Recurso de Revista interposto na vigência da Lei nº 13.015/2014 – Cartório extrajudicial – Transferência de titularidade – Ausência de prestação de serviços ao novo titular – Sucessão trabalhista não configurada – Na hipótese, o Tribunal Regional registra ser incontroverso que o reclamante prestou serviços ao cartório até o término da delegação interina do Sr. Gerson Francisco Olegário da Costa, sendo dispensado no dia 7/7/2015, ou seja, um dia antes da assunção da delegação do novo titular, ora recorrente – A jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que o reconhecimento de sucessão trabalhista, em se tratando de cartório extrajudicial, pressupõe a continuidade da prestação de serviços em favor do novo titular, o que não ocorreu na espécie – Assim, o entendimento do Tribunal Regional encontra-se em dissonância com a jurisprudência desta Corte – Precedentes da SBDI-1/TST – Recurso de revista conhecido e provido.


  
 

A C Ó R D Ã O – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

(1ª Turma)

RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. CARTÓRIO EXTRAJUDICIAL. TRANSFERÊNCIA DE TITULARIDADE. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AO NOVO TITULAR. SUCESSÃO TRABALHISTA NÃO CONFIGURADA.

Na hipótese, o Tribunal Regional registra ser incontroverso que o reclamante prestou serviços ao cartório até o término da delegação interina do Sr. Gerson Francisco Olegário da Costa, sendo dispensado no dia 7/7/2015, ou seja, um dia antes da assunção da delegação do novo titular, ora recorrente. A jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que o reconhecimento de sucessão trabalhista, em se tratando de cartório extrajudicial, pressupõe a continuidade da prestação de serviços em favor do novo titular, o que não ocorreu na espécie. Assim, o entendimento do Tribunal Regional encontra-se em dissonância com a jurisprudência desta Corte. Precedentes da SBDI-1/TST.

Recurso de revista conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-1818-87.2015.5.02.0031, em que é Recorrente ANDERSON HENRIQUE TEIXEIRA NOGUEIRA e são Recorridos FERNANDO RAMOS e 2° TABELIÃO DE NOTAS.

O Tribunal Regional da 2ª Região, mediante acórdão às fls. 351-360, complementado às fls. 398-399, na fração de interesse, negou provimento ao recurso ordinário interposto pelo reclamado no tocante ao tópico “Da ausência de sucessão”.

O reclamado interpõe recurso de revista, às fls. 403-447, com amparo no art. 896, “a” e “c”, da CLT, admitido às fls. 512-516.

O recorrido-reclamante apresentou contrarrazões ao recurso de revista às fls. 518-529.

Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 95, § 2º, II, do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

1. CONHECIMENTO

O recurso de revista é tempestivo (fls. 400 e 403), tem representação regular (fl. 91) e está satisfeito o preparo (fls. 330, 331 e 510).

Atendidos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, passa-se ao exame dos intrínsecos do recurso de revista.

1.1. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

Deixo de analisar a nulidade do acórdão do Tribunal Regional por negativa de prestação jurisdicional com fundamento no art. 282, § 2º, do NCPC.

NÃO CONHEÇO.

1.2. CARTÓRIO EXTRAJUDICIAL. TRANSFERÊNCIA DE TITULARIDADE. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AO NOVO TITULAR. SUCESSÃO TRABALHISTA

O Tribunal Regional, na fração de interesse, negou provimento ao recurso ordinário interposto pelo reclamado, aos seguintes fundamentos:

Da ausência de sucessão

Insurge-se o recorrente em face da r. sentença de origem que, reconhecendo a ocorrência de sucessão trabalhista, condenou o reclamado ao pagamento das verbas rescisórias descritas à fl.238, verso.

Sem razão o inconformismo do recorrente.

Com a promulgação da CRFB de 1988, os serviços notariais e de registro passaram a ser exercidos em caráter privado, mediante delegação do Poder Público, como se extrai do artigo 236 da Carta Magna:

Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em  caráter privado, por delegação do Poder Público.

§ 1° – Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.

§ 2° – Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.

§ 3º – O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.

Por outro lado, a Lei n° 8.935/1994, que regulamenta o artigo 236 da CRFB/88, estabelece que o ingresso na atividade notarial e de registro resulta de ato administrativo complexo, tornando-se perfeito com a delegação do Poder Público, observados os requisitos dos artigos 14 e 15, ora trazidos à colação:

Art. 14. A delegação para o exercício da atividade notarial e de  registro depende dos seguintes requisitos:

I – habilitação em concurso público de provas e títulos;

II – nacionalidade brasileira;

III – Capacidade civil;

IV – quitação com as obrigações eleitorais e militares;

V – diploma de bacharel em direito;

VI – verificação de conduta condigna para o exercício da profissão.

Art. 15. Os concursos serão realizados pelo Poder Judiciário, com a participação, em todas as suas fases, da Ordem dos Advogados do Brasil, do. Ministério Público, de um notário e de um registrador.

§ 1° O concurso será aberto com a publicação de edital, dele constando os critérios de desempate.

