Apelação – Ação anulatória – ITCMD – Meação e direitos hereditários sobre bens partilháveis – Atribuição de frações ideais à viúva-meeira (usufruto vitalício) e aos herdeiros (nua propriedade) – Pretensão inicial voltada à desconstituição de crédito de ITCMD lançado pela administração tributária – Lançamento operado em razão de suposta doação de bens (“renúncia translativa”) havida entre a viúva-meeira e os herdeiros do de cujus no processo de partilha dos bens integrantes do acervo hereditário – Desacerto da autoridade tributária – “De cujus” que era casado sob o regime da comunhão universal de bens, de modo que, à viúva, remanesce o singelo direito de meação (art. 1.667, do CC/2002), não figurando ela como herdeira (art. 1.829, inciso I, do CC/2002) – Até a data da partilha, tanto a meação como o acervo hereditário são representados por frações ideais do patrimônio do casal (universalidade de direito, correspondente a 50% do monte partilhável) – Validade jurídica da atribuição de direitos específicos, como é o caso do usufruto e da nua-propriedade sobre os bens partilháveis, a título de pagamento da meação e da herança, desde que sejam respeitadas as forças de uma e outra – Precedentes deste E. Tribunal de Justiça no entanto, caso o direito específico atribuído à viúva-meeira ou aos herdeiros supere, respectivamente, a fração ideal da meação ou da herança, o aperfeiçoamento da transmissão daquele direito somente ocorrerá se precedido da cessão (gratuita ou onerosa) da parte faltante, seja em prejuízo dos herdeiros (na hipótese de o valor do usufruto vitalício superar o valor da fração ideal correspondente à meação), seja em prejuízo da viúva-meeira (se o valor da nua propriedade resguardada aos herdeiros superar o valor da fração ideal correspondente ao acervo hereditário) – “Renúncia” da parte excedente, tanto pela viúva-meeira quanto pelos herdeiros, a fim de aperfeiçoarem a transmissão do direito específico atribuído na partilha, que não representa a abdicação pura e simples em prol do mesmo monte partilhável – Meação e herança que representam direitos próprios e inconfundíveis, não havendo que se falar em “renúncia abdicativa” caso haja a efetiva transferência de direitos entre os herdeiros e a viúva-meeira – Entendimento encampado pelo C. Superior Tribunal de Justiça – Hipótese dos autos em que a própria escritura pública de inventário e partilha reconhece o excesso do direito adquirido pelos herdeiros (nua propriedade dos bens, correspondente a 66,66% do monte partilhável), razão pela qual o aperfeiçoamento do ato de transmissão pressupõe a cessão de parte do direito próprio da viúva-meeira – Negócio jurídico sucessivo à partilha que se apresenta como fato gerador do Imposto sobre Doações de Bens ou Direitos – Inteligência do art. 5º, inciso I, da LE nº 10.705/2000, que trata sobre o referido tributo no âmbito do Estado de São Paulo – Sentença de procedência reformada, para julgar a demanda improcedente – Inversão dos ônus sucumbenciais – Recurso da Fazenda Estadual provido.

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001122-63.2018.8.26.0531, da Comarca de Santa Adélia, em que é apelante ESTADO DE SÃO PAULO, são apelados RENATA CRISTINA BERTOLO PIVA FIGLIOLI, SIMONE CRISTINA BERTOLO PIVA CORDIOLI e GUSTAVO ALEXANDRE PIVA.

ACORDAM, em 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ANA LIARTE (Presidente) e FERREIRA RODRIGUES.

São Paulo, 9 de dezembro de 2019.

PAULO BARCELLOS GATTI

RELATOR

Assinatura Eletrônica

APELAÇÃO CÍVEL N° 1001122-63.2018.8.26.0531

APELANTE: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO (ré)

APELADOS: RENATA CRISTINA BERTOLO PIVA FIGLIOLI, SIMONE CRISTINA BERTOLO PIVA CORDIOLI e GUSTAVO ALEXANDRE PIVA (autores)

ORIGEM: VARA ÚNICA DA COMARCA DE SANTA ADÉLIA

VOTO N° 17.710

APELAÇÃO AÇÃO ANULATÓRIA – ITCMD MEAÇÃO E DIREITOS HEREDITÁRIOS SOBRE BENS PARTILHÁVEIS ATRIBUIÇÃO DE FRAÇÕES IDEAIS À VIÚVA-MEEIRA (USUFRUTO VITALÍCIO) E AOS HERDEIROS (NUA PROPRIEDADE) Pretensão inicial voltada à desconstituição de crédito de ITCMD lançado pela administração tributária lançamento operado em razão de suposta doação de bens (“renúncia translativa”) havida entre a viúva-meeira e os herdeiros do de cujus no processo de partilha dos bens integrantes do acervo hereditário desacerto da autoridade tributária “de cujus” que era casado sob o regime da comunhão universal de bens, de modo que, à viúva, remanesce o singelo direito de meação (art. 1.667, do CC/2002), não figurando ela como herdeira (art. 1.829, inciso I, do CC/2002) até a data da partilha, tanto a meação como o acervo hereditário são representados por frações ideais do patrimônio do casal (universalidade de direito, correspondente a 50% do monte partilhável) validade jurídica da atribuição de direitos específicos, como é o caso do usufruto e da nuapropriedade sobre os bens partilháveis, a título de pagamento da meação e da herança, desde que sejam respeitadas as forças de uma e outra precedentes deste E. Tribunal de Justiça no entanto, caso o direito específico atribuído à viúva-meeira ou aos herdeiros supere, respectivamente, a fração ideal da meação ou da herança, o aperfeiçoamento da transmissão daquele direito somente ocorrerá se precedido da cessão (gratuita ou onerosa) da parte faltante, seja em prejuízo dos herdeiros (na hipótese de o valor do usufruto vitalício superar o valor da fração ideal correspondente à meação), seja em prejuízo da viúvameeira (se o valor da nua propriedade resguardada aos herdeiros superar o valor da fração ideal correspondente ao acervo hereditário) “renúncia” da parte excedente, tanto pela viúva-meeira quanto pelos herdeiros, a fim de aperfeiçoarem a transmissão do direito específico atribuído na partilha, que não representa a abdicação pura e simples em prol do mesmo monte partilhável meação e herança que representam direitos próprios e inconfundíveis, não havendo que se falar em “renúncia abdicativa” caso haja a efetiva transferência de direitos entre os herdeiros e a viúvameeira entendimento encampado pelo C. Superior Tribunal de Justiça – hipótese dos autos em que a própria escritura pública de inventário e partilha reconhece o excesso do direito adquirido pelos herdeiros (nua propriedade dos bens, correspondente a 66,66% do monte partilhável), razão pela qual o aperfeiçoamento do ato de transmissão pressupõe a cessão de parte do direito próprio da viúva-meeira negócio jurídico sucessivo à partilha que se apresenta como fato gerador do Imposto sobre Doações de Bens ou Direitos inteligência do art. 5º, inciso I, da LE nº 10.705/2000, que trata sobre o referido tributo no âmbito do Estado de São Paulo sentença de procedência reformada, para julgar a demanda improcedente inversão dos ônus sucumbenciais. Recurso da Fazenda Estadual provido.

