Recurso administrativo – Decisão proferida pela Corregedoria Permanente que determinou o bloqueio de matrículas – Recurso de credor fiduciário prejudicado pelo bloqueio – Bloqueio administrativo, previsto no artigo 214, § 3º, da Lei n° 6.015/73, que pressupõe que novas inscrições possam efetivamente causar danos de difícil reparação – Suposto vício registral alegado por pessoa que nem remotamente é afetada por ele – Suposto prejudicado pela falta de inscrição de faixa de terra cujos interesses foram preservados pela averbação de retificação imobiliária – Parecer pelo provimento do recurso, para determinar o desbloqueio das matrículas.


  
 

Número do processo: 1002337-20.2017.8.26.0625

Ano do processo: 2017

Número do parecer: 332

Ano do parecer: 2017

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1002337-20.2017.8.26.0625

(332/2017-E)

Recurso administrativo – Decisão proferida pela Corregedoria Permanente que determinou o bloqueio de matrículas – Recurso de credor fiduciário prejudicado pelo bloqueio – Bloqueio administrativo, previsto no artigo 214, § 3º, da Lei n° 6.015/73, que pressupõe que novas inscrições possam efetivamente causar danos de difícil reparação – Suposto vício registral alegado por pessoa que nem remotamente é afetada por ele – Suposto prejudicado pela falta de inscrição de faixa de terra cujos interesses foram preservados pela averbação de retificação imobiliária – Parecer pelo provimento do recurso, para determinar o desbloqueio das matrículas.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

JGP Canvas Distressed Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Não-Padronizados interpôs recurso administrativo contra a sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Registro de Imóveis e Anexos de Taubaté, que determinou o bloqueio das matrículas 139.473, 139.474, 139.475 e 4.539 e, por consequência, impediu a averbação da consolidação de propriedade fiduciária requerida por meio do protocolo n° 364.225.

Alega a recorrente, em resumo, que: o procedimento de consolidação de propriedade que lhe interessa foi injustamente suspenso; o pedido de cancelamento das alienações fiduciárias foi feito por avalista, pessoa que somente será beneficiada pela consolidação da propriedade; não houve erro registral no transporte das garantias fiduciárias para as matrículas resultantes do desmembramento da matrícula n° 4.539; os bloqueios determinados, por vias transversas, blindaram o patrimônio da devedora fiduciante; a sentença condiciona o levantamento do bloqueio à propositura de demanda pelo avalista, fato que provavelmente jamais ocorrerá; a existência de servidão administrativa omitida na matrícula não justifica o bloqueio. Pede, por fim, o desbloqueio das matrículas n° 139.473, 139.474, 139.475 e 4.539 todas do Registro de Imóveis de Taubaté (fls. 143/161).

Contrarrazões a fls. 288/315.

A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 327/329).

É o relatório.

Opino.

Inicialmente, destaco que o caso é de se receber a apelação – cabível exclusivamente em procedimento de dúvida, na forma do artigo 202 da lei n° 6.015/73 – como recurso administrativo, cabível genericamente contra decisões proferidas por Juízes Corregedores Permanentes[1].

De acordo com as informações prestadas pela Oficial (fls. 1/7):

a) em novembro de 1976, a matrícula n° 4.539 foi aberta, titulada por Granja Piloto Ltda., com área total de 79,86 hectares (fls. 82);

b) em junho de 1980, o imóvel foi adquirido por Cooperativa Agrícola de Cotia (R.37/M-4.539 – fls. 87);

c) em junho de 2014, a descrição do imóvel foi retificada (Av.52/M-4.539 – fls. 90);

d) em setembro de 2014, em ação de liquidação extrajudicial proposta por Unibanco União de Bancos Brasileiros S/A e outros contra Cooperativa Agrícola de Cotia, o bem foi arrematado por Eben 10 Empreendimento Imobiliário Spe Ltda. (R.53/M-4.539 – fls. 91);

e) também em setembro de 2014, a proprietária Eben 10 Empreendimento Imobiliário Spe Ltda. alienou fiuduciariamente o imóvel a Bny Mellon Serviços Financeiros Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários S/A, na qualidade de administradora de JGP Distressed Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Não-Padronizados (R.54/M-4.539 – fls. 92);

f) em março de 2015, o imóvel foi parcialmente desapropriado (Av.55/M-4.539 – fls. 92) e, em razão desse destaque, nova retificação foi requerida. Por ocasião do exame dos títulos, constatou-se que o imóvel era cortado por uma faixa de terra de propriedade de Light Serviços de Eletricidade S/A, por onde passa linha de transmissão de energia;

g) em virtude da desapropriação e da descoberta da linha de transmissão, a matrícula n° 4.539 foi encerrada, com a abertura de três matrículas novas: 139.473, 139.474 e 139.475 (Av.56/M-4.539 – fls. 93), para as quais foram transportadas a informação relativa à alienação fiduciária (cf. Av.1-M-139.473 – fls. 101/102; Av.1-M-139.474 – fls. 103/104; Av.1-M-139.475 -fls.106);

Verificada a mora no empréstimo garantido por alienação fiduciária e iniciado o procedimento de consolidação da propriedade do bem em favor da credora fiduciante, Paulo César Pinelli, coavalista na avença (fls. 259 e 262), apresentou requerimento solicitando: 1) imediata suspensão do procedimento de consolidação da propriedade fiduciária; e 2) a retificação das averbações referentes à alienação fiduciária que foram indevidamente inseridas nos imóveis de matrículas n° 139.473, 139.474 e 139.475.

