufrutuária – Consolidação da propriedade em nome do nu-proprietário – Exigência do Sr. Oficial de complementação do ITCMD, por 1/3 do valor do bem, uma vez já ter havido recolhimento do tributo, por 2/3 do valor do bem, quando da instituição do usufruto – Exigência afastada pela MM. Juíza Corregedora Permanente – Consolidação da propriedade que não caracteriza hipótese de incidência do tributo – Precedente desta Corregedoria Geral – Decreto regulamentar nº 46.655/2002, que, na espécie, extrapola seus limites – Parecer pelo desprovimento do recurso’ (Processo CGJ nº 1058147-03.2017.8.26.0100, Parecer 399/2017-E, MM. Juiz Carlos Henrique André Lisboa, Des. PEREIRA CALÇAS)

‘REGISTRO DE IMÓVEIS – Averbação de cancelamento de usufruto, pela morte da usufrutuária – Consolidação da propriedade em nome do nu-proprietário – Exigência do Sr. Oficial de complementação do ITCMD, por 1/3 do valor do bem, uma vez já ter havido recolhimento do tributo, por 2/3 do valor do bem, guando da instituição do usufruto – Exigência afastada pela MM Juíza Corregedora Permanente – Consolidação da propriedade que não caracteriza hipótese de incidência do tributo – Precedente desta Corregedoria Geral – Decreto regulamentar nº 46.655/2002, que, na espécie, extrapola seus limites – Parecer pelo desprovimento do recurso’ (Processo nº 1057875-09.2017.8.26.0100, Parecer 416/2017-E. MM Juiz Carlos Henrique André Lisboa, Des. PEREIRA CALÇAS)

Por essas razões, respeitado o entendimento do recorrente, a r. sentença deve ser mantida em sua integralidade”.

Ante o exposto, o parecer que submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de dar provimento ao recurso para afastar a recusa do cancelamento do usufruto.

São Paulo, 22 de setembro de 2020.

José Marcelo Tossi Silva

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, por seus fundamentos que adoto, e dou provimento ao recurso para afastar a recusa do cancelamento do usufruto. Intimem-se. São Paulo, 25 de setembro de 2020. (a) RICARDO ANAFE, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: WELLINGTON BENATTI DE JESUS MARTINS, OAB/SP 307.001.

Diário da Justiça Eletrônico de 26.10.2020

Decisão reproduzida na página 128 do Classificador II – 2020

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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