Tributário – Mandado de Segurança – SINOREG/SP – Notários e Registradores – Postergação do pagamento de obrigações tributárias federais – Portaria MF nº 12/2012 e artigo 151, inciso I, do CTN – Crise econômica inédita – Moratória ou postergação que não pode ser deferida pelo Poder Judiciário – Medida que cabe ao Poder Executivo – Segurança denegada. (Nota da Redação INR: ementa não oficial)


  
 

MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO (119) Nº 5005129-11.2020.4.03.6100 / 7ª Vara Cível Federal de São Paulo

IMPETRANTE: SINDICATO DOS NOTARIOS E REGISTRADORES DO ESTADO DE SP

Advogados do(a) IMPETRANTE: SAULO VINICIUS DE ALCANTARA – SP215228-A, CELSO CORDEIRO DE ALMEIDA E SILVA – SP161995, DANIEL BRUNO LINHARES – SP328133

IMPETRADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SAO PAULO-SP, UNIAO FEDERAL – FAZENDA NACIONAL

SENTENÇA TIPO B

S E N T E N Ç A

Trata-se de mandado de segurança coletivo, com pedido de liminar, objetivando o aproveitamento dos benefícios previstos na Portaria MF 12, de 20 de janeiro de 2012, e artigo 151, inciso I, do Código Tributário Nacional, postergando em seus exatos termos o pagamento de obrigações tributárias relativas a tributos federais (bem como eventuais parcelamentos existentes) de qualquer espécie e natureza, inclusive previdenciárias e securitárias, impedindo a cobrança de juros, multas punitivas, multas moratórias ou qualquer outra penalidade ou acréscimo ao valor do tributo, garantido a emissão de Certidões Negativas de Débito ou Certidões Positivas com Efeitos de Negativa, conforme o caso, além de outras certidões de regularidade fiscal, se não houverem outros débitos pendentes, vedando a inscrição em Dívida Ativa e qualquer outro ato de cobrança relativo ao crédito tributário decorrente da postergação pleiteada.

Alega ser pública e notória a derrocada da atividade econômica no país por força da pandemia do coronavírus, impossibilitando os associados do Impetrante, muitos deles responsáveis por serventias extrajudiciais deficitárias, de honrarem com suas obrigações tributárias que vencem imediatamente, em plena crise econômica sem precedentes na história atual da humanidade, estando sujeitos ao pagamento das sanções pela impontualidade, inclusive multa moratória de até 20% (vinte por cento) e multa punitiva de 75% (setenta e cinco) ou 150% (cento e cinquenta) por cento e, conforme já ressaltado, processos disciplinares.

Aduz que a União Federal, em 2012, publicou uma Portaria MF nº 12/2012 (“Portaria”), que dispõe sobre a prorrogação das datas de vencimentos de tributos federais para o caso de estado de calamidade pública decretada, e que a norma não fez distinções no tempo ou no espaço em ralação a calamidades públicas e nem se excepcionou a determinado acontecimento calamitoso, não devendo o hermeneuta criar em sua mente distinções que não figuram na lei ou que eventualmente ocuparam o imaginário do legislador.

Juntou procuração e documentos.

Na decisão ID 30430071 o pedido de liminar foi indeferido. Em face desta decisão houve interposição de agravo de instrumento pela Impetrante (comprovado no ID 30767767).

A União Federal requereu seu ingresso no polo passivo do feito, nos termos do art. 7º, II, da Lei 12.016/09 (ID 30730283), o que foi deferido no despacho ID 32237247, arguindo também, a inadequação da via eleita em virtude da necessidade de dilação probatória.

Devidamente notificado, o DERAT prestou informações no ID 31104226, alegando em preliminares, sua ilegitimidade passiva para administrar tributos de pessoas físicas / jurídicas domiciliadas fora do Município de São Paulo e a ausência de comprovação de direito líquido e certo do impetrante, pugnando pela denegação da ordem.

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo regular prosseguimento do feito no ID 32452507.

Vieram os autos à conclusão.

É o relatório do essencial.

Fundamento e decido.

