Agravo de Instrumento – Inventário – Decisão que indeferiu pedido de isenção de pagamento do ITCMD – Insurgência – Transmissão de 50% do único imóvel deixado em herança – Inteligência do art. 6º, inciso I, alínea “b”, da Lei nº 10.992/2001 – O imposto deve incidir sobre o montante transmitido e não sobre o valor venal do imóvel – Decisão reformada – Recurso provido

Agravo de Instrumento – Inventário – Decisão que indeferiu pedido de isenção de pagamento do ITCMD – Insurgência – Transmissão de 50% do único imóvel deixado em herança – Inteligência do art. 6º, inciso I, alínea “b”, da Lei nº 10.992/2001 – O imposto deve incidir sobre o montante transmitido e não sobre o valor venal do imóvel – Decisão reformada – Recurso provido. (Nota da Redação INR: ementa oficial)

ACÓRDÃO Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2195306-14.2016.8.26.0000, da Comarca de Araras, em que são agravantes ANTÔNIO LUCAS, ANA LUIZA LUCAS ALVES, SILVANA APARECIDA DOS SANTOS, RAQUEL DOS SANTOS, ADRIANA DOS SANTOS, JOSE REINALDO ALVES e EDNA MARIA MORELLI LUCAS, é agravado FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em 10ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso, vencido o 2º juiz, que declarará.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores JOÃO CARLOS SALETTI (Presidente) e ARALDO TELLES.

São Paulo, 9 de abril de 2019

J.B. PAULA LIMA

RELATOR

Assinatura Eletrônica

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 2195306-14.2016.8.26.0000

Comarca: Araras (2ª Vara Cível)

Agravante: Antônio Lucas

Agravante: Ana Luiza Lucas Alves

Agravante: Silvana Aparecida dos Santos

Agravante: Raquel dos Santos

Agravante: Adriana dos Santos

Agravante: José Reinaldo Alves

Agravante: Edna Maria Morelli Lucas

Agravada: Fazenda Pública do Estado de São Paulo

Interessado: Adelina Bordin Lucas (Espólio)

Voto n° 6360

Agravo de Instrumento – Inventário – Decisão que indeferiu pedido de isenção de pagamento do ITCMD – Insurgência – Transmissão de 50% do único imóvel deixado em herança – Inteligência do art. 6º, inciso I, alínea “b”, da Lei nº 10.992/2001 – O imposto deve incidir sobre o montante transmitido e não sobre o valor venal do imóvel – Decisão reformada – Recurso provido.

Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de concessão de efeito suspensivo, interposto nos autos de inventário, em face da decisão proferida a fls.106/107 dos autos principais, que determinou a comprovação quanto ao recolhimento integral do ITCMD, arquivando-se os autos na inércia.

Inconformados, sustentam os agravantes que a isenção do recolhimento do ITCMD, para os fins do disposto no artigo 6º, inciso I, alínea “b”, da Lei nº 10.705, de 2000, deve ter por base o valor da parte transmitida na herança, e não o valor total do imóvel, como considerado pelo prolator da decisão vergastada.

Assim, requerem a suspensão da decisão recorrida para que seja reconhecido o direito à isenção do referido imposto no caso.

Efeito suspensivo deferido (fls. 44/46).

Contraminuta de fls. 50/51.

Em parecer, a D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 57/62).

É o relatório.

Assiste razão aos agravantes.

A decisão agravada indeferiu o pedido de isenção do ITCMD considerando que o artigo 6º, inciso I, alínea “b”, da Lei 10.705 de 2000, alterado por força da Lei 10.992, de 2001, considera o valor do imóvel e não do valor da parte transmitida para efeitos da isenção.

Como já observei, em consulta aos autos do inventário (fls. 09/16), verifica-se que a transmissão causa mortis envolveu 50% (cinquenta por cento) do único bem imóvel a ser transmitido, e não sua totalidade, de forma que o imposto deve levar em consideração apenas o referido percentual para seu cálculo, que traz como fato gerador a transmissão efetivamente ocorrida com o falecimento.

