Restrições convencionais e sua equiparação às legais – Por Dr. Hélio Lobo

1 – Introdução:

No ano de 2007 tivemos a oportunidade de escrever artigo cujo título era “As restrições urbanísticas no parcelamento do solo urbano e o Registro de Imóveis”, publicado na Revista do Advogado nº 90, paginas 62/70 e nele, após análise geral do tema, aludimos de modo superficial ao artigo 247 da Lei Municipal de São Paulo nº 13.885, de 25.8.2004, então vigente, que equiparou as restrições convencionais às normas legais.

Esse dispositivo, após mencionar as zonas de uso, rezava que “as restrições convencionais de loteamentos aprovados pela Prefeitura, estabelecidas em instrumento público registrado no Cartório de Registro de Imóveis, referentes a dimensionamento de lotes, recuos, taxa de ocupação, coeficiente de aproveitamento, altura e número de pavimentos das edificações, deverão ser atendidas quando mais restritivas que as disposições desta lei”.

Assim, resumindo, dispunha que em determinadas zonas de uso, as restrições convencionais de loteamentos deverão ser atendidas quando mais restritivas do que as disposições daquela lei, prevendo, no parágrafo primeiro, uma limitação legal para esses usos, ao passo que no parágrafo segundo a possibilidade de alteração das restrições convencionais dos loteamentos. Finalmente, no parágrafo terceiro, cuidou da supressão, sempre mediante prévio procedimento junto à Municipalidade.

Atualmente, com a vigência da Lei Municipal nº 16.402, de 23 de março de 2016, editada em consonância com a Lei nº 16.050, de 31 de julho de 2014 (Plano Diretor Estratégico), as regras foram praticamente mantidas, como se verifica dos artigos 59 e parágrafos, abaixo transcritos.

Art. 59. Nas ZER-1, ZER-2, ZERa, ZCOR-1, ZCOR-2, ZCOR-3, ZCORa e ZPR, as restrições convencionais de loteamentos aprovadas pela Prefeitura, estabelecidas em instrumento público registrado no Cartório de Registro de Imóveis, referentes a dimensionamento de lotes, recuos, taxa de ocupação, coeficiente de aproveitamento, altura e número de pavimentos das edificações, deverão ser atendidas quando mais restritivas que as disposições desta lei.

§ 1º Os usos permitidos nos loteamentos referidos no “caput” deste artigo serão aqueles definidos por esta lei para as respectivas zonas.

§ 2º A alteração das restrições convencionais dos loteamentos deverá atender às seguintes condições:

I – realização de acordo entre o loteador e os proprietários dos lotes atingidos pela alteração;

II – emissão de parecer técnico favorável da CTLU;

III – anuência expressa do Executivo.

§ 3º A exigência constante no inciso I do § 2º deste artigo poderá ser suprida por acordo entre os proprietários dos lotes atingidos pela alteração, nos casos de encerramento de atividades da empresa loteadora ou de sua inércia quando legalmente notificada sobre a necessidade de manifestar-se a respeito do acordo, desde que haja a anuência de 2/3 (dois terços) dos proprietários do loteamento atingido.

A reiteração e continuidade dessas disposições, que acreditamos pudessem ser alteradas ou revogadas, nos induziu a um aprofundamento na questão, como tentaremos demonstrar nestas breves considerações.

2 – Uma possível interpretação às disposições:

As disposições constantes da legislação municipal são interessantes, mas, a sua análise demanda certa reflexão.

Já tivemos a oportunidade de diferenciar, no estudo publicado e acima referido, as restrições legais das convencionais. As legais decorrem da legislação. As convencionais teriam natureza obrigacional, embora um instrumento auxiliar do Poder Público quanto à urbanização da cidade.

Mantemos esse entendimento, notadamente quanto aos seus efeitos jurídicos, sem, contudo, ignorar e tentar interpretar a novidade contida nas normas municipais

Com base na legislação do Município (artigo 59, da Lei nº 16.402, de 23 de março de 2016, que repete o revogado artigo 247) passou a existir um hibridismo representado pelas restrições urbanísticas convencionais, constantes do memorial de loteamento ou contrato padrão, integrantes do procedimento registrado no Cartório de Registro de Imóveis, que se transformam em legais.