Vistos.

Trata-se de recurso de apelação interposto pela FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, nos autos da “ação declaratória de inexistência de obrigação tributária” promovida pelos apelados, RENATA CRISTINA BERTOLO PIVA FIGLIOLI, SIMONE CRISTINA BERTOLO PIVA CORDIOLI e GUSTAVO ALEXANDRE PIVA, e julgada procedente pelo Juízo “a quo”, sob o fundamento de os autores, na qualidade de únicos herdeiros necessários do de cujus, CEDINEY MAURO PIVA, terem comprovado a inocorrência de efetivo fato gerador do Imposto sobre Doações de Bens e Direitos durante o processo de partilha de bens ocorrido entre eles e a cônjuge supérstite, pelo que de rigor a desconstituição das CDAs representativas do crédito tributário, consoante r. sentença de e-fls. 258/261, cujo relatório se adota.

Inconformada, a Fazenda Estadual, em suas razões de apelação (e-fls. 263/267), limitou-se a reiterar os argumentos deduzidos em sua peça de defesa, sustentando que o plano de partilha de bens ocorrido entre os autores e a viúva-meeira teria desbordado dos limites a que sujeitos a meação (pertencente à cônjuge virago) e o acervo hereditário (pertencente unicamente aos herdeiros necessários). Nesta linha, defendeu que, ao disporem que a nua propriedade de todos os bens integrantes do patrimônio partilhável seria destinado ao pagamento do acervo hereditário, enquanto que o usufruto vitalício sobre os mesmo bens serviria de pagamento da meação, os envolvidos acabaram por desrespeitar as forças de suas frações ideais, de modo que o aperfeiçoamento das transmissões de direitos somente poderia ter ocorrido se, após o pagamento da meação e da herança, a viúva-meeira tivesse cedido parte de seu patrimônio particular aos herdeiros, hipótese esta que impõe a incidência do Imposto sobre Doações de Bens e Direitos. Ressalvou, ao fim, que a cessão de direitos havida entre cônjuge supérstite e herdeiros não se amoldaria ao conceito de “renúncia pura e simples”, mas ao de verdadeira “renúncia translativa”, pelo que de rigor o provimento do recurso, julgando-se integralmente improcedente a pretensão inicial.

Recurso regularmente processado, livre de preparo, por força da isenção legal conferida à Administração Pública, nos termos do art. 1.007, §1º, do CPC/2015, desafiando contrarrazões dos autores/apelados às e-fls. 277/292.

Este é, em síntese, o relatório.

VOTO

Insurge a Fazenda Estadual contra a r. sentença de primeiro grau que julgou procedente a pretensão inicial, sob o fundamento de os autores, na qualidade de únicos herdeiros necessários do de cujus, CEDINEY MAURO PIVA, terem comprovado a inocorrência de efetivo fato gerador do Imposto sobre Doações de Bens e Direitos durante o processo de partilha de bens ocorrido entre eles e a cônjuge supérstite, pelo que de rigor a desconstituição das CDAs representativas do crédito tributário.

E, pelo que se depreende do acervo fáticoprobatório coligido aos autos, o apelo comporta acolhimento.

In casu, colhe-se que CEDINEY MAURO PIVA foi casado, sob o regime da comunhão universal de bens, com CLARICE APARECIDA BERTOLO PIVA, vindo o primeiro a óbito aos 14.09.2014.

Em razão da morte do cônjuge varão, observou-se a formação de um acervo partilhável (universalidade de direito) entre a cônjuge virago e os herdeiros necessários do de cujus (sucessão ab intestato), compreendendo apenas os seus filhos, RENATA CRISTINA BERTOLO PIVA FIGLIOLI, SIMONE CRISTINA BERTOLO PIVA CORDIOLI e GUSTAVO ALEXANDRE PIVA. Para a cônjuge supérstite caberia a reserva de metade dos bens e direitos pertencentes ao casal em vida, chamada meação; já para os herdeiros necessários, por força da sucessão causa mortis, caberia o aquinhoamento da massa hereditária.

Neste diapasão, com o intento de formalizarem o plano de partilha consensual havido entre os interessados, levaram a respectiva escritura pública para registro junto ao Cartório da Comarca de Santa Adélia, oportunidade em que o oficial recursou o pedido formulado (25.02.2015), sob o seguinte fundamento: “(…) A partilha e o pagamento dos quinhões foram feitas em desacordo com o previsto na lei sucessória, já que atribuiu-se à meação o usufruto do imóvel e ao pagamento da herança a nua-propriedade do imóvel, superando as forças da herança (…). Inclusive, há contraditória indicação de que a partilha é feita sobre o patrimônio total e o pagamento é feito sobre a nua-propriedade/usufruto.” (e-fl. 45).

Não concordantes com a exigência feita, os interessados requereram a instauração de procedimento administrativo (suscitação de dúvida art. 198 e ss., da LF nº 6.015/73 Lei de Registros Públicos), para que o Juízo competente deliberasse a respeito (Processo nº 0000964-30.2015.8.26.0531).