Afasto a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo DERAT em informações, pois independentemente da estrutura organizacional da Receita Federal do Brasil, o DERAT manifestou-se quanto ao mérito da impetração, defendendo a legalidade do ato. Conforme entendimento pacificado do C. Superior Tribunal de Justiça, “aplica-se a Teoria da Encampação quando a autoridade apontada como coatora não se limita a arguir a ilegitimidade passiva, e promove a defesa do ato impugnado em suas informações.” (ROMS 29378. Relator FELIX FISCHER Sigla do órgão STJ Órgão julgador Quinta Turma. Fonte DJE Data: 28/09/2009).

Afasto a preliminar de inadequação da via eleita, por necessidade de dilação probatória, já que a matéria tratada nos autos demanda tão só a análise de questões de direito.

No que tange a preliminar de ausência de direito líquido e certo, considerando que se confunde com o mérito do presente mandamus, com o mesmo será analisada.

Passo ao exame do mérito.

Considerando a publicação da Portaria n° 139, do Ministério da Economia, bem como da Instrução Normativa 1932, da Secretaria da Receita Federal, ambas do dia 03 de abril de 2020, fica prejudicada parte do pedido aqui formulado, posto que houve prorrogação do recolhimento das contribuições previdenciárias que de trata o artigo 22 da Lei n° 8.212/91, do PIS e da COFINS relativos às competências março e abril de 2020, bem como a entrega das DCTF’s dos meses de abril, maio e junho de 2020.

No que tange aos demais, observa-se que pretende o impetrante, por via jurisdicional obter benefício inexistente na legislação, sob a alegação de situação de calamidade pública, criando benefício fiscal pelo Poder Judiciário, em afronta aos princípios da isonomia e da separação de poderes.

Reveste-se o pleito, na realidade, das características de um pedido de moratória, voltado ao Poder Judiciário, em indevida invasão de competência do Poder Legislativo, já que a moratória depende de lei (art. 97, c.c. o art. 151, I, ambos do CTN).

A moratória individual – já autorizada pela lei – também depende de ato do poder público; não cabendo ao Judiciário tomar o lugar do Executivo e dispensar temporariamente o pagamento de tributos.

Ademais, é jurisprudência assentada no STF que concessão ou extensão de benefício fiscal não é da alçada do Judiciário: ARE 1181341 AgR-terceiro, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 21/02/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-053 DIVULG 11-03-2020 PUBLIC 12-03-2020 – ARE 928139 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 17/08/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-185 DIVULG 04-09-2018 PUBLIC 05-09-2018 – RE 1052420 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 17/11/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-279 DIVULG 04-12-2017 PUBLIC 05-12-2017.

Por outro lado, no que tange a aplicação da Portaria MF 12 de 2012, forçoso ressaltar que a mesma, editada em situação muito distante daquela hoje atravessada mundialmente, não dispõe de mecanismos de aplicação geral, irrestrita e imediata, uma vez que limita de maneira clara o âmbito do seu raio de atuação, exigindo a identificação dos municípios abrangidos pelo Decreto de reconhecimento de calamidade pública, o que não se observa no Decreto nº 64.879 de 20 de março de 2020, do Governador do Estado de São Paulo, bem como o início e o fim de sua aplicação.

Importante salientar, ainda, que situação análoga à tratada nestes autos, foi analisada pelo Ministro Presidente do C. Supremo Tribunal Federal, nos autos da Suspensão de Segurança n. 5363 – DF, onde foi deferido pedido formulado pelo Estado de São Paulo para suspender os efeitos de decisão proferida pelo e. TJ do Estado de São Paulo, que concedeu liminar nos autos do Agravo de Instrumento nº 2062467-83.2020.8.26.0000, a saber:

“(….) Narra o requerente que referida decisão, proferida sob o alegado fundamento de “resguardar o particular de consequências nefastas ao direito de exercer livremente atividade econômica, garantido pelo art. 170, parágrafo único da Constituição Federal de 1988, que poderá ser gravemente afetado acaso advenham medidas punitivas pela eventual descumprimento das obrigações tributárias decorrentes do não pagamento de tributos ao Estado de São Paulo”, em verdade permite, em detrimento da receita pública, que o interessado deixe de responder pelo ônus da mora em que porventura incida, podendo obter certidões sem o efeito de positiva, não podendo eventuais débitos nem mesmo serem inscritos na dívida ativa, constituindo um verdadeiro estímulo à inadimplência. Restou afastada a incidência de regras legais aplicáveis em hipóteses de atraso no pagamento de tributos, sob a alegação de que o requerente teria dado causa à paralisação das atividades do contribuinte, em vista da edição do Decreto nº 64.881, de 22/3/20. Contudo, o certo é que as restrições constantes desse Decreto não se aplicam ao contribuinte, cuja área de atuação não foi atingida, sendo certo, ainda que referido normativo foi editado com vistas ao combate da pandemia de COVID-19 e em estrita consonância com as normas federais pertinentes, bem como às recomendações da OMS e do Ministério da Saúde. (…)

