A PANDEMIA VAI PASSAR E O NATAL VAI CHEGAR- POR AMILTON ALVARES

Se Steve Jobs estivesse entre nós, talvez ele dissesse para olhar a pandemia e ligar os pontos.

Steve Jobs fez um discurso notável na Universidade de Stanford, em 2005. Ele disse: “Você tem que encontrar o que ama, não perca a fé. Você deve ligar os pontos dos acontecimentos da sua vida, olhar para trás e aproveitar as lições, precisa aprender com as perdas, perseguir alvos e objetivos com determinação e enfrentar a morte com coragem”. Sabe-se, agora, muito tempo após a sua morte, que Steve Jobs andou fazendo muitas reflexões acerca da finitude da existência humana. Ele deixou um singelo recado para seus admiradores. A suma é: – “Corra atrás de seus sonhos, mas não deixe Deus à margem”.

Milhões foram alcançados pela morte na pandemia. Só no Brasil 150 mil mortos. A morte é implacável e um dia vai alcançar a todos nós.

Ninguém conseguiu escapar; embora ninguém queira morrer. Queremos viver mais e mais, e se fosse possível, viver uma vida sem fim. Mas diante da certeza de que nascemos para morrer, precisamos ligar os pontos do passado ao futuro e desenvolver a nossa esperança. Não há outra maneira de compreender a existência humana. Precisamos olhar para trás. E quando você olhar para trás verá então que alguém já venceu a morte – Jesus de Nazaré. Só Ele pode dar e reaver a própria vida; só Ele aceitou dar a vida por pecadores. Mas não deixe de olhar para a frente. Veja as oportunidades que Deus tem colocado diante você. A pandemia vai passar e as oportunidades se apresentam. Seja generoso, amável, sirva as pessoas, ame o próximo, ande com Deus, seja grato e faça o bem. Você precisa tocar a vida, influenciar a vida de pessoas, mas tem de encontrar aquele que o amou primeiro – Jesus de Nazaré, o Salvador da cruz do Calvário. E precisa conhecer Jesus como seu Salvador. Faça isso agora! Ligue os pontos!

Corra atrás dos seus sonhos. Não largue a mão do Salvador. Creia, a pandemia vai passar. Deus é poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo quanto pedimos ou pensamos, conforme o seu poder que opera em nós (Efésios 4.20). Ligue os pontos. A pandemia vai passar, o Natal vai chegar e as esperanças vão se renovar.

* O autor é Procurador da República aposentado, Oficial do 2º Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de São José dos Campos/SP, colaborador do Portal do Registro de Imóveis (www.PORTALdoRI.com.br) e colunista do Boletim Eletrônico, diário e gratuito, do Portal do RI.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.


1VRP/SP: Registro de Imóveis. Fusão ou unificação. A unificação de imóveis com proprietários de frações ideais diversas não fica, com esta decisão, autorizada em todas as hipóteses, cabendo ao registrador, em cada caso concreto, analisar os elementos da unificação pretendida, com o histórico de transações envolvendo os imóveis unificandos e características do imóvel unificado, com possível remessa a este juízo em caso de elementos que indiquem vício na operação. Sendo requerido eventual desmembramento no futuro, caberá ao Oficial, ao analisar todo o histórico do imóvel, verificar se tal ato não estaria, em última análise, levando a permuta da propriedade por meios diversos, impedindo o registro.