Na ocasião, colhidas as manifestações das partes, concluiu-se (e-fls. 193/196): “No caso em tela, a viúva meeira renuncia sua metade ideal em favor dos herdeiros, reservando para si o usufruto vitalício dos bens. De fato, é perfeitamente possível que isto se concretize na patilha. O Código Civil autoriza a renúncia à herança e a cessão de direitos hereditários (artigos 1.793 e 1.806). Portanto, nesta linha de pensamento, não se justifica impedir que, no caso de partilha amigável, a viúva não possa renunciar à meação de que é titular para, em contrapartida, receber o usufruto dos bens do espólio. (…) Desta forma, bastou atribuir a nua propriedade dos imóveis no pagamento dos quinhões dos herdeiros e o usufruto vitalício na meação da viúva, independentemente de qualquer outro negócio jurídico. Em verdade, o direito real de usufruto vitalício reflete expressivo valor econômico, de tal modo que pode caber e se amoldar à meação da viúva, com a atribuição do valor do usufruto semelhante ao da nua propriedade. E são diversos os precedentes jurisprudenciais autorizando, na hipótese de partilha amigável, a instituição do usufruto vitalício em favor da viúva e a atribuição da nua-propriedade em benefício dos herdeiros, na medida em que o direito real de usufruto vitalício reflete expressivo valor econômico (TJSP, Agravo de Instrumento nº 2072203-72.2013.8.26.0000, 6ª Câmara de Direito Privado, Rel. Paulo Alcides, j. 18/02/2014). (…) Ademais, a atribuição, em partilha amigável, da nua propriedade dos bens inventariados aos herdeiros, com reserva de usufruto vitalício, não caracteriza doação e, portanto, inexigível o recolhimento do imposto de transmissão inter vivos. Como os imóveis já pertenciam à viúva em comunhão com o falecido, ela apenas se desfez da nua propriedade permanecendo com o direito de usar e gozar da coisa, nada adquiriu. Por essa simples razão, inexistente o ato de aquisição ou “outros negócios estranhos à simples sucessão”, conforme alegado pela Oficial de Registro de Imóveis. Assim, não há que se falar em tributo por ausência do fato gerador. (…) Em relação à manifestação da Fazenda Pública, na qual levanta a possibilidade de eventual sonegação fiscal, tal fato, por si só, não tem o condão de impedir o ingresso da partilha no fólio real. Além disso, a via eleita não é sede para discutir eventuais divergências de tributos, devendo para tanto, caso entenda a Fazenda Estadual, ser credora de algum valor, cobrar o mesmo na esfera administrativa ou judicial, mas em processo próprio. (…). Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a dúvida suscitada, para, em consequência, determinar à Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Santa Adélia, a proceder ao registro da escritura de inventário e partilha do espólio de Cediney Mauro Piva, lavrada pelo Tabelião de Notas do Município de Santa Adélia, no Livro 076, páginas 101/107, de 12/12/2014 e escritura de re-ratificação, lavrada pelo mesmo tabelião, no Livro 076, páginas 197/199, de 07/01/2015.”.

A FESP, de seu turno, atenta aos limites cognitivos do procedimento registrário (regularidade formal do instrumento levado a registro, independentemente de eventuais inconsistências tributárias), insistiu na tese de que: “(…) De acordo com a documentação juntada ao expediente, apurou-se que o ‘de cujus’ era casado no regime da Comunhão Universal de Bens com Clarice Aparecida Bertolo Piva e deixou os filhos Simone, Renata e Gustavo, que possuía em comum com a viúva meeira. Conforme disposto na Escritura Pública de inventário e Partilha e sua respectiva Escritura de Re-Ratificação, (…) coube à viúva meeira os Direitos Reais de usufruto Vitalício sobre a totalidade dos bens objeto de partilha, enquanto os filhos receberam em pagamento, em partes iguais, o total correspondente à nuapropriedade. Entretanto, ao se interpretar o Art. 1.667, cc. Art. 1.829, ambos do Código Civil (Lei 10.406/2002), concluise que, em função do regime de casamento adotado, cabe à viúva, a título de meação, o correspondente a 50% do patrimônio que o casal possuía em comum. (…), enquanto a parte correspondente à herança de cada um dos filhos é de 16,66% [equivalente aos outros 50% do todo partilhável]. Porém, ao se analisar a partilha em consonância com o Art. 9º, da Lei 10.705/2000 [Lei que rege o ITCMD no Estado de São Paulo], verifica-se que foi atribuído à viúva o correspondente a 33,33% (1/3 usufruto) e, a cada um dos três filhos, 22,22% (totalizando 66,66%, ou seja, 2/3 nua propriedade). Portanto, tendo em vista que houve a atribuição de valores acima do respectivo quinhão a cada um dos herdeiros, pode-se afirmar que, de acordo com o Art. 2º e §5º, da Lei 10.705/2000, além da incidência do ITCMD Causa Mortis, há também a incidência do ITCMD Doação, em função de se considerar tal atribuição equiparada à doação.” (efls. 171/173).

E, ato contínuo, procedeu ao lançamento do ITCMD considerado devido no ato de cessão de direitosespecíficos (renúncia translativa) em favor de cada um dos envolvidos.

Diante de tais acontecimentos, os aqui autores, indicados como contribuintes do Imposto sobre Doações de Bens e Direitos lançado pela autoridade fazendária, ajuizaram presente ação declaratória de inexigibilidade de débito, pugnando pela desconstituição dos créditos tributários exigidos pelo Fisco (e-fls. 01/18).

Pois bem.

A Constituição Federal, de 05 de outubro de 1988, inaugura a Seção IV, do Capítulo I (sistema tributário nacional), Título VI (da tributação e do orçamento), disciplinando a respeito dos impostos dos estados e do distrito federal, dentre os quais se insere o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doações de Quaisquer Bens e Direitos (art. 155, I e §1º, da CF/88).

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

I – transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;

(…)

§ 1.º O imposto previsto no inciso I:

I – relativamente a bens imóveis e respectivos direitos, compete ao Estado da situação do bem, ou ao Distrito Federal

II – relativamente a bens móveis, títulos e créditos, compete ao Estado onde se processar o inventário ou arrolamento, ou tiver domicílio o doador, ou ao Distrito Federal;

III – terá competência para sua instituição regulada por lei complementar:

a) se o doador tiver domicilio ou residência no exterior;

b) se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior;

IV – terá suas alíquotas máximas fixadas pelo Senado Federal;

A respeito do ITCMD, o jurista RICARDO ALEXANDRE leciona que:

“Segundo o art. 155, I, da CF/1988, os Estados e o Distrito Federal podem instituir imposto sobre a transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos. O tributo possui natureza eminentemente arrecadatória (fiscal) e não incide sobre as transmissões originárias, como por usucapião (art. 1.238 do Código Civil) ou por acessão (art. 1.248 do Código Civil). O Código Tributário Nacional disciplina o imposto nos arts. 35 a 42 e deve ser interpretado à luz da atual Constituição, visto que a redação original do CTN trata de um único imposto de transmissão, de competência estadual, incidente exclusivamente sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos. Com a Constituição Federal de 1988, previu-se a instituição de dois impostos de transmissão, um estadual (ITCMD) e outro municipal (ITBI), sujeitando à incidência do primeiro as transmissões a título gratuito (causa mortis e doação) e do segundo as transmissões a título oneroso.”[1].

