1VRP/SP. Registro de Imóveis. Doação de numerário para aquisição de bem a título oneroso (venda e compra). Indisponibilidade em nome do doador. Possibilidade do registro. Processo 1026463-55.2020.8.26.0100

Dúvida – Notas – Vitor Augusto Ortenzio Velloso – Vistos. Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Vítor Augusto Ortenzio Velloso, diante da negativa em se proceder ao registro da escritura pública de doação e venda e compra concernente aos imóveis matriculados sob nºs 175.726 e 175.801. De acordo com o título, o genitor Nylton Velloso Filho doou o valor de R$ 1.535.000,00 (um milhão, quinhentos e trinta e cinco mil reais) ao suscitado, ora comprador da nua propriedade, com a imposição das cláusulas vitalícias de incomunicabilidade e impenhorabilidade sobre mencionados imóveis. O óbice registrário refere-se à existência de indisponibilidade de bens, comunicada pela Egrégia Corregedoria Geral da Justiça em nome do doador, sendo necessária a determinação formal da autoridade responsável para realização do cancelamento dos gravames, nos termos do artigo 252 da Lei de Registros Públicos. Juntou documentos às fls.05/42 e 75/81. O suscitado apresentou impugnação às fls.50/53. Informa que as indisponibilidades não existem mais, vez que ocorreram exclusivamente em decorrência da decretação da liquidação extrajudicial das empresas Economisa Economia Distribuidora de Títulos e Valores Imobiliários LTDA, Economisa Crédito, Financiamento e Investimento S/A e ONV Participação e Administração S/A, das quais Nylton Velloso Filho era o administrador, sendo que houve o cancelamento pelo Banco Central do Brasil. Apresentou documentos às fls.54/65. Segundo informações do Banco Central do Brasil, não mais subsiste a indisponibilidade de bens em nome de Nylton Vello Filho (fls.101, 104, 105, 109 e 110), razão pela qual o suscitado corrobora os argumentos da impugnação. O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls.116/118). É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Apesar do entendimento pessoal desta magistrada, no sentido de que a doação de valor por pessoa que teve a indisponibilidade decretada, com a finalidade específica de compra de imóvel poder caracterizar fraude contra credores, vez que o objeto principal da indisponibilidade é preservar o patrimônio do devedor, devendo haver anterior levantamento do gravame junto ao Juízo que o decretou, em recente decisão proferida pelo Egrégio Conselho Superior da Magistratura, restou pacificado o entendimento relativo à dispensa da exigência. Neste sentido, no parecer exarado no procedimento de dúvida nº 1095017-76.2019.8.26.0100, pelo DD. Juiz Corregedor Geral da Justiça Drº Ricardo Anafe, voto nº 31.212: “Registro de Imóveis Dúvida Título notarial Compra e venda Prévia doação de dinheiro ao comprador para a aquisição do imóvel Indisponibilidade sobre os bens do doador Limite da qualificação registral Restrição que não diz respeito ao objeto, nem aos figurantes da compra e venda e, portanto, não pode impedir o registro – Óbice afastado Dáse provimento”. Confira-se do corpo do Acórdão: “… Ou seja, a compra e venda é, aqui, um titulo material e, portanto, é somente ela que pode ser objeto de qualificação registral. Do ponto de vista estritamente formal, o Oficial de Registro de Imóveis não tem , para isso, atribuição ratione materiae (cf. Lei n. 6015/1973, c.c. Arts. 167 e 246) para também examinar a doação e dela trazer uma razão que influencie a análise da compra e venda. …. Também não cabe entrar na investigação de fraude a credores ou à execução, ainda que decorrer diretamente da compra e venda, visto que essa matéria, como se usa dizer, é de cariz jurisdicional , e tampouco se insere no âmbito da qualificação registral”. Na presente hipótese, a indisponibilidade diz respeito somente aos bens do doador Nylton Velloso Filho, mas não do comprador Vítor Augusto Ortenzio Velloso, nem da vendedora Eleonora Biagi Cruz Perri, assistida por seu marido Alexandre Rivetti Perri, logo, não há qualquer óbice ao registro pretendido, cabendo ao registrador o juízo de qualificação do título somente sob o aspecto formal. Somado a este fato, tem-se que de acordo com as informações do Banco Central do Brasil, as indisponibilidades em nome de Nylton Velloso Filho não mais subsistem (fls.101, 104, 105, 109 e 110), o que reforça a possibilidade do registro. Diante do exposto, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Vítor Augusto Ortenzio Velloso, e consequentemente determino o registro da escritura pública de doação e venda e compra, referente aos imóveis matriculados sob nºs 175.726 e 175.801. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os  autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: MARCELO ANTONIO ROBERTO FINK (OAB 119585/SP) (DJe de 24.11.2020 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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Recurso Especial – Autos de Agravo de Instrumento na origem – Inventário – Pretensão de deferimento de usufruto vidual por meeira separada de corpos do de cujus – Pedido negado nas instâncias ordinárias – Irresignação da cônjuge supérstite – A controvérsia reside em saber se ao cônjuge sobrevivente, mesmo com separação de corpos já decretada judicialmente há mais de dois anos antes do óbito do consorte, pode ser conferido o usufruto vidual de imóvel, consoante disposto no artigo 1611, § 1°, do Código Civil de 1916, em que pese já contemplado com a meação, em face de ajuste homologado em juízo – 1. Não enseja eventual perda de objeto ou prejudicialidade da pertinente postulação, o só fato de ter sido expressamente ressalvada, na sentença homologatória de transação havida entre as partes, temática atinente ao usufruto vidual, exatamente por encontrar-se a matéria em grau recursal – 2. O usufruto vidual do consorte sobrevivente tem como escopo a salvaguarda do mínimo necessário ao cônjuge ou companheiro que não possui, obrigatoriamente, quinhão na herança do falecido, em sucessões abertas na vigência do Código Civil de 1916, não reputado herdeiro necessário o supérstite – 2.1 Na interpretação teleológica do instituto, não faz jus ao usufruto legal a que alude o art. 1.611, § 1º, do Código Civil revogado, a viúva meeira em razão de já ter sido contemplada com parcela significativa do patrimônio, afastando a necessidade econômica autorizativa da benesse – 3. Incidência do óbice da súmula 283/STF no que concerne ao fundamento de que ao tempo do falecimento do de cujus o casal já estava separado (separação de corpos) há mais de dois anos – 4. Recurso especial conhecido em parte e, na extensão, desprovido.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.280.102 – SP (2011/0189758-7)