Ocorre que a parte ideal objeto do inventário é avaliada em R$ 26.485,05 (vinte e seis mil, quatrocentos e oitenta e cinco reais e cinco centavos), montante inferior ao limite de isenção determinado legalmente, de 2.500 UFESPs. Cumpre observar que, em 2014, ano da sucessão, o valor unitário da UFESP era de R$ 20,14 (vinte reais e quatorze centavos). Assim, procedente o pleito dos agravantes.

Nesse sentido, a jurisprudência desse Egrégio Tribunal:

“INVENTÁRIO. ITCMD. Pedido de isenção. Possibilidade de decisão nos autos de inventário. Recurso Especial Repetitivo nº 1.150.356/SP. Transmissão de 1/3 do bem imóvel. Tributo que deve incidir sobre o percentual transmitido, e não sobre o valor venal total. Arts. 38, CTN, e 9º, Lei nº 10.705/00. Herdeiros que fazem jus à isenção. Art. 6º, I, b, Lei nº 10.705/00. Decisão reformada. Recurso provido. (5ª Câmara de Direito Privado, Tribunal de Justiça de São Paulo, Agravo de Instrumento nº 2192785-96.2016.8.26.0000, Rel. Fernanda Gomes Camacho, j. 01/03/2017)” (grifei)

“Agravo de Instrumento – Inventário – Decisão determinando o recolhimento do ITCMD. Inconformismo dos agravantes, pugnando pela isenção. Juízo do inventário que é o competente para decidir sobre o pedido de isenção – Entendimento do STJ em recursos repetitivos – Falecido, ademais, que era titular, tão somente, de 50% do único bem a ser partilhado – Agravantes que preenchem os requisitos para a concessão da isenção – Decisão reformada – Recurso provido. (2ª Câmara de Direito Privado, Tribunal de Justiça de São Paulo, Agravo de Instrumento nº 2138773-69.2015.8.26.0000, Rel. José Joaquim dos Santos, j. 25/10/2016)” (grifei)

Diante do exposto, ratifico o efeito suspensivo concedido a fls. 44/46 e DOU PROVIMENTO ao recurso nos moldes supra.

J.B. PAULA LIMA

RELATOR

DECLARAÇÃO DE V O T O Nº 30.027

Segundo o relatório procedido pelo eminente Relator,

“Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de concessão de efeito suspensivo, interposto nos autos de inventário, em face da decisão proferida a fls.106/107 dos autos principais, que determinou a comprovação quanto ao recolhimento integral do ITCMD, arquivando-se os autos na inércia.

Inconformados, sustentam os agravantes que a isenção do recolhimento do ITCMD, para os fins do disposto no artigo 6º, inciso I, alínea “b”, da Lei nº 10.705, de 2000, deve ter por base o valor da parte transmitida na herança, e não o valor total do imóvel, como considerado pelo prolator da decisão vergastada.

Assim, requerem a suspensão da decisão recorrida para que seja reconhecido o direito à isenção do referido imposto no caso.

Efeito suspensivo deferido (fls. 44/46).

Contraminuta de fls. 50/51.

Em parecer, a D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 57/62)”.

É o relatório.

1. A r. decisão agravada foi lavrada nos termos seguintes:

“Conforme resta claro no art. 6º,I,”b”, da lei estadual 10.992/01, a isenção legal do ITCMD está restrita aos imóveis cujo valor de avaliação não ultrapasse 2.500 UFESPs. Assim, segundo interpretação unívoca do dispositivo em comento, não há isenção para imóveis com valor superior a 2500 UFESPs, sendo justamente este o caso dos autos.

