CSM/SP: Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Compromisso de compra e venda de imóvel loteado – Prova de quitação consistente em recibos outorgados pela loteadora nas folhas do carnê que emitiu para pagamento mensal das parcelas do preço – Recusa fundada na ausência de segurança jurídica dos documentos para que sejam aceitos pelo Oficial de Registro como prova de quitação – Ausência de vício formal que permita a recusa dos comprovantes de pagamento das prestações – Dever de qualificar atribuído ao Oficial de Registro de Imóveis que não comporta a recusa do título com fundamento em análise pessoal e subjetiva – Imóvel loteado – Compromisso de compra e venda registrado – Comprovação de pagamento do preço para efeito de registro da transmissão da propriedade – Art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79 – Documentos juntados aos autos que não demonstram o preço total pactuado para venda e o número de parcelas previstas para seu pagamento – Recurso não provido, mas por fundamentos distintos do que foi adotado na r. sentença.


  
 

Apelação nº 1000279-30.2018.8.26.0198

Apelantes: Valdinei Ricardo do Nascimento e Gislene Vieira dos Santos Nascimento

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Franco da Rocha

VOTO Nº 37.665

Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Compromisso de compra e venda de imóvel loteado – Prova de quitação consistente em recibos outorgados pela loteadora nas folhas do carnê que emitiu para pagamento mensal das parcelas do preço – Recusa fundada na ausência de segurança jurídica dos documentos para que sejam aceitos pelo Oficial de Registro como prova de quitação – Ausência de vício formal que permita a recusa dos comprovantes de pagamento das prestações – Dever de qualificar atribuído ao Oficial de Registro de Imóveis que não comporta a recusa do título com fundamento em análise pessoal e subjetiva – Imóvel loteado – Compromisso de compra e venda registrado – Comprovação de pagamento do preço para efeito de registro da transmissão da propriedade – Art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79 – Documentos juntados aos autos que não demonstram o preço total pactuado para venda e o número de parcelas previstas para seu pagamento – Recurso não provido, mas por fundamentos distintos do que foi adotado na r. sentença.

Trata-se de apelação interposta por Valdinei Ricardo do Nascimento e Gislene Vieira dos Santos Nascimento contra r. sentença que julgou procedente a dúvida inversamente suscitada e manteve a recusa do Sr. Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Franco da Rocha em promover o registro da transmissão do domínio do Lote 04 da Quadra “D” do Parque dos Eucaliptos, objeto da matrícula nº 74.992, porque os recibos apresentados não conferem segurança jurídica para a prática do ato.

Os apelantes alegaram, em suma, que o carnê de pagamento das prestações do compromisso de compra e venda é suficiente para comprovar a quitação do preço do imóvel. Ademais, os comprovantes de pagamento das prestações foram instruídos com certidão que demonstra que o vendedor não moveu ação para a rescisão do contrato, devendo ser considerado que nas prestações periódicas a prova do pagamento de uma delas faz presumir a quitação das anteriores. Aduziram que o parágrafo 6º do art. 26 da Lei nº 6.766/79 não afasta a possibilidade de apresentação do carnê de pagamento emitido pela loteadora, com as respectivas quitações, como prova do pagamento do preço. Requereram a improcedência da dúvida (fls. 50/54).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 68/69).

É o relatório.

A certidão da matrícula nº 74.992 do Registro de Imóveis de Franco da Rocha, juntada às fls. 11/12, comprova que o Lote 04 da Quadra “D” do Parque dos Eucaliptos, de co-propriedade de SOCEM – EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS S/A na proporção de 60%, e de TRINACRIA S/A – ADMINISTRAÇÃO DE BENS na proporção de 40%, foi compromissado à venda para o apelante Valdinei Ricardo dos Santos, solteiro, mediante contrato particular celebrado em 13 de abril de 1983 e registrado em 09 de outubro de 2008.

Conforme a referida certidão, o compromissário comprador se obrigou a pagar pelo imóvel o preço total de Cr$ 4.000.000,00 mediante entrada de Cr$ 50.000,00 e o restante em prestações mensais e consecutivas de Cr$ 15.398,70, “na forma prevista no título” (fls. 11), corrigidas pela ORTN, a primeira com vencimento em 13 de setembro de 1983 (fls. 11/12).

