TJSP: Apelação Cível – Indenização – Erro na grafia do nome da nubente no registro de casamento – Prescrição – Inocorrência – Prazo fixado em lei especial – Termo inicial – Último ato do processo judicial – Causa interruptiva – Danos morais não caracterizados – Ausência de nexo de causalidade – Recurso provido apenas para afastar a prescrição – Improcedência por outro fundamento – 1. A propositura de ação em que se visa a correção de erro constante no assento de casamento tem o condão de interromper a prescrição, que se reinicia após o último ato do processo que a interrompeu, nos termos do artigo 202, parágrafo único, do Código Civil – 4. Não havendo nexo de causalidade entre a conduta do oficial de registro e o dano alegado, falta requisito fundamental a ensejar obrigação de indenizar.


  
 

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1009520-97.2017.8.26.0348, da Comarca de Mauá, em que é apelante BIBIANA FRANCISCA DE ALMEIDA (JUSTIÇA GRATUITA), são apelados CLAUDIA ALVES DOS SANTOS SOUZA e SIMEAO JORGE DOS REIS.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento em parte ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores DONEGÁ MORANDINI (Presidente sem voto), JOÃO PAZINE NETO E ALEXANDRE MARCONDES.

São Paulo, 30 de setembro de 2019.

MARIA DO CARMO HONÓRIO

Relatora

Assinatura Eletrônica

Apelação Cível nº 1009520-97.2017.8.26.0348

Apelante: Bibiana Francisca de Almeida

Apelados: Claudia Alves dos Santos Souza e Simeao Jorge dos Reis

Comarca: Mauá

Juiz sentenciante: Glauco Costa Leite

V. 0090

APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO. ERRO NA GRAFIA DO NOME DA NUBENTE NO REGISTRO DE CASAMENTO. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. PRAZO FIXADO EM LEI ESPECIAL. TERMO INICIAL. ÚLTIMO ATO DO PROCESSO JUDICIAL. CAUSA INTERRUPTIVA. DANOS MORAIS NÃO CARACTERIZADOS. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE. RECURSO PROVIDO APENAS PARA AFASTAR A PRESCRIÇÃO. IMPROCEDÊNCIA POR OUTRO FUNDAMENTO.

1. A propositura de ação em que se visa a correção de erro constante no assento de casamento tem o condão de interromper a prescrição, que se reinicia após o último ato do processo que a interrompeu, nos termos do artigo 202, parágrafo único, do Código Civil.

4. Não havendo nexo de causalidade entre a conduta do oficial de registro e o dano alegado, falta requisito fundamental a ensejar obrigação de indenizar.

Trata-se de Apelação interposta contra r. sentença (págs. 91/94), cujo relatório adoto, proferida pelo MM. Juiz da 3ª Vara Cível do Foro de Mauá que, em ação indenizatória, reconheceu a prescrição da pretensão e julgou extinto o processo, nos termos do artigo 487, II, do Código de Processo Civil. Condenou, ainda, a autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa.

Apela a autora (págs. 97/109) pugnando pelo afastamento da prescrição, pois ajuizou a ação dentro do prazo trienal do artigo 206, §3º, V, do Código Civil, contados da data da sentença proferida nos autos de retificação (processo n° 1006066-17.2014.8.26.0348). Alega ainda que a relação entre ela e as réus é regida pelo Código de Defesa do Consumidor, em que o prazo prescricional para reparação pelos danos causados por falha na prestação do serviço é de cinco anos. Aduz que a responsabilidade dos notários e dos oficiais de registro é objetiva, nos termos do artigo 22 da Lei nº 8.935/1994 e, por isso, são responsáveis pelos prejuízos suportados pela autora.

Recurso tempestivo e isento de preparo, por ser a apelante beneficiária da justiça gratuita (págs. 97/98).

Regularmente intimados, os apelados não apresentaram contrarrazões (págs. 113).

Não houve oposição ao julgamento virtual.

É O RELATÓRIO.

VOTO.

O recurso comporta parcial acolhimento, pois, respeitado o entendimento do Douto Juiz prolator da r. sentença de págs. 91/94, não se operou o fenômeno da prescrição.

O prazo prescricional para se pleitear a reparação civil em decorrência de prejuízos causados por atos de notários e oficiais de registro prescreve em 3 anos [1], nos termos da Lei nº 8.935/1994, in verbis:

Art. 22. Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso.

