1ªVRP/SP: Registro de Imóveis. Tratando-se de aquisição originária da propriedade, a abertura da matrícula exige a apresentação de título hábil a inaugurar cadeia filiatória, em consonância ao princípio da continuidade registrária. Não consta a aquisição do imóvel pela Municipalidade de São Paulo, mas somente a inscrição de compromisso de venda e compra firmado pelo órgão municipal.


  
 

Processo 1018356-90.2018.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1018356-90.2018.8.26.0100

Processo 1018356-90.2018.8.26.0100 – Dúvida – Registro de Imóveis – Teresa Salera de Castro – Municipalidade de São Paulo – Vistos. Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 5º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Teresa Salera de Castro, tendo em vista a negativa em se proceder à abertura de matrícula na qual figure como proprietária a interessada, tendo como objeto um imóvel localizado na Rua Felisberto de Carvalho, nº 53 – Canindé/SP. O óbice registrário refere-se ao não preenchimento dos requisitos legais, nos termos dos artigos 195, 197, 237 e 260 a 265 da Lei nº 6015/73, do Decreto nº 3.200/41 e dos artigos 1711 a 1722 do Código Civil. Esclarece o Registrador que, tratando-se de aquisição originária da propriedade, a abertura da matrícula exige a apresentação de título hábil a inaugurar cadeia filiatória, em consonância ao principio da continuidade registrária. Não consta a aquisição do imóvel pela Municipalidade de São Paulo, mas somente a inscrição de compromisso de venda e compra firmado pelo órgão municipal em favor de Giacomino Salera. Juntou documentos às fls.08/68, 72/134. A suscitada apresentou impugnação às fls.137/141. Informa que foram tomadas todas as providencias cabíveis a fim de obter a certidão de propriedade aquisitiva do imóvel pela Prefeitura de São Paulo, sendo que percorreu vários departamentos da Municipalidade, Tabelionatos e Registros de Imóveis da Capital, sem obter êxito. Destaca que outros imóveis localizados na Rua Felisberto de Carvalho – Canindé, igualmente adquiridos pela Municipalidade através de várias Leis Estaduais de Organização Municipal, bem como Decreto Lei Complementar Estadual nº 9, de 31.12.1969, foram devidamente registrados perante o Oficial do 5º Registro de Imóveis da Capital, a exemplo dos registros sob as matrículas nºs 8.978 e 48.084. Juntou documentos às fls.142/154. A Municipalidade de São Paulo (fls.195/197) alega que a área onde se insere o imóvel é de propriedade do Município de São Paulo por força de Leis Estaduais de Organização Municipal e corresponde a parte de gleba devoluta. Esclarece que a gleba não possuía registro, e com a finalidade de possibilitar a alienação dos imóveis, requereu perante este Juízo a abertura das respectivas matrículas, sendo o pedido indeferido. Salienta que a Lei Federal nº 11.977/09, já revogada, alterou substancialmente o regime de regularização fundiária, tendo seu artigo 71 previsto a possibilidade de se registrar o parcelamento do solo em glebas sem registro, e portanto sem a cadeia filiatória definida, tendo como exigências somente a implantação anterior a 1979, e a integração à cidade. Assim, é possível a regularização de parcelamento sem registro, sendo certo que a interessada adquiriu parcela desta gleba nos termos do compromisso de compra e venda, inexiste óbice para a abertura da matrícula pretendida. O Registrador prestou esclarecimentos às fls.208/213, corroborando os argumentos expostos na inicial. Assevera que este procedimento não satisfaz os requisitos indicados na legislação aplicável para a regularização fundiária, bem como a área desta quadra encontra-se picotada por alienações sucessivas, razão pela qual algumas foram registradas e outras não. Logo, seria necessário apurar em procedimento próprio de regularização fundiária quais são os lotes alienados e quais não o foram atentando-se para as discrepâncias verificadas entre a descrição dos lotes matriculados e os dados da própria municipalidade. O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls.176 e 217). É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Com razão o registrador bem como a D. Promotora de Justiça. Conforme exposto pela Municipalidade de São Paulo, a área em que se insere o imóvel não possui registro, sendo que o órgão municipal formulou perante este Juízo pedido administrativo a abertura das respectivas matrículas (processo nº 0001989-18.2012.8.26.100), sendo a pretensão julgada improcedente, por ausência de apresentação do título aquisitivo. Confira-se o trecho do julgado da lavra do MMº Juiz Marcelo Martins