CSM: Registro de Imóveis – Escritura pública de compra e venda e cessão de direitos – Cessões sucessivas – Comunhão universal de bens – Situação de universalidade, com necessidade de que seja inventariada a totalidade do patrimônio comum – Recurso desprovido


  
 

Apelação n° 1035326-48.2017.8.26.0506

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1035326-48.2017.8.26.0506
Comarca: RIBEIRÃO PRETO

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 1035326-48.2017.8.26.0506

Registro: 2019.0000718914

ACÓRDÃO – Texto selecionado e originalmente divulgado pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1035326-48.2017.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em que é apelante SAID GAIVOTAS EMPREENDIMENTOS SPE LTDA, é apelada 2º OFICIAL DE REGISTROS DE IMÓVEIS DA COMARCA DE RIBEIRÃO PRETO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida e afastar o óbice apresentado pelo registrador, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 27 de agosto de 2019.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1035326-48.2017.8.26.0506

Apelante: Said Gaivotas Empreendimentos Spe Ltda

Apelado: 2º Oficial de Registros de Imóveis da Comarca de Ribeirão Preto

VOTO Nº 37.829

Registro de imóveis – Registro de loteamento – Óbice ofertado pelo Oficial com fulcro no art. 18, § 2º, da Lei nº 6.766/79 – Acordo homologado nos autos da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público contra um dos sócios da loteadora – Inviabilidade, no mais, de desqualificação do título por questões que merecem ser discutidas, se o caso, na esfera jurisdicional – Dúvida improcedente – Recurso provido.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Said Gaivotas Empreendimentos SPE Ltda. e pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra a r. sentença[1] que, deixando de homologar acordo entabulado entre os apelantes, julgou procedente a dúvida suscitada pelo 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Ribeirão Preto/SP. Sustentam, em síntese, que os óbices apresentados ao registro do loteamento estão superados, pois: a) na ação civil pública nº 0029876-35.2003.8.26.0506, já em fase de execução, foi homologado acordo celebrado com o Ministério Público, com a consequente aprovação do parcelamento do solo na gleba objeto daquele feito e regularização de toda a documentação perante os órgãos competentes; b) o inquérito civil instaurado sob nº 14.0702.0000007/2017-2 foi arquivado; c) na ação civil pública ambiental nº 1012954-76.2015.8.26.0506 foi cassada a liminar deferida, tendo o Ministério Público se mostrado satisfeito, posteriormente, com a área verde do loteamento em questão, eis que destinados 53,25% da área total do imóvel; e d) na ação popular nº 1003244-61.2017.8.26.0506 foi liberado o início das obras, bem como a comercialização dos lotes. Entendem, assim, que inexiste risco algum ao empreendimento, razão pela qual não subsistem motivos para negativa do registro do loteamento[2].

A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso[3].

O pedido de atribuição de efeito ativo ao recurso foi negado.

É o relatório.

A apelante Said Gaivotas Empreendimentos SPE Ltda., ao requerer o registro do loteamento denominado “Parque das Gaivotas”, deparou-se com a seguinte exigência formulada pelo Oficial:

“Em observância aos itens III e IV do artigo 18 da Lei nº 6.766/1979, deverão ser apresentados documentos comprobatórios de que o processo cível nº 0029876-35.2003.8.26.0506, em trâmite perante a 5ª Vara Cível desta Comarca, não coloca em risco o presente empreendimento”.

Inconformada, a interessada requereu a suscitação de dúvida, que foi julgada procedente para manter a qualificação negativa formulada pelo Oficial. Agora, conjuntamente com o Ministério Público, defende a possibilidade do registro.

O procedimento de dúvida é reservado à análise da discordância do apresentante com os motivos que levaram à recusa do registro do título. De seu julgamento, decorrerá a manutenção da recusa, com cancelamento da prenotação, ou a improcedência da dúvida, que terá como consequência a realização do registro (art. 203, inciso II, da Lei nº 6.015/73), não havendo espaço, portanto, para a pretendida homologação de acordo nestes autos.

Contudo, respeitada a posição contrária, o recurso comporta provimento. Sobre o tema, dispõe a Lei n.º 6.766/79:

“Art. 18. Aprovado o projeto de loteamento ou de desmembramento, o loteador deverá submetê-lo ao registro imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de caducidade da aprovação, acompanhado dos seguintes documentos:

(…)

§ 2º – A existência de protestos, de ações pessoais ou de ações penais, exceto as referentes a crime contra o patrimônio e contra a administração, não impedirá o registro do loteamento se o requerente comprovar que esses protestos ou ações não poderão prejudicar os adquirentes dos lotes. Se o Oficial do Registro de Imóveis julgar insuficiente a comprovação feita, suscitará a dúvida perante o juiz competente”.

