Recurso Administrativo – Registro de Imóveis – Pedido de providências – Prenotação de título – Vencimento do prazo de trinta dias de seu lançamento no Livro Protocolo – Impossibilidade de prorrogação dos efeitos da prenotação fora das hipóteses legais – Princípio da prioridade – Recurso não provido, com determinação.


  
 

Número do processo: 1002102-32.2016.8.26.0223

Ano do processo: 2016

Número do parecer: 273

Ano do parecer: 2018

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1002102-32.2016.8.26.0223

(273/2018-E)

Recurso Administrativo – Registro de Imóveis – Pedido de providências – Prenotação de título – Vencimento do prazo de trinta dias de seu lançamento no Livro Protocolo – Impossibilidade de prorrogação dos efeitos da prenotação fora das hipóteses legais – Princípio da prioridade – Recurso não provido, com determinação.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso administrativo interposto por Paulo Roberto de Oliveira Bromerchenkel contra decisão do MM. Juiz Corregedor Permanente da Oficial do Registro de Imóveis de Guarujá/SP, que julgou improcedente o pedido de providências e indeferiu o pretendido restabelecimento da prioridade da prenotação n° 363.037. Alega o recorrente, em síntese, que o próprio substituto da registradora reconheceu que houve equívoco ao formular nota devolutiva no final do expediente do último dia do prazo da prenotação. Entende que, ao deixar de prorrogar a prenotação n° 363.037, de 23.12.2015, de forma a possibilitar o cumprimento das novas exigências, ou então efetuar o registro e depois inserir a profissão de um dos doadores, a registradora lhe causou prejuízos em relação ao planejamento sucessório familiar, eis que a doação acabou sendo registrada posteriormente à averbação de arrolamento fiscal, prenotado sob n° 363.229, em 04.01.2016. Afirma que o MM. Juiz Corregedor Permanente reconheceu o equívoco da Oficial do Registro de Imóveis, mas indeferiu o registro da escritura de doação antes da averbação do arrolamento fiscal, como requerido.

Remetidos os autos à D. Procuradoria de Justiça, sobreveio parecer pelo provimento do recurso.

É o relatório.

Opino.

A despeito dos argumentos apresentados pelo recorrente, penso que o recurso não comporta provimento.

Assim se afirma, pois o recorrente apresentou a registro perante a Oficial de Registro de Imóveis de Guarujá, em 23.12.2015, escritura de doação, prenotada naquela serventia extrajudicial sob n° 363.037 (fls. 04). O título foi positivamente qualificado, sendo o valor correspondente ao registro pago em 13.01.2016. Contudo, depois disso, foi expedida nota de devolução datada de 22.01.2016 (fls. 06). O recorrente, então, atendeu às exigências da registradora no primeiro dia útil subsequente, ou seja, em 25.01.2016, quando já transcorrido o trintídeo da prenotação n° 363.037, ensejando assim nova prenotação sob n° 363.740, realizada naquela mesma data.

Ocorre que, em data anterior, houve prenotação dos títulos referentes ao arrolamento fiscal de partes ideais do bem (prenotações nºs 363.229, 363.233 e 363.234, todas de 04.01.2016), ensejando as averbações lançadas na matrícula n° 85.839 daquela serventia, em 25.01.2016 (AV.s nºs 07, 08, 09) que, assim, antecederam o registro da escritura de doação (agora prenotada sob n° 363.740, em 25.01.2016 – R.s 10, 11, 12 e 13, datados de 11.02.2016).

A pretensão do recorrente, portanto, esbarra no princípio da anterioridade, cuja principal finalidade é evitar conflito de títulos contraditórios, que são aqueles incompatíveis entre si ou reciprocamente excludentes, referentes ao mesmo imóvel. A prioridade se dá conforme o protocolo do título perante o Registro de Imóveis, segundo sua ordem de ingresso. Na lição de Afrânio de Carvalho, “o princípio da prioridade significa que, num concurso de direitos reais sobre um imóvel, estes não ocupam todos o mesmo posto, mas se graduam ou classificam por uma relação de precedência fundada na ordem cronológica do seu aparecimento: prior tempore potior jure. Conforme o tempo em que surgirem, os direitos tomam posição no registro, prevalecendo os anteriores estabelecidos sobre os que vierem depois” (“Registro de Imóveis”, 4ª ed., Editora Forense, 1998, p. 181).

A propósito, os arts. 182, 183 e 174 da Lei 6.015/73 dispõem, respectivamente:

Art. 182 Todos os títulos tomarão, no Protocolo, o número de ordem que lhes competir em razão da sequência rigorosa de sua apresentação.

Art. 183 Reproduzir-se-á, em cada título, o número de ordem respectivo e a data de sua prenotação.