§ 2° Ao concurso público poderão concorrer candidatos não bacharéis em direito que tenham completado, até a data da primeira publicação do edital do concurso de provas e títulos, dez anos de exercício em serviço notarial ou de registro.

Neste passo, cumpre, portanto, analisar se a alteração na titularidade do cartório caracteriza sucessão por si só, independentemente da prestação de serviço ao novo oficial, tema objeto de cizânia jurisprudencial e doutrinária.

Pois bem.

Malgrado a natureza peculiar dos serviços notarias e de registro exercidos por delegação do Poder Público, os princípios justrabalhistas somados às disposições dos artigos 10 e 448 da CLT conduzem à ilação de que é possível, sim, o reconhecimento da sucessão quando da mudança da titularidade do tabelionato, tendo em vista que o novo titular assume o risco, a administração e a gerência do serviço que lhe é delegado em caráter privado.

Destarte, a transferência da unidade econômico-jurídica, que integra o estabelecimento, caracteriza a sucessão trabalhista, restando, pois, resguardados direitos porventura sonegados no curso do pacto laboral daqueles empregados que certamente contribuíram para a apuração do resultado positivo, bem como ao sucesso da atividade econômica.

Nada obstante o recorrente alegue que os notários não praticam atos negociais e que atuam por delegação do Poder Público, não há como negar que os serviços notariais e de registro possuem nítida feição econômica, pois, embora sejam outorgados pelo Estado a um particular, este último exerce a atividade notarial com finalidade lucrativa e, dessa forma, equipara-se a qualquer outro empregador.

O fato de o particular receber a delegação mediante prévia aprovação em concurso público de provas e título não altera a conclusãb acima. Importante, pontuar que o grande interesse dos candidatos em relação aos serviços notariais e de registro se dá, em grande parte, pela rentabilidade financeira auferida pelos respectivos cartórios. É irrelevante, assim, o modo pelo qual se deu a transferência de titularidade, ou seja, a alteração subjetiva patronal.

Ainda que assim não fosse, o documento de fl.23 comprova que o reclamante foi contratado e registrado pelo 2° Tabelião de Notas de São Paulo, razão pela qual o autor, inclusive, o nomeou como parte reclamada na peça de estreia, por ser o empregador e parte legítima para responder às pretensões do demandante, independentemente do serventuário titular do cartório, especialmente porque é este quem detém capacidade econômica para suportar os custos trabalhistas.

Outrossim, o reclamante prestou serviços ao cartório até o término da delegação, aliás interina, do Sr. Gerson Francisco Olegário da Costa (informação da defesa fl-98 – responsável interino), sendo, incontroversamente, dispensado, pelo procurador do recorrente, no dia 07/07/2015, ou seja, um dia antes da assunção da delegação pelo Sr. Anderson.

Logo, considerando-se as disposições do artigo 487 do Texto Consolidado, somadas ao parágrafo único do artigo 1° da lei 12.506/2011, o reclamante teria direito a, pelo menos, 75 dias de aviso prévio indenizado o que redundaria em término do contrato de trabalho em, aproximadamente, 21 de setembro de 2015, ou seja, já sob a administração do novo titular da delegação. Neste sentido, a OJ n° 82 da SBDI-1 do C. TST:

82 Aviso prévio. Baixa na CTPS.

A data de saída a ser anotada na CTPS deve corresponder à do término do prazo do aviso prévio, ainda que indenizado.

Ainda em socorro a estas razões de decidir e sem prejuízo, de respeitáveis posicionamentos em sentido contrário, o artigo 236, §1°, da Constituição Federal, acima transcrito, não eximiu o recém aprovado titular de serviços notariais e de registro de responsabilidades trabalhistas quanto ao pessoal do cartório existente à época em que o mesmo foi investido nas suas funções. Aliás, não sem razão, o constituinte cravou no artigo 32 do ADCT que “o disposto no artigo 236 não se aplica aos serviços notariais e de registro que já tenham sido oficializados pelo Poder Público respeitando-se o direito de seus servidores(grifos não do original).

Sem embargo do reconhecimento de que o escopo do artigo 32 do ADCT fosse o de resguardar direitos de titulares de cartório já em pleno funcionamento quando da promulgação da Lei Maior, investidos em suas funções sem a exigência de concurso público, é correto afirmar que expressamente resguardou os direitos, trabalhistas de seus subordinados, sem qualquer exceção. Ainda que se reconheça que na hipótese vertente o recorrente reclamado tenha se submetido a certame para ingressar em suas funções, não menos correta é a assertiva de que no exercício de autêntico poder potestativo escolheu quem continuaria trabalhando no cartório o quem seria dispensado, dentre os quais o reclamante que nada recebeu por ocasião da rescisão contratual.

Enfim, é assente que o cartório já existia quando da titularidade do reclamado e que este assumiu todos os direitos (e lucros) inerentes à atividade cartorária, e considerando-se, ainda, que a alegada interinidade do responsável anterior por certo seria óbice intransponível à quitação dos direitos trabalhistas do autor pelo antecessor, cabe aqui à inteireza o norte dos artigos 10 e 448 da CLT.