A respeito: RECURSO DE APELAÇÃO EM AÇÃO ORDINÁRIA.TRIBUTÁRIO. ITCMD. ISENÇÃO. BEM IMÓVEL. Hipótese em que não se verifica isenção de ITCMD em transmissão de bem imóvel, valor do imóvel ultrapassa o limite de 2500 UFIRs, previsto no art. 6°, inciso I, alínea “b”, da Lei Estadual n° 10.705/00, com redação da Lei n° 10.992/01. (Relator(a): Marcelo Berthe; Comarca: Jundiaí; Órgão julgador: 5ª Câmara de Direito Público; Data do julgamento: 21/03/2016; Data de registro: 28/03/2016).Observo que não é dado ao juiz agir “contra legem”, para criar hipótese de isenção não contemplada expressamente em lei:ITCMD. Isenção. LE n” 10.705/00. Art. 6o,I, ub”. Valor total do imóvel superior a 2.500 UFESP. Valor da fração ideal arroladainferior a 2.500 UFESP. Isenção. Valor do imóvel A Lei n° 10.705/00 isenta do ITCMD a transmissão “causa mortis” de imóvel cujo valor não ultrapasse 2.500 UFESP, desde que seja o único transmitido; a lei considera o valor do imóvel, não da parte transmitida, e não pode o juiz ampliar a hipótese legal. A sentença está correta. – Segurança denegada. Recurso do impetrante desprovido. (Relator(a): Torres de Carvalho; Comarca: Presidente Prudente; Órgão julgador: 10ª Câmara de Direito Público; Data do julgamento: 22/11/2010; Data de registro: 08/12/2010; Outros números: 4502735000).

Ante todo o exposto, defiro ao inventariante o prazo de 10 dias para que traga comprovação do recolhimento integral do ITCMD.

Na inércia, arquive-se”.

Dispõe o artigo 6º, inciso I da Lei 10.705/00 (Redação dada ao artigo pela Lei 10.992, de 21-12-2001):

” Artigo 6º Fica isenta do imposto:

I a transmissão “causa mortis”:

a) de imóvel de residência, urbano ou rural, cujo valor não ultrapassar 5.000 (cinco mil) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo UFESPs e os familiares beneficiados nele residam e não tenham outro imóvel;

b) de imóvel cujo valor não ultrapassar 2.500 (duas mil e quinhentas) UFESPs, desde que seja o único transmitido;

(…).

Respeitado entendimento em diverso sentido, a norma em apreço não possibilita interpretação diversa que a literalidade do texto. A lei admite a isenção considerado o valor do imóvel, não o da parte transmitida.

Como sustenta a agravada, a lei não se refere a outro valor base de incidência do tributo senão ao do imóvel, tanto na primeira hipótese, quanto na segunda. A norma não admite outra interpretação senão essa, mesmo porque não se refere a quinhão ou a parte transmitida do bem.

Normas concessivas de isenção não admitem interpretação extensiva, restritiva ou analógica, como da doutrina e da jurisprudência dominantes, como se lê no corpo da ementa do v. acórdão proferido pelo C. Superior Tribunal de Justiça no REsp 1116620/BA Representativo de Controvérsia (Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/08/2010, DJe 25/08/2010):

“(…) revela-se interditada a interpretação das normas concessivas de isenção de forma analógica ou extensiva, restando consolidado entendimento no sentido de ser incabível interpretação extensiva do aludido benefício à situação que não se enquadre no texto expresso da lei, em conformidade com o estatuído pelo art. 111, II, do CTN. (Precedente do STF: RE 233652 / DF Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Segunda Turma, DJ 18-10-2002.

Precedentes do STJ: EDcl no AgRg no REsp 957.455/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/05/2010, DJe 09/06/2010; REsp 1187832/RJ, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/05/2010, DJe 17/05/2010; REsp 1035266/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/05/2009, DJe 04/06/2009; AR 4.071/CE, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/04/2009, DJe 18/05/2009; REsp 1007031/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/02/2008, DJe 04/03/2009; REsp 819.747/CE, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/06/2006, DJ 04/08/2006)”.

No mesmo sentido a Corte Superior decidiu nos autos do REsp 1129335/SP, em regime de recurso repetitivo (Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/06/2010, DJe 24/06/2010), afirmando, no aqui interessante: “a teor do disposto nos artigos 3º (hipóteses de isenção) e 8º (hipóteses de alíquota zero), da Lei 9.311/96, a conversão de crédito (decorrente de empréstimo) em investimento externo direto (operação simbólica de câmbio) não se encontra albergada por qualquer norma exonerativa, sendo de rigor a interpretação literal da legislação tributária que disponha sobre outorga de isenção ou exclusão do crédito tributário (artigo 111, incisos I e II, do CTN)”.

