1VRP/SP: Registro de Imóveis. Carta de sentença. Princípio da prioridade. Necessidade de registro dos títulos anteriores.


  
 

Processo 1024310-49.2020.8.26.0100

Dúvida – Notas – Wladimir Barrozo e outro – Vistos. Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 15º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Wladimir Barrozo e sua mulher Rosalinda Vizeu Barrozo, diante da negativa em se proceder ao registro da carta de sentença expedida pelo MMº Juízo da 12ª Vara Cível da Capital, extraída dos autos da ação de adjudicação compulsória (processo nº 1025134-81.2015.8.26.0100), pelo qual o suscitado e sua mulher adquiriram, de Elisa Del Rosário Igarte Verduguez, o imóvel matriculado sob nº 210.047. O óbice registrário refere-se: a) a violação do princípio da continuidade registrária, tendo em vista a ausência de um encadeamento subjetivo de titulares que possa demonstrar de forma segura as relações jurídicas entre as partes. Assim, torna-se necessário os registros dos títulos anteriores, completando a cadeia sucessória das cessões, sendo que no pólo passivo da ação figurou somente Elisa Del Rosário Igarte Verduguez, que não é titular de domínio e nem detentora de direitos reais, vez que, de acordo com a menciona matricula a titularidade dominial encontra-se em nome de Amedeo Frugoli S/A Comércio e Comissária e Irmãos Frugoli e compromissado em favor de Alexandre Valko e sua mulher Elizabeth Valko Neumann e Stephen Feher e sua mulher Sacha ou Sascha Feher; b) necessidade de apresentação das guias de ITBI, decorrentes da adjudicação e cessão de direitos de compromisso de compra e venda. Juntou documentos às fls.06/81. Os suscitados não apresentaram impugnação, conforme certidão de fl.82. O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls.86/88). É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Preliminarmente, cumpre destacar que os títulos judiciais não estão isentos de qualificação, positiva ou negativa, para ingresso no fólio real, cabendo ao Oficial qualifica-los conforme os princípios que regem a atividade registral. Entre eles o princípio da continuidade, explicado por Afrânio de Carvalho, da seguinte forma: “O princípio da continuidade, que se apóia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia, de titularidade à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente” (Registro de Imóveis, Editora Forense, 4ª Ed., p. 254). Ou seja, o título que se pretende registrar deve estar em conformidade com o inscrito na matrícula, formando um perfeito encadeamento entre as informações inscritas e as que se pretende inscrever. Oportuno destacar, ainda, a lição de Narciso Orlandi Neto, para quem: “No sistema que adota o princípio da continuidade, os registros têm de observar um encadeamento subjetivo. Os atos praticados têm de ter, numa das partes, a pessoa cujo nome já consta do registro. A pessoa que transmite um direito tem de constar do registro como titular desse direito, valendo para o registro o que vale para validade dos negócios” (Retificação do Registro de Imóveis, Editora Oliveira Mendes, p. 56). Necessário, por conseguinte, que o titular de domínio seja o mesmo no título apresentado a registro e no registro de imóveis, sob pena de violação ao princípio da continuidade, previsto no art. 195, da Lei nº 6.015/73: “Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a previa matrícula e o registro do titulo anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro”. Tal questão já foi objeto de análise pela Egrégia Corregedoria Geral da Justiça: “Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Carta de sentença expedida em ação de adjudicação compulsória – Titular de domínio que não figurou no pólo passivo – Registro inadmissível – Princípio da continuidade- Embargos de declaração – Inexistência de contradição, obscuridade ou omissão – Finalidade infringente – Rejeição” (ED nº 994.09.231.632-5/500, Comarca: Taubaté, Rel: Corr. Geral: Munhoz Soares, dje. 22.11.2010). “Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente, impedindo-se o registro de carta de adjudicação- parte das exigências cumpridas no curso do procedimento – Ausência de inclusão de Espólio no polo passivo de ação de adjudicação compulsória – Quebrado do princípio da continuidade- Sentença de ação de adjudicação compulsória que não está imune ao exame dos requisitos para seu registro – Dúvida prejudicada – Recurso não conhecido”. (Apelação nº 3007590- 50.2013.8.26.0477, Comarca: Praia Grande, Rel: Corr. Geral: Manoel de Queiroz Pereira