CSM/SP: Registro de imóveis – Dúvida – Intervenção de terceiros – Não cabimento, por ser a dúvida procedimento administrativo destinado à solução do dissenso entre o registrador e o interessado no registro do título – Intervenção indeferida – Divergências de dados qualificativos no título – Necessidade de complementação dos documentos – Impossibilidade de regularização superveniente – Recurso não conhecido.


  
 

Apelação Cível nº 1105389-21.2018.8.26.0100

Apelante: Pérsio Bruno de Souza

Apelado: 15º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

Interessados: MARCELO VAZ DO AMARAL PEREIRA e ROBERTA ANDRÉ RIBEIRO PEREIRA

VOTO Nº 37.827

Registro de imóveis – Dúvida – Intervenção de terceiros – Não cabimento, por ser a dúvida procedimento administrativo destinado à solução do dissenso entre o registrador e o interessado no registro do título – Intervenção indeferida – Divergências de dados qualificativos no título – Necessidade de complementação dos documentos – Impossibilidade de regularização superveniente – Recurso não conhecido.

Cuida-se de recurso de apelação interposto por PERSIO BRUNO DE SOUZA em face da r. sentença de fls. 83/85, que julgou procedente dúvida suscitada pelo Sr. 15° Oficial de Registro de Imóveis da Capital, que obstou o registro de compromisso de compra e venda de imóvel, em razão de deficiência e divergência nos dados de qualificação dos seus promitentes vendedores e compradores.

O apelante sustenta a possibilidade do registro, já que as exigências referentes ao estado civil dos promitentes vendedores e compradores são devidamente supridas pelos documentos juntados, e que a escritura já traz as informações necessárias.

Além disso, as demais diligências poderiam ser tomadas pela própria serventia ou pela Corregedoria Permanente.

Por fim, relata que lavrou boletim de ocorrência para apurar possível estelionato, uma vez que o imóvel foi negociado a terceiras pessoas.

MARCELO VAZ DO AMARAL PEREIRA e ROBERTA ANDRÉ RIBEIRO PEREIRA se manifestam às fls. 119/125, na qualidade de terceiros interessados, relatando haver prenotado título contraditório, que consiste em escritura de compra e venda pela qual os titulares de domínio transmitem para si o imóvel.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 190/194).

É o relatório.

Preliminarmente, não é possível o ingresso de terceiros interessados no presente procedimento.

O procedimento de dúvida tem natureza administrativa (art. 204 da Lei nº 6.015/73), não tem lide e não comporta as modalidades de intervenção de terceiro previstas nos arts. 119 e seguintes do Código de Processo Civil.

Nessa linha, cabe lembrar os v. acórdãos prolatados por este Col. Conselho Superior da Magistratura na Apelação Cível nº 510-0, da Comarca de Ribeirão Preto, de que foi relator o Desembargador BRUNO AFFONSO DE ANDRÉ, e na Apelação Cível nº 000.964.6/0-00, da Comarca de São Paulo, de que foi relator o Desembargador RUY PEREIRA CAMILO, o último com a seguinte ementa:

“REGISTRO DE IMÓVEIS. Dúvida inversa Intervenção de terceiro Não cabimento por ser a dúvida destinada à solução do dissenso entre o registrador e o interessado no registro do título Intervenção indeferida Admissibilidade, apenas, de apelação pelo terceiro interessado, do que não se trata no presente caso concreto.”

Indefiro, portanto, o pedido de intervenção no processo, como terceiros interessados, realizado por MARCELO VAZ DO AMARAL PEREIRA e ROBERTA ANDRÉ RIBEIRO PEREIRA.

Quanto ao recurso de apelação, ele não comporta conhecimento.

Houve sucessivas reiterações da prenotação, até que aquela de nº 836.156 deu origem ao presente procedimento.

O título foi qualificado negativamente devido aos seguintes óbices: (I) O domínio do imóvel foi adquirido pelos promitentes vendedores José Ricardo de Souza Pinheiro e Tania Rodrigues Santos, no estado civil de solteiros, ao passo que no título consta que estão casados sob regime de união estável; (II) Ausentes informações acerca do casamento do promitente comprador Pérsio Bruno de Souza, data de casamento e regime de bens; e (III) Ausência de informações sobre os promitentes vendedores estarem sujeitos ou não à Lei Previdenciária nº 8.212/91.

Dessa forma, as apontadas divergências não permitem o ingresso do título junto ao fólio real, por ofensa à própria especialidade subjetiva e continuidade, o que, por si só, já seria motivo suficiente para a procedência da dúvida suscitada.

Não bastasse, muito embora o recorrente afirme ter instruído corretamente o título, ao mesmo tempo, aduz que as exigências apresentadas deveriam ser supridas pela própria Serventia Imobiliária, ou pela Corregedoria Permanente, reconhecendo que os documentos apresentados admitem complementação (fls. 100/101):