É o relatório. Decido: Inicialmente, cadastre-a empresa Intercement Brasil S/A, como interessada neste processo, bem como os ilustres patronos que a representam. Afaste-se, desde logo, o segredo de justiça sobre o trâmite desta contracautela, porque inexiste interesse público ou social a exigi-lo, e tampouco vieram a estes autos documentos ou dados protegidos pelo direito constitucional à intimidade. Consigne-se, em prosseguimento, a competência do Supremo Tribunal Federal para julgamento da presente suspensão, visto que a controvérsia instaurada na ação originária é de índole constitucional, conforme se conclui pela menção a diversas normas da Constituição Federal então elencadas (arts. 2º e 170, caput e parágrafo único). O pedido de suspensão de liminar não objetiva a reforma ou anulação da decisão impugnada, não sendo, portanto, instrumento idôneo para reapreciação judicial. O requerente deve pretender tão somente suspender a eficácia da decisão contrária ao Poder Público, comprovando, de plano, que o cumprimento imediato da decisão importará grave lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas. Sob essas considerações, reputo presentes os requisitos de admissibilidade do presente incidente de suspensão de liminar, passando, então, ao exame da pretensão deduzida pelo requerente. A cautelar ora atacada, reformando anterior decisão proferida pelo Juízo de Primeiro Grau, concedeu a liminar postulada pelo autor do mandado de segurança, para impedir o estado de aplicar-lhe sanções tributárias de cunho pecuniário e administrativo, assegurando-lhe, ainda, a possibilidade de incluir débitos em programas de parcelamento de débito fiscal, sem inclusão de juros e multa e suspendeu a exigibilidade de eventuais valores passíveis de exigência, em decorrência de sanções fiscais pecuniárias. Constata-se, assim, sem maiores dificuldades que, de uma penada, foi completamente subvertida a ordem administrativa, no tocante ao regime fiscal vigente no estado de São Paulo, em relação à empresa impetrante, medida essa que pode ser potencialmente estendida a milhares de outras empresas existentes naquele estado. Pese embora as razões elencadas pelo ilustre prolator dessa decisão, ao fundamentá-la, tem-se que sua execução poderá acarretar grave lesão à ordem público-administrativa e econômica no âmbito do estado de São Paulo. Não se ignora que a situação de pandemia, ora vivenciada, impôs drásticas alterações na rotina de todos, atingindo a normalidade do funcionamento de muitas empresas e do próprio estado, em suas diversas áreas de atuação. Mas, exatamente em função da gravidade da situação, exige-se a tomada de medidas coordenadas e voltadas ao bem comum, não se podendo privilegiar determinado segmento da atividade econômica em detrimento de outro, ou mesmo do próprio Estado, a quem incumbe, precipuamente, combater os nefastos efeitos decorrentes dessa pandemia. Assim, não cabe ao Poder Judiciário decidir quem deve ou não pagar impostos, ou mesmo quais políticas públicas devem ser adotadas, substituindo-se aos gestores responsáveis pela condução dos destinos do Estado, neste momento. Apenas eventuais ilegalidades ou violações à ordem constitucional vigente devem merecer sanção judicial, para a necessária correção de rumos, mas jamais – repita-se – promover-se a mudança das políticas adotadas, por ordem de quem não foi eleito para tanto e não integra o Poder Executivo, responsável pelo planejamento e execução dessas medidas. Não se mostra admissível que uma decisão judicial, por melhor que seja a intenção de seu prolator ao editá-la, venha a substituir o critério de conveniência e oportunidade que rege a edição dos atos da Administração Pública, notadamente em tempos de calamidade como o presente, porque ao Poder Judiciário não é dado dispor sobre os fundamentos técnicos que levam à tomada de uma decisão administrativa. Ademais, a subversão, como aqui se deu, da ordem administrativa vigente no estado de São Paulo, em matéria tributária, não pode ser feita de forma isolada, sem análise de suas consequências para o