A regra confere, portanto, de forma explícita, força de lei às restrições impostas, unilateralmente, pelo loteador aos adquirentes de lotes, bem como a todos aqueles inseridos no âmbito de seus efeitos.

Assim, embora as restrições convencionais tenham natureza obrigacional, com regulamentação prevista no Código Civil, Lei do Parcelamento do Solo Urbano e Lei de Registros Públicos, razoável é considerar que os aspectos urbanísticos decorrentes podem ser compatibilizados com a competência constitucional do Município.

Alguns dispositivos da Lei nº 6.766, de 1979, referem-se às restrições convencionais. O artigo 26, inciso VII, menciona que devem constar, no contrato padrão, as restrições convencionais do loteamento, “supletivas da legislação pertinente”. Por outro lado, o artigo 9º, § 2º, inciso II, estipula que o projeto do loteamento deverá conter “as condições urbanísticas do loteamento e as limitações que incidem sobre os lotes e suas construções, além daquelas constantes das diretrizes fixadas”.

É verdade que nenhuma dessas regras erigiu restrições convencionais às normas legais, embora as tenha mencionado como instrumentos auxiliares da urbanização.

A legislação do Município de São Paulo, porém, inovou e, certamente, considerou que, diante da necessidade de aprovação do projeto, com tais restrições urbanísticas, decorre a presunção de que as convenções estabelecidas pelo loteador foram examinadas, aceitas e aprovadas.

Além disso, deve ter animado o legislador a menção das restrições convencionais como “supletivas da legislação pertinente” (artigo 26, inciso VII) e resolveu erigi-las a essa condição “quando mais restritivas que as disposições desta lei” (artigo 59, da Lei nº 16.402, de 23 de março de 2016).

Sem adentrar aspectos referentes à constitucionalidade da norma, ou, ainda, sobre a amplitude conferida ao loteador e ao próprio Executivo Municipal quanto à regulamentação de restrições que passam a ter força de lei, o que, certamente, será melhor definido na esfera jurisdicional, vamos tentar compatibilizar o direito positivo posto com a sua aplicação e efeitos.

A premissa básica desse enfoque coloca o loteador apresentando restrições e se estas não conflitam com a legislação municipal, sendo, inclusive, mais restritivas do que as por ela estabelecidas, devem ser atendidas, pois, equiparam-se à própria legislação.

Decorre a obrigação conferida ao Município de fiscalizar efetivamente a edição das restrições estabelecidas no parcelamento. Elas precisam ser verificadas em relação à região e à espécie de empreendimento. E isso porque, se forem extremamente rigorosas ou estapafúrdias, sem atender ao interesse de todos, notadamente ao interesse público, não devem ser aceitas.

Essas as considerações básicas, embora muitos outros aspectos devam ser esclarecidos e interpretados, como tentaremos na sequência expor.

3 – Aspectos polêmicos a considerar:

Nada obstante essa aparente conformidade das regras com o sistema jurídico vigente, muitos pontos ainda causam perplexidade ao intérprete. Destacaremos a seguir, sem, no entanto, tentar solucioná-los, salvo por meras induções ao raciocínio. Isso porque a tarefa se mostra difícil e dependerá, certamente, das apreciações jurisdicionais e administrativas futuras.

3.1 – Uma espécie de norma em branco:

O legislador municipal conferiu uma espécie de “cheque em branco” ao loteador. Inexistindo conflito com a legislação municipal, se as restrições são mais restritivas, devem ser aceitas, mediante a singela aprovação do projeto e memorial. Como consequência o empreendedor pode dizer os termos da legislação, aplicável a todos que, no presente e futuro, ingressarem naquele espaço delimitado.

Outro aspecto interessante diz respeito ao binômio tempo e espaço referente a tais restrições, como se verá a seguir.

3.2 – A incidência sobre espaço delimitado:

Começando pelo espaço é preciso considerar que as normas urbanísticas, decorrentes das restrições, só incidem sobre a área efetivamente ocupada pelo loteamento ou desmembramento, conforme o projeto aprovado.

Assim, como consequência, os espaços delimitados no parcelamento recebem tratamento diverso dos demais, às vezes no mesmo bairro e região.

Não podemos esquecer que o loteamento tem duração transitória e, ao ser executado, após o recebimento pela Municipalidade, integra-se à cidade.