No âmbito paulista, a regulamentação do referido tributo vem consignada na Lei nº 10.705, de 29 de dezembro de 2000, sendo que, quanto à situação considerada pela lei como necessária e suficiente para ocorrência do fato gerador (hipótese de incidência), os arts. 2º e 3º, da legislação estadual prelecionam:

Artigo 2.º – O imposto incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido:

I – por sucessão legitima ou testamentária, inclusive a sucessão provisória;

II – por doação.

(…)

Artigo 3.º – Também sujeita-se ao imposto a transmissão de:

I – qualquer título ou direito representativo do patrimônio ou capital de sociedade e companhia, tais como ação, quota, quinhão, participação civil ou comercial, nacional ou estrangeira, bem como, direito societário, debênture, dividendo e crédito de qualquer natureza;

II – dinheiro, haver monetário em moeda nacional ou estrangeira e titulo que o represente, depósito bancário e crédito em conta corrente, depósito em caderneta de poupança e a prazo fixo, quota ou participação em fundo mútuo de ações, de renda fixa, de curto prazo, e qualquer outra aplicação financeira e de risco, seja qual for o prazo e a forma de garantia;

III – bem incorpóreo em geral, inclusive título e crédito que o represente, qualquer direito ou ação que tenha de ser exercido e direitos autorais.

(…)

Nesta linha, ressalvado que à legislação tributária é vedada alteração da definição, do conteúdo e do alcance dos institutos de direito privado (art. 110, do CTN), conclui-se que a hipótese de incidência suficiente e necessária para legitimar o lançamento do ITCMD, segundo a legislação paulista, consiste na transmissão de bens e/ou direitos por meio de negócio jurídico em que “uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra” (art. 538, do CC/2002).

Com esteio nestas premissas, verifica-se que, na hipótese sub examine, o Fisco paulista procedeu à exação do ITCMD em desfavor dos aqui autores, por considerar que, para aperfeiçoar as transmissões de direitos descritas no plano de partilha amigável levado a registro por eles e pela viúva-meeira, teria ocorrido inarredável divisão do acervo partilhável em meação e acervo hereditário (este último sujeito à incidência do ITCMD Mortis Causa), seguida de cessão gratuita de parte ideal dos direitos integrantes do patrimônio exclusivo da viúva-meeira em favor dos herdeiros (negócio jurídico sujeito à incidência do ITCMD Doação), a fim de que estes obtivessem a integralidade da nua propriedade dos bens integrantes do monte partilhável (correspondente a 2/3 do todo e, portanto, superior aos limites do acervo hereditário isoladamente considerado 50% do todo).

Acertada a compreensão da FESP, conforme se passa a expor.

Considerado o regime da comunhão universal de bens, importa consignar que, quando do óbito de um dos cônjuges, o conjunto de bens e direitos representativo do patrimônio comum do casal segrega-se em duas frações ideais e iguais: (i) a meação reservada como direito próprio do cônjuge supérstite e (ii) a meação reservada ao espólio do de cujus, a partir de então representada pelo acervo hereditário, direito próprio dos herdeiros.

Por corresponderem a “frações ideais” de um todo indiviso, entende-se que tanto a meação como o acervo hereditário não precisam ser integrados necessariamente por bens específicos; ao revés, revelasse juridicamente possível que o pagamento destas frações ideais se dê a partir da transferência de direitos específicos (e não por meio dos bens).

Estes direitos, por óbvio, devem representar conteúdo econômico aferível, tendo em vista que somente assim se poderá averiguar se houve, ou não, o respeito às forças da meação (limitada a 50% do todo partilhável) e do acervo hereditário (limitado, igualmente, a 50% do todo partilhável).

Daí porque ter-se consolidado na jurisprudência e na doutrina, a validade e eficácia da partilha realizada a partir da atribuição do direito à nua-propriedade sobre bens integrantes do acervo partilhável como pagamento da fração ideal correspondente ao acervo hereditário e, de outro lado, a atribuição do direito real de usufruto vitalício destes mesmos bens como pagamento da meação devida ao cônjuge supérstite.

A validade e eficácia da partilha, observada exclusivamente sob o aspecto formal (possibilidade jurídica), não impede, porém, eventuais consequências prejudicais à forma inicialmente imaginada para divisão dos bens e direitos.

Imagine-se, por exemplo, a superveniente notícia de um herdeiro necessário cujos direitos não foram observados na partilha originalmente planejada (art. 1.824, do CC/2002 petição de herança). Neste caso, pode o herdeiro pleitear o reconhecimento de seu direito sucessório e, em caso de procedência do pedido, vir a receber a quota-parte que lhe seria devida quando da abertura da sucessão.

Para tanto, no cálculo de seu quinhão hereditário, dever-se-á levar em consideração o conteúdo econômico do direito específico que compôs a massa hereditária, extraindo-se daí o valor de cada quotaparte. Poderá ocorrer de o cálculo demonstrar que o valor do direito à nua-propriedade herdada representa, in concreto, fração superior ao idealmente considerado para fins de viabilizar a partilha (mais de 50% do todo partilhável).

Isto é, que a despeito da intenção original de se atribuírem direitos específicos como pagamento das frações ideais representativas da meação e do acervo hereditário, este último acabou, no plano dos fatos, por superar as forças a que estava sujeito.

Em consequência, no cálculo do quinhão devido ao herdeiro peticionário não se levará em conta o valor real da nua propriedade transferida aos herdeiros, mas sim o conteúdo econômico inerente ao acervo hereditário (50% do monte partilhável), de modo que o pagamento de sua fração ideal ficará aquém dos montantes efetivamente recebidos pelos demais herdeiros.

E, isso, não por desrespeito à equivalência dos quinhões (art. 1.835, do CC/2002), mas por conta de os herdeiros, no plano de partilha, terem sido beneficiados pela cessão de direitos (pertencentes à viúva-meeira) que, ao abdicar de parte da força de sua fração ideal, garantiu aos herdeiros o alcance necessário para viabilizar a transferência do específico direito por eles adquirido.

Sendo assim, saliente-se: embora não haja óbice, em tese, à praxe de atribuição do usufruto vitalício e da nua propriedade sobre os bens partilháveis como pagamento, respectivamente, da meação do cônjuge supérstite e da herança cabível aos herdeiros do de cujus, tal ato não implica a irresponsabilidade integral dos envolvidos. Se, no plano concreto, verificar-se que um ou outro direito específico superou as forças da meação ou do acervo hereditário, nada obsta que os eventuais prejudicados promovam a responsabilização dos envolvidos no plano de partilha pelas consequências materiais daí decorrentes.

