CSM/SP: Registro de Imóveis – Registro de instituição parcial e convenção de condomínio – Empreendimento que abrange uma área pertencente a dois Municípios – “Habite-se” expedido por apenas um dos Municípios em que situado o empreendimento – Quadro de avaliação do custo global da construção atualizado, instruído com certidões de valor venal emitidas pelo mesmo Município – Ausência de provas de que as construções finalizadas estão localizadas, na sua totalidade, no território desse Município, exclusivamente – Documentação insuficiente – Óbice ao registro configurado – Dúvida procedente, com manutenção da qualificação negativa do título, embora por fundamento diverso – Nega-se provimento à apelação.


  
 

Apelação Cível nº 1008593-69.2019.8.26.0152

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1008593-69.2019.8.26.0152
Comarca: COTIA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1008593-69.2019.8.26.0152

Registro: 2020.0000211821

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1008593-69.2019.8.26.0152, da Comarca de Cotia, em que é apelante HOGA CONSTRUÇÕES LTDA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE COTIA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Mantiveram a recusa do registro e, em consequência, negaram provimento ao recurso, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE).

São Paulo, 16 de março de 2020.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1008593-69.2019.8.26.0152

Apelante: Hoga Construções Ltda

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Cotia

VOTO Nº 31.110

Registro de Imóveis – Registro de instituição parcial e convenção de condomínio – Empreendimento que abrange uma área pertencente a dois Municípios – “Habite-se” expedido por apenas um dos Municípios em que situado o empreendimento – Quadro de avaliação do custo global da construção atualizado, instruído com certidões de valor venal emitidas pelo mesmo Município – Ausência de provas de que as construções finalizadas estão localizadas, na sua totalidade, no território desse Município, exclusivamente – Documentação insuficiente – Óbice ao registro configurado – Dúvida procedente, com manutenção da qualificação negativa do título, embora por fundamento diverso – Nega-se provimento à apelação.

1. Trata-se de apelação interposta por Hoga Construções Ltda. contra r. sentença que julgou procedente a dúvida inversa e manteve a recusa do registro de instituição parcial, especificação e convenção do Condomínio Horizontal “Bosque dos Pássaros” junto à matrícula nº 107.485 do Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Cotia/SP, confirmando os óbices apresentados pelo registrador pois inviável a prática do ato registral a partir do “habite-se” concedido apenas sobre parte do empreendimento, bem como porque indispensável a certidão de inexistência de débito tributário e de regularidade da construção a ser emitida pelo Município de Cotia/SP (fl. 412/414).

Na nota de devolução expedida, o Sr. Oficial Registrador formulou as seguintes exigências: a) apresentar certidões negativas de tributos imobiliários referentes ao imóvel e de tributos mobiliários em nome da proprietária e incorporadora, bem como certidões de valor venal e número cadastral emitidas pelo Município de Cotia/SP; b) apresentar o “habite-se” e CND – Previdenciária referentes às áreas construídas emitidas, ou com anuência, das duas Prefeituras Municipais, referentes às 196 unidades autônomas e a todas as áreas comuns construídas, em conformidade ao projeto aprovado, pois a certidão do IGC – Instituto Geográfico e Cartográfico do Estado de São Paulo confirma que o imóvel e suas respectivas construções são de competência territorial dos dois Municípios; c) juntar ao processo de incorporação arquivado em Cartório a via original da certidão IGC nº 513/2018, conforme decisão judicial proferida nos autos do Processo nº 1003492-85.2018.8.26.0152; d) juntar certidão da Prefeitura de Cotia/SP, anuindo à emissão do “habite-se” emitido pela Prefeitura de Vargem Grande Paulista/SP, referente às áreas construídas no limite territorial do Município de Cotia/SP; e) apresentar quadro de avaliação do custo global da construção atualizado até a data do registro, instruído com as respectivas certidões de valor venal dos Municípios de Cotia/SP e Vargem Grande Paulista/SP (fl. 39/42).

Em sua manifestação, o Sr. Oficial de Registro informou que, a despeito de suscitar dúvida inversa, o interessado não encaminhou a via original do título para protocolo (fl. 384/386).