orçamento estatal, que está sendo chamado a fazer frente a despesas imprevistas e que certamente têm demandado esforço criativo, para a manutenção das despesas correntes básicas do estado. E nem mesmo a liminar obtida pelo requerente, em ação ajuizada originariamente perante esta Suprema Corte, pode servir de fundamento a justificar a medida cautelar ora em análise, na medida em que foi proferida com o escopo de permitir um melhor direcionamento dos recursos públicos ao combate aos efeitos da pandemia, sendo certo que as consequências advindas da decisão cuja suspensão aqui se postula, apontam exatamente em sentido contrário. Além disso, a concessão dessa série de benesses de ordem fiscal a uma empresa denota quadro passível de repetir-se em inúmeros processos, pois todos os demais contribuintes daquele tributo poderão vir a querer desfrutar de benesses semelhantes. Aliás, o quadro constante do e-doc. nº 3, demonstra que várias são as ações já ajuizadas, no estado de São Paulo, com esse fito, tendo sido rejeitada a quase totalidade das pretensões assim deduzidas. Destaque-se, ainda, que algumas daquelas liminares ali elencadas foram suspensas por decisão proferida pelo eminente Presidente do Tribunal de Justiça paulista, no dia 8/4/20, nos autos da Suspensão de Liminar nº 2066138-17.8.26.0000, conforme notícia veiculada no site daquela Corte regional. Inegável, destarte, concluir-se que a decisão objeto do presente pedido apresenta grave risco de efeito multiplicador, o qual, por si só, constitui fundamento suficiente a revelar a grave repercussão sobre a ordem e a economia públicas e justificar o deferimento da suspensão pleiteada. Nesse sentido e apreciando hipóteses semelhantes, citem-se os seguintes precedentes: TRIBUTO. Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS. Redução da alíquota incidente sobre serviços de telecomunicação e energia elétrica. Grave lesão à economia pública demonstrada. Ocorrência do chamado “efeito multiplicador”. Pedidos idênticos já deferidos. Suspensão de segurança concedida. Agravos regimentais improvidos. Defere-se pedido de suspensão quando demonstrados o potencial efeito multiplicador e a grave lesão aos interesses públicos tutelados pelo regime de contracautela (SS nº 4.178-AgR/RJ, Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, DJe de 17/11/11). AGRAVO REGIMENTAL NA EXTENSÃO NA SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. IMPOSTO SOBRE A CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA E SERVIÇOS. ICMS. REDUÇÃO DA ALÍQUOTA INCIDENTE SOBRE SERVIÇOS DE TELECOMINICAÇÃO E ENERGIA ELÉTRICA. DEMONSTRAÇÃO DE GRAVE LESÃO À ECONOMIA PÚBLICA. OCORRÊNCIA DE EFEITO MULTIPLICADOR. AUSÊNCIA DE ARGUMENTOS OU FATOS NOVOS CAPAZES DE INFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO (SS nº 3.977/RJ-Extn-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe de 18/4/2018). Ante o exposto, defiro o pedido para suspender os efeitos da decisão que concedeu liminar nos autos do Agravo de Instrumento nº 2062467-83.2020.8.26.0000, até o trânsito em julgado do mandado de segurança a que se refere. Comunique-se com urgência. Publique-se. Brasília, 15 de abril de 2020. Ministro Dias Toffoli Presidente.”. (g.n.).

Sendo assim, por qualquer ângulo que se analise a questão, mostra-se inviável o deferimento das medidas postuladas pelo impetrante.

Diante do exposto, a segurança pretendida, com fulcro no DENEGO artigo 487, I, do Código de Processo Civil.

Custas pelo impetrante.

Sem condenação em honorários advocatícios, nos termos do artigo 25 da Lei n° 12.016/09.

Comunique-se ao E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, via e-mail, a sentença proferida, tendo em vista o agravo noticiado, nos termos do artigo 239, do provimento CORE nº 01/2020.

P.R.I.O.

São Paulo, 28 de maio de 2020.

Assinado – – /

Dados do processo:

TRF 3ª Região – Mandado de Segurança Coletivo nº 5005129-11.2020.4.03.6100 – 7ª Vara Cível Federal de São Paulo – DJ 28.05.2020

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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