Logo, por óbvio, as restrições impostas pelo loteador e constantes, por exemplo, de um pequeno parcelamento, não subsistem para imóveis vizinhos, com outras origens, embora sejam todos integrantes do mesmo bairro.

Competirá à Municipalidade catalogar e disciplinar todos os projetos, inclusive de desmembramentos, que também admitem a imposição de restrições convencionais, de molde a evitar situações incompatíveis e contraditórias dentro de uma mesma região.

3.3 – As legislações no tempo:

Importante é considerar que a equiparação entre restrição convencional e legislação municipal só pode existir a partir da vigência dos diplomas que regularam o tema, ou seja, após a atualmente revogada Lei nº 13.885, de 25.8.2004, artigo 247 e parágrafos, que, todavia, teve as mesmas regras repetidas pela Lei Municipal nº 16.402, de 23 de março de 2016.

Os loteamentos anteriores, que previam restrições convencionais, não estão abrangidos pela regra. Há que se preservar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito.

Há, atualmente, uma espécie de fatiamento das disposições urbanísticas dentro de uma mesma região, embora com característicos semelhantes.

Todos esses aspectos precisam ser levados em conta pela Municipalidade ao aprovar o empreendimento.

3.4 – A alteração ou revogação das restrições com força de lei:

Importa refletir sobre a possibilidade de alteração ou cancelamento das restrições convencionais.

Assentada a premissa de que a restrição convencional, diante dos termos da legislação municipal, se equipara à própria legislação, em princípio só poderia ser revogada ou alterada por outra superveniente.

No entanto, não é o que decorre dos termos da norma vigente. Esta permite uma alteração e, porque não dizer, a própria revogação, por acordo entre o loteador e proprietários de lotes atingidos, mediante parecer técnico, além de expressa anuência do Poder Executivo Municipal.

Há inclusive, no parágrafo 3º, do artigo 59, um “quórum” de dois terços dos proprietários de lotes na área.

Assim, a qualquer tempo, os proprietários de imóveis no perímetro parcelado podem revogar ou alterar as restrições anteriormente impostas.

Logo, naquele espaço representado pelo parcelamento, os proprietários dos lotes, obtidas as anuências necessárias, podem alterar ou cancelar as restrições e, também, a própria legislação municipal em que elas se transformaram.

Nesse ponto nova indagação se mostra pertinente: a legislação municipal superveniente em dissonância com as restrições, aprovada para toda a região, revoga aquelas específicas da área loteada?

A resposta há de ser positiva, salvo se a própria legislação ressalvasse a situação excepcional.

Há entendimento da Corregedoria Geral da Justiça de que a Lei Municipal posterior, dispondo expressamente sobre a restrição convencional e a revogando, prevaleceria sobre a cláusula do contrato padronizado (PARECER Nº 396/2009 E PROCESSO CG Nº 2009/79569  Data inclusão: 19/01/2010(396/2009 _E), cuja ementa é a que segue:

“Registro de Imóveis – Desdobro – Lote – Aprovação pelo Município que faz presumir o respeito à legislação urbanística-Restrição urbanística prevista no contrato padrão arquivado com o registro do loteamento, por outro lado, que foi expressamente revogada por legislação municipal posterior – Recurso provido para afastar a recusa da averbação do desdobro”.

 

É interessante considerar que essa afirmação remete a outra indagação pertinente: se a restrição era convencional, embora com força de lei, o que lhe foi atribuído pela norma municipal, revogado esse efeito previsto expressamente no artigo 59, o que se fará pelo próprio procedimento que o dispositivo prevê, subsistirá a restrição convencional do contrato apenas entre as partes?

A resposta parece também ser positiva. A restrição convencional subsiste e isso porque mesmo desaparecendo a força legal conferida pela legislação municipal em exame, restariam os efeitos da obrigação assumida, notadamente quanto aos direitos de vizinhança, principalmente em consonância com as disposições do Código Civil.

Sempre se entendeu que as restrições convencionais legais não poderiam interferir com os aspectos contratuais. Isso porque as restrições convencionais podem ser livremente impostas pelas partes por força do contrato. Eventuais limitações ao direito de contratar ou de alterar o seu conteúdo deverão estar previstos em Lei Federal, como o Código Civil, cuja competência constitucional é exclusiva da União Federal.

