ADJUDICAÇÃO. PENHORA – CANCELAMENTO INDIRETO.

Um tema muito interessante e sempre debatido é o relacionado ao cancelamento indireto de constrições judiciais, mormente penhoras, em razão de arrematação ou adjudicação posteriores quando a execução não guarde relação com as penhoras anteriormente inscritas. A decisão da CGJSP que hoje divulgamos é muito boa e merece ser conhecida.

CGJSP – RECURSO ADMINISTRATIVO: 1093002-08.2017.8.26.0100
LOCALIDADE: São Paulo DATA DE JULGAMENTO: 13/03/2018 DATA DJ: 22/03/2018
RELATOR: Geraldo Francisco Pinheiro Franco
LEI: LRP – Lei de Registros Públicos – 6.015/1973 ART: 251 INC: I
LEI: CPC – Código de Processo Civil – 5.869/1973 ART: 698

REGISTRO IMOBILIÁRIO. CANCELAMENTO DE PENHORA – Mesmo diante do registro de carta de adjudicação e sua repercussão no registro imobiliário (cancelamento indireto) não cabe expedição de ordem para o cancelamento de inscrições de penhora provenientes de outros processos judiciais, competindo requerimento ao juízo que a determinou – Preliminar rejeitada e Recurso não provido.

ÍNTEGRA

PROCESSO Nº 1093002-08.2017.8.26.0100 – SÃO PAULO – FRANCISCO DE OLIVEIRA NETO. – Advogado: ROGERIO DAMASCENO LEAL, OAB/ SP 156.779. – (101/2018-E) – DJE DE 22.3.2018, P. 23.

REGISTRO IMOBILIÁRIO. CANCELAMENTO DE PENHORA – Mesmo diante do registro de carta de adjudicação e sua repercussão no registro imobiliário (cancelamento indireto) não cabe expedição de ordem para o cancelamento de inscrições de penhora provenientes de outros processos judiciais, competindo requerimento ao juízo que a determinou – Preliminar rejeitada e Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de apelação interposta contra r. sentença que indeferiu o cancelamento de penhoras anteriores em razão do registro de adjudicação de bem imóvel decorrente de ação trabalhista.

Sustenta o recorrente, em preliminar, nulidade da sentença por não haver apreciado o pedido sucessivo e no mérito o cabimento do cancelamento das averbações de penhoras em virtude do registro da carta de adjudicação (a fls. 66/146).

A D. Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (a fls. 154/156).

É o relatório.

Opino.

Apesar da interposição do recurso com a denominação de apelação, substancialmente cuida-se de recurso administrativo previsto no artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo, cujo processamento e apreciação competem a esta Corregedoria Geral da Justiça.

Diante disso, pela aplicação dos princípios da instrumentalidade e fungibilidade ao processo administrativo, passo a seu conhecimento.

Apesar da r. sentença não haver mencionado de forma expressa no dispositivo o pedido de cancelamento indireto das averbações, de seu conteúdo é possível concluir pela improcedência daquele. A tanto, o parágrafo final da fundamentação menciona (a fls. 46):

Logo, sem expressa ordem judicial oriunda dos Juízos que determinaram a constrição, não se pode admitir o cancelamento das penhoras anteriores como decorrência do registro da adjudicação dos bens constritos em ação trabalhista.

Nessa ordem de ideias, não se sustenta a alegação de nulidade, porquanto a r. sentença indeferiu o cancelamento, seja de modo direto ou indireto.

Como se observa do R.10 da matrícula n. 117.414 (a fls. 26), realizado em 20.05.2013, houve o registro da adjudicação do imóvel em favor do Sr. Francisco de Oliveira Neto, ora recorrente, consoante carta de adjudicação expedida pela 35ª Vara do Trabalho da Comarca de São Paulo em 28.09.2007.

Não obstante, permaneceram as inscrições R.3 (penhora, efetuada em 10.02.2005), R.4 (penhora, realizada em 21.10.2005), R.5 (penhora, realizada em 09.03.2007) e Av. 7 (arrolamento, realizada em 26.01.09 (a fls. 21/22); cujo cancelamento é objeto deste recurso.