Na mesma linha de pensamento e consideração, a agravada traz à colação outra manifestação da Corte Superior e v. arestos deste Tribunal de Justiça, no mesmo sentido, e especificamente a respeito da isenção do ITCMD em hipótese semelhante à dos autos. Vale repetir:

ITCMD. Isenção. LEI nº 10.705/00. Art. 6º, I, b. Valor total do imóvel superior a 2.500 UFESP. Valor da fração ideal arrolada inferior a 2.500 UFESP. Isenção. Valor do imóvel. A LEI nº 10.705/00 isenta do ITCMD a transmissão causa mortis de imóvel cujo valor não ultrapasse 2.500 UFESP, desde que seja o único transmitido; a lei considera o valor do imóvel, não da parte transmitida, e não pode o juiz ampliar a hipótese legal. A sentença está correta. Segurança denegada. Recurso do impetrante desprovido (Ap. Civ. nº 994.05.018830-O ou 450.273.5/0.00; Rel. Des. Torres de Carvalho, 10ª Câmara de Direito Público, j. 22-11-2010)”.

ITCMD. Isenção. Bem herdado à metade. Valor venal do imóvel que não leva em conta quotas dos herdeiros, mas a integralidade do bem. Cálculo do imposto que se junge a tal entendimento. Restrição, ademais, porque os herdeiros não residem no imóvel. Inteligência do art. 6º, I, a, da Lei n. 10.705/2000, do Estado de São Paulo. Recurso não provido(AI nº 538.114-4/3-00, 6ª Câmara de Direito Privado, 27-3-2008, Rel. Des. Percival Nogueira)”.

“MANDADO DE SEGURANÇA – ITCMD – Pretensão de isenção – Não cabimento – Herança de 50% de imóvel residencial Benefício fiscal que não pode ser concedido se o valor total do imóvel superar 5.000 UFESP’s – Ocorrência Inteligência do artigo 6º, inciso I, “b”, da Lei nº 10.705/00 – Interpretação literal da legislação tributária, nos termos do art. 111, inciso II, do Código Tributário Nacional Apelo não provido. (Relator(a): Spoladore Dominguez; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 13ª Câmara de Direito Público; Data do julgamento: 28/09/2016; Data de registro: 29/09/2016)”.

Enfim, não prevendo a lei de regência hipótese de isenção do ITCMD (neste caso, porque a parte transmitida do a metade tem valor sujeito à isenção, esta a isenção pretendida, ou a incidência do tributo sobre a parte transmitida de imóvel, acertada a r. decisão agravada que, por meu voto, fica mantida.

Em outras palavras, devendo o imposto ser calculado sobre o valor do imóvel e não sobre sua metade, a isenção não pode ser concedida. Em sendo assim, a solução que se impõe é a manutenção da r. decisão recorrida.

2. Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

É meu voto.

JOÃO CARLOS SALETTI

Relator

assinado digitalmente /

Dados do processo:

TJSP – Agravo de Instrumento nº 2195306-14.2016.8.26.0000 – Araras – 10ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. J. B. Paula Lima

Fonte: DJe de 25.04.2019

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TJ/SP: Registro Civil de Pessoa Jurídica – Entidade Religiosa Católica – Registro de seus atos constitutivos junto ao Registro de Títulos e Documentos – Posterior registro dos atos constitutivos junto ao Registro Civil de Pessoas Jurídicas – Ausência de incompatibilidade de atos ou de falta dos registradores – Finalidades e efeitos jurídicos distintos em cada procedimento – Reclamação arquivada – Recurso improvido

Número do processo: 0035061-54.2016.8.26.0100

Ano do processo: 20 16

Número do parecer: 69

Ano do parecer: 2017

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 0035061-54.2016.8.26.0100

(69/2017-E)