RELATOR : MINISTRO MARCO BUZZI

RECORRENTE : MARIA HELENA ERMEL GUATIMOSIM

ADVOGADO : MILTON GUILHERME ROSSI MENDONÇA E OUTRO(S) – SP267931

RECORRIDO : JOSÉ LANARI GUATIMOSIM – ESPÓLIO

ADVOGADO : GISELE HEROICO PRUDENTE DE MELLO – SP185771

EMENTA

RECURSO ESPECIAL – AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM – INVENTÁRIO – PRETENSÃO DE DEFERIMENTO DE USUFRUTO VIDUAL POR MEEIRA SEPARADA DE CORPOS DO DE CUJUS – PEDIDO NEGADO NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS.

IRRESIGNAÇÃO DA CÔNJUGE SUPÉRSTITE.

A controvérsia reside em saber se ao cônjuge sobrevivente, mesmo com separação de corpos já decretada judicialmente há mais de dois anos antes do óbito do consorte, pode ser conferido o usufruto vidual de imóvel, consoante disposto no artigo 1611, § 1°, do Código Civil de 1916, em que pese já contemplado com a meação, em face de ajuste homologado em juízo.

1. Não enseja eventual perda de objeto ou prejudicialidade da pertinente postulação, o só fato de ter sido expressamente ressalvada, na sentença homologatória de transação havida entre as partes, temática atinente ao usufruto vidual, exatamente por encontrar-se a matéria em grau recursal.

2. O usufruto vidual do consorte sobrevivente tem como escopo a salvaguarda do mínimo necessário ao cônjuge ou companheiro que não possui, obrigatoriamente, quinhão na herança do falecido, em sucessões abertas na vigência do Código Civil de 1916, não reputado herdeiro necessário o supérstite.

2.1 Na interpretação teleológica do instituto, não faz jus ao usufruto legal a que alude o art. 1.611, § 1º, do Código Civil revogado, a viúva meeira em razão de já ter sido contemplada com parcela significativa do patrimônio, afastando a necessidade econômica autorizativa da benesse.

3. Incidência do óbice da súmula 283/STF no que concerne ao fundamento de que ao tempo do falecimento do de cujus o casal já estava separado (separação de corpos) há mais de dois anos.

4. Recurso especial conhecido em parte e, na extensão, desprovido.

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso especial e, nesta parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão.

Brasília (DF), 13 de outubro de 2020 (Data do Julgamento)

MINISTRO MARCO BUZZI

Relator

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO MARCO BUZZI (Relator):

Cuida-se de recurso especial interposto por MARIA HELENA ERMEL GUATIMOSIM, com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas “a” e “c” da Constituição Federal, em desafio a acórdão proferido em agravo de instrumento pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

O inconformismo inicial fora interposto contra decisão exarada nos autos do inventário dos bens deixados pelo finado JOSÉ LANARI GUATIMOSIM, com quem a recorrente era casada sob o regime de comunhão parcial de bens, ante o indeferimento do pedido apresentado pela viúva no sentido de ver reconhecido o usufruto vidual da quarta parte dos bens inventariados, nos moldes do disposto no artigo 1.611, §1º, do Código Civil de 1916.

