Registro de Imóveis – Alienação fiduciária de bem imóvel – Consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário – Indisponibilidade judicial decretada, a impedir a averbação da consolidação da propriedade, por implicar disposição do bem – Necessidade de levantamento das ordens de indisponibilidade, pelos juízes de onde emanaram – Recurso desprovido – Parecer pelo desprovimento do recurso.

Número do processo: 1038883-97.2017.8.26.0100

Ano do processo: 2017

Número do parecer: 372

Ano do parecer: 2017

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1038883-97.2017.8.26.0100

(372/2017-E)

Registro de Imóveis – Alienação fiduciária de bem imóvel – Consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário – Indisponibilidade judicial decretada, a impedir a averbação da consolidação da propriedade, por implicar disposição do bem – Necessidade de levantamento das ordens de indisponibilidade, pelos juízes de onde emanaram – Recurso desprovido – Parecer pelo desprovimento do recurso.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Cuida-se de recurso interposto em face de r. sentença que manteve óbice à averbação de consolidação da propriedade imobiliária, em decorrência de inadimplemento de contrato de alienação fiduciária.

Alega a recorrente que a decisão impede a própria cobrança do crédito constituído a partir do inadimplemento dos devedores fíduciantes. Versou sobre enriquecimento ilícito de parte dos devedores. Tratou da validade do contrato de alienação fiduciária.

O Ministério Público opinou pelo desprovimento.

É o relatório.

À luz do art. 23 da Lei 9.514/97:

Art. 23. Constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título.

Parágrafo único. Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel.

Consoante os magistérios de Melhim Namem Chalhub:

“Ao ser registrado o contrato de alienação fiduciária, considera-se transmitida a propriedade ao credor-fiduciário, em caráter resolúvel; de outra parte, o devedor-fiduciante é demitido de sua propriedade e investido de direito real de reaquisição, sob condição suspensiva, podendo tornar-se novamente titular da propriedade plena ao implementar o pagamento da dívida que constitui objeto do contrato garantido pela propriedade fiduciária.” (Negócio Fiduciário, Renovar, 4ª Ed., p. 239).

Nota-se, pois, que o credor fiduciário é titular da propriedade resolúvel do imóvel, ao passo que o devedor fiduciante é titular de direito real de aquisição, que possui valor de mercado. Por conseguinte, o direito em voga, dada sua apreciação pecuniária, acaba abarcado pelo decreto de indisponibilidade. Irrelevante, neste passo, que o ato de disposição seja decorrente da própria inadimplência de seu titular. Independentemente da forma como se dê, ato algum de transmissão da propriedade comportará registro, enquanto hígida a ordem de indisponibilidade.

E o levantamento da restrição, por seu turno, há de ser determinado por quem a decretou. O MM. Corregedor Permanente, pelo só fato de o ser, não está provido de poderes a tanto.

Como elucidado em precioso parecer da lavra do Ilustre Assessor Swarai Cervone de Oliveira:

“Logo, embora a propriedade seja, não obstante resolúvel, do credor fiduciário, é certo que o devedor fiduciante tem direitos. E tais direitos são economicamente relevantes e, por isso, consideram-se bens. Se são bens, podem ser atingidos pelo decreto de indisponibilidade.

A conclusão, assim, é de que a indisponibilidade averbada incide não sobre a propriedade nem poderia , mas sobre os bens dos devedores fiduciantes: a posse direta e o direito real de reaquisição.

A consolidação da propriedade, se averbada, faria extinguir os direitos dos devedores fiduciários. Porém, por força de determinação judicial, decretou-se a indisponibilidade de tais bens ou direitos. Permitir a averbação da consolidação da propriedade implicaria, por via reflexa, tornar sem efeito a indisponibilidade. Dito de outro modo, traduziria revisão de determinação judicial pela via administrativa, o que não se admite.

Como se sabe, no sistema jurídico constitucional brasileiro, admite-se que os atos dos demais Poderes do Estado legislativos e administrativos sejam revistos pelos juízes, no exercício da jurisdição, mas o contrário, ou seja, a revisão dos atos jurisdicionais dos juízes pelas autoridades legislativas ou administrativas, isso não se admite (Cândido Rangel Dinamarco, Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo: Malheiros, 2001, vol. I, p. 310).

É preciso, dessa maneira, que, antes de averbar a consolidação, o recorrente promova o levantamento das constrições perante os Juízos de onde elas partiram.” (PROCESSO N° 2015/167424, Des. Guerrieri Rezende, DJ 5/11/15)

Na mesma esteira, parecer do Ilustre Assessor Gustavo Henrique Bretas Marzagão:

”Registro de Imóveis – alienação fiduciária de bem imóvel – Consolidação da propriedade em nome da credora fiduciária, em face da regular intimação e da mora dos devedores fiduciantes – Averbações de indisponibilidades contra os fiduciantes, que impedem a consolidação – Necessidade de levantamento mediante ordem dos juízos de onde emanaram – Recurso desprovido.” (PROCESSO N° 2015/154498, Des. Guerrieri Rezende, DJ 17/12/15)

Por fim, note-se que, diversamente do quanto sustentado pelo recorrente, não se está afirmando haver qualquer mácula no negócio jurídico entabulado entre as partes, tampouco óbice à cobrança do crédito a que entenda fazer jus. A barreira está, unicamente, no registro ou na averbação, perante o Cartório de Registro Imobiliário, de qualquer ato de disponibilidade que recaia sobre o imóvel em comento.

Por todo o aduzido, o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de se negar provimento ao recurso administrativo.

Sub censura.

São Paulo, 1º de novembro de 2017.

Iberê de Castro Dias

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso administrativo. Publique-se. São Paulo, 06 de novembro de 2017. (a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: MARCOS SANTIAGO FORTES MUNIZ, OAB/SP 149.737 e CARLOS PINTO DEL MAR, OAB/SP 43.705.

Diário da Justiça Eletrônico de 23.01.2018

Decisão reproduzida na página 012 do Classificador II – 2018


Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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