Registro Civil de Pessoa Jurídica – Entidade Religiosa Católica – Registro de seus atos constitutivos junto ao Registro de Títulos e Documentos – Posterior registro dos atos constitutivos junto ao Registro Civil de Pessoas Jurídicas – Ausência de incompatibilidade de atos ou de falta dos registradores – Finalidades e efeitos jurídicos distintos em cada procedimento – Reclamação arquivada – Recurso improvido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Cuida-se de recurso administrativo tirado de sentença que arquivou reclamação elaborada por CONSELHO GRECO MELKITA CATÓLICO DE SÃO PAULO, solicitando apuração de suposta irregularidade no registro de seu Estatuto e de ata de assembleia geral, alterando o nome da entidade Eparquia Nossa Senhora do Paraíso Greco Melquita Católica do Brasil e contendo outras decisões, realizado pelo 3º Oficial de Pessoa Jurídica da Capital.

Alega, em síntese, que seu ato constitutivo (Bula Pontifícia datada de 1972) já havia sido registrado em fevereiro de 1999 pelo 4º Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Capital, seguido de inúmeras averbações posteriores, sendo necessário que novos atos da entidade religiosa fossem averbados nesse registro original. Argumenta com a necessidade de que o 3º Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de São Paulo agisse com cautela, pesquisando no âmbito dos títulos e documentos eventual registro prévio de atos constitutivos da recorrente, em respeito ao princípio registral da segurança jurídica. Acrescenta que o art. 114, I, da Lei 6.015/73 já indicava o procedimento a ser seguido para registro da pessoa jurídica. Havendo polêmica quanto à necessidade de registro de entidade da Igreja Católica para obtenção de personalidade jurídica, o certo é que a Eparquia Nossa Senhora do Paraíso apresentara a registro seus atos constitutivos junto ao Cartório de Títulos e Documentos, o que gerou efeitos similares aos esperados do Registro de Pessoa Jurídica. Tanto é assim, que obteve cadastro junto à Receita Federal. Cita o art. 3º do Decreto n. 7.107/10, que reafirma personalidade jurídica à Igreja Católica e todas Instituições Eclesiásticas que possuem tal personalidade em conformidade com o direito canônico. Distingue a constituição da pessoa jurídica da inserção da entidade no seio da Igreja Católica, o que depende de conformidade com o direito canônico. Nessa linha de argumentação, sustenta que a Bula Pontifícia deveria preceder qualquer outro ato subsequente, por ser ela o ato de fundação da entidade eclesiástica. Argumenta com descontinuidade registral, que não teria sido contornada pela apresentação de cópia dos documentos registrados no 4º RTD, considerando que, segundo consta da certidão de inteiro teor emitida pelo 4º RTD (fl. 27), o ato constitutivo da Eparquia (Bula Pontifícia registrada sob n. 2793339/99) teria 26 páginas, ao passo que o que foi encaminhado para o 3º RTD teria apenas cinco páginas (fls. 28/32). Ao contrário do alegado pelo Registrador do 3º RTD, a Eparquia havia sido denominada, pela Bula Pontifícia, IGREJA NOSSA SENHORA DO PARAÍSO. Aduz, ainda, a finalidade escusa do registro junto ao 3º RTD, qual seja, tratar da disposição de bens imóveis da entidade, o que já está sendo objeto de questionamento pela via jurisdicional.

Sobreveio parecer da Procuradoria de Justiça, pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

Opino.

As atribuições do Registro de Títulos e Documentos estão elucidadas no Capítulo XIX, Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, em consonância com o disposto nos arts. 127 e seguintes da Lei de Registros Públicos:

DO REGISTRO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS

SEÇÃO I

DAS ATRIBUIÇÕES

1. O registro de títulos e documentos, no âmbito de suas atribuições, é o serviço de organização técnica e administrativa que tem por finalidade assegurar a autenticidade, segurança, publicidade e eficácia dos atos e negócios jurídicos, constituindo ou declarando direitos e obrigações, para prova de sua existência e data, além da conservação perpétua de seu conteúdo.