Logo, não pode o Município interferir nos contratos do loteamento celebrados entre as partes, por invadir competência privativa da União Federal. Se existe a obrigação entre vizinhos, por força do Código Civil, a legislação municipal não pode interferir. Haveria invasão de competências constitucionais. A solução para tais impasses deverá ser obtida na esfera jurisdicional.

Para melhor compreensão basta formular a seguinte hipótese: se um dos adquirentes de lotes, que não anuiu para a alteração, resolver fazer cumprir uma restrição que existia em contrato com o loteador ou terceiro, poderá fazê-lo, pois, a regra municipal não interfere com a relação obrigacional celebrada com base no Código Civil. A restrição pode ter perdido a força legal, mas manteve a obrigacional, decorrente do contrato.

É interessante lembrar, também, que o Conselho Superior da Magistratura tem admitido alterar a restrição convencional, até para revogá-la totalmente, se houver a anuência de todos os adquirentes de lotes, com direito real registrado.

Duas, pois, as situações que devem ser consideradas: a) a revogação dos efeitos legais da restrição; e b) a prevalência, conforme o caso, dos seus efeitos obrigacionais e decorrentes do contrato.

Logo, por absurdo que possa parecer, conclui-se que a revogação da restrição convencional com força de lei, se alterado ou revogado esse efeito, não interfere com aquelas constantes do contrato padronizado e que poderão, autonomamente, subsistir.

Cabe aí outra indagação: a revogação dos efeitos que equiparou a restrição convencional à legal, caso o contrato ou cláusula do memorial seja cancelada, seria automática ou, ainda, depende do procedimento junto à Municipalidade, previsto na legislação municipal?

Parece-nos que desaparecendo a causa que constituiu a restrição, os efeitos não mais se produzem.

A Municipalidade poderia argumentar que a restrição convencional incorporou-se ao sistema legal e, por isso, dele só deixaria de fazer parte pelos mecanismos que sua legislação instituiu.

Incidiriam, aí, diplomas legais diversos. Os decorrentes da legislação federal e municipal.

Parece estranho que a mesma restrição que constou do contrato tenha sido revogada ou alterada, conforme as regras obrigacionais, com base em legislação federal aplicável, enquanto seus efeitos estão incorporados pela legislação municipal.

O normal seria que as regras obrigacionais observem o seu curso natural, enquanto que as municipais, no caso, sigam apenas o aspecto supletivo das restrições, enquanto juridicamente existentes. Se estas desaparecem, por outros meios permitidos na legislação federal, os seus efeitos também estariam extintos.

Essa simbiose de competências legislativas, portanto, além da duvidosa legalidade, causa perplexidade ao intérprete e, porque não dizer, insegurança jurídica aos contribuintes.

A responsabilidade, pois, é do próprio sistema instituído pela legislação municipal.

Enfim, a situação é nova e ainda não foi devidamente enfrentada, mas, no futuro, esse emaranhado de normas deverá ser solucionado, certamente as duras penas, nas esferas próprias.

4 – O registrador e a polêmica:

Temos acompanhado a evolução das interpretações, especialmente na esfera jurisdicional, sobre restrições convencionais. As decisões têm sido surpreendentes e só não são comentadas neste breve estudo por demandarem muitas outras considerações.

Quanto ao registrador, no entanto, o que deve prevalecer é a regra prevista no item 191, Capítulo XX, das Normas de Serviço.

“191. Todas as restrições presentes no loteamento, impostas pelo loteador ou pelo Poder Público serão mencionadas no registro do loteamento. Não caberá ao oficial, porém, fiscalizar sua observância”.

Além dessa recomendação, sábia por sinal, ao Oficial compete apenas seguir as regras registrarias e normativas, sem adentrar a polêmica que o sistema jurídico integrado pelo Código Civil, Leis do Parcelamento e de Registros Públicos, além das Municipais, causaram, quanto ao tema, ao operador do direito em geral.

Fonte: www.iregistradores.org.br

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2ªVRP/SP: Ocorrendo equívoco do preposto, o qual foi corretamente orientado e fiscalizado, ato doloso do serventuário ou ainda um erro isolado e sem maior repercussão, tem-se aplicado o entendimento da insuficiência para configuração do ilícito administrativo do Registrador ou Tabelião em virtude da ausência de culpa e gravidade, respectivamente.