A mencionada deliberação restou assim redigida (fls. 24-26):

O Código Civil de 1916 contemplava o instituto do usufruto vidual. Nos termos do §1° do artigo 1.611 do anterior Código Civil, se o regime de bens do casamento não fosse o da comunhão universal, o cônjuge viúvo teria direito, enquanto durasse a viuvez, ao usufruto da quarta parte dos bens do cônjuge falecido, se houvesse filhos deste ou do casal, e à metade, se ‘não houvesse filhos embora sobreviventes os ascendentes do “de cujus”. 11 José Lanari Guatimosim faleceu em 10 de novembro de 2000, na vigência do Código Civil dei 1916.

O “de cujus” era casado desde de 30 de outubro de 1982, pelo regime da comunhão parcial de bens, com Maria Helena Ermel Guatimosim, de quem estava separado de corpos desde 04 de setembro de 1998, por força de sentença proferida nos autos da ação que tramitou perante a 12a Vara de Família do Foro Central da Capital (011.98.010909-4).

No esboço de partilha de fls. 909/9113, tem-se reconhecida a meação da viúva em relação a parte dos bens inventariados. Pretende a viúva, ainda, o reconhecimento do usufruto vidual em seu favor sobre parte da herança. Indefiro o pedido da viúva.

Quando do falecimento do autor da herança, este se encontrava separado de corpos de Maria Helena Ermel Guatimosim, desde 04 de setembro de 1998, por força de sentença proferida nos autos da ação que tramitou perante a 12a Vara de Família do Foro Central da Capital (011.98.010909-4). Embora houvesse ação de separação litigiosa em trâmite, a separação judicial não chegou a ser decretada, em razão do falecimento do varão.

É certo que o casal não convivia e que estavam separados de corpos, conforme alvará e sentença proferida em medida cautelar de separação de corpos. Certo, também, que havia processo de separação litigiosa em trâmite quando do falecimento do “de cujus”.

Considerando que a separação de fato do casal equivale à ruptura do conteúdo material do casamento, fazendo cessar os efeitos que dele decorrem; e, ainda, que ,o instituto do usufruto vidual tem por escopo a proteção do cônjuge viúvo desamparado, inaplicável a regra do artigo 1611, § 1º do Código Civil de 1916 ao caso destes autos.

(…)

Assim, cumpra o Cartório a determinação de fls. 955, expedindo-se o alvará deferido naquela decisão.

Após, remetam-se os autos ao Partidor para que verifique o exposto às fls. 964/965.

O Tribunal paulista, negou provimento ao agravo de instrumento nos termos da seguinte ementa:

Agravo de instrumento – Usufruto vidual indeferido – Regime da comunhão parcial de bens – Viúva já contemplada com a meação, não fazendo jus a aludido instituto previsto no artigo 1611, § 1°, do Código Civil de 1916 Caráter protetivo – Precedentes do STJ e STF’– Decisão mantida – Litigância de má fé não caracteriza – Recurso improvido.

Direito real de habitação que não foi postulado perante o juízo monocrático – Questão que não pode ser apreciada nesta Instância, sob pena de supressão de um grau de jurisdição.

Nas razões do recurso especial (fls. 215-223), alega a insurgente, além de dissídio jurisprudencial, violação ao artigo 1611, § 1º do Código Civil de 1916. Sustenta, em síntese: a) ter atendido aos dois únicos requisitos estabelecidos pelo § 1° do art. 1.611 do antigo Código Civil para a concessão do usufruto: regime de bens diferente do da comunhão universal e viuvez do cônjuge e b) o usufruto vidual deve ser concedido, independente de eventual meação a que tenha direito o cônjuge sobrevivente.

Contrarrazões às fls. 277-302.

Admitido o reclamo na origem, ascenderam os autos ao exame desta Corte Superior.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO MARCO BUZZI (Relator):

O reclamo não merece prosperar.

A controvérsia reside em saber se ao cônjuge sobrevivente, separado de corpos do de cujus há mais de dois anos, pode ser conferido o usufruto vidual de imóvel, consoante disposto no artigo 1611, § 1°, do Código Civil de 1916, mesmo quando já contemplado com a meação.

1. De início, é necessário mencionar que embora o inventário subjacente ao agravo de instrumento na origem tenha sido sentenciado e transitado em julgado, estando arquivado definitivamente, é certo que a deliberação exarada nos referidos autos foi homologatória da transação havida entre as partes com a ressalva atinente à matéria a ser deliberada nesse recurso referente à “definição do usufruto vidual”.