Assim, não merece reparo a decisão a quo que reconheceu a ocorrência de sucessão e condenou o recorrente ao pagamento da verbas rescisórias decorrentes do contrato de trabalho.

Nada a reformar. (grifos apostos)

Nas razões do recurso de revista, o reclamado sustenta, em síntese, que não se há de falar em sucessão trabalhista, uma vez que o autor foi demitido antes da posse da delegação do ora recorrente, ou seja, não ocorreu a continuidade da prestação de serviços do autor ao novo delegatário.

Aponta violação dos artigos 1º, IV, 236, caput, da Constituição Federal; 10 e 448 da CLT; 188, I, 265 do Código Civil; e 3º, 20, 21 e 22 da Lei nº 8.935/1994. Traz arestos.

Examino.

O Tribunal Regional registra ser incontroverso que o reclamante prestou serviços ao cartório até o término da delegação interina do Sr. Gerson Francisco Olegário da Costa, sendo dispensado no dia 7/7/2015, ou seja, um dia antes da assunção da delegação do novo titular, Sr. Anderson Henrique Teixeira Nogueira, ora recorrente.

A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que o reconhecimento de sucessão trabalhista, em se tratando de cartório extrajudicial, pressupõe a continuidade da prestação de serviços em favor do novo titular, o que não ocorreu no presente caso. Assim, não configurada, na hipótese, a sucessão trabalhista.

Nesse sentido, cito precedentes da SBDI-1/TST:

CARTÓRIO. TRANSFERÊNCIA DA TITULARIDADE. SUCESSÃO TRABALHISTA. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AO NOVO TABELIÃO. Em se tratando de serventia cartorial, não há que se falar em sucessão trabalhista, nos moldes dos arts. 10 e 448 da CLT, quando não há a continuidade da relação de emprego com o novo titular do cartório. Embargos conhecidos e desprovidos. (E-ED-RR 191300-69.2007.5.15.0032, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT 18/09/2015)

CARTÓRIO. SUCESSÃO TRABALHISTA. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AO TITULAR SUCESSOR. Sendo certo que a relação de emprego nos serviços notariais se dá com o titular da serventia, em caso de sucessão na titularidade do cartório somente se reconhece a sucessão trabalhista na hipótese da continuidade da prestação de serviços em favor do novo titular. Com efeito, não caracteriza sucessão trabalhista quando o empregado do titular anterior não prestou serviços ao novo titular do cartório. Recurso de Embargos de que se conhece e a que se dá provimento. (E-RR 76200-16.2004.5.01.0047, Relator Ministro: João Batista Brito Pereira, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT 24/08/2012)

Nesse sentido, também, cito precedente da minha lavra:

RECURSO DE REVISTA. CARTÓRIO EXTRAJUDICIAL. SUCESSÃO. CONTINUIDADE DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. REEXAME DE FATOS E PROVAS. A jurisprudência deste Tribunal Superior orienta-se no sentido de que o reconhecimento de sucessão trabalhista, na hipótese de cartório extrajudicial, pressupõe a continuidade da prestação de serviços em favor do novo titular, o que, segundo o acórdão recorrido, não ocorreu na espécie. Trata-se de quadro fático insuscetível de reexame nesta fase recursal, de natureza extraordinária, a teor da Súmula nº 126 do TST. Recurso de revista de que não se conhece. (RR-80100-18.2011.5.17.0014, Relator Ministro: Walmir Oliveira da Costa, 1ª Turma, DEJT 02/12/2016)

Ante o exposto, CONHEÇO do recurso de revista, por violação dos arts. 10 e 448 da CLT.

2. MÉRITO

CARTÓRIO. SUCESSÃO TRABALHISTA. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AO TITULAR SUCESSOR

No mérito, conhecido o recurso de revista por violação dos artigos 10 e 448 da CLT, DOU-LHE PROVIMENTO para julgar improcedentes os pedidos da reclamação trabalhista em relação ao novo titular do Cartório, 2º Tabelião de Notas, Anderson Henrique Teixeira Nogueira. Invertido o ônus da sucumbência. Isento o reclamante das custas processuais por ser beneficiário de justiça gratuita.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista, por violação dos artigos 10 e 448 da CLT, e, no mérito, dar-lhe provimento para julgar improcedentes os pedidos da reclamação trabalhista em relação ao novo titular do Cartório, 2º Tabelião de Notas, Anderson Henrique Teixeira Nogueira. Invertido o ônus da sucumbência, isenta-se o reclamante das custas processuais por ser beneficiário de justiça gratuita.

Brasília, 21 de agosto de 2019.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

WALMIR OLIVEIRA DA COSTA

Ministro Relator – – /

Dados do processo:

TST – Recurso de Revista nº 1818-87.2015.5.02.0031 – São Paulo – 1ª Turma – Rel. Des. Walmir Oliveira da Costa – DJ 22.08.2019

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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