Processo 1011992-34.2020.8.26.0100

Pedido de Providências – Registro de Imóveis – Bref Iii Empreendimentos Imobiliários 4 S/A e outros – Municipalidade de São Paulo – Vistos. Trata-se de pedido de providências formulado pelo Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital tendo por requeridas Bref III Empreendimentos Imobiliários 4 S/A e outros. As requeridas fizeram pretendem a fusão de diversas matrículas de sua propriedade, pedido que foi negado pelo Oficial já que não há homogeneidade de domínio, pois cada imóvel que se pretende unificado é titularizado pelas requeridas em partes ideais diversas. O Oficial aduz que, com a fusão, haveria indevida transmissão de propriedade, sendo necessária escritura pública, além de possíveis reflexos tributários. Juntou documentos às fls. 05/414. As requeridas manifestaram-se às fls. 415/434. Alegam que houve prévia retificação de todas as matrículas para fins de observação da especialidade objetiva, para posterior unificação, e que, anteriormente, 23 dos 24 imóveis eram de propriedade isolada de uma das pessoas jurídicas, tendo havido permuta por escritura pública para que passassem a ser coproprietárias de todos os imóveis, permitindo a fusão. Argumentam que a legislação apenas exige que os imóveis a serem fundidos sejam do mesmo proprietário e contíguos, não havendo previsão quanto a parte ideal de cada proprietário. Cita julgado desta Corregedoria Permanente que teria decidido no sentido de inexistir exigência de igualdade de proporções. O Ministério Público opinou às fls. 609/610 pela manutenção do óbice, reiterando o parecer às fls. 656/657. Veio aos autos parecer jurídico às fls. 616/624. Esclarecimentos pelas requeridas às fls. 632/640. ARISP falou às fls. 642/643, pela manutenção do óbice. O Município manifestou-se às fls. 648/652, alegando inexistir repercussão tributária. É o relatório. Decido. Respeitados os entendimentos diversos constantes dos autos, as peculiaridades do caso permitem afastar o óbice, já que demonstrado que a unificação não configura burla ao sistema notarial e registral, tampouco transmissão indevida de propriedade. De início, cumpre expor as normas de regência relativa a fusão de imóveis. Assim prevê o Art. 234 da Lei de Registros Públicos: Art. 234 – Quando dois ou mais imóveis contíguos pertencentes ao mesmo proprietário, constarem de matrículas autônomas, pode ele requerer a fusão destas em uma só, de novo número, encerrando-se as primitivas. Já os itens 75 e seguintes do Cap. XX das NSCGJ assim dispõe: 75. No caso de fusão de matrículas, deverá ser adotada rigorosa cautela na verificação da área, medidas, características e confrontações do imóvel que dela poderá resultar, a fim de se evitarem, a tal pretexto, retificações sem o devido procedimento legal, ou efeitos só alcançáveis mediante processo de usucapião. 75.1. Além disso, para esse propósito, será recomendável que o requerimento seja instruído com prova de autorização da Prefeitura Municipal, que poderá ser a aprovação de planta da edificação a ser erguida no imóvel resultante da fusão. 75.2. Para a unificação de diversas transcrições e matrículas, não deve ser aceito requerimento formulado por apenas 1 (um) dos vários titulares de partes ideais. 75.3. A fusão e a unificação não devem ser admitidas, quando o requerimento vier acompanhado de simples memorial, cujos dados tornem difícil a verificação da regularidade do ato pretendido. 75.4. Nas unificações e desmembramentos de áreas urbanas, são consideradas regulares as descrições que contenham apenas as medidas lineares e a metragem quadrada, mesmo que não sejam declinados ângulos internos e graus do polígono. 75.5. Tratando-se de unificação de imóveis transcritos, não se fará prévia abertura de matrículas para cada um deles, mas sim a averbação da fusão nas transcrições respectivas. 75.6. Os documentos apresentados para a fusão de matrículas, incluídos o memorial e a planta, que deverão permitir a identificação das áreas originais e sua correspondência com a formada pela unificação, deverão ser arquivados em classificador próprio, ou por meio eletrônico seguro. Portanto, do que se extrai de tal contexto normativo, a unificação tem como requisitos essenciais a existência de mesmo proprietário dos imóveis unificandos e serem estes imóveis contíguos. E ainda que o Art. 234 da LRP utilize o termo “proprietário” no singular, o item 75.2 das Normas de Serviço utiliza-se da expressão “vários titulares de partes ideais”, a indicar permissivo que a unificação se dê quando há mais de um proprietário, em condomínio, em cada um dos imóveis unificandos. A questão posta nos autos, e não resolvida expressamente nas normas citadas, é se tais partes ideais devem ser idênticas em cada um dos imóveis. Veja-se que não há vedação ou autorização, o que exige do intérprete extrair da legislação eventuais impeditivos. E solução é alcançável pela leitura do item 75, que expõe as cautelas a serem tomadas pelo registrador para fins de impedir dois objetivos escusos com a unificação: retificações sem o devido procedimento legal ou efeitos alcançáveis somente pelo processo de usucapião. Além disso, um terceiro impeditivo, retirado dos