Por oportuno, confira-se o teor da sentença de homologação da transação constante do andamento processual do inventário n. 0021605-72.2000.8.26.0011 (011.00.021605-5):

Homologada a Transação – Sentença Resumida

“Vistos. Considero justificada a ausência da viúva. Homologo o acordo efetuado pelas partes para que produza os seus jurídicos e legais efeitos. Em consequência, HOMOLOGO A PARTILHA de fls. 1081/1085 (com a exclusão do valor acima mencionado e do apartamento situado na rua da Consolação nº 3240, apto 84 e da definição do usufruto vidual, ainda em grau de recurso para que produza os seus jurídicos e legais efeitos, salvo erros, omissões e prejuízos a terceiro e, em especial, à Fazenda Pública, a qual já se manifestou nos autos às fls. 1211, extinguindo a sucessão com julgamento de mérito nos termos do artigo 269, inciso III, do Código de Processo Civil. Dada e publicada em audiência. Saem os presentes cientes e intimados. Registre-se e cumpra-se. Providenciadas as cópias necessárias expeça-se oportunamente carta de sentença. Nada requerido em 30 dias, arquivem-se os autos da sucessão, observadas as formalidades legais Junte-se cópia deste termo nos autos apensados, ficando desde logo recebido o aditamento para a regularização da ação, a qual permanecerá apenas como AÇÃO DE EXCLUSÃO DA PARTILHA DO IMÓVEL DA CONSOLAÇÃO (apensada), a qual deverá ser desapensada (em virtude dos inúmeros volumes da sucessão), entregando-se os autos desapensados ao Dr. Advogado das herdeiras, o qual já recebeu a contrafé fornecida nesta audiência para a apresentação de contestação no prazo legal a partir do dia 15 de setembro de 2014″

Como se vê, ante a circunstância de ter sido expressamente ressalvada, na sentença homologatória, que a transação não alcançava a temática referente ao usufruto vidual, não se pode cogitar de eventual perda do objeto ou prejudicialidade do presente reclamo.

2. O usufruto vidual era conferido no regime do Código Civil revogado (art. 1.611, § 1º, com o acréscimo conferido pela Lei nº 4.121/62) aos cônjuges casados em regimes de bens diversos da comunhão universal, correspondendo, a aludida instituição, à quarta parte dos bens deixados pelo falecido, caso houvesse filhos, ou metade do bens, na hipótese de herdeiros ascendentes.

Confira-se, por oportuno, o texto do regramento mencionado:

Art. 1.611. Em falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão ao cônjuge sobrevivente, se, ao tempo da morte do outro, não estavam desquitados.

§ 1º O cônjuge viúvo se o regime de bens do casamento não era o da comunhão universal, terá direito, enquanto durar a viuvez, ao usufruto da quarta parte dos bens do cônjuge falecido, se houver filho deste ou do casal, e à metade se não houver filhos embora sobrevivam ascendentes do “de cujus”.

§ 2º Ao cônjuge sobrevivente, casado sob o regime da comunhão universal, enquanto viver e permanecer viúvo será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habilitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único bem daquela natureza a inventariar.

O escopo do instituto era a salvaguarda do mínimo necessário ao cônjuge que não era agraciado, obrigatoriamente, com herança do falecido, como no caso de comunhão parcial ou separação absoluta, em sucessões abertas na vigência do Código Beviláqua, esse que não considerava o cônjuge como herdeiro necessário.

O atual Código não abarcou esse tema jurídico nos mesmos moldes então previstos na legislação revogada, porém estendeu o direito real de habitação referido no § 2º do art. 1.611 do CC/1916 a todos os regimes de bens (art. 1.831, CC/02), sem as restrições então previstas e alçou o cônjuge ao patamar de herdeiro necessário.

Na hipótese, tem-se que a recorrente, nos autos do Inventário dos bens deixados por seu marido, José Lanari Guatimosim, falecido em 10 de novembro de 2000, com quem era casada desde 30 de outubro de 1982 sob o regime da comunhão parcial de bens, requereu o reconhecimento do direito ao usufruto vidual sobre a quarta parte da totalidade dos bens do então inventariado, por força do disposto no § 1° do art. 1.611 do antigo Código Civil, esse que é o aplicável àquela sucessão.

As instâncias ordinárias afirmaram que embora a insurgente tenha cumprido, em princípio, os requisitos estabelecidos na lei de regência para a concessão da benesse – casamento sob o regime diverso da comunhão universal de bens e existência de filhos herdeiros do de cujus – , o deferimento do pleito restava inviabilizado em razão de ter obtido a meação de bens e de ao tempo do falecimento estar separada de fato há mais de dois anos do falecimento de cujus.

Há inegável dissenso tanto na doutrina quanto na jurisprudência acerca da possibilidade ou não de conviverem o usufruto vidual com eventual legado ou meação a que o cônjuge ou companheiro supérstite tenha direito.

Esta Corte Superior já deliberou em algumas oportunidades sobre o assunto em evidência, não tendo, no entanto, formado um derradeiro posicionamento uniforme quanto ao tema.

Ainda assim, é possível conferir precedentes que corroboram a assertiva segundo a qual o usufruto vidual independe da situação financeira do cônjuge sobrevivente, bastando para a concessão da benesse o estado de viuvez e o regime do casamento diferente da comunhão universal:

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SUCESSÃO. USUFRUTO VIDUAL. PARTILHA DE BENS. INOCORRÊNCIA DE TRANSAÇÃO SOBRE O DIREITO DE FRUIR DA ESPOSA SOBREVIVA. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO.