Os documentos de fls. 15/23 demonstram que para o pagamento do preço do compromisso de compra e venda a loteadora emitiu carnê formado por talões representativos das prestações mensais, e que a promitente vendedora SOCEM – EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS S/A deu quitação em cada uma das folhas que corresponderam às prestações vencidas entre 13 de novembro de 1983 (fls. 15) e 13 de janeiro de 1986 (fls. 23).

Na época em que o contrato foi celebrado não era incomum a emissão de carnê para pagamento das prestações mensais do compromisso de compra e venda e, neste caso concreto, cada uma das folhas que compõem o referido carnê contém: I) a indicação do número do contrato; II) a identificação do compromissário comprador, ou seja, Valdinei Ricardo do Nascimento, e da promitente vendedora SOCEM – Empreendimentos Imobiliários S/A; III) a especificação do imóvel como sendo o Lote 04 da Quadra “D” do Parque dos Eucaliptos; IV) a indicação do valor pago e a data do vencimento da prestação; V) a quitação, em cada dos talões, emitida pela promitente vendedora SOCEM – Empreendimentos Imobiliários S/A.

Os referidos recibos fazem prova do pagamento das prestações a que se referem, sendo injustificável a recusa com fundamento em suposta insegurança jurídica que, in casu, decorre de análise subjetiva que não se coaduna com o dever de qualificar os títulos e praticar, ou recusar, os atos solicitados conforme o resultado de análise jurídica promovida dentro dos limites legais de atuação do Oficial de Registro de Imóveis.

Em outros termos, atendidos os requisitos de validade que devem ser examinados dentro dos limites da qualificação não pode o registro ser recusado com fundamento em suposta ausência de segurança jurídica sobre o modo escolhido pelas partes do contrato para o pagamento das parcelas mensais e emissão dos respectivos recibos (fls. 24).

Por seu turno, os recibos emitidos pelo credor abrangeram o total de cada uma das prestações devidas, razão pela qual não se mostra relevante o fato de que o Sr. Oficial de Registro de Imóveis não teria meios para conferir se os pagamentos observaram os reajustes pela ORTN.

Esse fundamento para a recusa do registro, ademais, não constou como exigência formulada na nota de devolução de fls. 24, pois somente foi indicado na manifestação de fls. 37/38, o que impediu que os apresentantes se manifestassem antes da suscitação da dúvida.

Entretanto, prevalece óbice ao registro consistente na ausência de comprovação de que os recibos apresentados representam o pagamento integral do preço pactuado.

Assim porque o registro do contrato de compromisso de compra e venda somente indica que a primeira prestação de Cr$ 15.398,70 teve vencimento em 13 de setembro de 1983, sem esclarecer o número de parcelas e a data de vencimento da última prestação (fls. 11/12).

Ademais, os talões contidos no carnê juntado aos autos dizem respeito às parcelas vencidas a partir de 13 de novembro de 1983, não havendo prova do pagamento das parcelas vencidas em 13 de setembro e em 13 de outubro de 1983.

E sem a prova do número de parcelas pactuadas e de que todas foram objeto de quitação outorgada pelo promitente vendedor não é possível o registro da transmissão da propriedade com fundamento no § 6º do art. 26 da Lei nº 6.766/79 que dispõe:

§ 6° Os compromissos de compra e venda, as cessões e as promessas de cessão valerão como título para o registro da propriedade do lote adquirido, quando acompanhados da respectiva prova de quitação“.

Essa prova não é suprida pela certidão de ausência de distribuição de ação de cobrança, de rescisão contratual, ou de reintegração de posse, porque não equivale à quitação.

Por fim, o apelante Valdinei comprometeu comprar o imóvel por contrato celebrado em 13 de abril de 1983, quando era solteiro (fls. 11), e se casou com a apelante Gislene em 12 de julho de 1986, pelo regime da comunhão parcial de bens (fls. 10), o que demanda esclarecimento, na eventual reapresentação do título, em relação à causa do pedido de registro da transmissão da propriedade em favor de ambos, com especificação do quinhão do imóvel que pertencerá a cada um dos cônjuges (fls. 04).

Ante o exposto, embora por fundamentos distintos do adotado na r. sentença, nego provimento ao recurso para manter a recusa do registro do título.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator.

Fonte: DJe/SP de 03.07.2019

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.