Art. 174 O livro n° 1 – Protocolo – servirá para apontamento de todos os títulos apresentados diariamente, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 12 desta Lei.

De seu turno, dispõem os arts. 11 e 12 da mesma lei que:

Art. 11. Os oficiais adotarão o melhor regime interno de modo a assegurar às partes a ordem de precedência na apresentação dos seus títulos, estabelecendo-se, sempre, o número de ordem geral.

Art. 12. Nenhuma exigência fiscal, ou dúvida, obstará a apresentação de um título e o seu lançamento do Protocolo com o respectivo número de ordem, nos casos em que da precedência decorra prioridade de direitos para o apresentante.

Parágrafo único. Independem de apontamento no Protocolo os títulos apresentados apenas para exame e cálculo dos respectivos emolumentos.

Daí porque é possível concluir que todos os títulos apresentados devem ser obrigatoriamente lançados no Livro de Protocolo e que a ordem de apresentação, mediante atribuição de um número, deve ser rigorosamente respeitada. A finalidade é dar publicidade à situação jurídica que possibilita a atribuição dos efeitos que o ordenamento jurídico lhes concede, gerando direitos que irão repercutir na transmissão ou oneração dos imóveis. Ainda lembrando os ensinamentos de Afrânio de Carvalho, cumpre ressaltar que “a sua caracterização é originariamente registral, pois se funda na ordem cronológica de apresentação e prenotação dos títulos no protocolo, sendo irrelevante a ordem cronológica de sua feitura ou instrumentalização, vale dizer, a sequência da data dos títulos. A ordem de apresentação, comprovada pela numeração sucessiva do protocolo, firma, pois, a posição registral do título relativamente a qualquer outro que já esteja ou venha apresentar-se no registro. Se essa posição lhe assegura prioridade, correlatamente lhe assegurará a inscrição, contanto que o resultado final do exame da legalidade lhe seja favorável” (ob. cit., pp. 182/183).

Por conseguinte, as averbações de arrolamento fiscal tinham preferência sobre o registro da escritura de doação, na medida em que cessados os efeitos da prenotação n° 363.037 pelo vencimento do prazo de trinta dias de seu lançamento no Livro Protocolo.

Nesse sentido, dispõem as Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, em seu Capítulo XX, Seção III, Subseção III:

37. O número de ordem determinará a prioridade do título.

(…)

39. No caso de prenotações sucessivas de títulos contraditórios ou excludentes, criar-se-á uma fila de precedência. Cessados os efeitos da prenotação, poderá retornar à fila, mas após os outros, que nela já se encontravam no momento da cessação.

(…)

47. Cessarão automaticamente os efeitos da prenotação, salvo prorrogação por previsão legal ou normativa, se, decorridos 30 (trinta) dias do seu lançamento no livro protocolo, o título não tiver sido registrado por omissão do interessado em atender as exigências legais. Na contagem do prazo exclui-se o primeiro e inclui-se último dia, não se postergando os efeitos para além da data final, ainda que esta ocorra em sábado, domingo ou feriado.

47.1. Será prorrogado o prazo da prenotação nos casos dos artigos 189, 198 e 260 da Lei n° 6.015/73 e artigo 18 da Lei n° 6.766/79, bem como nos casos de procedimento de retificação administrativa bilateral na forma do artigo 213, II, da Lei n° 6.015/73, de regularização fundiária e de registro dos títulos dela decorrentes, quando houver expedição de notificação, publicação de edital, audiência de conciliação e remessa ao juízo corregedor permanente para decidir impugnação.

47.2. Será também prorrogado o prazo da prenotação se a protocolização de reingresso do título, com todas as exigências cumpridas, der-se na vigência da força da primeira prenotação.

Destarte, como a protocolização de reingresso do título apresentado pelo recorrente, no caso, não ocorreu na vigência da força da primeira prenotação, inevitável a cessação dos efeitos desta, em especial no tocante à prioridade para ingresso na tábua registral. Por conseguinte, não havia outra alternativa à oficial registradora a não ser realizar as averbações de arrolamento fiscal, prenotadas sucessivamente no Livro Protocolo da serventia.

Disso resulta que eventuais prejuízos suportados pelo recorrente no episódio, com o registro da escritura de doação posteriormente às averbações questionadas, não podem ser resolvidos pela pretendida prorrogação do prazo da prenotação n° 363.037, por absoluta falta de previsão legal nesse sentido.

Veja-se, por oportuno, que as normas acima referidas, em que previstas hipóteses de prorrogação do prazo de prenotação, são de interpretação estrita, de forma que não comportam aplicação analógica ou extensiva para abranger situações que não estejam expressamente disciplinadas.