princípios gerais que regem o sistema notarial e registral, é impedir burla a tal sistema, notadamente evitando que haja, pelo processo de unificação, transmissão de propriedade sem a devida formalização por ato notarial e eventual sonegação de tributos. Em suma, a legislação exige que haja identidade de proprietários e contiguidade dos imóveis unificandos, requisitos preenchidos pelas requerentes, e impede a unificação quando esta recaia em um dos vícios acima apontados. E tais vícios, no contexto destes autos, não estão presentes, o que deve levar à procedência do pedido. Isso porque as requeridas bem demonstraram que todos os seus atos sempre tiveram por objetivo permitir a unificação, inclusive adotando as cautelas prévias necessárias para que seguissem a legislação. Como se vê dos documentos juntados, houve permuta entre cada uma das requeridas para fins de que os imóveis que antes eram titularizados por apenas uma delas passassem a ser de copropriedade, permitindo a unificação. E as permutas foram feitas por escritura pública, com recolhimento de tributos e posterior registro nas matrículas. Tal ato demonstra que não há intenção escusa com a unificação, como transferência indevida de propriedade entre si, já que nada impediria que as permutas anteriormente realizadas tivessem proporções diversas que levassem a identidade de partes ideais. As proporções escolhidas parecem apenas refletir os objetivos empresariais de cada uma das requerentes, que, ao final, promoverá empreendimento imobiliário no imóvel unificado. Mas mais relevante, no ponto, é que as proporções finais no imóvel unificado, conforme fls. 634/638, restarão idênticas a soma das atuais, com identidade de área e do valor prévio titularizado por cada uma das requeridas, a demonstrar não haver, com a unificação em si, transferência indevida de propriedade. Aqui, respeitosamente, deve-se afastar o argumento da ARISP relativa a diversidade de titularidade de segmento específico da superfície, já que, como se sabe, o condomínio em partes ideais não representa propriedade distribuída sobre parte específica do solo, mas sobre o todo. Assim, com a unificação do imóvel, não há que se dizer que haveria alteração da propriedade sobre parcela determinada do solo, já que o imóvel unificado é diverso dos anteriores, com a parte ideal final pertencente a cada requerida passando a incidir sobre toda a área final. Eventual problemática existiria somente com posterior desmembramento, o que será enfrentado mais abaixo nesta decisão. Some-se a isso que a unificação não visa retificação de área por meios diversos, já que as requeridas promoveram anteriormente retificação de cada uma das matrículas que serão fundidas, demonstrando que prezaram pela regularidade registral no que toca a especialidade objetiva, não pretendendo, com a unificação, adquirir área diversa ou transferir propriedade. Finalmente, conforme manifestação do Município, não há repercussão tributária na operação. Em resumo, a unificação pretendida parece não violar os impeditivos previstos na legislação de regência, além de não indicar burla ao sistema notarial, registral e tributário. Duas observações finais devem ser feitas. Primeiramente, a unificação de imóveis com proprietários de frações ideais diversas não fica, com esta decisão, autorizada em todas as hipóteses, cabendo ao registrador, em cada caso concreto, analisar os elementos da unificação pretendida, com o histórico de transações envolvendo os imóveis unificandos e características do imóvel unificado, com possível remessa a este juízo em caso de elementos que indiquem vício na operação. E se cabe ao registrador impedir fraudes na unificação, também tal objetivo deve ser buscado no desmembramento, o que leva a segunda observação. De fato, não seria cabível averbação prévia e abstrata na matrícula advinda da fusão impedindo desmembramento, pois isso caracterizaria indevida restrição ao direito de propriedade. Todavia, em sendo requerido eventual desmembramento no futuro, caberá ao Oficial, ao analisar todo o histórico do imóvel, verificar se tal ato não estaria, em última análise, levando a permuta da propriedade por meios diversos, impedindo o registro. É dizer que, havendo determinada distribuição de partes ideais entre os imóveis atualmente, se eventual unificação e posterior desmembramento levarem a existência de imóveis similares com partes ideais diversas, poderá haver burla ao sistema notarial, registral e tributário, o que deverá ser analisado com rigor pelo Oficial. Todavia, tal possibilidade abstrata não é apta, por si só, a impedir a fusão ora pleiteada, que deverá, por todo o exposto, ser deferida. Do exposto, julgo procedente o presente pedido de providências, afastando o óbice e determinando a unificação dos imóveis, nos termos do requerimento de fls. 13/32. Não há custas, despesas processuais nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C. – ADV: JOAO DE AMBROSIS PINHEIRO MACHADO (OAB 113596/SP), LUIZ HENRIQUE DE ALMEIDA FARIGNOLI (OAB 346016/ SP), NICHOLAS MINORU FERNANDES YOSHINO (OAB 424659/SP), ALEXANDRE LAIZO CLAPIS (OAB 155884/SP) (DJe de 14.10.2020 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.