Parágrafo único. Prescreve em três anos a pretensão de reparação civil, contado o prazo da data de lavratura do ato registral ou notarial. (destaques meus)

O ato do qual reclama a apelante foi praticado pelos réus, ora apelados, no dia 24/01/2013 (pág. 15), quando iniciou-se a contagem do prazo prescricional da pretensão reparatória.

A prescrição, entretanto, foi interrompida, nos termos do artigo 202 do Código Civil, pela propositura de ação de retificação de registro civil, que foi julgada no dia 16/10/2014 (págs. 11/12).

Assim, de acordo com o parágrafo único do artigo 202 do Código Civil vigente, “A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper”.

No caso em análise, o último ato do processo que interrompeu a prescrição foi praticado em 24/11/2014, com o trânsito em julgado da sentença do processo nº 1006066-17.2014.8.26.0348, conforme pode ser observado na certidão de inteiro teor de casamento juntada à página 66.

Nesse sentido é a lição de Caio Mario da Silva Pereira que explica que, se a causa interruptiva “tiver sido um processo judicial, somente recomeça a contar do último ato nele praticado” (Instituições de Direito Civil, 1º v., Forense, RJ, 5ª ed., pág. 605).

Essa lição foi consagrada pela doutrina moderna, tanto que o Mestre Luiz Antônio Alves Torrano, ao comentar as questões controvertidas acerca do instituto, originadas com o advento do novo Código Civil escreveu:

“(…) na hipótese de a causa interruptiva se efetivar por meio de uma série de atos que, no entanto, protraem os seus efeitos e consequências por um dado interregno, a prescrição interrompe-se com a prática do primeiro ato da série e reinicia seu curso, também por inteiro, já que se trata de interrupção, somente a partir do último ato da referida série. Di-lo o parágrafo único do art. 202 do CC”. (Prescrição e Decadência, Lemos & Cruz, 2011, pág. 114).

Enfim, o interstício legal foi reiniciado após o último ato do processo que o interrompeu, ou seja, 24/11/2014. A presente ação foi distribuída em 09/10/2017. Logo, antes do término do prazo prescricional de 3 anos, que havia sido interrompido pela propositura da ação nº 1006066-17.2014.8.26.0348.

Afastado o fenômeno prescricional, passo à análise do pedido indenizatório, concluindo que a pretensão da apelante não merece acolhimento.

Com efeito, pelo que se infere da certidão de inteiro teor de casamento (pág.66), o erro na grafia do nome da recorrente ocorreu na ocasião do registro do seu casamento, quando o ato foi lavrado em Livro próprio pelo oficial de registro da época. Na ocasião foi registrado que a contraente passaria a assinar Bibiana Xavier de Almeida, o que não foi percebido por nenhuma das pessoas que assinou o ato, nem mesmo pelos nubentes, pois a estes foi entregue um documento manuscrito, onde o nome grafado constou de forma correta – Bibiana Francisca de Almeida (pág.14).

Assim, não há como atribuir a responsabilidade aos apelados, pois eles apenas transcreveram o que constava no livro de registro de casamento, o que só pode ser retificado posteriormente por ordem judicial.

Nessas condições, não havendo nexo de causalidade entre a conduta dos apelados e o dano alegado, falta requisito fundamental a ensejar o dever de indenizar.

Em face do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso apenas para afastar a prescrição, julgando improcedente o pedido inicial por outro fundamento, nos termos do 487, I do Código de Processo Civil.

Em observância ao artigo 85, §11, do CPC, levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal exercido pelo advogado do recorrido, majoro os seus honorários advocatícios para 15% sobre o valor da causa.

MARIA DO CARMO HONÓRIO

Relatora


Nota:

[1] Nesse sentido: “(…) 4. Prescreve em 3 (três) anos a pretensão de reparação civil contra ato praticado por tabelião no exercício da atividade cartorária, haja vista a aplicação do art. 206, § 3º, V, do Código Civil de 2002 e do art. 22, parágrafo único, da Lei nº 8.935/1994. 5. Recurso especial não provido. (REsp 1622471/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2018, DJe 01/06/2018)” – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1009520-97.2017.8.26.0348 – Mauá – 3ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Maria do Carmo Honório – DJ 10.03.2020

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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