Berthe: “… Para a alienação dos imóveis pela Municipalidade de São Paulo pressupõe-se que haja prévio domínio tabular. E no caso não há. A abertura de matrícula não pode ser feita sem título hábil que inaugurará uma cadeia filiatória, uma vez que se trata de aquisição originária da propriedade. O título que se prestará à abertura dessas matrículas apenas poderá advir da ação própria para demarcação e discriminação das terras devolutas, o qual terá natureza declaratória do direito real da Municipalidade de São Paulo” Pois bem, para a abertura da matrícula pleiteada é imprescindível a apresentação de título hábil a registro, em consonância com o principio da continuidade, previsto nos artigos 195 e 273 da Lei de Registros Públicos, segundo o qual os registros devem ser perfeitamente encadeados, de modo a preservar a cadeia filiatória. Ocorre que na presente hipótese não consta a aquisição do imóvel pela Prefeitura de São Paulo, mas somente a inscrição de compromisso de venda e compra firmado entre a Municipalidade e Giacomino Gillo Salera. Neste contexto, a simples alegação de domínio decorrente de terras devolutas não prospera, uma vez que é necessária a discriminação da área transferido para o patrimônio público, o que é feito através da respectiva ação discriminatória a ser formulada na esfera judicial. Tal questão já foi objeto de análise perante o Egrégio Conselho Superior da Magistratura: “Abertura de matrícula e registro de imóvel em favor do Município – Terras devolutas – necessidade de ação discriminatória administrativa ou judicial para formação do título – Recurso não provido” (Apelação Cível nº 0001989-18.2012.8.26.0100, rel: Des. José Renato Nalini). Confira-se do corpo do Acórdão: “… Conforme precedente administrativo, as terras devolutas não prescindem de ação discriminatória administrativa ou judicial para a abertura de matrícula e registro em nome da municipalidade. Há necessidade da formação do titulo para a realização do registro. Essa compreensão consta do trecho do voto do Exmo. Sr. Des. Gilberto Passos de Freitas, Corregedor Geral da Justiça à época, na Ap. n.612-6/5, j. 22/02/2007, conforme segue: Não se diga, por outro lado, como faz a Apelante, que o fato de se tratar de terra devoluta dispensa prévio registro no serviço imobiliário, a autorizar que se inaugure, agora, com o ingresso da escritura de doação, nova matrícula. Isso porque, embora a situação juridica de terra devoluta se apresenta, realmente, como modo originário de aquisição de domínio, o certo é que ela não dispensa a necessária discriminação da área transferida para o patrimônio público, seja pela cia administrativa ou judicial. … Bem por isso, há que se compreender que a nova cadeia dominial, nesses casos, se inicia com o registro do titulo gerado pela discriminação da terra devoluta, sem o que o ente público não pode dispor do bem, ou, pelo menos, o ato de disposição praticado pelo ente público não tem acesso ao fólio real” Fato é que a abertura de matrícula indiscriminadamente, sem apresentação do titulo aquisitivo, gerará insegurança juridica que atos registrários se espera, visando a estabilidade das relações jurídicas, a justificar o formalismo moderado que os delegatários realizam na qualificação dos documentos apresentados. Ressalto que o fato de que outros imóveis localizados na mesma rua e adquiridos na mesma forma serem registrados, por si só não induz a abertura da matrícula, tendo em vista a atualização dos julgados e da jurisprudência que com base no mencionado princípio da segurança juridica interrompeu a prática dos registros somente com base em leis e decretos, logo, eventuais condutas equivocadas não justificam a prática de novos erros. Por fim, a alegação da possibilidade de regularização fundiária pelo órgão municipal não é objeto do presente procedimento, sendo que tal questão poderá ser aventada e formulada em procedimento específico com o fim de regularizar o parcelamento da área adquirida pela interessada a partir do registro do compromisso de compra e venda. Logo entendo que deve ser mantido o óbice imposto pelo delegatário. Diante do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 5º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Teresa Salera de Castro, e consequentemente mantenho o óbice para abertura de matrícula. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: MARCIA HALLAGE VARELLA GUIMARAES (OAB 98817/SP), SIMONE COSTA NAZIOZENO (OAB 283962/SP).

Fonte: DJe de 06.03.2019 – SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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