Civil e processual civil – Ação de divórcio cumulada com partilha de bens – Improcedência – Partilha de bem imóvel situado em loteamento irregular – Autonomia entre o direito de propriedade e o direito possessório – Expressão econômica do direito possessório – Ausência de má-fé dos possuidores quanto à não regularização do imóvel – Possibilidade de partilha do direito possessório – 1. Ação distribuída em 30/07/2015. Recurso especial interposto em 30/05/2017 e atribuído à Relatora em 16/04/2018 – 2. O propósito do presente recurso especial é definir se é admissível, em ação de divórcio, a partilha de bem imóvel situado em loteamento irregular – 3. A imposição de determinadas restrições ao exercício do direito fundamental de acesso à justiça pelo jurisdicionado e ao acolhimento da pretensão de mérito por ele deduzida são admissíveis, desde que os elementos condicionantes sejam razoáveis – 4. Não apenas as propriedades formalmente constituídas compõem o rol de bens adquiridos pelos cônjuges na constância do vínculo conjugal, mas, ao revés, existem bens e direitos com indiscutível expressão econômica que, por vícios de diferentes naturezas, não se encontram legalmente regularizados ou formalmente constituídos sob a titularidade do casal, como, por exemplo, as edificações realizadas em lotes irregulares sobre os quais os cônjuges adquiriram direitos possessórios – 5. Dada a autonomia existente entre o direito de propriedade e o direito possessório, a existência de expressão econômica do direito possessório como objeto de partilha e a existência de parcela significativa de bens que se encontram em situação de irregularidade por motivo distinto da má-fé dos possuidores, é possível a partilha de direitos possessórios sobre bem edificado em loteamento irregular, quando ausente a má-fé, resolvendo, em caráter particular, a questão que decorre da dissolução do vínculo conjugal, e relegando a segundo momento a discussão acerca da regularidade e formalização da propriedade sobre o bem imóvel – 6. Recurso especial conhecido e provido.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.739.042 – SP (2018/0077442-0)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECORRENTE : S DA S