(…)

2. No Registro de Títulos e Documentos será feito o registro:

a) dos documentos particulares, para a prova das obrigações convencionais de qualquer valor;

b) do penhor sobre bens móveis;

c) da caução de títulos da dívida pública federal, estadual ou municipal, ou em bolsa;

d) de parceria agrícola ou pecuária;

e) do mandado judicial de renovação do contrato de arrendamento;

f) de quaisquer títulos e documentos, cuja competência para registro não esteja expressamente atribuída a outra serventia em razão da especialidade ou territorialidade, a fim de assegurar autenticidade, publicidade ou eficácia contra terceiros, além de sua conservação;

g) facultativo, de quaisquer documentos, exclusivamente para fins de mera conservação.

2.1. Para surtir efeitos em relação a terceiros, deverão ser registrados no Registro de Títulos e Documentos, dentre outros documentos:

a) os contratos de locação de prédios, sem prejuízo de serem também levados ao registro imobiliário, quando consignada cláusula de vigência no caso de alienação da coisa locada;

b) os documentos decorrentes de depósitos ou de cauções feitos em garantia de cumprimento de obrigações contratuais, ainda que em separado dos respectivos instrumentos;

c) as cartas de fiança em geral feitas por instrumento particular, seja qual for a natureza do compromisso por elas abonado;

d) os contratos de locação de serviços não atribuídos a outras especialidades de registro;

e) os contratos de compra e venda em prestações, com reserva de domínio ou não, qualquer que seja a forma de que se revistam;

f) os contratos de alienação fiduciária ou de promessas de venda referentes a bens móveis;

g) todos os documentos de procedência estrangeira, acompanhados das respectivas traduções, para produzirem efeitos em repartições da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ou em qualquer juízo ou tribunal;

h) as quitações, recibos e contratos de compra e venda de automóveis, bem como o penhor destes, qualquer que seja a forma que revistam;

i) os atos administrativos expedidos para cumprimento de decisões judiciais, sem trânsito em julgado, pelas quais for determinada a entrega, pelas alfândegas e mesas de renda, de bens e mercadorias procedentes do exterior;

j) os instrumentos de cessão de direito e de crédito, de sub-rogação e de dação em pagamento.

(…)

4. O interessado deverá ser previamente esclarecido de que o registro facultativo exclusivamente para fins de mera conservação prova apenas a existência, data e conteúdo do documento, não gerando publicidade nem efeitos em relação a terceiros, sendo vedada qualquer indicação que possa ensejar dúvida sobre a natureza do registro ou confusão com a eficácia decorrente de outras espécies de atos registrais. (…)

As atribuições do Registro Civil de Pessoas Jurídicas estão disciplinadas no Capítulo XVIII, do Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, em consonância do que dispõem os arts. 114 e seguintes da Lei de Registros Públicos:

DO REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS JURÍDICAS

SEÇÃO I

DA ESCRITURAÇÃO

1. É atribuição dos Oficiais do Registro Civil das Pessoas Jurídicas:

a) registrar os atos constitutivos, contratos sociais e estatutos das sociedades simples; das associações; das organizações religiosas; das fundações de direito privado; das empresas individuais de responsabilidade limitada, de natureza simples; e, dos sindicatos. (grifo nosso)

(…)

d) averbar, nas respectivas inscrições e matrículas, todas as alterações supervenientes.

2. É vedado o registro de quaisquer atos relativos às sociedades simples; associações; organizações religiosas; fundações de direito privado; empresas individuais de responsabilidade limitada, de natureza simples; e, sindicatos, se os atos constitutivos não estiverem registrados no mesmo Serviço.

Da leitura dos itens acima copiados, nota-se a profunda diferença entre o ato de registro de títulos e documentos e o de registro de pessoa jurídica. Enquanto o primeiro tem o escopo de assegurar a autenticidade, segurança, publicidade e eficácia de atos e negócios jurídicos diversos, inclusive para o fim de sua conservação perpétua, o segundo tem a finalidade de registrar a pessoa jurídica, formalizando sua existência no âmbito nacional. Somente o registro da pessoa jurídica no Registro Civil de Pessoa Jurídica proporciona a regularidade de sua constituição perante o ordenamento jurídico brasileiro.

Os tratados internacionais que não dispõem sobre direitos humanos (CF, art. 5º, parágrafo 3º) ingressam no ordenamento jurídico pátrio, após aprovação por decreto legislativo do Congresso Nacional, situando-se, hierarquicamente, na mesma posição de leis ordinárias.