Processo 1079097-96.2018.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1079097-96.2018.8.26.0100

Processo 1079097-96.2018.8.26.0100 Pedido de Providências Tabelionato de Notas J.S.C.A. Juíza de Direito: Dra. Letícia Fraga Benitez VISTOS, Trata-se de expediente instaurado a partir de comunicação encaminhada por José Sidney Crespo Affonso, noticiando falsidade em reconhecimento de firma aposto em diversos documentos. O Sr. 12º Tabelião de Notas desta Capital manifestou-se às fls. 120/124. Designou-se audiência às fls. 149, oportunidade em que foram ouvidos Manoel Celestino dos Santos Nicolau, Jefferson de Souza, Rogério Manzanares Lindo e Delva Juliana Teixeira (fls. 177/194). O D. Representante do Ministério Público apresentou manifestação conclusiva às fls. 242/243. É o breve relatório. DECIDO. Positivou-se, na espécie, a ocorrência de abertura de cartões de assinatura em nome de José Sidney Crespo Affonso e sua ex-esposa, Sra. Julia Arzillo Affonso, com a utilização de documentos falsos, bem como o reconhecimento de firma em diversos documentos com base nos referidos cartões, cujos atos foram atribuídos ao 12º Tabelião de Notas da Capital. Consta da peça inicial que o interessado José Sidney Crespo Affonso já possuía cartão de assinatura arquivado perante à Serventia, mas que não efetuava qualquer reconhecimento desde 1998, tendo em vista que se encontra domiciliado no México desde 1999, com saída definitiva perante a Receita Federal em dezembro de 2000. Aduz, ainda, que, no ano de 2017 tomou conhecimento da existência de execuções de título extrajudicial em seu nome, as quais tinham por objeto dois contratos de locação celebrados em 2016 e 2017, em que o interessado figurava como fiador, contendo assinaturas falsas. Sendo assim, diligenciou junto à Unidade, momento em que constatou a abertura de novas fichas de assinatura em seu nome, no ano de 2005, e em nome de sua ex-esposa, Sra. Julia Arzilo Affonso, em 2017, em ambos os casos com a utilização de documentos falsos. Pois bem. Cumpre, primeiramente, frisar que o âmbito de atribuições do exercício desta Corregedoria Permanente dos Tabelionatos de Notas da Capital se desenvolve na esfera administrativa nesta 2ª Vara de Registros Públicos, limitado aos aspectos administrativos do serviço público delegado, com vistas a apurar eventual responsabilidade disciplinar do Delegatário. Vale dizer, não haverá formação de convencimento judicial para anulação dos atos notariais ou sobre responsabilidade civil. Impende ressaltar, ainda, que os fatos ocorreram quando o Delegatário anterior era o responsável pela Serventia, sendo certo que a renúncia à delegação, em nosso sentir, não acarretaria a perda de objeto do presente pedido de providências, uma vez que as supostas infrações remetem à período anterior à renúncia. Feita estas observações iniciais, após detalhada análise da documentação carreada aos autos e dos esclarecimentos prestados, bem como diante da oitiva dos envolvidos, reputo que, de fato, o antigo Delegatário tomou todas as precauções havidas por necessárias para a abertura das fichas de assinatura e para os reconhecimentos de firma, ora em análise. A despeito das alegações ventiladas pelo interessado, certo é que os documentos apresentados para a abertura das fichas de firma (fls. 127/128) demonstravam ser aparentemente verdadeiros (fls. 113/116), não indicando erro grosseiro, rasuras ou manejo de alterações. Ademais, a ausência do dígito verificador no documento de identificação de fls. 113, por si só, não configura falha suficiente à ensejar ilícito funcional, observando-se haver congruência da assinatura traçada na ficha com aquela existente na cédula, bem como correspondência entre a fisionomia do usuário e a fotografia estampada no RG. Observe-se, ainda, no ponto, que o item 182, do Capítulo XIV das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça apenas faculta ao Tabelião a exigência de renovação das assinaturas ou o preenchimento de outra ficha-padrão. Assim é que, havendo perfeita conferencia entre os padrões de assinatura do documento apresentado para reconhecimento de firma e a ficha padrão arquivada na unidade, em que pese tenha sido aberta em 2005, de fato, não seria obrigatória a nova abertura de cartão de assinatura. Ainda, nessa senda, extraí-se dos autos que José Sidney Crespo Affonso possuía cartão de assinatura na serventia desde 1987, sendo que, à época, não era exigida a reprografia do documento de identidade exibido, razão pela qual, quando da abertura do novo cartão em 2005, inexistente qualquer documento de identificação arquivado na Serventia para que fosse realizada eventual comparação. Sendo assim, em que pese a fraude perpetrada, verifica-se que foram atendidos todos os requisitos previstos nos itens 178 e 179 do Capítulo XIV das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, tendo em vista que as fichas de assinatura juntadas aos autos contêm todos os elementos necessários, com