ADVOGADOS : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO

ALBERTO ZORIGIAN GONÇALVES DE SOUZA – DEFENSOR PÚBLICO

RECORRIDO : J C N

ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS – SE000000M

EMENTA

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE DIVÓRCIO CUMULADA COM PARTILHA DE BENS. IMPROCEDÊNCIA. PARTILHA DE BEM IMÓVEL SITUADO EM LOTEAMENTO IRREGULAR. AUTONOMIA ENTRE O DIREITO DE PROPRIEDADE E O DIREITO POSSESSÓRIO. EXPRESSÃO ECONÔMICA DO DIREITO POSSESSÓRIO. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DOS POSSUIDORES QUANTO À NÃO REGULARIZAÇÃO DO IMÓVEL. POSSIBILIDADE DE PARTILHA DO DIREITO POSSESSÓRIO.

1– Ação distribuída em 30/07/2015. Recurso especial interposto em 30/05/2017 e atribuído à Relatora em 16/04/2018.

2– O propósito do presente recurso especial é definir se é admissível, em ação de divórcio, a partilha de bem imóvel situado em loteamento irregular.

3– A imposição de determinadas restrições ao exercício do direito fundamental de acesso à justiça pelo jurisdicionado e ao acolhimento da pretensão de mérito por ele deduzida são admissíveis, desde que os elementos condicionantes sejam razoáveis.

4– Não apenas as propriedades formalmente constituídas compõem o rol de bens adquiridos pelos cônjuges na constância do vínculo conjugal, mas, ao revés, existem bens e direitos com indiscutível expressão econômica que, por vícios de diferentes naturezas, não se encontram legalmente regularizados ou formalmente constituídos sob a titularidade do casal, como, por exemplo, as edificações realizadas em lotes irregulares sobre os quais os cônjuges adquiriram direitos possessórios.

5– Dada a autonomia existente entre o direito de propriedade e o direito possessório, a existência de expressão econômica do direito possessório como objeto de partilha e a existência de parcela significativa de bens que se encontram em situação de irregularidade por motivo distinto da má-fé dos possuidores, é possível a partilha de direitos possessórios sobre bem edificado em loteamento irregular, quando ausente a má-fé, resolvendo, em caráter particular, a questão que decorre da dissolução do vínculo conjugal, e relegando a segundo momento a discussão acerca da regularidade e formalização da propriedade sobre o bem imóvel.

6– Recurso especial conhecido e provido.

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos Prosseguindo no julgamento, após o vista regimental, a Terceir, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília (DF), 08 de setembro de 2020(Data do Julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI

Relatora

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):

Cuida-se de recurso especial interposto por S DA S, fundamentado no art. 105, III, alíneas “a” e “c”, da Constituição Federal.

Recurso especial interposto em: 30/05/2017.

Atribuído à Relatora em: 16/04/2018.

Ação: de divórcio litigioso cumulada com partilha de bens, ajuizada pela recorrente em face de J C N.

Sentença: julgou parcialmente procedentes os pedidos, a fim de decretar o divórcio do casal e partilhar o veículo adquirido na constância da sociedade conjugal, sem, contudo, promover a partilha de imóvel que se encontrava em situação irregular (fls. 41/43, e-STJ).

Acórdão: o TJ/SP negou provimento à apelação interposta pela recorrente, em acórdão que ficou assim ementado (fls. 68/71, e-STJ):

DIVÓRCIO LITIGIOSO. Regime da comunhão parcial de bens. Bens adquiridos na constância da sociedade conjugal, em regra, comunicam-se ao casal, pois se presume o esforço comum na aquisição. Entretanto, o fato de imóvel se encontrar localizado em loteamento irregular, impede a partilha sobre os direitos possessórios. Sobrepartilha que poderá ser requerida após regularização do bem. Sentença mantida. Recurso desprovido.

Embargos de declaração: opostos pela recorrente, foram rejeitados, por unanimidade (fls. 113/118, e-STJ).