Por meio da sentença de fls. 134/135, tanto o pedido de suspensão do procedimento de consolidação da propriedade fiduciária, como o requerimento de retificação das averbações foram indeferidos. No entanto, acolhendo pleito do Ministério Público, o MM. Juiz Corregedor Permanente determinou o bloqueio das matrículas n° 139.473, 139.474, 139.475, bem como o da matrícula primitiva, 4.539.

Como ponderado pelo recorrente, todavia, o bloqueio das matrículas não se justifica e deve ser revisto.

Embora o § 3º do artigo 214 da Lei n° 6.015/73 admita o bloqueio de matrículas na esfera administrativa, essa medida pressupõe que novas inscrições possam efetivamente causar danos de difícil reparação.

Em outras palavras, o simples receio de um dano, cuja ocorrência seja improvável, não justifica medida gravosa como o bloqueio de matrícula.

Cabe assinalar, de início, que a ordem de bloqueio determinada em primeiro grau coloca o recorrente em situação extremamente desvantajosa, por suposto vício registral a que não deu causa. Isso porque a consolidação da propriedade fiduciária do imóvel dado em garantia fica obstada pelos bloqueios. Ou seja, concedido um empréstimo de R$20.000.000,00 (fls. 260), ficou o credor impedido de executar a principal garantia que lhe foi dada por conta dos bloqueios das matrículas.

Além disso, uma pessoa que nunca foi proprietária do imóvel dado em garantia nem dos imóveis que resultaram da segunda retificação e que, indiretamente, se beneficiará com a consolidação da propriedade, pois deixará de responder pelo débito como avalista, alega um vício registral que nem de longe lhe afeta. O ponto a que se apega o recorrido – preservação da faixa de terra de propriedade de Light Serviços de Eletricidade S/A – somente interessa a essa empresa.

E mais do que isso. A partir do momento em que se constatou a existência de faixa de terra de propriedade de Light Serviços de Eletricidade S/A, essa área foi preservada, o que resultou no encerramento da matrícula primitiva (4.539) e na abertura de três novas (139.473, 139.474 e 139.475).

Como bem explicado pela registradora, “com a desapropriação de uma área de 33.935,13m² pela Prefeitura local, a devedora fiduciante provocou nova retificação, que além de excluir essa área desapropriada, excluiu, também, aquela desapropriada no passado pela Light” (fls. 5).

Isto é, mesmo os interesses da Light Serviços de Eletricidade S/A estão aparentemente preservados.

Ressalte-se, por fim, que o transporte da garantia fiduciária da matrícula primitiva para aquelas que surgiram a partir do procedimento de retificação é medida adequada, que encontra amparo no item 56.1 do Capítulo XX das NSCGJ:

56.1. Se na certidão constar ônus ou ações, o oficial fará a abertura da matrícula e em seguida (AV. 1) averbará sua existência, consignando sua origem, natureza e valor, o que ocorrerá, também, quando o ônus estiver lançado no próprio cartório. Por tais averbações não são devidos emolumentos e custas.

Por todas essas razões, a reforma da decisão de primeiro grau se impõe, pois não há motivo razoável a justificar a manutenção dos bloqueios.

Nesses termos, o parecer que submeto à elevada consideração de Vossa Excelência é no sentido de receber a apelação como recurso administrativo, dando-lhe provimento, para determinar o desbloqueio das matrículas n° 139.473, 139.474, 139.475 e 4.539 todas do Registro de Imóveis e Anexos de Taubaté.

Sub censura.

São Paulo, 13 de setembro de 2017.

Carlos Henrique André Lisboa

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, recebo a apelação como recurso administrativo e a ele dou provimento, para determinar o desbloqueio das matrículas nº 139.473, 139.474, 139.475 e 4.539 todas do Registro de Imóveis e Anexos de Taubaté. Publique-se. São Paulo, 14 de setembro de 2017. (a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: MARCELO ALEXANDRE LOPES, OAB/SP 160.896, EDUARDO MENDES DE OLIVEIRA PECORARO, OAB/SP 196.651, RODRIGO BARRETO COGO, OAB/SP 164.620, THIAGO PEIXOTO ALVES, OAB/SP 301.491, LUIZA PEIXOTO DE SOUZA MARTINS, OAB/SP 373.801, LUIZ RODOLFO CABRAL, OAB/ SP 168.499 e PAULO SÉRGIO DE TOLEDO, OAB/SP 248.912.

Diário da Justiça Eletrônico de 16.11.2017

Decisão reproduzida na página 296 do Classificador II – 2017

Nota:

[1] Artigo 246 – De todos os atos e decisões dos Juízes corregedores permanentes, sobre matéria administrativa ou disciplinar, caberá recurso voluntário para o Corregedor Geral da Justiça, interposto no prazo de 15 (quinze) dias, por petição fundamentada, contendo as razões do pedido de reforma da decisão.

Fonte: INR Publicações

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