O Decreto n. 7.107/2010 conferiu ao Acordo firmado entre Estado Brasileiro e a Santa Sé, pessoas jurídicas de direito público internacional, o status de lei ordinária. O art. 3º desse Acordo promulgado pelo Decreto mencionado dispõe que “A República Federativa do Brasil reafirma a personalidade jurídica da Igreja Católica e de todas as Instituições Eclesiásticas que possuem tal personalidade em conformidade com o direito canónico, desde que não contrarie o sistema constitucional e as leis brasileiras (…)” (grifo nosso)

Reconhecido, portanto, que as instituições eclesiásticas criadas em conformidade com o Direito Canônico podem ser registradas no Brasil, desde que observem o ordenamento jurídico brasileiro, ou seja, desde que registradas no Registro Civil de Pessoa Jurídica, consoante disciplinado pela Lei de Registros Públicos e pelas NSCGJ.

Dispõe o Código Civil, em seu artigo 45, que a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado se inicia com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, sendo certo que a Lei de Registros Públicos, com a regulamentação das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, definiu que o registro formal das pessoas jurídicas de direito privado no Brasil se dá junto ao Registro Civil de Pessoas Jurídicas.

Dessa forma, não há qualquer incompatibilidade ou incongruência entre o registro dos atos constitutivos da Eparquia junto ao 3º Registro Civil de Pessoa Jurídica e o Decreto acima indicado.

Os registros havidos junto ao 4º RTD ocorreram no âmbito dos títulos e documentos, não emprestando aos atos registrados e averbados os efeitos jurídicos pretendidos pelo recorrente. Por esse motivo, não houve qualquer desrespeito ao princípio da continuidade e não havia qualquer razão para que o 3º RTD pesquisasse, no âmbito de títulos e documentos, eventuais registros dos documentos que representam os atos constitutivos da entidade religiosa.

Nos precedentes citados pelo recorrente, nota-se que o que se reconhece é que o direito canônico, correspondendo ao ordenamento jurídico da Santa Sé, pessoa jurídica de direito internacional, pode funcionar no Brasil como lei estatutária, estando, portanto, submetida às normas legais aqui vigentes e, dentre elas, as que impõem o registro de pessoa jurídica no Cartório de Registro Civil de Pessoa Jurídica.

Ao contrário do que sustenta a recorrente, não se configurou qualquer erro praticado pelo 3º Registro de Títulos e Documentos e não há falar em descontinuidade registral, já que antes do registro mencionado, não havia sido formalmente constituída a pessoa jurídica em questão perante o direito pátrio.

Não se vislumbra, portanto, qualquer vício formal nos atos registrais procedidos pelo 3º e 4º Registros de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de São Paulo e não cabe questionar, nesta seara administrativa, os critérios utilizados pela Receita Federal para cadastrar a entidade religiosa em questão.

Formalmente correto o registro dos atos constitutivos da Eparquia Nossa Senhora do Paraíso Greco-Melquita Católica do Brasil no ano de 2015, pelo 3° RTD, não cabendo, nesta esfera administrativa, analisar eventual vício intrínseco a tais atos ou eventual lesividade desses atos aos interesses da entidade. Para tais questionamentos, o interessado já informou estar se valendo das vias jurisdicionais.

Ante o exposto, o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de se negar provimento ao recurso administrativo.

Sub censura.

São Paulo, 15 de março de 2017.

Tatiana Magosso

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo, pelas razões expostas, o parecer da Juíza Assessora, para o fim de negar provimento ao recurso administrativo. Publique-se. São Paulo, 16 de março de 2017. (a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: ANTOIN ABOU KHALIL, OAB/SP 130.046, LUIZ CARLOS WAISMAN FLEITLICH, OAB/SP 131.761, ROBERTO DA SILVA ROCHA, OAB/SP 114.343 e HENRIQUE GONÇALVES VIEIRA PINTO, OAB/SP 376.355.

Diário da Justiça Eletrônico de 29.05.2017

Decisão reproduzida na página 147 do Classificador II – 2017

Fonte: INR Publicções

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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