Recurso especial: alega-se violação aos arts. 1.210, §2º, e 1.228, §4º, ambos do Código Civil, e art. 620, IV, “g”, do CPC/15, ao fundamento de que os direitos de propriedade e de posse são autônomos e de que há autorização legal para a partilha de direitos e ações, o que permitiria a realização de partilha de imóvel situado em loteamento irregular (fls. 77/98, e-STJ).

Ministério Público Federal: opinou pela desnecessidade de sua intervenção no processo (fls. 163/165, e-STJ).

É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):

O propósito do presente recurso especial é definir se é admissível, em ação de divórcio, a partilha de bem imóvel situado em loteamento irregular.

POSSIBILIDADE DE PARTILHA DE BEM IMÓVEL SITUADO EM LOTEAMENTO IRREGULAR EM AÇÃO DE DIVÓRCIO. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 1.210, §2º, E 1.228, 4º, AMBOS DO CC/2002, E ART. 620, IV, “G”, DO CPC/15.

01) De início, anote-se que os dispositivos legais alegadamente violados possuem o seguinte conteúdo: CC/2002

Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.

(…)

§2º Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa.

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

(…)

§4º O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. CPC/15

Art. 620. Dentro de 20 (vinte) dias contados da data em que prestou o compromisso, o inventariante fará as primeiras declarações, das quais se lavrará termo circunstanciado, assinado pelo juiz, pelo escrivão e pelo inventariante, no qual serão exarados:

(…)

IV – a relação completa e individualizada de todos os bens do espólio, inclusive aqueles que devem ser conferidos à colação, e dos bens alheios que nele forem encontrados, descrevendo-se:

(…)

g) direitos e ações;

02) Examinando a questão controvertida, o acórdão recorrido adotou a seguinte fundamentação:

Consoante a certidão de casamento, as partes se casaram em 29.04.2008 (fl. 07), e, através de contrato particular de compromisso de venda e com pra assinado em 04.05.2009, adquiriram a posse sobre parte de um terreno situado à Rua Cazil Frazon, 271 (fls. 20/ 21).

Entretanto, muito embora o bem se comunique ao casal, há óbice à partilha dos seus direitos possessórios, pois, com o bem pontuou o douto Juízo de primeiro grau:

“(…) considerando que o imóvel encontra-se em situação irregular frente ao Cartório de Registro de Imóveis, que não se sabe, ao certo, se em estado de integral clandestinidade ou de mera irregularidade quanto ao parcelamento do solo urbano.

Com efeito, a despeito do suposto conteúdo econômico sustentado, que parece estar à margem do mundo jurídico, dispõe o artigo 37 da Lei 6.766/79, que “é vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado.” (fl. 41).

Consigne-se, ainda, com o constou no r. decisum: “Portanto, se o loteamento não for registrado, a proibição da venda ou a proibição da mera promessa de venda tem o condão de suspender a eficácia econômica no que toca ao aspecto jurídico de tais bens, pois são proibidos por lei de constarem com o objeto de contratos de transmissão de bens ou de direitos.” (fl. 41).

Entretanto, nada impede que as partes venham a requerer a sobrepartilha após a regularização do imóvel, quando então terá expressão econômica protegida pelo ordenamento jurídico.

03) Em seu recurso especial, sustenta a recorrente que os direitos de posse e de propriedade possuem autonomia, de modo que seria possível a realização da partilha do bem imóvel situado loteamento irregular, utilizando-se, por analogia, da regra prevista para a ação de inventário que admite a partilha de direitos (art. 993, IV, “g”, do CPC/73; art. 620, IV, “g”, do CPC/15).

04) Em primeiro lugar, não se pode olvidar que a averbação das alterações realizadas em bens imóveis, inclusive do loteamento, é um ato de natureza obrigatória, na forma dos arts. 167, II, “4”, e 169, ambos da Lei de Registros Públicos, que assim dispõem:

Art. 167 – No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos.