1. “O usufruto vidual [art. 1.611, § 1º, do CC/1916] é instituto de direito sucessório, independente da situação financeira do cônjuge sobrevivente, e não se restringe à sucessão legítima. Os únicos requisitos são o regime do casamento diferente da comunhão universal e o estado de viuvez” (REsp 648.072/RJ, Rel. Min. ARI PARGENDLER, DJ 23.04.2007).

2. O reconhecimento do direito de fruição da viúva não é obstado se, apesar de existir partilha, o usufruto vidual não foi nela transacionado, ou se não ocorreu eventual compensação por esse direito, ou, ainda, se não existiu sua renúncia (que não pode ser presumida). Isso porque usufruto vidual e domínio são institutos diversos, sendo um temporário e o outro de caráter definitivo, o que torna desnecessária a prévia rescisão ou anulação da partilha, já que não se alterará a propriedade dos bens partilhados.

3. Se impossível se tornar o usufruto da esposa sobreviva pela alienação dos bens inventariados, deverá ela ser indenizada.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 472.465/SP, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), TERCEIRA TURMA, julgado em 08/06/2010, DJe 24/06/2010)

AGRAVO REGIMENTAL. CIVIL. USUFRUTO VIDUAL.

– O usufruto vidual independe da situação financeira do cônjuge sobrevivente.

– O fato de o viúvo ser beneficiário de testamento do cônjuge falecido, não elide o usufruto vidual.

(AgRg no REsp 844.953/MG, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/12/2007, DJ 19/12/2007, p. 1223)

CIVIL. USUFRUTO VIDUAL. SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA. O usufruto vidual é instituto de direito sucessório, independente da situação financeira do cônjuge sobrevivente, e não se restringe à sucessão legítima; tem aplicação, também, na sucessão testamentária. Recurso especial conhecido e provido.

(REsp 648.072/RJ, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/03/2007, DJ 23/04/2007, p. 255)

CIVIL. USUFRUTO VIDUAL. O usufruto vidual é instituto do direito sucessório, e independe da situação financeira do cônjuge sobrevivo; recai sobre a totalidade do patrimônio do falecido – inclusive, portanto, sobre a legítima. Recurso especial não conhecido.

(REsp 229.799/SP, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/04/2001, DJ 28/05/2001, p. 160)

De sua vez, em precedentes específicos, constata-se tendência em reputar o usufruto legal ora em causa uma medida de amparo ao cônjuge desfavorecido de fortuna, que corra o risco de cair em situação, senão de penúria, pelo menos de grande inferioridade em comparação àquela de que desfrutava em vida do consorte.

Nesse sentido:

DIREITO SUCESSÓRIO. ART. 1.611, § 1º, CC/16. USUFRUTO VIDUAL. IMPOSSIBILIDADE. COMPANHEIRA CONTEMPLADA EM TESTAMENTO COM PROPRIEDADE DE VALOR IGUAL OU SUPERIOR AOS BENS SOBRE OS QUAIS RECAIRIA O USUFRUTO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. O usufruto vidual do consorte sobrevivente tem como escopo a salvaguarda do mínimo necessário ao cônjuge ou companheiro que não possui, obrigatoriamente, quinhão na herança do falecido, como no caso de comunhão parcial ou separação absoluta, em sucessões abertas na vigência do Código Beviláqua, que não considerava o cônjuge como herdeiro necessário.

2. Por isso que não faz jus ao usufruto legal a que alude o art. 1.611, § 1º, do Código Civil revogado, a companheira que foi contemplada em testamento com bens de valor superior ou igual àqueles sobre os quais recairia o usufruto.

3. Tendo sido legado à companheira do falecido propriedade equivalente a que recairia eventual usufruto, tem-se que tal solução respeita o que dispõe o art. 1.611, § 1º, do CC/16, uma vez que, juntamente com a deixa testamentária de propriedade, transmitem-se, por consequência, os direitos de usar e de fruir da coisa, na proporção exigida pela lei.

4. Recurso especial conhecido e provido.

(REsp 594.699/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 01/12/2009, DJe 14/12/2009)

Direito civil. Sucessões. Usufruto vidual. Exclusão testamentária. Prevalência.

– O art. 1.574 do CC/16, estabelece que, na hipótese de morrer a pessoa sem testamento, transmite-se a herança a seus herdeiros legítimos.

– Se houver disposição testamentária, resguardada a legítima aos herdeiros necessários, prepondera a última vontade transmitida pelo testador, notadamente quando manifestada por meio de testamento público, com o cumprimento de todos os requisitos e solenidades legalmente previstos no art. 1.632 e seguintes do CC/16.

– O testamento é a expressão da liberdade no direito civil, cuja força é o testemunho mais solene e mais grave da vontade íntima do ser humano.