Foi exatamente o que se observou no caso concreto destes autos, tendo em vista o prejuízo provocado em detrimento da Administração Pública.

De fato, quando da origem dos acontecimentos que culminaram no presente processo, o juízo registrário, ao examinar a suscitação de dúvida (Processo nº 0000964-30.2015.8.26.0531), afirmou que, a despeito da validade formal do plano de partilha, resguardava-se à Administração Pública a possibilidade de, uma vez demonstrado in concreto o desacerto dos tributos recolhidos, perquirir o que de direito pelas vias adequadas.

Veja-se, in verbis: “(…) Em relação à manifestação da Fazenda Pública, na qual levanta a possibilidade de eventual sonegação fiscal, tal fato, por si só, não tem o condão de impedir o ingresso da partilha no fólio real. Além disso, a via eleita não é sede para discutir eventuais divergências de tributos, devendo para tanto, caso entenda a Fazenda Estadual, ser credora de algum valor, cobrar o mesmo na esfera administrativa ou judicial, mas em processo próprio.” (e-fl. 195).

Tal precaução decorre, de um lado, da natureza meramente administrativa da decisão que venha a ser proferida no processo de suscitação de dúvida registrária, que, por conseguinte, não obsta a utilização do procedimento jurisdicional contencioso por parte dos interessados (art. 204, da LRP[2]).

Se não bastasse, ainda que admitida a validade e eficácia da partilha extrajudicial (sob o prisma formal), tal qual promovida entre a cônjuge supérstite e os herdeiros do de cujus, o art. 116, parágrafo único, do Código Tributário Nacional, permite à autoridade tributária desconsiderar os atos jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador de tributos ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária (prisma material).

Num primeiro momento, herdeiros e cônjuge supérstite dividiram entre si o acervo partilhável, atribuindo para cada qual, respectivamente e de forma ideal, a nua propriedade e o usufruto sobre todos os bens. Para tanto e a fim de que fossem respeitadas as forças da meação e da herança, assumiram o ônus de que, no plano concreto, o valor de avaliação daqueles específicos direitos respeitava o limite quantitativo a que sujeitos (cada qual correspondente a 50% do todo partilhável).

Ato contínuo, no ato de recolhimento do Imposto sobre a Transmissão Mortis Causa de bens e direitos, os herdeiros, sem impugnar o critério adotado pelo Fisco Estadual, utilizaram como base de cálculo aquele previsto em Lei para o caso de “transmissão não onerosa da nua-propriedade”, que corresponde, na forma do art. 9º, §2º, item ‘4’, da LE nº 10.705/2000, a 2/3 do valor dos bens por eles recebidos.

Diante desta informação, frise-se, prestada pelos próprios contribuintes, o Fisco compreendeu que os herdeiros, no plano concreto, teriam recebido no momento da partilha o equivalente a 2/3 do montante partilhável, superando, assim, as forças do acervo hereditário (limitado a 50%).

Neste diapasão, a meação assegurada à cônjuge-supérstite só teria sido respeitada em uma única hipótese: caso, depois de aperfeiçoada a partilha das frações ideias (50% do acervo partilhável para os herdeiros e 50% para a viúva-meeira), aquela tenha cedido parte de sua fração ideal, permitindo, assim, que se chegasse no correspondente a 2/3 do valor total do acervo partilhável em favor dos herdeiros.

Houve, portanto, dois atos jurídicos (sentido lato) sucessivos neste procedimento de transmissão de direitos:

1. A partilha ideal das frações entre viúva-meeira e herdeiros, assumindo-se, por conta e risco dos envolvidos, que essas frações ideais (50% do todo partilhável) correspondiam exatamente ao conteúdo econômico da nua propriedade (herdeiros) e do usufruto vitalício (viúva meeira);

2. Verificado, no plano concreto, que a base de cálculo utilizada pelos herdeiros para o recolhimento do ITCMD Mortis Causa – correspondeu à fração de 2/3 do valor total dos bens partilháveis, considerou-se que houve a transmissão em favor deles do quanto necessário para que o acervo hereditário alcançasse aquela, o que somente poderia se admitir a partir da cessão gratuita em favor dos herdeiros de parte da fração ideal atribuível à viúva-meeira.

Se os contribuintes pretendiam ilidir a compreensão do Fisco Estadual, incumbia-lhes o ônus (art. 373, inciso I, do CPC/2015) de comprovar que, a despeito da presunção legal (que preestabelece o conteúdo econômico da nua propriedade como correspondente a 2/3 do valor do imóvel), o real conteúdo econômico do direito por eles herdado correspondia efetivamente a 50% do valor do montante partilhável.

Ao quedarem inertes, acabaram por assumir que o conteúdo econômico do direito específico a eles atribuído extravasou as forças próprias do acervo hereditário, revelando-se imprescindível para a efetivação da partilha, nos termos em que proposta, que fosse acrescida à herança parte da fração ideal atribuível à viúva-meeira e, isso, por meio de cessão gratuita de direitos.

Importante considerar que os próprios herdeiros não negam que o direito específico a eles atribuído no plano de partilha acabou, in concreto, por superar as forças da herança.

Tanto que, a fim de sustentarem a versão apresentada na peça vestibular[3], sustentaram que a cessão de direitos realizada pela viúva-meeira representaria mera “renúncia abdicatória (pura e simples em favor do monte)” (e-fl. 288), o que atrairia a regra de não incidência prevista no art. 5º, inciso I, da LE nº 10.705/2000.

Artigo 5º – O imposto não incide:

I – na renúncia pura e simples de herança ou legado;

II – sobre o fruto e rendimento do bem do espólio havidos apos o falecimento do autor da herança ou legado;

III – sobre a importância deixada ao testamenteiro, a título de prêmio ou remuneração, até o limite legal.

Contudo, respeitados os entendimentos em sentido diverso[4], tem-se que os direitos da viúva-meeira e dos herdeiros são próprios, não se confundindo em absoluto, razão pela qual a renúncia pura operada por um ou por outro não leva jamais ao acréscimo no “todo partilhável” da parte renunciada.

Ora, ainda que provenientes de um mesmo acervo patrimonial indiviso (universalidade de direito[6]), a meação corresponde a um direito próprio de cada um dos cônjuges em caso de extinção da sociedade conjugal e equivale à fração ideal de metade (50%) dos bens integrantes do patrimônio do casal, observadas algumas exceções (arts. 1.667 e 1.668, do CC/2002).

Art. 1.667. O regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte.

Art. 1.668. São excluídos da comunhão:

I – os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;

II – os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva;

III – as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum;

IV – as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade;

V – Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659.