II – a averbação:

4) da mudança de denominação e de numeração dos prédios, da edificação, da reconstrução, da demolição, do desmembramento e do loteamento de imóveis;

Art. 169 – Todos os atos enumerados no art. 167 são obrigatórios e efetuar-se-ão no Cartório da situação do imóvel…

05) Nos termos do acórdão recorrido, a regularização do bem imóvel pertencente ao casal perante o registro de imóveis seria uma condição sine qua non para que seja examinado e eventualmente acolhido o pedido de partilha decorrente do divórcio, o que corresponde a dizer que o acesso à justiça e o exame da pretensão deduzida pela parte deverão ser precedidos do preenchimento de determinados requisitos.

06) É certo que o direito fundamental de acesso à justiça – art. 5º, XXXV, da CF/88 e art. 3º, caput, do CPC/15, deve ser interpretado sempre em sua acepção mais ampla, abarcando, nas palavras de Kazuo Watanabe, não apenas o direito de socorrer-se do Poder Judiciário, mas também o direito de ter acesso à ordem jurídica justa, conceito substancialmente mais abrangente e que compreende a tutela integral da pretensão, incluídos os direitos ao contraditório e à ampla defesa, à prova, à uma decisão tempestiva e também à atividade satisfativa.

07) Isso não significa dizer que o direito de acesso à justiça seja absoluto, admitindo-se, com naturalidade, que se imponham condições ao adequado exercício deste direito fundamental. Confira-se:

A compreensão de que nenhuma lei excluirá ameaça ou lesão a direito da apreciação do Poder Judiciário deve ser entendida no sentido de que qualquer forma de “pretensão”, isto é, “afirmação de direito” pode ser levada ao Poder Judiciário para solução. Uma vez provocado, o Estado-juiz tem o dever de fornecer àquele que bateu às suas portas uma resposta, mesmo que negativa, no sentido de que não há direito nenhum a ser tutelado ou, bem menos do que isso, uma resposta que diga ao interessado que não há condições mínimas de saber se existe, ou não, direito a ser tutelado, isto é, que não há condições mínimas de exercício da própria função jurisdicional, o que poderá ocorrer por diversas razões, inclusive por faltar o mínimo indispensável para o que a própria CF exige como devido processo legal. (BUENO, Cássio Scarpinella. Manual de direito processual civil: inteiramente estruturado à luz do novo CPC – Lei nº 13.105, de 16-3-2015. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 40).

(…)

A princípio não se tem como violadoras ao acesso à justiça as disposições que estatuem requisitos ou condicionantes à realização da tutela, tais como pressupostos processuais e condições da ação, pois mesmo quando não examinado o mérito terá existo prestação da tutela jurisdicional, posto que negativa. Numa frase, o acesso à justiça não pode ser obstaculizado, mas aceita condicionantes razoáveis. (GAJARDONI, Fernando da Fonseca; DELLORE, Luiz; ROQUE, André Vasconcelos; OLIVEIRA JR., Zulmar. Teoria geral do processo: comentários ao CPC de 2015. São Paulo: Forense, 2015. p. 15).

08) Diante desse cenário, o que se deve examinar é se a regularização do bem imóvel pertencente ao casal perante o registro de imóveis seria, nas palavras da doutrina, uma condicionante razoável ao direito à obtenção de tutela de mérito referente à partilha do imóvel em decorrência do divórcio.

09) Nesse sentido, é bem verdade que esta Corte, em situação análoga, entendeu que “a regra contida na Lei de Registros Públicos que determina a obrigatoriedade de averbar as edificações efetivadas em bens imóveis autoriza a suspensão da ação de inventário até que haja a regularização dos referidos bens no respectivo registro, inclusive porque se trata de medida indispensável a adequada formação do conteúdo do monte partível e posterior destinação do quinhão hereditário”. (REsp 1.637.359/RS, 3ª Turma, DJe 11/05/2018).