– Se, ao dispor de seu patrimônio por meio de testamento público, silencia o testador a respeito do cônjuge que a ele sobreviver, opera-se a exclusão deste, conforme disposto no art. 1.725 do CC/16, o que se contrapõe, diretamente, ao direito de usufruto pleiteado pelo viúvo com base no art. 1.611, § 1º, do mesmo Código, que não deve ter guarida na hipótese; sobrepõe-se, dessa forma, a vontade explícita do testador em excluir o cônjuge sobrevivente da sucessão, ao direito de usufruto pleiteado pelo viúvo, que somente seria resguardado se não houvesse a referida disposição testamentária.

Recurso especial provido.

(REsp 802.372/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/09/2008, DJe 10/12/2008)

INVENTARIO. USUFRUTO VIDUAL. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL. VIUVA MEEIRA NOS AQUESTOS. RECONHECIDA A COMUNHÃO DOS AQUESTOS, NÃO TEM A VIUVA MEEIRA, AINDA QUE CASADA SOB REGIME DIVERSO DO DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS, DIREITO AO USUFRUTO VIDUAL PREVISTO NO ART. 1.611, PAR. 1., DO CODIGO CIVIL. PRECEDENTE DO STF.

RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.

(REsp 34.714/SP, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 25/04/1994, DJ 06/06/1994, p. 14278)

Em que pese os precedentes sobre o tema possam ser considerados um tanto dissonantes, certo é que havendo o estatuto civil de 1916 – que é o regente do inventário em evidência, vez que a abertura da sucessão ocorrera sob a sua égide – , em seu art. 1.611, § 1º, instituído o direito ao usufruto nas condições que elenca, dentre as quais não se inclui a da absoluta necessidade financeira, não poderia o aplicador do Direito deduzir tal enquadramento.

Afinal, sob o restrito ditame da lei referida, não seria a condição econômica do viúvo fator determinante para a existência do direito de usufruto sobre parte dos bens. O art. 1.611, § 1º, do Código Civil de 1916 preleciona, aliás, que para a aplicação do instituto, seriam exigidos apenas três requisitos, a saber:

(a) que o cônjuge sobrevivente não tenha sido casado com o falecido no regime de comunhão universal de bens;

(b) que existam herdeiros necessários, isto é, ascendentes ou descendentes; e

(c) que perdure o estado de viuvez.

A despeito dessa constatação, extraída do regramento legal estabelecido no § 1º do referido artigo, é possível, todavia, depreender que os requisitos legais impostos para a benesse são, efetivamente, restrições legais para o desfrute do instituto, o que é, inclusive, corroborado por legislações correlatas ao tema.

Nesse ponto, prudente referir que a Lei nº 8.971/74, regulamentadora dos direitos dos companheiros a alimentos e à sucessão, estabeleceu a similaridade do usufruto vidual aos companheiros, enquanto não constituírem nova união e desde que provada a necessidade, nos seguintes termos:

Art. 1º A companheira comprovada de um homem solteiro, separado judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos, ou dele tenha prole, poderá valer-se do disposto na Lei nº 5.478, de 25 de julho de 1968, enquanto não constituir nova união e desde que prove a necessidade.

Parágrafo único. Igual direito e nas mesmas condições é reconhecido ao companheiro de mulher solteira, separada judicialmente, divorciada ou viúva.

Art. 2º As pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão do(a) companheiro(a) nas seguintes condições:

I – o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito enquanto não constituir nova união, ao usufruto de quarta parte dos bens do de cujos, se houver filhos ou comuns;

II – o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito, enquanto não constituir nova união, ao usufruto da metade dos bens do de cujos, se não houver filhos, embora sobrevivam ascendentes;

III – na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança.

Art. 3º Quando os bens deixados pelo(a) autor(a) da herança resultarem de atividade em que haja colaboração do(a) companheiro, terá o sobrevivente direito à metade dos bens.

É cediço que ao intérprete do direito não é dado ampliar ou restringir o âmbito de aplicação da norma, mormente nas hipóteses em que o regramento existente não é genérico, mas sim específico. Todavia, não é menos verdade que a interpretação adequada é aquela que extrai do texto normativo a sua finalidade essencial, teleológica.

O normativo, ao prescrever… “se o regime de bens do casamento não era o da comunhão universal” enuncia ditame consentâneo à idéia de que aquele que foi contemplado com meação – como ocorre com o cônjuge casado sob o dito regime – , ou com quinhão igual ou superior à meação, não faz jus ao usufruto de que trata o artigo.

É o próprio dispositivo que reduz o alcance do instituto do usufruto vidual, ora em evidência. E, se excepcionada a hipótese do casamento sob o regime de comunhão universal, isso se deve às consequências patrimoniais do aludido regime, as quais podem ser semelhantes, ou mesmo idênticas, em outros regimes ou casos de deixa testamentária.

Quisesse o legislador emprestar total elastério ao instituto, assim o teria feito, como de fato o fez no parágrafo § 2°, do mesmo artigo, quando garantiu o direito real de habitação ao cônjuge sobrevivo “sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança”.