Cediço que, dentre as hipóteses que implicam a extinção da sociedade conjugal, encontra-se justamente a morte de um dos cônjuges (art. 1.571, inciso I, do CC/2002). E, neste caso, a universalidade de direito (patrimônio comum), aferível economicamente no momento do óbito de um dos cônjuges, dividir-se-á, em partes iguais: (i) na meação – direito próprio do cônjuge supérstite e (ii) no acervo hereditário – direito próprio daqueles que venham ser chamados a suceder o de cujus, titular da outra metade ideal (art. 1.829, do CC/2002).

Por representarem direitos próprios, isto é, titularizados por diferentes sujeitos (viúva meeira x herdeiros) e constituídos a partir de fatos geradores distintos (extinção da sociedade conjugal x sucessão hereditária), a renúncia pura e simples operada pela viúva-meeira não aproveita ao acervo hereditário e, da mesma forma, a renúncia pura e simples realizada pelos herdeiros não pode beneficiar a cônjuge supérstite.

Antes, em caso de renúncia pura e simples à herança (art. 1.810, do CC/2002[7]), o conteúdo econômico renunciado é devolvido exclusivamente à fração ideal representativa do acervo hereditário, beneficiando apenas a classe dos herdeiros e sem gerar interferência no conteúdo pecuniário reservado à meação.

Igualmente, eventual renúncia pura e simples aos direitos integrantes da meação, à vista da inexistência de outros sujeitos integrantes da mesma classe de beneficiários, acabaria por implicar verdadeira causa de extinção do direito meado, sem beneficiar em qualquer medida o acervo hereditário.

À luz destas premissas, para que a viúvameeira reverta validamente parte do conteúdo pecuniário integrante de sua meação em favor da classe dos herdeiros (e vice-versa), deverá observar a forma da cessão de direitos, que pode ocorrer tanto da forma gratuita (“renúncia translativa” ou doação) quanto da forma onerosa.

Sobre o tema, o ilustre civilista CRISTIANO CHAVES DE FARIAS leciona que:

“A consequência lógica e natural da renúncia de uma herança, portanto, é a inexistência de transmissão e, por conseguinte, a não incidência tributária.

Aliás, por conta disso, exige-se que o ato de renúncia seja puro e simples, não podendo ser equiparado à renúncia o ato pelo qual o titular abre mão da herança em favor de alguém (indevidamente rotulado como renúncia translativa, translatícia ou in favorem). Em tal hipótese, verdadeiramente, ocorre uma aceitação da herança, com posterior cessão gratuita de direitos, e não uma renúncia.”[8].

Na mesma linha, o professor FLÁVIO TARTUCE ratifica:

“(…) conforme se extrai da melhor doutrina, duas são as modalidades de renúncia à herança:

a) Renúncia abdicativa o herdeiro diz simplesmente que não quer a herança, havendo cessão pura e simples a todos os coerdeiros, o que equivale à renúncia. Em casos tais, não há incidência de Imposto de Transmissão Inter Vivos contra o renunciante.

b) Renúncia translativa quando o herdeiro cede os seus direitos a favor de determinada pessoa (in favorem). Como há um negócio jurídico de transmissão, incide o Imposto de Transmissão Inter Vivos, conforme entende a jurisprudência (TJSP, Agravo de Instrumento 218.709-4, São Paulo, 1.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Elliot Akel, j. 25.09.2001; TJSP, Agravo de Instrumento 208.959-1, São Paulo, Rel. Des. Márcio Martins Bonilha, j. 14.10.1993).”

Por estas razões, renovada a vênia aos respeitáveis entendimentos em sentido diverso, tem-se que, nos estritos termos do caso apresentado a este Tribunal “ad quem”, a renúncia à fração ideal de parte da meação própria da cônjuge supérstite operada em favor dos herdeiros e com o fim específico de viabilizar a eficácia da transmissão da nua propriedade dos bens partilháveis (cujo conteúdo econômico superava as forças exclusivas do acervo hereditário), caracteriza situação de “renúncia translativa” de direito, isto é, cessão gratuita/doação apta a ensejar o lançamento do Imposto de Transmissão Inter Vivos, na forma do art. 2º, inciso II, da LE nº 10.705/2000.

Aliás, esta mesma conclusão foi acolhida pelo C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp nº 1.196.992/MS (persuasive precedent), sob a Relatoria da eminente Ministra NANCY ANDRIGHI. Confirase:

SUCESSÕES. RECURSO ESPECIAL. MEAÇÃO. ATO DE DISPOSIÇÃO EM FAVOR DOS HERDEIROS. DOAÇÃO. ATO INTER VIVOS. FORMA. ESCRITURA PÚBLICA.

1. Discussão relativa à necessidade de lavratura de escritura pública para prática de ato de disposição da meação da viúva em favor dos herdeiros.

2. O ato para dispor da meação não se equipara à cessão de direitos hereditários, prevista no art. 1.793 do Código Civil, porque esta pressupõe a condição de herdeiro para que possa ser efetivada.

3. Embora o art. 1.806 do Código Civil admita que a renúncia à herança possa ser efetivada por instrumento público ou termo judicial, a meação não se confunde com a herança.

4. A renúncia da herança pressupõe a abertura da sucessão e só pode ser realizada por aqueles que ostentam a condição de herdeiro.

5. O ato de disposição patrimonial representado pela cessão gratuita da meação em favor dos herdeiros configura uma verdadeira doação, a qual, nos termos do art. 541 do Código Civil, far-se-á por Escritura Pública ou instrumento particular, sendo que, na hipótese, deve ser adotado o instrumento público, por conta do disposto no art. 108 do Código Civil.

6. Recurso especial desprovido.

Guardadas as peculiaridades dos objetos da presente demanda e do mencionado precedente jurisprudencial, de rigor a transcrição de excerto extraído do voto condutor, com o escopo de revelar as razões de decidir utilizadas pela Corte Superior:

“(…) O acórdão recorrido afirma a necessidade de escritura pública porque a ‘disposição da meação do cônjuge supérstite é ato de iniciativa inter vivos e não se confunde com a sucessão causa mortis. Ademais, a escritura pública é a forma prescrita pela lei como condição essencial para validade de alguns atos, e para tais, torna-se ele imprescindível, nos termos do art. 108 do CC’ (e-STJ fl. 90).

Aduz a recorrente, todavia, que não tem condições de arcar com o pagamento dos emolumentos cartorários necessários à lavratura de instrumento público para dispor da meação em favor dos herdeiros, e que há jurisprudência do TJ/SP admitindo a cessão da meação por termo judicial nos autos do inventário.