A carta de adjudicação registrada não determinou expressamente o cancelamento das inscrições acima referidas, destarte, não ocorre situação prevista no artigo 251, inciso I, da Lei n. 6.015/73.

De outra parte, as decisões exaradas neste processo têm natureza jurídica administrativa, não de jurisdição voluntária (nesse sentido, Luís Paulo Aliende Ribeiro, Regulação da função pública notarial e de registro, São Paulo: Saraiva, 2009, p. 86), assim, o fato de serem tomadas pelo Poder Judiciário, em função atípica, não as torna decisões judiciais, ou seja, aquelas com natureza jurídica jurisdicional.

Ainda que se tivesse outra compreensão, não seria possível, neste processo, o cancelamento das inscrições, as quais devem ser requeridas ao juízo que as determinou.

É posição consolidada nos precedentes administrativos desta Corregedoria Geral da Justiça a impossibilidade do cancelamento de inscrição de penhora no registro imobiliário, realizada a partir de determinação da Autoridade Jurisdicional, por decisão administrativa da Corregedoria Permanente.

Nesse sentido, os seguintes precedentes:

REGISTRO DE IMÓVEIS – Arrematação – Modo derivado de aquisição da propriedade imobiliária – Questão, todavia, irrelevante – Cancelamento direto de penhoras estranhas ao processo onde ocorreu a alienação judicial – Necessidade de ordem judicial emanada da autoridade competente, ou seja, daquela que determinou as inscrições – Registro da carta de arrematação, portanto, é insuficiente para tanto – Confirmação do juízo de desqualificação registral – Recurso desprovido. (CGJ, Processo n. 0004589-40.2014.8.26.0456, j. 03.08.2016).

REGISTRO DE IMÓVEIS – Carta de arrematação – Cancelamento direto de penhora estranha à do processo onde ocorrida a alienação judicial -Impossibilidade – Precedentes do Conselho Superior da Magistratura e da Corregedoria Geral da Justiça – Dúvida improcedente – Recurso provido. (CGJ, Processo n. 0011823-84.2015.8.26.0344, j. 28.07.2016).

Registro de Imóveis – Pretensão de cancelamento de hipotecas e penhoras à vista de arrematação ocorrida em juízo cível – Cancelamento de penhoras que depende de ordem do juízo que as determinou – Ausência de comprovação da notificação do credor hipotecário – Impossibilidade do cancelamento – Inteligência do art. 1.501 do Código Civil – Recurso desprovido. (CGJ, Processo n. 1017712-21.2016.8.26.0100, j. 16.07.2016).

Esse raciocínio também se aplica à averbação do arrolamento realizado por solicitação da Receita Federal.

Nessa linha, não é possível ao Juiz Corregedor Permanente, bem como a esta Corregedoria Geral da Justiça em sede recursal, determinar o cancelamento das averbações objeto deste pedido de providências.

Também é posição pacífica do C. Conselho Superior da Magistratura o cancelamento indireto das inscrições de penhora em decorrência do registro de Carta de Adjudicação.

Entre muitos, cito trecho do voto do Exmo. Des. Manoel de Queiroz Pereira Calças, Corregedor Geral da Justiça à época, na apelação cível n. 0019371-42.2013.8.26.0309, j. 14.03.2017, conforme segue:

A jurisprudência administrativa do C. CSM, forte na doutrina de Afrânio de Carvalho, sedimentou posição no sentido de que duas são as espécies de cancelamento dos registros (em sentido lato): o direto, dependente de assento negativo, efetuado mediante averbação, e o indireto, decorrente da repercussão de inscrições subsequentes (como, por exemplo, as da arrematação e adjudicação) sobre as anteriores.