10) Todavia, após renovadas e necessárias reflexões acerca do tema, é preciso, respeitosamente, examinar a questão controvertida sob outros e diferentes enfoques.

11) Não se pode olvidar que a partilha de bens, seja causa mortis, seja em razão da dissolução de vínculo conjugal, está normalmente associada à ideia de partilha das propriedades formalmente amealhadas em vida pelo de cujus ou pelo casal na constância do vínculo conjugal, justamente porque a partilha é, em regra, um instituto vocacionado a dirimir, com ares de definitividade, a titularidade dos bens após a existência de um determinado evento – a morte ou o rompimento do matrimônio ou da convivência.

12) Ocorre que não apenas as propriedades formalmente constituídas compõem o rol de bens adquiridos pelos cônjuges na constância do vínculo conjugal. Ao revés, também é preciso observar que existem bens e direitos com indiscutível expressão econômica que, por vícios de diferentes naturezas, não se encontram legalmente regularizados ou formalmente constituídos sob a titularidade do casal divorciando, como, por exemplo, as edificações realizadas em lotes irregulares sobre os quais os cônjuges adquiriram direitos possessórios.

13) Nesse contexto, é notório que, em algumas hipóteses, a ausência de regularização do imóvel que se pretende partilhar decorre de desídia, de má-fé ou de artifício engendrado pelas partes com diferentes finalidades (sonegação de tributos, ocultação de bens, etc.).

14) A despeito disso, não se pode olvidar que há uma parcela significativa de bens que se encontram em situação de irregularidade por causas distintas, como, por exemplo, a incapacidade do Poder Público de promover a formalização da propriedade em determinados parcelamentos, loteamentos ou edificações ou, até mesmo, a hipossuficiência econômica ou jurídica das partes para dar continuidade aos trâmites necessários para que se atinja esse resultado. Em tais situações, os titulares dos direitos possessórios devem receber a tutela jurisdicional.

15) Anote-se, quanto ao ponto, que esta Corte consignou que, em se tratando “de imóvel situado em condomínio irregular, a penhora não recairá sobre a propriedade do imóvel, mas sobre os direitos possessórios que o devedor tenha”, reconhecendo a expressão econômica desses direitos e a sua integração ao patrimônio do devedor (REsp 901.906/DF, 4ª Turma, DJe 11/02/2010).

16) De outro lado, também é importante destacar que esta Corte possui o entendimento de que “o expropriado que detém apenas a posse do imóvel tem direito a receber a correspondente indenização”. (REsp 1.118.854/SP, 2ª Turma, DJe 28/10/2009.

17) Reconhece-se, pois, a autonomia existente entre o direito de propriedade e o direito de posse, bem como a expressão econômica do direito possessório como objeto de possível partilha entre os cônjuges no momento da dissolução do vínculo conjugal sem que haja reflexo direto às discussões relacionadas à propriedade formal do bem.

18) Diante desse cenário, a melhor solução acerca da questão controvertida está em admitir a possibilidade de partilha de direitos possessórios sobre bem edificado em loteamento irregular, quando ausente a má-fé dos possuidores (como na hipótese em exame), resolvendo, em caráter particular e imediatamente, a questão que diz respeito somente à dissolução do vínculo conjugal, relegando a um segundo e oportuno momento as eventuais discussões acerca da regularidade e da formalização da propriedade sobre o bem imóvel.

CONCLUSÃO

19) Forte nessas razões, CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao recurso especial, para julgar procedente o pedido de partilha dos direitos possessórios sobre o bem imóvel indicado na petição inicial, deixando de majorar os honorários por se tratar de sentença proferida na vigência do CPC/73 (EAREsp 1.255.986/PR, Corte Especial, DJe 06/05/2019). – – /

Dados do processo:

STJ – REsp nº 1.739.042 – São Paulo – 3ª Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – DJ 16.09.2020

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.