O acórdão paradigma apontado pela recorrente, de fato, reconheceu a possibilidade da cessão da meação se dar por termo nos autos, ao equipará-la, de certa maneira, à renúncia da herança.

Para corroborar sua conclusão, o TJ/SP faz remissão à lição de Euclides Benedito de Oliveira e Sebastião Luiz Amorim, no sentido de que ’embora inconfundível com a renúncia à herança, dela se aproxima ao ponto em que implica efetiva cessão de direitos, de modo que utilizáveis os mesmo instrumentos para sua formalização. Com efeito, o direito de cada herdeiro, a título de posse ou propriedade, sobre sua parte ideal na herança, antes da partilha é juridicamente equivalente ao do cônjuge sobrevivo sobre a metade ideal do patrimônio a partilhar’ (Inventários e Partilhas Direito das Sucessões, 16ªed., Leud: São Paulo, 2003, p. 64/65) (e-STJ fl. 19) (sem destaque no original).

Embora o art. 1.806 do Código Civil, de fato, admita que a renúncia à herança possa ser efetivada por instrumento público ou termo judicial, é relevante apontar uma sensível diferença entre os institutos: enquanto na herança, a posse ou propriedade dos bens do de cujus transmite-se aos herdeiros quando e porque aberta a sucessão (princípio do saisine), na meação, o patrimônio é de propriedade da viúva em decorrência do regime de bens do casamento, independe da abertura da sucessão, e pode ser objeto de ato de disposição pela viúva a qualquer tempo, seja em favor dos herdeiros ou de terceiros.

Em síntese, a renúncia da herança pressupõe a abertura da sucessão e a condição de herdeiro, situações que não se aplicam à viúva-meeira. Nas palavras de Francisco José Cahali e Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka:

Representando abdicação do direito à herança, só se admite a renúncia quando da abertura da sucessão, oportunidade em que nasce o direito hereditário. O repúdio prematuro, ou promessa de renúncia, ainda que formal, promovidos antes do falecimento, não tem validade jurídica, até porque implicariam em ilegal pacto sucessório” (Direito das Sucessões, 4ªed., São Paulo: RT, 2012, p. 89).

Assim, na hipótese, o ato de disposição patrimonial da recorrente, caracterizado como a renúncia da sua meação em favor dos herdeiros, não pode ser equiparada renúncia da herança.

Da mesma forma, ele não se confunde com a cessão de direitos hereditários, prevista no art. 1.793 do Código Civil, porque esta também pressupõe a condição de herdeiro do cedente. Note-se, por oportuno, que a própria cessão de direitos hereditários exige a lavratura de escritura pública para sua efetivação, não havendo porque se prescindir dessa formalidade no que tange à cessão da meação.

Com efeito, verifica-se que ato de disposição patrimonial pretendido pela recorrente, representado pela cessão gratuita da sua meação em favor dos herdeiros do falecido, configura uma verdadeira doação, inclusive para fins tributários, como, aliás, já foi consignado por esta Corte, no Ag 1165370, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 18.09.2009.

E a doação, por sua vez, nos termos do art. 541 do Código Civil, far-se-á por Escritura Pública ou instrumento particular, sendo que, na hipótese, deve ser adotado o instrumento público, por conta do disposto no art. 108 do Código Civil.

Embora seja compreensível a dificuldade da recorrente em arcar com o pagamento dos custos necessários à lavratura de uma escritura pública, perante o Tabelião, para poder transferir aos seus filhos a propriedade da metade do imóvel inventariado, que lhe pertence em razão da meação, não há possibilidade de se prescindir das formalidades expressamente previstas na legislação civil.”.

Por conseguinte, evidenciada a higidez do crédito tributário aqui impugnado (ITCMD, tendo por fato gerador a cessão gratuita de direitos operada pela viúvameeira em favor dos herdeiros), o caso é de provimento do apelo da FESP e de consequente reforma da r. sentença de primeiro grau para se julgar integralmente improcedente a demanda.

Diante da inversão da sucumbência, caberá à autora arcar com as despesas e custas do processo, bem como com os honorários advocatícios devidos ao Procurador Estadual, ora arbitrados, nos termos do art. 85, §3º, do CPC/2015, em 15% sobre o valor atribuído à causa, devidamente atualizado, respeitando-se os critérios de ponderação estatuídos nas alíneas do §2º, do art. 85, do CPC/2015, e já considerados os trabalhos desenvolvidos nesta fase cognitiva recursal (§11, do art. 85, do CPC/2015).

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso da FESP, de modo a reformar a r. sentença de primeiro grau, JULGANDO-SE INTEGRALMENTE IMPROCEDENTE a pretensão inicial da servidora, nos termos da fundamentação. Diante da inversão da sucumbência na demanda, caberá à autora arcar com as despesas e custas do processo, bem como com os honorários advocatícios devidos ao Procurador Estadual, ora arbitrados, nos termos do art. 85, §3º, do CPC/2015, em 15% sobre o valor atribuído à causa, devidamente atualizado, respeitando-se os critérios de ponderação estatuídos nas alíneas do §2º, do art. 85, do CPC/2015, e já considerados os trabalhos desenvolvidos nesta fase cognitiva recursal (§11, do art. 85, do CPC/2015).

PAULO BARCELLOS GATTI

RELATOR


Notas:

[1] ALEXANDRE, Ricardo, Direito Tributário Esquematizado, 7ª Ed., São Paulo: Método, 2013, pp. 573-574.

[2] (LF nº 6.015/73) Art. 204 – A decisão da dúvida tem natureza administrativa e não impede o uso do processo contencioso competente.

[3] Extrai-se da petição inicial: “Conforme as mesmas escrituras os requerentes nessa ação judicial estão identificados como herdeiros descendentes (filhos) do falecido Cediney Mauro Piva, este no caso autor da herança, e finalmente a pessoa de Clarice Aparecida Bertolo Piva na condição de viúva inventariante. Nas citadas escrituras foi renunciado pela viúva meeira e inventariante sua metade ideal em favor dos herdeiros e em contrapartida lhe foi reservado usufruto vitalício dos bens.” (e-fl. 02).

