2ª VRP/SP: Pedido de Providências – Reconhecimento de assinatura na modalidade semelhança – Ato notarial que atesta a coincidência do sinal gráfico lançado por determinada pessoa e aquele arquivado no Tabelionato – Cabe, ademais, ao Tabelião, a análise de eventual ilegalidade do ato, ou se este é manifestamente contrário à moral ou à ordem pública, não sendo de sua alçada, contudo, a averiguação da vontade subjetiva das partes – Não é permitida consulta a ficha de assinatura, que somente pode ocorrer com ciência do titular e autorização do Corregedor Permanente.


  
 

Processo 1029445-76.2019.8.26.0100 

Pedido de Providências

Reclamação do extrajudicial (formulada por usuários do serviço)

M.J.G.A.

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Leticia Fraga Benitez

Vistos,

Trata-se de expediente instaurado em razão de comunicação encaminhada por M.J.G.A., noticiando supostas irregularidades na abertura de ficha de firma e no reconhecimento de firma por semelhança realizado em 19 de fevereiro de 2003 em instrumento particular de comodato, objetivando, ao final, o bloqueio de seu cartão de assinaturas.

O Sr. Titular apresentou manifestação às fls. 18/20 e 40/42.

A ilustre representante do Ministério Público apresentou parecer conclusivo às fls. 56/57.

É o breve relatório. Decido.

Trata-se de expediente instaurado em razão de comunicação encaminhada por M.J.G.A., noticiando supostas irregularidades na abertura de ficha de firma e no reconhecimento de firma por semelhança realizado em 19 de fevereiro de 2003 em instrumento particular de comodato.

Extrai-se da exordial que a interessada é possuidora de um imóvel localizado à Rua Cidade de Bagdá, nº 944, nesta Capital. E, em fevereiro de 2001, foi procurada pelo suposto proprietário do imóvel, tendo sido levada ao Registro Civil e Tabelionato de Notas do XXº Subdistrito Santo Amaro, Capital, oportunidade em que foi aberta ficha de assinatura em seu nome e efetivado o reconhecimento de firma em instrumento particular de comodato, sem o seu conhecimento (fls. 11/13).

Por fim, aduziu a Interessada que, ao comparecer à Unidade, foi impedida pelo Sr. Registrador de analisar a ficha de assinatura em seu nome.

Pois bem.

Cumpre, primeiramente, frisar que a Corregedoria Permanente, perante a qual tramita o presente, não é investida de jurisdição, posto que é via administrativa, à qual compete orientar, traçar diretriz, dirimir dúvidas, fiscalizar e eventualmente aplicar sanções disciplinares em relação aos serviços públicos delegados.

Além do mais, a extinção da Delegação do antigo Oficial, já falecido, esvazia, quase que completamente, o âmbito de atuação desta Corregedoria Permanente, uma vez que somente a ele seria atribuível eventual penalidade censório-disciplinar.

Feita estas observações iniciais, após detalhada análise da documentação carreada aos autos e dos esclarecimentos prestados, reputo que, de fato, o antigo Delegatário tomou todas as precauções havidas por necessárias para a abertura de ficha de firma e para o reconhecimento de firma no instrumento particular apresentado às fls. 11/13.

Consoante esclarecimentos prestados pelo atual Delegatário, o carimbo e o selo utilizados no documento de fls. 11/13 conferem com os empregados pela Serventia à época, bem como a assinatura aposta pertence ao escrevente J. R. S.. Ademais, verifica-se que com cartão de assinatura juntado às fls. 43 foi arquivado, adequadamente, o documento de identificação de Maria José Gomes de Almeida.

Sendo assim, o conjunto probatório colacionado demonstra a observância de todas as cautelas previstas nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.

Por outro lado, por ocasião do reconhecimento de firma por semelhança, a atuação do Notário limita-se na atestação que o sinal gráfico lançado por determinada pessoa coincide com o padrão arquivado na serventia extrajudicial, colhido após se verificar, com segurança a identidade da pessoa referida.

Cabe, ademais, ao Senhor Tabelião, a análise de eventual ilegalidade do ato, ou se este é manifestamente contrário à moral ou à ordem pública, não sendo de sua alçada, contudo, a averiguação da vontade subjetiva das partes.

Nesse quesito, consigno que já foi decidido pela Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, nos autos do Recurso Administrativo nº 0048142-07.2015, que não se pode exigir “do notário a prévia apuração da veracidade das declarações dos comparecentes, a fim de se verificar a existência ou não de ato simulado ou anulável por erro ou dolo, o que, no sistema brasileiro, não se admite.”

Igualmente, no mesmo julgado, a E. Câmara Especial firmou entendimento a respeito da matéria, nos seguintes termos: A possível existência de fraude, quando vinculada ao aspecto subjetivo da manifestação de vontade, como no caso de reserva mental, não permite a interferência do notário, por significar um julgamento da vontade final e dissimulada pela vontade declarada. A fraude apta à recusa de lavratura do ato é objetiva, verificável entre o objeto da declaração e o ordenamento jurídico, e não em relação à causa ou intenção das partes, isentos da investigação pessoal do notário (Recurso Administrativo nº 0048142-07.2015.8.26.0100, Des. Salles Abreu RELATOR, 07/08/2017).

E, consoante bem sustentado pela i. Representante do Ministério Público, “não é possível cancelar cartão de assinaturas em que não há a comprovação da fraude, tampouco para se proibir a prática do reconhecimento de firma por semelhança” (fls. 47).

Por fim, no tocante à consulta da ficha de assinatura pelo patrono da interessada, agiu bem o Sr. Notário. Isto porque, à luz do artigo 46 da Lei nº 8.935/94 e nos itens 36 e 37 do Capítulo XIII das NSCGJSP (Provimento nº 58/890), o exame dos livros e documentos somente poderia ocorrer com a ciência do titular e autorização desta Corregedoria Permanente.

Ante o exposto, indefiro o bloqueio requerido e, verificando que a hipótese dos autos não dá margem à adoção de providência censório-disciplinar em relação ao serviço correcionado, não se vislumbrando responsabilidade funcional apta a ensejar procedimento administrativo, determino o arquivamento dos autos.

Ciência ao Sr. Oficial e Tabelião e ao Ministério Público.

Comunique-se à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo a presente sentença como ofício.

P.R.I.C.

Fonte: DJe/SP de 28.05.2019.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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