No caso dos autos, em razão da meação efetivamente atribuída à esposa, é incontroverso que a recorrente foi aquinhoada com significativa parcela do patrimônio do de cujus, fração esta que lhe garante meios suficientes de subsistência, tornando desnecessária, para não dizer injusta e penosa aos herdeiros, atribuir a seu favor usufruto vidual sobre a parcela dos bens objeto da herança.

Confira-se o quanto afirmado pela Corte local acerca da questão:

Destarte, no caso em análise, não há falar em situação de desamparo, porque a viúva receberá, a titulo de meação, segundo o esboço de partilha elaborado pelo Partidor Judicial, que instruiu a informação do Magistrado da causa, bens no montante de R$ 292.890,75, motivo pelo qual, a r. decisão hostilizada merece ser prestigiada, rejeitando-se a pretensão recursal. (fl. 205)

Ressalta-se que a referida quantia (R$ 292.890,75) equivale à metade de todo o patrimônio formado pelos bens comunicáveis amealhados pelo casal durante o casamento, que perdurou de 30/10/1982 (data do matrimônio) até 04/07/1998 (sentença de separação de corpos), correspondendo a 2 (dois) apartamentos, 1 (um) veículo Escort/Ford, 2 (duas) linhas telefônicas, 1 (um) título de clube e saldo em conta bancária, todos os bens no valor global de R$ 585.781,49, consoante os termos do esboço de partilha realizado pelo partidor judicial (fls. 87-91), na data de 10/02/2010.

Como se vê, o valor de aproximadamente 293 mil reais no ano de 2010, época na qual o salário mínimo mensal era de R$ 510,00 não pode ser considerado insignificante, principalmente quando tal quantum, nos dias atuais, devidamente atualizado pelo IGPM, alcança o montante de R$ 599.087,26 (corrigido até 01/09/2020).

Ademais, embora não tenha sido referido nos presentes autos, mas é presumível que ao tempo da separação de corpos do casal a ora insurgente tenha recebido um pensionamento mensal/alimentos para fazer frente à nova situação social vivida, não havendo notícia de que tais valores tenham sido abatidos da quantia final a ser recebida.

E ainda, o falecido deixou três filhas herdeiras e ao tempo de sua morte já tramitava a separação judicial/divórcio do casal que apenas não se ultimou em virtude do passamento prematuro do de cujus. Prudente mencionar, nesse ponto, que se tivesse ocorrido a separação judicial derradeira do casal antes do falecimento do ex-cônjuge da insurgente, não haveria sequer cogitar em usufruto vidual, mas apenas na partilha dos bens amealhados na constância do matrimônio.

Embora não seja essa a hipótese, mas apenas a título elucidativo, acaso o falecido não tivesse filhos, mas apenas ascendentes vivos, não se mostra consentâneo com a pretensão do legislador que a viúva fosse agraciada com a quase totalidade do patrimônio – 50% a título de meação (dos bens amealhados na constância do enlace) e 50% como usufruto vidual de todo o patrimônio do falecido – pois, nessa circunstância hipotética, os ascendentes, então efetivos herdeiros, pouco ou absolutamente nada receberiam, esvaindo-se o escopo da lei de salvaguardar uma subsistência digna aos parentes herdeiros que presume-se, em razão de ascendentes contarem com idade avançada, não tendo a mesma força laboral para fazer frente às adversidades da vida.

Certamente, o dispositivo legal em questão (§ 1º do artigo 1611 do Código Civil de 1916) tem o inequívoco sentido de amparo ao cônjuge que fica desprovido dos recursos que pertenciam ao falecido, em consequência do regime matrimonial dos bens.

Se, no entanto, a viúva, pelo reconhecimento de sua participação na metade dos aquestos, já tem uma situação correspondente à que lograria se o regime fosse o da comunhão universal, não há razão alguma de se lhe atribuir, ademais, o benefício legal ora em foco, sobre parte dos bens que excederam a sua fração do monte, vez que o usufruto em tela é modo de compensação pelo que não teria recebido, a denotar a imprescindibilidade do afastamento da benesse em virtude da ausência de necessidade econômico-patrimonial.

3. Ademais, quando do falecimento do então inventariado ocorrido em 10/11/2000, é incontroverso que o de cujus e a recorrente já estavam separados de corpos, por sentença proferida na Medida Cautelar n° 98.010.909-4, proferida pelo Juízo da 12ª’ Vara da Família e das Sucessões do Foro Central da Comarca de São Paulo, há mais de 2 (dois) anos.

Eis o excerto do acórdão recorrido no ponto:

A agravante foi casada com o finado, com adoção da comunhão parcial de bens, pelo período de 16 anos e, desde dois anos antes do falecimento do marido, o casal estava separado de fato, com ajuizamento da medida cautelar de separação de corpos que tramitou perante a 12′ Vara da Família e Sucessões do Foro Central (fls. 137).

Esse fundamento, em específico, não foi rebatido pela insurgente em suas razões de recurso especial, a atrair o óbice da súmula 283/STF.