[4] Conferir, no sentido de se admitir como renúncia abdicatória aquela realizada pela viúva-meeira e não herdeira em favor do acervo hereditário, os seguintes julgamentos oriundos deste Tribunal de Justiça Estadual: (i) Agravo de Instrumento nº 2245929-14.2018.8.26.0000, 5ª Câmara da Seção de Direito Público, Rel. Des. FRANCISCO BIANCO, j. 04.02.2019; (ii) Agravo de Instrumento nº 2150913-38.2015.8.26.0000, 8ª Câmara da Seção de Direito Privado, Rel. Des. SALLES ROSSI, j. 17.08.2016 e (iii) Agravo de Instrumento nº 2026891-68.2016.8.26.0000, 2ª Câmara da Seção de Direito Público, Rel. Des. ALVARO PASSOS, j. 31.05.2016.

[6] (CC/2002) Art. 91. Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico.

[7] Art. 1.810. Na sucessão legítima, a parte do renunciante acresce à dos outros herdeiros da mesma classe e, sendo ele o único desta, devolve-se aos da subsequente.

[8] FARIAS, Cristiano Chaves de. Sucessões. Coleção curso de direito civil; v. 7, São Paulo: Atlas, 2015, p. 170. – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1001122-63.2018.8.26.0531 – Santa Adélia – 4ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Paulo Barcellos Gatti – DJ 16.12.2019

Fonte: INR Publicações

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Sinduscon divulga tabelas de Custo Unitário Básico no Estado de São Paulo – Referência Dezembro de 2020.

06/01/2020

a) Custo Unitário Básico no Estado de São Paulo*, Dezembro de 2020

a.1) Projetos – Padrões Residenciais – R$/m²

  Padrão Baixo Padrão Normal Padrão Alto
R-1 1.408,99 1.746,79 2.086,75
PP-4 1.282,41 1.640,26
R-8 1.221,68 1.433,00 1.672,90
PIS 954,26
R-16 1.388,74 1.810,68

(*) Conforme Lei 4.591 de 16 de dezembro de 1964 e disposto na NBR 12.721 da ABNT. Na formação do Custo Unitário Básico não foram incluídos os itens descritos na seção 8.3.5 da NBR 12.721/06

a.2) Projetos – Padrões Comerciais – R$/m²

CAL (comercial andar livre), CSL (comercial – salas e lojas), GI (galpão industrial) e RP1Q (residência popular)

  Padrão Normal Padrão Alto
CAL – 8 1.655,06 1.750,66
CSL – 8 1.433,85 1.542,86
CSL – 16 1.908,61 2.051,46

a.3) Projetos – Padrão Galpão Industrial (GI) E Residência Popular (RP1Q) – R$/m²

RP1Q 1.553,33
GI 807,91

(*) Conforme Lei 4.591 de 16 de dezembro de 1964 e disposto na NBR 12.721 da ABNT. Na formação do Custo Unitário Básico não foram incluídos os itens descritos na seção 8.3.5 da NBR 12.721/06

b) Custo Unitário Básico no Estado de São Paulo, Dezembro de 2020 (Desonerado**)

b.1) Projetos – Padrões Residenciais – R$/m²

  Padrão Baixo Padrão Normal Padrão Alto
R-1 1.316,24 1.616,19 1.945,02
PP-4 1.204,26 1.524,81
R-8 1.148,25 1.329,11 1.563,34
PIS 891,10
R-16 1.288,75 1.687,55

(*) Conforme Lei 4.591 de 16 de dezembro de 1964 e disposto na NBR 12.721 da ABNT. Na formação do Custo Unitário Básico não foram incluídos os itens descritos na seção 8.3.5 da NBR 12.721/06

b.2) Projetos – Padrões Comerciais – R$/m²

CAL (comercial andar livre), CSL (comercial – salas e lojas), GI (galpão industrial) e RP1Q (residência popular)

  Padrão Normal Padrão Alto
CAL – 8 1.538,96 1.633,46
CSL – 8 1.329,39 1.435,59
CSL – 16 1.769,58 1.908,65

b.3) Projetos – Padrão Galpão Industrial (GI) E Residência Popular (RP1Q) – R$/m²

RP1Q 1.427,62
GI 749,82

(*) Conforme Lei 4.591 de 16 de dezembro de 1964 e disposto na NBR 12.721 da ABNT. Na formação do Custo Unitário Básico não foram incluídos os itens descritos na seção 8.3.5 da NBR 12.721/06

(**) Nota técnica Tabela do CUB/m² desonerado

Os valores do Custo Unitário Básico (CUB/m²) presentes nesta tabela foram calculados e divulgados para atender ao disposto no artigo 7º da Lei 12.546/11, alterado pela Lei 12.844/13 que trata, entre outros, da desoneração da folha de pagamentos na Construção Civil.

Eles somente podem ser utilizados pelas empresas do setor da Construção Civil cuja atividade principal (assim considerada aquela de maior receita auferida ou esperada) esteja enquadrada nos grupos 412,432,433 e 439 da CNAE 2.0.

Salienta-se que eles não se aplicam às empresas do setor da Construção Civil cuja atividade principal esteja enquadrada no grupo 411 da CNAE 2.0 (incorporação de empreendimentos imobiliários).

A metodologia de cálculo do CUB/m² desonerado é a mesma do CUB/m² e obedece ao disposto na Lei 4.591/64 e na ABNT NBR 12721:2006. A diferença diz respeito apenas ao percentual de encargos sociais incidentes sobre a mão de obra. O cálculo do CUB/m² desonerado não considera a incidência dos 20% referentes a previdência social, assim como as suas reincidências.

Qualquer dúvida sobre o cálculo deste CUB/m² entrar em contato com o setor de economia do Sinduscon-SP, pelo e-mail secon@sindusconsp.com.br.

Fonte: INR Publicações

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TJ/RS: Judiciário gaúcho tem horário especial nos meses de janeiro e fevereiro

06/01/2020

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O Presidente do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Desembargador Carlos Eduardo Zietlow Duro, estabeleceu, através da Ordem de Serviço n° 004/2019-P, a realização de horário especial nos serviços auxiliares do Tribunal de Justiça e no 1° grau de jurisdição, durante os meses de janeiro e fevereiro de 2020.

Nas segundas-feiras, o expediente será das 12h às 19h, e nas sextas-feiras, das 8h às 15h, de forma ininterrupta. Mantendo-se os respectivos serviços jurisdicionais sob regime de plantão, e sem prejuízo das audiências já designadas.

Nas sextas-feiras, o intervalo para almoço será de 30 minutos, mediante revezamento, a critério das chefias.

Na Quarta-Feira de Cinzas (26/02/20), o horário do expediente será das 12h às 19h, de forma ininterrupta, mantendo-se os respectivos serviços jurisdicionais sob regime de plantão, e sem prejuízo das audiências já designadas.

Acesse aqui a OS n° 004/2019-P.

Fonte: INR Publicações

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