especial destaque para: a) nome do depositante, endereço, profissão, nacionalidade, estado civil, filiação e data do nascimento; b) indicação do número de inscrição no CPF e do registro de identidade c) data do depósito da firma; d) assinatura do depositante, aposta 2 (duas) vezes; e) cópia reprográfica do documento de identidade apresentado para preenchimento da ficha-padrão, devidamente arquivado com a ficha-padrão para fácil verificação. Observa-se, ainda, que, após ser comunicado da ocorrência dos fatos pelo Interessado, cuidou o Sr. Notário de apontar uma restrição nos referidos cartões de assinatura, exigindo-se o comparecimento pessoal para novos reconhecimentos de firma, a fim de que se evitar novas fraudes, em observância ao disposto no item 188 do Capítulo XIV das Normas da Corregedoria Geral de Justiça. Por oportuno, importante ressaltar a presteza, tanto do ex-Delegatário quanto do Senhor Interino atualmente responsável pela Serventia, em atender as ordens deste Juízo, providenciando a juntada de toda a documentação que se fez necessária para apuração dos fatos. Em resumo, neste expediente verificatório não foi apurada ausência de orientação e, tampouco fiscalização, da parte do Sr. Tabelião; pelo contrário, o quadro probatório é indicativo à existência de orientação e fiscalização. Ausente, portanto, culpa, está excluída a possibilidade de instauração de processo administrativo disciplinar e futura imposição de sanção administrativa. Com efeito, os precedentes desta Corregedoria Permanente fixaram a possibilidade da responsabilização disciplinar do Oficial ou Tabelião somente no caso da possibilidade de comportamento (culposo) com aptidão para impedir ato contrário ao ordenamento jurídico (erro praticado pelo Titular ou preposto). Assim, ocorrendo erro de preposto, que poderia ser evitado com a orientação e ou fiscalização do Titular da Delegação, ocorre sua responsabilização administrativa-disciplinar; a exemplo de equívocos repetidos, situações perceptíveis com um mínimo de diligência e erros crassos que denotem clara falta de orientação ou fiscalização. De outra parte, ocorrendo equívoco do preposto, o qual foi corretamente orientado e fiscalizado, ato doloso do serventuário ou ainda um erro isolado e sem maior repercussão, tem-se aplicado o entendimento da insuficiência para configuração do ilícito administrativo do Registrador ou Tabelião em virtude da ausência de culpa e gravidade, respectivamente. Neste sentido é a recente decisão da Câmara Especial do Tribunal de Justiça, no Recurso Administrativo nº 0048142-07.2015.8.26.0100, j. 07.08.2017, como se observa do seguinte extrato do voto do Desembargador Salles Abreu, Presidente da Seção de Direito Criminal, como segue: “Há de se observar a concorrência de elementos objetivo e subjetivo para a caracterização da infração disciplinar do notário. Ou seja, a conduta havida por infração disciplinar ou funcional, deve-se observar uma conduta dolosa ou culposa do notário ou seu preposto, observando-se, neste último caso, uma falha no dever de cuidado na verificação da legalidade e legitimidade do ato. Mais que isto, a responsabilidade administrativa somente surge com a existência de uma conduta ilícita no aspecto dos deveres administrativos, sendo certo que tal qualificação da ilicitude não pode ser irrazoável ou mesmo fugir ao princípio da legalidade. Não se pode considerar ilícito administrativo a conduta que, em seu aspecto material e legal, não comporta nenhuma ilicitude conhecível de ofício, mas que tem seu regime de confronto vinculado à questão da eficácia ou ineficácia privada do ato, ou mesmo da aferição da divergência entre a vontade declarada e a vontade real do declarante. Embora a configuração do ilícito administrativo não se sujeite objetivamente ao princípio da tipicidade, não se pode esvaziar o conceito formal de culpa para se configurar a conduta culposa punível no âmbito administrativo.” Em suma, os elementos probatórios coligidos nos autos não autorizam a formação de convencimento judicial no sentido da adoção de providência censório-disciplinar em relação ao serviço correicionado, não se vislumbrando responsabilidade funcional apta a ensejar instauração do procedimento administrativo, de tudo se inferindo que a fraude não contou, à evidência, com a conivência da Serventia. Ante todo o exposto, à míngua de medida correcional a ser instaurada, determino o arquivamento dos autos. De outra parte, determino o bloqueio definitivo das ficha de firma em nome de José Sidney Crespo Affonso (fls. 127) e Julia Arzilo Affonso (fls. 128). No mais, como já houve comunicação do fato à Autoridade Policial, assim, desnecessário outras providências atinentes ao artigo 40 do Código de Processo Penal. Ciência ao Sr. Tabelião e ao Ministério Público. Encaminhe-se cópia desta decisão à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo a presente sentença como ofício. I.C. ADV: DELVA JULIANA TEIXEIRA (OAB 179788/ SP)

