CSM/SP: Registro de Imóveis – Dúvida inversa – Regularização fundiária urbana – Título com prenotação cancelada pelo decurso do prazo de validade do protocolo – Requerimento não instruído com todos os documentos necessários ao registro – Impossibilidade de julgamento condicional – Dúvida prejudicada – Recurso não conhecido.


  
 

Trata-se de apelação interposta contra r. sentença que indeferiu pedido formulado pela Prefeitura do Município de Santo André para o afastamento dos óbices opostos ao registro de projeto de regularização fundiária e para que seja “…expedida determinação judicial a permitir o reparcelamento do Loteamento Parque Represa Billings, Glebas I e II, na forma proposta no pedido encaminhado ao 2º Cartório de Registro de Imóveis” (fls. 05).

A apelante alegou, em suma, que o projeto de loteamento, que abrangeu área de proteção aos mananciais, foi originalmente arquivado no 1º Registro de Imóveis de Santo André que teve competência entre os anos de 1955 a 1966. Posteriormente, entre 1967 e 1990 foi competente o Registro de Imóveis de Ribeirão Pires, passando o registro do imóvel, a partir de 1990, para a circunscrição do 2º Registro de Imóveis de Santo André em razão de decisão judicial que reconheceu que está situado neste Município. Disse que o loteamento foi implantando por Osvaldo Marques de Almeida e que foram constatadas divergências entre as plantas do loteamento e sua implantação, afetando os compradores dos lotes, além do loteamento ocupar área de preservação permanente com restrições para construção e uso. Em razão disso moveu ação civil pública em que foi celebrada transação, homologada por sentença, em que se obrigou a promover os levantamentos necessários para que o registro do loteamento seja adequado à forma como foi implantado, observadas as normas incidentes para a ocupação do solo urbano, obrigando-se o loteador, por seu turno, a promover a transferência de lotes suficientes para que sejam atendidas as normas ambientais e urbanísticas. Informou que promoveu os estudos e levantamentos necessários, com a participação dos adquirentes dos lotes. O loteador, por sua vez, se obrigou a promover a doação de lotes para o reassentamento de famílias, a permuta de lotes com terceiros, a obtenção do licenciamento ambiental, a contratação de projetos e a implantação de obras de infraestrutura e iluminação Pública. Porém, o registro foi negado com sugestão de adequação do pedido às normas incidentes para a regularização fundiária, ressalvada eventual determinação judicial para que seja realizado em conformidade com o projeto já elaborado. Além disso, em sua manifestação neste processo o Oficial de Registro afirmou que o título deve ser complementado para também conter: “1.) o destino final das matrículas abertas com base no registro original do loteamento; 2.) a possível quebra do princípio da continuidade no momento da transmissão dos imóveis criados a partir da nova planta do empreendimento, caso tal missão não seja desempenhada pelo loteador ou seus sucessores; 3.) será também necessário especificar qual o documento que servirá como justo título para aquisição da propriedade dos lotes; 4.) por fim, explicitar a forma de cobrança dos emolumentos ( dentro ou fora do regime especial instituído pela legislação que disciplina a regularização fundiária)” (fls. 218). Diante das exigências formuladas, requereu a reforma da sentença: “…a fim de que seja possibilitada a regularização do Loteamento do Parque Represa Billings, Glebas I e II, na forma proposta no pedido encaminhado ao 2º Cartório de Registro de Imóveis” (fls. 208/223).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pela manutenção da recusa do registro (fls. 241/243).

É o relatório.

Anoto, primeiro, que embora sob a denominação de “procedimento administrativo” (fls. 05) o que a apelante pretende é a obtenção de determinação judicial de registro do projeto de regularização fundiária já elaborado e apresentado ao Oficial de Registro de Imóveis (fls. 05), razão pela qual o pedido foi processado como dúvida inversa, com interposição do recurso previsto no art. 202 da Lei nº 6.015/73 (fls. 208).

O registro do projeto de regularização fundiária apresentado pela apelante ao Oficial de Registro de Imóveis foi originalmente prenotado em 19 de abril de 2016, sob nº 136461 (fls. 46), e foi reapresentado em 13 de junho de 2016 com prenotação nº 136513 (fls. 47).

Na primeira prenotação foi expedida nota de devolução em que exigida “…a relação dos nomes dos proprietários dos lotes referentes às glebas 02 e 03 do ‘Parque Represa Billings’, fornecida pelo 1º Oficial de Registro de Imóveis de Santo André e pelo Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Pires” (fls. 46).

Vencido o prazo de validade da primeira prenotação, foi o título reapresentado e gerou nova nota devolutiva em que constou:

1 – O presente levantamento aprovado pela Municipalidade, foi efetivamente recepcionado por este serviço registral.