Nesse aspecto, há que ser mantida a decisão proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente, sob pena de se configurar indesejável ofensa ao princípio da prioridade.

No mais, é preciso consignar que, tal como disposto no Capítulo XX, Seção III, Subseção III, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça:

40. E dever do Registrador proceder ao exame exaustivo do título apresentado. Havendo exigências de qualquer ordem, deverão ser formuladas de uma só vez, por escrito, de forma clara e objetiva, em formato eletrônico ou papel timbrado do cartório, com identificação e assinatura do preposto responsável, para que o interessado possa satisfazê-las ou requerer a suscitação de dúvida ou procedimento administrativo.

40.1. A nota de exigência deve conter a exposição das razões e dos fundamentos em que o Registrador se apoiou para qualificação negativa do título, vedadas justificativas de devolução com expressões genéricas, tais como “para os devidos fins”, “para fins de direito” e outras congêneres.

40.2. Ressalva-se a emissão de segunda nota de exigência, exclusivamente, na hipótese de, cumpridas as exigências primitivamente formuladas, surgirem elementos que não constavam do título anteriormente qualificado ou em razão do cumprimento parcial das exigências formuladas anteriormente.

(…)

43. O prazo para exame, qualificação e devolução do título, com exigências ou registro, será de 15 (quinze) dias, contados da data em que ingressou na serventia.

43.1. O prazo acima ficará reduzido a 10 (dez) dias, se o título for apresentado em documento eletrônico estruturado em XML (Extensible Markup Language), com especificações definidas por portaria da Corregedoria Geral da Justiça.

43.2. Reapresentado o título com a satisfação das exigências, o registro será efetivado nos 5 (cinco) dias seguintes.

43.3. Caso ocorram dificuldades na qualificação registral em razão da complexidade, novidade da matéria, ou volume de títulos apresentados em um mesmo dia, o prazo poderá ser prorrogado, somente por uma vez, até o máximo de 10 (dez) dias, desde que emitida pelo Oficial nota escrita e fundamentada a ser arquivada, microfilmada ou digitalizada com a documentação de cada título.

43.4. As disposições acima não se aplicam às hipóteses de prazos previstos em lei ou decisão judicial.

Nesse cenário, considerando que a própria Oficial registradora reconhece ter havido equívoco na qualificação do título e descumprimento dos prazos previstos para registro, bem como a cobrança de emolumentos durante o prazo de qualificação, além da emissão de nota devolutiva apenas ao final dos trinta dias de vigência do prazo de prenotação (fls. 36/40) e a não observância da alteração, para a base de cálculo dos emolumentos, do valor venal do imóvel para o ano de 2016, data da nova prenotação (fls. 10/12), deverá ser instaurado procedimento próprio pelo MM. Juiz Corregedor Permanente, para investigação mais detalhada da situação fática e apuração de eventual falta disciplinar.

Diante do exposto, o parecer que respeitosamente submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de negar provimento ao recurso e determinar a abertura de procedimento próprio, pelo MM. Juiz Corregedor Permanente, para apuração disciplinar dos fatos acima apontados.

Sub censura.

São Paulo, 10 de julho de 2018.

STEFÂNIA COSTA AMORIM REQUENA

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer da MM. Juíza Assessora da Corregedoria, por seus fundamentos que adoto, e nego provimento ao recurso interposto. Ainda, determino ao MM. Juiz Corregedor Permanente a abertura de procedimento próprio para apuração disciplinar dos fatos relativos ao reconhecido equívoco, por parte da Oficial, na qualificação do título e descumprimento dos prazos previstos para registro, bem como a cobrança de emolumentos durante o prazo de qualificação, além da emissão de nota devolutiva apenas ao final dos trinta dias de vigência do prazo de prenotação e a não observância da alteração, para a base de cálculo dos emolumentos, do valor venal do imóvel para o ano de 2016, data da nova prenotação, deverá ser instaurado procedimento próprio pelo MM. Juiz Corregedor Permanente, para investigação mais detalhada dos fatos e apuração de eventual falta disciplinar. A abertura do procedimento para a adoção de medidas disciplinares e as providências nele determinadas deverão ser comunicadas à Corregedoria Geral da Justiça no prazo de 15 dias contados do retorno dos autos à Comarca de origem, para acompanhamento. Estabeleço o prazo de 60 dias para conclusão da apuração. Publique-se. São Paulo, 11 de julho de 2018. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça – Advogado: PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA BROMERCHENKEL, OAB/SP 337.166 (em causa própria).

Diário da Justiça Eletrônico de 16.07.2018

Decisão reproduzida na página 122 do Classificador II – 2018

Fonte: INR Publicações

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