O título, então, foi reapresentado e prenotado sob nº 301770 (fl. 392), tendo o Sr. Oficial de Registro prestado esclarecimentos (fl. 396/403).

Alega a apelante, em síntese, que para o registro da incorporação realizado na matrícula nº 107.485 (R.3) foram apresentados todos os documentos previstos no art. 32 da Lei nº 4.591/64, dentre os quais se encontra o projeto aprovado pela Prefeitura de Vargem Grande Paulista/SP, a certidão do IGC – Instituto Geográfico e Cartográfico do Estado de São Paulo e a manifestação da Prefeitura de Cotia/SP anuindo à aprovação expedida pela Prefeitura de Vargem Grande Paulista/SP. Assim, realizado o registro da incorporação, aduz que o Oficial não pode exigir a reapresentação da documentação já analisada e aprovada, sendo que para o registro da instituição, total ou parcial, resta apenas o cumprimento do disposto nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, Capítulo XX, item 224.1, vigente à época, o que foi atendido. Defende a possibilidade de instituição parcial, citando precedentes que permitem o registro da especificação relativamente às partes já edificadas, o que justifica a apresentação do “habite-se” parcial e averbação apenas das construções concluídas, com afastamento de todos os óbices apresentados pelo Oficial (fl. 420/435).

A D. Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fl. 449/452).

É o relatório.

2. O empreendimento “Bosque dos Pássaros” foi implantado sobre imóvel cujo perímetro abrange dois Municípios, certo que já efetuado o registro da incorporação. Pretende agora a apelante registrar a instituição parcial, especificação e convenção de condomínio horizontal, o que foi negado pelo Sr. Oficial registrador.

Desde logo, há que ser afastada a exigência, fundada no art. 32 da Lei nº 4.591/64, de apresentação de certidões negativas de tributos imobiliários referente ao imóvel e de tributos mobiliários em nome da proprietária e incorporadora (item 1 da Nota de Devolução a fl. 39/41). Isso porque, uma vez efetivado o registro da incorporação (R.03/107.485 – fl. 58 e AV.08/107.485 – fl. 117), concluise que todos os requisitos necessários à prática do ato foram atendidos, sendo inviável a complementação da documentação apresentada ao Oficial de Registro de Imóveis depois de finalizado o procedimento.

Pela mesma razão, não subsiste a exigência de juntada, no procedimento de incorporação arquivado na serventia extrajudicial, do original da certidão IGC nº 513/2018, emitida pelo IGC – Instituto Geográfico e Cartográfico do Estado de São Paulo, conforme determinado nos autos do Processo nº 1003492-85.2018.8.26.0152 (item 1.3 da Nota de Devolução a fl. 39/42). Até porque, eventual descumprimento da ordem judicial proferida em outro processo deverá ser debatida naqueles autos e não, no presente procedimento de dúvida.

No mais, importa lembrar que a instituição ocorre quando o empreendimento já está pronto e acabado, total ou parcialmente, dependendo, pois, da apresentação do “habite-se” ou documento equivalente, expedido pela Prefeitura segundo o projeto de construção aprovado e arquivado na incorporação, além da certidão negativa de débitos da obra.

Não se desconhece, por certo, a possibilidade do registro de instituição parcial de condomínio, o que vem sendo amplamente admitido pela jurisprudência deste C. Conselho Superior da Magistratura[1]. Contudo, a controvérsia existente no caso concreto é de natureza diversa, como veremos.

Entende a apelante que, uma vez registrada a incorporação, os documentos já apresentados são suficientes para a prática do ato agora pretendido, consoante disposto no item 224.1, Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça então vigente. Em sua atual redação, as Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, Capítulo XX, assim preveem:

“219. A instituição e especificação de condomínio serão registradas mediante a apresentação do respectivo instrumento público ou particular, que caracterize e identifique as unidades autônomas, ainda que implique atribuição de unidades aos condôminos, acompanhado do projeto aprovado e do “habite-se”, ou do termo de verificação de obras em condomínio de lotes.

219.1. Para averbação da construção e registro de instituição cujo plano inicial não tenha sido modificado, será suficiente requerimento que enumere as unidades, com remissão à documentação arquivada com o registro da incorporação, acompanhado de certificado de conclusão da edificação e desnecessária anuência dos condôminos.