Ainda que assim não fosse, certo é que consoante a interpretação teleológica do instituto do usufruto vidual, é viável referir que esse tem por escopo manter o mínimo existencial para o cônjuge sobrevivente ou, ao menos, manter as condições materiais semelhantes àquelas existentes antes do falecimento do consorte, a quem, presume-se, competia a gestão financeira e patrimonial da família.

Afirma-se inviável o deferimento da benesse na hipótese de separação de corpos intentada por ambos os cônjuges e referendada/confirmada por deliberação judicial, em razão do rompimento da sociedade conjugal, por não condizer com o intento do instituto.

4. Do exposto, conheço em parte do recurso especial e, na extensão, nego-lhe provimento.

É como voto. – – /

Dados do processo:

STJ – REsp nº 1.280.102 – São Paulo – 4ª Turma – Rel. Min. Marco Buzzi – DJ 16.10.2020

Fonte: INR Publicações

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Terceira Turma não aceita cumprimento de testamento público que não foi assinado por tabelião

​​Embora a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) admita que, para a preservação da última vontade do autor do testamento, é possível flexibilizar alguns requisitos formais no registro do documento, a assinatura do tabelião ou de seu substituto legal é requisito indispensável de validade. Afinal, o notário é quem possui fé pública para dar autenticidade ao testamento.

O entendimento foi fixado pela Terceira Turma ao manter acórdão do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) que negou pedido de abertura, registro e cumprimento de testamento público apresentado por uma irmã da falecida – documento no qual a titular teria deixado todos os bens para as suas irmãs.

Por sua vez, o viúvo apresentou testamento registrado apenas 19 dias antes do documento indicado pela irmã, no qual somente ele era apontado como beneficiário.

Suspeita de f​​​raude

Pela falta da assinatura do tabelião ou de seu substituto legal, o juiz julgou improcedente o pedido da irmã – decisão mantida pelo TJPB. Para o tribunal, não poderia produzir qualquer efeito jurídico um documento sem a assinatura do responsável pelo cartório e que, além disso, apresentava evidências de falsificação da assinatura da falecida – situações essas que, segundo a corte paraibana, dispensariam a necessidade de perícia grafotécnica.

Por meio de recurso especial, a irmã argumentou, entre outros pontos, que a divergência da assinatura ocorreu porque a falecida tinha um tumor cerebral, o que comprometia sua coordenação motora. Ela também defendeu a possibilidade de flexibilização do rigor formal no exame dos requisitos de validade do testamento, em respeito à vontade do testador.

Segura​​nça jurídica

O ministro Moura Ribeiro explicou que os testamentos são atos solenes, cercados por formalidades essenciais cujo objetivo é resguardar a última vontade do testador – que não estará mais vivo para confirmá-la – e também os direitos dos herdeiros necessários, circunstâncias pelas quais, em regra, devem ser observados os requisitos do artigo 1.864 do Código Civil de 2002.

Entretanto, exatamente para preservar a manifestação de vontade da pessoa que morreu, Moura Ribeiro enfatizou que o rigor das formalidades legais deve ser observado com parcimônia e de acordo com as peculiaridades de cada caso.

Na hipótese dos autos, o ministro ressaltou que o notário é dotado de fé pública, e sua atuação faz parte da própria substância do ato, de forma que sua assinatura – e também a sua presença – é imprescindível para a própria manifestação de última vontade da parte, como forma de evitar nulidades e garantir segurança jurídica.

“Como negócio jurídico, o testamento, para ser válido, requer também a presença dos requisitos do artigo 104 do CC/2002, quais sejam, agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei, sendo que, no caso, o último requisito não se mostrou presente, porque a lei exige expressamente a assinatura do tabelião que presenciou e registrou o negócio jurídico, que, como visto, tem fé pública e confere legitimidade a ele”, afirmou o relator.

Situações estr​​anhas

Em seu voto, o ministro também analisou decisões dos colegiados do STJ que, apesar de flexibilizarem os requisitos para o testamento, referiam-se a situações distintas, a exemplo do REsp 1.633.254, no qual a Terceira Turma confirmou a possibilidade de substituição de assinatura formal pela impressão digital – caso em que, todavia, tratou-se de testamento particular, para o qual é dispensada a presença do tabelião.

Ao manter o acórdão do TJPB, Moura Ribeiro destacou a existência de situações que causam “estranheza” nos autos, como o fato de o segundo testamento ter sido elaborado apenas 19 dias depois de testamento público formal, validado por tabelião, o qual foi apresentado por pessoa casada com a falecida durante 43 anos e dava aos bens destinação totalmente diferente.

“Todas essas peculiaridades trazidas, além da grave ausência de assinatura e identificação do tabelião que teria participado da confecção do testamento público, revelam haver fortes indícios de que o instrumento não traduz com segurança a real vontade da testadora, e, por isso, tal grave vício formal e máculas não podem ser relegadas”, concluiu o ministro.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1703376

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

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