“Em consonância com as questões relativas a qualificação e legislação previdenciária, entendendo estarem todas supridas, fato que não é de concordância do oficial registrador, dentro as possibilidades, nos termos do artigo 201 da Lei nº. 6.015/73 caberia a realização de diligências para a elucidação das questões voltadas para o registro imobiliário. Assim, foi colocado que não estão esgotadas as formas de alcance para a elucidação das questões e desta feita, o que se admite apenas por argumentação, as diligências, salvo entendam Vossas Excelências não restar cumpridas as exigências, a expedições de diligências para possibilitar, em sede final, a Averbação / Registro do Instrumento Particular de Compromisso de Compra e Venda devem ser tomadas por iniciativa do MM. Juízo nas formas requeridas. Esclareceu ainda o apelante/suscitado que oportunamente traria a prova de ingresso de medida judicial criminal específica, inicialmente lavrado apenas um Boletim de Ocorrência, para apurar autoria e materialidade de crime de estelionato tipificado no Código Penal e outros crimes porventura cometidos, posto que inegável que houve a venda e compra por duas vezes do mesmo imóvel nos termos do relato do Sr. Oficial Registrador (fls. 05). Concluindo, além de presentes todos os requisitos para a Averbação / Registro do Instrumento Particular de Compromisso de Compra e Venda, supridas assim as exigências registrais, inegável deveria ser a determinação do MM. Juízo da 01º VARA DE REGISTROS PÚBLICOS DO FORO CENTRAL DA CAPITAL – SP., salvo entendimento diverso de complementação de documentos por diligências a serem tomadas, a final, não podendo ser outro o resultado, senão, a necessária inclusão no registro imobiliário do Instrumento Particular de Compromisso de Compra e Venda.” (g.n).

Como se sabe, o procedimento de dúvida é reservado à análise da discordância do apresentante com os motivos que levaram à recusa do registro do título. De seu julgamento, decorrerá a manutenção da recusa, com cancelamento da prenotação, ou a improcedência da dúvida, que terá como consequência a realização do registro (art. 203, II, da Lei nº 6.015/73).

A afirmação do recorrente no sentido de que o título poderia ser complementado por outras diligências, após a prenotação, reconhecendo, consequentemente, que aquele apresentado poderia demandar integração, prejudica o exame da dúvida, já que, ainda que julgada improcedente, haveriam outros óbices, quando da prenotação, que prejudicariam o ingresso do título no registro imobiliário.

A referida constatação atribui ao procedimento de dúvida natureza consultiva, ou meramente doutrinária. O novo exame de admissibilidade para o futuro registro poderá ser influenciado por eventuais fatos novos, mesmo se o título for apresentado com atendimento das exigências impugnadas.

Esse é o entendimento pacífico deste C. Conselho Superior da Magistratura:

“No mais, ao contrário do sustentado pelo recorrente, não cabe aqui ao Judiciário se pronunciar acerca da solução cabível para o caso concreto, não se tratando de órgão consultivo, como bem ressaltado pela nobre representante do parquet.” (CSM, Processo n° 000.608.6/7-00, Rel. Des. GILBERTO PASSOS DE FREITAS, j. 21/12/2006).

Ademais, a complementação ou alteração do título no curso do procedimento de dúvida enseja prorrogação indevida do prazo de validade do protocolo, o que acarreta potencial prejuízo aos eventuais apresentantes de títulos representativos de direitos conflitantes que forem posteriormente protocolados.

Por isso, os precedentes do Eg. Conselho Superior da Magistratura são firmes no sentido de que não se admite a complementação do título no curso da dúvida:

“Dúvida registrária é só para dirimir o dissenso, entre o registrador e o apresentante, sobre a prática de ato de registro, referente a título determinado que, para esse fim (registro) foi protocolado e prenotado. Logo, não se admite, no seu curso, diligências ou dilação de provas destinadas à complementação de título desqualificado, à apuração de fatos extratabulares demonstrativos de situação jurídica de loteamento ou à promoção de medidas de saneamento de vício que macula o parcelamento do solo. A razão dessa restrição cognitiva, ademais, é evitar a indevida prorrogação do prazo da prenotação, consoante firme orientação deste Conselho Superior da Magistratura: “A dilação probatória em procedimento desta natureza prorrogaria indevidamente o prazo da prenotação, potencializando prejuízo para o direito de prioridade de terceiros, que também tivessem prenotado outros títulos que refletissem direitos contraditórios.” (Apelação Cível nº 027583-0/7, Santa Rosa do Viterbo, j. 30.10.1995, rel. Des. ALVES BRAGA, in Revista de Direito Imobiliário 39/297-298). Confira, ainda, Apelação Cível nº 97.090-0/4, São José do Rio Preto, j. 12.12.2002, Rel. Des. LUIZ TÂMBARA; Apelação Cível nº 000.176.6/4-00, Socorro, j. 16.09.2004, Rel. Des. JOSÉ MÁRIO ANTONIO CARDINALE.” (CSM, Apelação Cível nº 482-6/0, Relator Desembargador GILBERTO PASSOS DE FREITAS).

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Registro de loteamento – Dúvida julgada procedente, com manutenção da recusa do registro – Impugnação parcial – Título complementado no curso da dúvida mediante apresentação de documentos destinados ao atendimento parcial das exigências formuladas pelo Oficial de Registro – Alteração do título que implicou em anuência com as exigências formuladas para o registro, ainda que de forma parcial – Impossibilidade de alteração do título no curso da dúvida, o que impede o reexame da qualificação – Recurso não conhecido, prejudicada a dúvida suscitada.” (CSM, Apelação Cível n° º 1003326-39.2017.8.26.0168, Relator Desembargador PINHEIRO FRANCO).

A complementação do título no curso deste procedimento, para atender exigências feitas pelo Oficial, impedem o conhecimento do recurso.

Ante o exposto, rejeito a intervenção de terceiros e não conheço da dúvida suscitada.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: DJe/SP de 23.08.2019

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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