Fonte: DJe/SP de 03.06.2019.7

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Registro Civil de Pessoas Jurídicas – Atas de assembleias – Prazos de antecedência mínima para a convocação e realização de eleição que não foram respeitados – Inobservância de regra estatutária que obsta a averbação das atas – Recurso improvido.

Número do processo: 1025037-37.2016.8.26.0071

Ano do processo: 2016

Número do parecer: 382

Ano do parecer: 2017

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1025037-37.2016.8.26.0071

(382/2017-E)

Registro Civil de Pessoas Jurídicas – Atas de assembleias – Prazos de antecedência mínima para a convocação e realização de eleição que não foram respeitados – Inobservância de regra estatutária que obsta a averbação das atas – Recurso improvido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso interposto pela Associação dos Moradores e Amigos do Vale do Igapó – AMAVI contra a sentença de fls. 82/83, que manteve os óbices à averbação de diversas atas da assembleia apresentadas ao Oficial de Registro Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de Bauru.

Sustenta a recorrente, em resumo, que o prazo de antecedência mínima não foi observado porque as assembleias tiveram que ser marcadas aos sábados para que houvesse um número maior de participantes. Além disso, entende que o processo eleitoral restou convalidado porque não houve impugnação aos atos praticados.

A Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 138/139).

É o relatório. Opino.

A recorrente se insurge contra a negativa de averbação de atas de assembleias.

As averbações foram negadas porque não foram observados os prazos de antecedência mínima previstos no artigo 41 do Estatuto Social da Associação para a convocação e a realização da eleição (fls. 52).

Analisadas as razões recursais, é forçoso reconhecer que a desqualificação das atas de assembleias foi correta.

No âmbito administrativo, cabe ao Oficial analisar a regularidade dos atos praticados sob o prisma da Lei e do Estatuto.

E, como não foram observados os prazos de antecedência previstos no Estatuto Social, correta a negativa de averbação.

A realização das assembleias aos sábados não é circunstância que autoriza a flexibilização da regra cogente que trata dos prazos mínimos previstos no Estatuto Social. Tampouco importa se os atos não foram impugnados pelos interessados, pois sob o prisma dos registros públicos, exige-se a observâncias estrita das normas legais e do Estatuto Social.

Ante o exposto, o parecer que submeto a Vossa Excelência propõe, respeitosamente, que se negue provimento ao recurso.

Sub censura.

São Paulo, 13 de novembro de 2017.

Paula Lopes Gomes

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer da MMª. Juíza Assessora da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso administrativo. Publique-se. São Paulo, 14 de novembro de 2017. (a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: CLEVERSON LUZZI, OAB/SP 250.734, AURÉLIA CARRILHO MORONI SIMAS, OAB/SP 153.224.

Diário da Justiça Eletrônico de 22.01.2018

Decisão reproduzida na página 011 do Classificador II – 2018


Fonte: INR Publicações

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