1VRP/SP: Registro de Imóveis. Doação de dinheiro, com as cláusulas de incomunicabilidade e impenhorabilidade e venda e compra de imóvel urbano. Óbice registrário mantido. Existência de indisponibilidade em nome do doador do numerário.


  
 

Processo 1095017-76.2019.8.26.0100

Dúvida – Notas – 4º Oficial de Registro de Imóveis da Capital – Marcos Gondim Gananian – Vistos. Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Marcos Gondim Gananian, diante da negativa em proceder ao registro da escritura pública de doação de dinheiro, com as cláusulas de incomunicabilidade e impenhorabilidade e venda e compra de imóvel urbano, pela qual Guarará Empreendimentos Imobiliários SPE LTDA transmite por venda o imóvel objeto da matrícula nº 196.874 a Marcos Gondim Gananian, pelo valor de R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais), recebido por doação de Gabriel Gananian, na qualidade de genitor do requerente, razão pela qual ficou convencionada a imposição das cláusulas de incomunicabilidade e de impenhorabilidade sobre o imóvel, extensiva aos frutos e rendimentos. O óbice registrário refere-se a existência de indisponibilidade em nome do doador do numerário, Gabriel Gananian, conforme determinação do processo nº 0022227812016036182, da 6ª Vara das Execuções Fiscais Federais – TRF 3ª Região. Juntou documentos às fls.06/40 e 55. O suscitado não apresentou impugnação, conforme certidão de fl.47, todavia, manifestou-se perante a Serventia Extrajudicial (fls.07/13). Argumenta que a indisponibilidade foi decretada não em relação ao adquirente ou ao titular dos direitos reais do imóvel, na forma da lei, mas daquele que doou montante em dinheiro para custear a aquisição do bem. Entende que a aplicação da restrição decorrente da decretação de indisponibilidade ultrapassa os limites da razoabilidade e da própria norma reguladora, bem como o título apresentado atende integralmente a todos os requisitos legais. O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls.59/60). Às fls.69/166 foi juntada cópia da decisão proferida pelo MMº Juízo da 6ª Vara das Execuções Fiscais, que deferiu a indisponibilidade dos bens de Gabriel Gananian. É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Com razão o Registrador, bem como o D. Promotor de Justiça. De acordo com o documento que se pretende registrar, as partes entabularam dois negócios jurídicos, quais sejam, a doação do numerário correspondente a R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais) por Gabriel Gananian a seu filho Marcos Gondim Gananian e a compra e venda do imóvel matriculado sob nº 196.874 do 4º RI, com imposição das cláusulas de incomunicabilidade e impenhorabilidade (fls.24/34). O Conselho Superior da Magistratura tem admitido a cindibilidade do título, permitindo que dele seja extraídos elementos que poderão ingressar de imediato no fólio real, desconsiderando outros que demandem providencias diversas. Ocorre que na presente hipótese tal desmembramento do título não é possível, vez que a compra e venda do imóvel dependeu exclusivamente da doação do numerário, sendo certo que um dos elementos do contrato de compra e venda é o preço e o pagamento efetuado entre as partes. Logo, não há como haver a cisão. Em consulta realizada junto à Central de Indisponibilidade, a ordem de indisponibilidade adveio da ação cautelar fiscal em tramite perante o MMº Juízo da 6ª Vara das Execuções Fiscais, oriunda de dívida tributária no montante de quase R$ 300.000.000,00. Logo, a doação de valor de Gabriel, que teve a indisponibilidade decretada, ao seu filho Marcos, com a finalidade de comprar um imóvel no valor de R$ 4.0000.0000,00 pode caracterizar fraude contra credores, vez que o objeto principal da indisponibilidade de bens é resguardar o patrimônio do devedor, evitando sua dilapidação. O Superior Tribunal de Justiça entende que, para a Fazenda Pública obter a decretação de indisponibilidade de bens em execuções fiscais, terá de provar o esgotamento de diligências em busca de bens penhoráveis. Tal medida é prevista no artigo 185 do CTN que dispõe que: “Na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial”. Ao analisar a norma o STJ em recurso repetitivo firmou jurisprudência no sentido de que o art. 185-A do CTN atinge todo e qualquer bem ou direito do devedor, observado como limite o valor do crédito tributário. Contudo, a indisponibilidade de todos os bens depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) citação do executado; b) inexistência de pagamento ou de oferecimento de bens à penhora no prazo legal; c) não localização de bens penhoráveis após esgotamento das diligências (REsp 1377507). Ademais, o registro da referida escritura poderá trazer prejuízo a terceiros de boa fé em caso de posterior alienação do imóvel, devendo primeiramente o interessado requerer o levantamento do gravame junto ao Juízo das Execuções Fiscais, para posteriormente haver a doação. Assim, mister a manutenção do óbice registrário. Diante do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Marcos Gondim Gananian, e consequentemente mantenho o óbice registrário. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo. Sem prejuízo, expeça-se oficio ao MMº Juízo da 6ª Vara das Execuções Fiscais Federais – TRF 3ª Região, comunicando acerca deste processo, inclusive para adoção das providências que entender cabíveis. Junte ao oficio cópia integral dos autos. P.R.I.C. – ADV: ARTHUR LISKE (OAB 220999/SP), RAQUEL GUERREIRO BRAGA (OAB 297660/SP) (DJe de 13.05.2020 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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