2 – Desta forma, títulos anteriores elaborados em desacordo com a presente planta, deverão ser saneados, ou, alternativamente, novos títulos deverão ser confeccionados em sede de regularização fundiária ou determinação judicial“.

Contudo, este procedimento foi apresentado em 25 de setembro de 2017 (fls. 01), quando já vencido o prazo de 30 dias para validade da última prenotação (art. 205 da Lei nº 6.015/73), o que prejudica o reexame do título que, ademais, não foi juntado por inteiro aos autos como consta às fls. 5, item V, nem foi reapresentado ao Oficial de Registro de Imóveis para novo protocolo como exigido em nota de esclarecimento do item 41.1 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça:

Nota: Suscitada por meio eletrônico, o Juízo dará ciência dos termos e da data da suscitação ao oficial de registro e aguardará a apresentação dos motivos da recusa do registro. O suscitante encaminhará ao registrador a via original do título em cinco dias contados da data do protocolo da dúvida, sob pena de arquivamento. Ao receber o título, o registrador o prenotará, dará recibo ao apresentante e, no prazo de 15 dias, informará ao Juízo se lhe foi apresentada a via original do título dentro do prazo e as razões da recusa. Se o interessado no registro não tiver advogado constituído, poderá apresentar a petição em meio físico no distribuidor do Fórum, onde será protocolada, digitalizada, e destruída após a formação do processo eletrônico. Os documentos que instruem a petição, o título recusado pelo registrador inclusive, serão apresentados em cópia, não cabendo ao distribuidor esse exame. Distribuída a dúvida, o suscitante encaminhará a via original do título ao registro de imóveis nos termos do parágrafo acima. As petições intermediárias em meio físico serão apresentadas diretamente no Ofício Judicial competente, que a digitalizará e a inserirá no processo eletrônico“.

O procedimento de dúvida é reservado à análise da dissensão do apresentante com os motivos que levaram à recusa do registro do título que, para essa finalidade, deve ser objeto de protocolo válido, pois de seu julgamento decorrerá a manutenção da recusa, com cancelamento da prenotação, ou a improcedência da dúvida que terá como consequência a realização do registro (art. 203, II, da Lei nº 6.015/73).

A necessidade de protocolo válido decorre de interpretação lógica da Lei nº 6.015/73 que: I) em seu art. 182 determina que todos os títulos tomarão no protocolo o número de ordem correspondente à sequência de apresentação; II) em seu art. 198, e incisos, dispõe sobre a anotação da dúvida no Livro nº 1 Protocolo, para conhecimento da prorrogação do prazo da prenotação; III) em seu art. 203 prevê os efeitos do julgamento da dúvida em relação ao registro e, em consequência, ao resultado da qualificação realizada depois da respectiva prenotação do título.

Ademais, os títulos ingressaram no protocolo conforme a rigorosa ordem cronológica de apresentação e adquirem preferência para o registro também conforme essa ordem.

E não é possível decidir a dúvida sem prenotação válida porque o que se qualifica é o título efetivamente apresentado para registro e com prioridade sobre eventuais outros títulos representativos de direitos reais contraditórios.

Em razão disso, na forma como suscitada a dúvida adquire natureza meramente consultiva, para o que não se presta.

Ainda, a determinação de registro em procedimento em que o título não foi apresentado por inteiro e sem que exista prenotação válida equivaleria à prolação de decisão condicional, pois sua execução dependeria da futura e eventual observação de outros requisitos, o que não se mostra possível (art. 492, parágrafo único, do CPC).

Por esses motivos este Col. Conselho Superior da Magistratura já decidiu:

No mais, ao contrário do sustentado pelo recorrente, não cabe aqui ao Judiciário se pronunciar acerca da solução cabível para o caso concreto, não se tratando de órgão consultivo, como bem ressaltado pela nobre representante do parquet” (CSM, Processo n° 000.608.6/7-00, Rel. Des. Gilberto Passos de Freitas, j. 21/12/2006).

Por seu turno, o presente procedimento não é adequado para o suprimento judicial de eventuais requisitos para o registro da regularização fundiária urbana, que não foram especificados pela apelante, pois, reitero, se destina unicamente à análise do inconformismo com as exigências formuladas para o registro do título na forma como prenotado (art. 198 da Lei nº 6.015/73).

Tudo isso torna a dúvida prejudicada, impedindo o conhecimento do recurso.

Ressalvo, porém, que o resultado deste procedimento não impede a adoção das medidas que forem cabíveis para a regularização fundiária urbana, observada a legislação vigente, assim como não impede que a apelante se utilize dos meios próprios para a execução da transação celebrada com o loteador, se for o caso, ou adote outras medidas que entender necessárias para que o projeto de regularização fundiária atenda todos os requisitos que se mostrarem cabíveis ao seu registro.

Ante o exposto, pelo meu voto, declaro a dúvida prejudicada e não conheço do recurso.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: INR Publicações – DJe/SP

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