Ocorre que a ação civil pública referida pelo Oficial (processo nº 0029876-35.2003.8.26.0506), ajuizada contra um dos sócios da apelante, não se apresenta como razão para impedir o registro do loteamento.

Assim se afirma, pois os documentos trazidos aos autos, corroborados pela manifestação do Ministério Público[4], evidenciam que, nos termos do acordo celebrado naquele feito e devidamente homologado em juízo[5], os proprietários do imóvel matriculado sob nº 73.651 e sócios da loteadora comprometeram-se a reflorestar a APP e restaurar a reserva legal, estando todas as obras de compensação ou infraestrutura garantidas por apólices de seguros-garantias.

A existência de ações pessoais, como é sabido, não impede o registro do loteamento se o requerente comprovar que essa ação não pode prejudicar os adquirentes dos lotes (art. 18, § 2º, da Lei n° 6.766/79). Além disso, o item 181 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça assim dispõe:

“Item 181 – As certidões de ações pessoais e penais, inclusive da Justiça Federal, e as de protestos devem referir-se ao loteador e a todos aqueles que, no período de 10 (dez) anos, tenham sido titulares de direitos reais sobre o imóvel; serão extraídas, outrossim, na comarca da situação do imóvel e, se distintas, naquelas onde domiciliados o loteador e os antecessores abrangidos pelo decênio, exigindo-se que as certidões tenham sido expedidas há menos de 6 (seis) meses.”

No caso concreto, a possibilidade de descumprimento do acordo celebrado com o Ministério Público, nos autos da ação civil pública referida pelo Oficial, não se mostra suficiente para impedir o registro do loteamento, especialmente porque, ao menos por ora, a extensão do dano a ser reparado já está garantida, o que afasta a existência de risco aos futuros adquirentes dos lotes.

No mais, as outras ações referidas nos autos, como a Ação Popular em curso perante a 1ª Vara da Fazenda Pública de Ribeirão Preto (processo nº 1003244-61.2017.8.26.0506), a Ação Civil Pública Ambiental proposta contra a Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto (processo nº 1012954-76.2015.8.26.0506) e o Inquérito Civil instaurado pelo Ministério Público (autos nº 14.0702.0000007/2017-2), não configuram, igualmente, óbice ao registro do loteamento.

O inquérito civil instaurado sob nº 140702.0000007/2017-2 foi arquivado[6].

Na ação civil pública ambiental (processo nº 1012954-76.2015.8.26.0506) foi cassada a liminar deferida e, ao final, o pedido foi julgado improcedente[7].

Outrossim, ao que consta dos autos da Ação Popular (processo nº 1003244-61.2017.8.26.0506[8]) e da Ação Civil Pública ambiental (processo nº 1012954-76.2015.8.26.0506[9]), não foram proferidas decisões que possam configurar óbice ao registro do loteamento.

É preciso lembrar que não há espaço, em sede administrativa, para qualquer exame quanto ao cumprimento ou não do termo de compromisso assinado pelos sócios, matéria que deverá, pois, ser acompanhada pelo Ministério Público e, se o caso, questionada judicialmente. Da mesma forma, eventual alegação de vício formal ou material que possa recair sobre os atos administrativos somente poderá ser analisada na via judicial, com o devido processo legal, inclusive quanto à existência ou não de dano ambiental.

E ainda que existente o risco de inversão das decisões até então proferidas nas ações propostas[10], presume-se que essa possibilidade foi sopesada pelos magistrados. O entendimento que ora se adota permite o afastamento do óbice ao registro, certo que a posição contrária, ao revés, levaria à paralisação de um empreendimento imobiliário, até o trânsito em julgado, em virtude de qualquer demanda que viesse a ser proposta, retirando-se do juiz da causa a possibilidade de afastar esse entrave.

A propósito, no campo administrativo é cabível, apenas, o exame dos requisitos previstos na Lei n° 6.766/79 e demais atos legais ou normativos, do ponto de vista estritamente registral. Em outras palavras, verificar se o requerimento apresentado comporta qualificação positiva e ingresso no fólio real.

Estando o plano de loteamento aprovado pelos órgãos do Poder Executivo e não se tratando de matéria estritamente vinculada ao âmbito registral, não cabe ao registro de imóveis, e nem mesmo a este C. Conselho Superior da Magistratura, qualquer juízo valorativo nesta seara.

Não bastasse, o patrimônio apresentado pela apelante[11], até o momento, supera em muito o valor previsto no cronograma físico-financeiro trazido aos autos[12].

Diante do exposto, dou provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida e afastar o óbice apresentado pelo registrador.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: INR Publicações

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