Calças). Destaco a parte final do Acórdão: “… Ricardo Arcoverde Credie, em obra específica sobre o tema, observa: Uma primeira questão nos ocorre: os atos administrativos decorrentes das sentenças constitutivas, da assim dita execução imprópria destas sentenças (representados por certidões, mandados ou cartas de sentença), obrigam o oficial do registro de imóveis a proceder ao ato registral? Evidente que não. A sentença, de per si, não transfere o domínio, como os atos de expropriação de mesmo nome ocorrentes em outros procedimentos também não o transferem, posto que sempre dependentes do registro. Somente o efeito translativo do registro imobiliário, como frisamos linhas atrás, é que efetivamente transfere a propriedade. Se o vendedor promete outorgar a escritura, na hipótese de descumprimento o Estado o faz emitir a declaração de vontade com o mesmo efeito do ato não praticado… É correto que, nessa ordem de ideias expedida carta de sentença, mandado ou simples ato decisório e respectivo trânsito em julgado, não está o serventuário do Registro de imóveis obrigado a transcrever tal título. Se ocorrer qualquer circunstância impediente, poderá ele solicitar que o interessado a supra, ou poderá ainda, fazer instaurar processo de dúvida, sendo o caso” (Adjudicação Compulsória, 9ª edição, Malheiros, 2004, p.90). Decorre também do princípio da continuidade o princípio da disponibilidade, que prevê que somente aquele que detém determinado direito pode transmiti-lo. No presente caso, a carta de adjudicação representa a transmissão imobiliária entre Elisa Del Rosário Igarte Verduguez e os suscitados. Todavia, uma vez que Elisa não é proprietária do bem, não pode transferi-lo, mesmo havendo determinação judicial transitada em julgado. Destaco que, na qualificação registral da carta de adjudicação, deve o Registrador verificar se ela preenche os requisitos exigidos para o registro da escritura pública que visa substituir. Logo, mostra-se correta a exigência do Oficial, em consonância com o princípio da continuidade e segurança jurídica que dos atos registrários se esperam. Elisa Del Rosário Igarte Verduguez não é titular de domínio, e não há como transferir aquilo que não lhe pertence, sendo necessário que inclua os proprietários tabulares no polo passivo da ação para que constem na carta de adjudicação como transmitentes do bem, além de necessário que haja o registro dos títulos anteriores, completando a cadeia sucessória das cessões. Logo, mister a manutenção do primeiro óbice. A segunda exigência também procede . É dever do Oficial de Registro de Imóveis a fiscalização do pagamento dos impostos devidos em razão dos títulos apresentados para registro em sentido amplo, sob pena de responsabilidade solidária de forma subsidiária, salvo hipótese de isenção devidamente demonstrada, o que não é o caso. Neste contexto, de acordo com o art. 289 da Lei de Registros Públicos e art.134, VI do CTN são claros ao dispor: “Art. 289: No exercício de suas funções, cumpre aos oficiais de registro fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício”. Art. 134: Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis: (…) VI – os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício; E ainda o art.2º, VI da Lei Municipal nº 11.154, de 30/12/1991, que estabelece as hipóteses de recolhimento ITBI, dispõe: “Art. 2º: Estão compreendidos na incidência do imposto: (…) VI a arrematação, a adjudicação e a remição”. Neste aspecto conforme estabelecido nos artigos 1º, II, e 2º, VIII do Decreto Municipal nº 51.627: “Art. 1º O Imposto sobre Transmissão “Inter Vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos à sua aquisição – ITBI-IV tem como fato gerador: … II – a cessão, por ato oneroso, de direitos relativos à aquisição de bens imóveis”. “Art. 2º: Estão compreendidos na incidência do Imposto: … VII – a cessão de direitos do arrematante ou adjudicatário, depois de assinado o auto de arrematação ou adjudicação” Logo, cabe o recolhimento do imposto, vez que o registro da adjudicação, implicará na transferência da propriedade, constituindo fato gerador do imposto em questão. Diante do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 15º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Wladimir Barrozo e sua mulher Rosalinda Vizeu Barrozo, e consequentemente mantenho os óbice registrários. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: SILVIO POGGI NUNES (OAB 291825/SP) (DJe de 22.07.2020 – SP)

Fonte: DJE/SP

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