219.2. Quando do registro da instituição, deve ser exigida, também, a convenção do condomínio, que será registrada no Livro nº 3.”

O dissenso está, portanto, na necessidade de apresentação, para o registro da instituição parcial do condomínio, do

“habite-se” expedido tanto pela Prefeitura de Vargem Grande Paulista/SP, como também pela Prefeitura de Cotia/SP, ou anuência desta em relação ao “habite-se” expedido por aquela, assim como de apresentação do quadro de avaliação do custo global da construção, atualizado até a data do registro, instruído com as respectivas certidões de valor venal de ambos os Municípios.

E quanto a essas exigências, cumpre observar que o registrador não se refere à obrigatoriedade de construção de toda área comum, mas sim, de comprovação da regularidade, mediante apresentação do “habite-se” expedido por ambas as Prefeituras, relativo às casas e áreas comuns já construídas.

Inexiste nos autos prova de que as construções finalizadas, referidas no “habite-se” expedido pela Municipalidade de Vargem Grande Paulista/SP (fl. 368/369) e na certidão negativa de débitos apresentada (fl. 370/371), estejam localizadas, na sua integralidade, no território do referido Município, exclusivamente. Com essa prova, a exigência formulada pelo registrador, no que se refere à apresentação do “habite-se” também pela Municipalidade de Cotia/SP, poderia, em tese, ser afastada.

Veja-se que no título apresentado a registro (fl. 283/367) há referência ao memorial de incorporação (fl. 284) e, quanto a este, houve, à época da incorporação, anuência do Município de Cotia/SP em relação ao projeto aprovado pelo Município de Vargem Grande Paulista/SP (fl. 282). Logo, não se pode presumir que todas as edificações finalizadas, sejam aquelas de uso exclusivo, sejam aquelas de uso comum, encontram-se fora do Município de Cotia/SP.

E sem a prova de que as edificações finalizadas estão localizadas apenas no território de Vargem Grande Paulista/SP, não basta a apresentação do “habite-se” expedido por esse Município para o pretendido registro.

Pelo mesmo motivo, mostra-se insuficiente a apresentação do quadro de avaliação do custo global da construção acompanhado das respectivas certidões de valor venal emitida por um dos Municípios, uma vez que o instrumento de instituição de condomínio não indica em qual deles estão as casas e as partes de uso comum já edificadas.

Tal conclusão é reforçada pelo teor da certidão expedida pelo IGC – Instituto Geográfico e Cartográfico do Estado de São Paulo, dando conta de que “o imóvel, conforme planta planimétrica, que me foi fornecida, matrícula nº 107.485 – RI Cotia, propriedade de Hoga Construções Ltda., pertence à jurisdição territorial dos MUNICÍPIOS DE COTIA – 87,46% (oitenta e sete inteiros e quarenta e seis centésimos por cento) da área, e de VARGEM GRANDE PAULISTA – os 12,54% (doze inteiros e cinquenta e quatro centésimos por cento) restantes” (fl. 378/380).

Nesse cenário, ainda que a exigência de apresentação do “habite-se” e do quadro de avaliação do custo global da construção atualizado, instruído com as respectivas certidões de valor venal dos Municípios de Cotia/SP e Vargem Grande Paulista/SP, não se justifique – eis que nada indica que as edificações estão localizadas no território de ambos os Municípios – o fato é que, exatamente porque não há prova da localização de tais edificações, os documentos apresentados são insuficientes para o pretendido registro.

Anote-se, por fim, que a apelação devolve integralmente a análise da qualificação do título, de forma que a recusa de registro deve ser mantida, ainda que por fundamento diverso daquele apresentado pelo Sr. Oficial registrador.

3. Diante do exposto, pelo meu voto, embora por fundamento diverso, mantenho a recusa do registro e, em consequência, nego provimento ao recurso.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator.

Nota:

[1] CSMSP – Apelação Cível: 72.874-0/0; CSMSP – Apelação Cível: 10.292-0/0. (DJe de 14.04.2020 – SP)

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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