Oportuno, a respeito do tema, transcrever trechos do julgamento da Apelação Cível n.º 13.838-0/4, rel. Des. Dínio de Santis Garcia, ocorrido em 24.2.1992:

… o registro de arrematação não reclama o cancelamento direto e autônomo de registro das constrições precedentes, porque ele se afeta negativamente pela inscrição mais nova. Isso se dá porque a arrematação tem força extintiva das onerações pessoais e até mesmo das reais (cfr. Artigo 251 – II, Lei 6.015/73, de 31 de dezembro de 1973; Afrânio de Carvalho, op. cit., pág. 83), e de extinção do direito é que deriva a admissão de cancelamento do registro que lhe corresponda (RIFA SOLER, “La anotaction preventiva de embargo, 1983, págs. 510 ss.). O vínculo da penhora traslada-se para o preço da aquisição, sobre o qual concorrem os credores (LOPES DA COSTA, com apoio em DIDIMODA VEIGA e CARVALHO SANTOS, “Direito Processual Civil Brasileiro, 1947, IV, pág. 169).

Observe-se, por fim, que, no cancelamento indireto, é despicienda, em regra, a elaboração de assento negativo, salvo quanto à hipoteca, em vista da necessidade de qualificar-se pelo registrador a ocorrência que não é automática – da causa extintiva segundo prescreve o artigo 251 – II, Lei nº 6.015, citada. (grifei)

A E. CGJ, nessa linha, subsidiada pelos precedentes do C. CSM, consolidou o entendimento de ser indireto o cancelamento de penhoras, arrestos e sequestros em função do registro de arrematação ou adjudicação, ou seja, o cancelamento direto não é automático, não deriva necessariamente da inscrição da arrematação, mas é prescindível, malgrado possível, se por ordem expressa do Juízo que determinou a constrição judicial.

A resposta à consulta formulada no Protocolado CG n.º 11.394/2006, documentada no parecer n.º 238/06-E, de autoria do Juiz Assessor da Corregedoria Álvaro Luiz Valery Mirra e do hoje Des. Vicente de Abreu Amadei, aprovado, em 26.6.2006, pelo Des. Gilberto Passos de Freitas, é esclarecedora:

… no tocante ao registro da arrematação ou adjudicação o que se verifica é a sua ‘ressonância’ sobre o registro das constrições anteriores (penhoras, arrestos ou sequestros), para a retirada da eficácia destas em relação ao credor que arremata ou adjudica o imóvel, configurador do aludido ‘cancelamento indireto’. Não há, nesses termos, ‘cancelamento direto’ das constrições anteriores, dependente de assento negativo, razão pela qual inviável se mostra falar em automático cancelamento do registro daquelas com base tão-só no registro da arrematação ou adjudicação, a partir de requerimento do interessado.

É certo, porém, que tal cancelamento direto das penhoras antecedentes, embora despiciendo, como visto, pode, efetivamente, ser obtido pelo interessado, a fim de evitar dificuldade na leitura e no entendimento, por parte de leigos, da informação gerada pela matrícula, como mencionado pelo Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente (fls. 77). Mas para tanto, dever-se-á obter ordem judicial, expedida pelo juízo da execução que determinou a penhora.

Anote-se que a ordem judicial em questão se mostra imprescindível para o cancelamento direto das penhoras, já que estas foram determinadas pelo juiz da execução, no exercício regular da jurisdição, não cabendo sequer ao Juiz Corregedor Permanente ou a esta Corregedoria Geral da Justiça, no exercício de atividade meramente administrativa, deliberar a respeito. Como se sabe, no sistema jurídico-constitucional brasileiro, admite-se que os atos dos demais Poderes do Estado – legislativos e administrativos – sejam revistos pelos juízes no exercício da jurisdição, mas o contrário, ou seja, a revisão dos atos jurisdicionais dos juízes pelas autoridades legislativas ou administrativas, é absolutamente inadmissível (Cândido Rangel Dinamarco, Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo: Malheiros, 2001, vo. I, p. 310).

… Assim, sem expressa ordem judicial oriunda do juízo que determinou a constrição, não se pode admitir o cancelamento de penhoras, arrestos e sequestros antecedentes, como decorrência automática do registro da arrematação ou adjudicação dos bens constritos havida em execução judicial. (grifei)

Tal compreensão foi mantida pelo C. CSM e pela E. CGJ mesmo no período durante o qual subsistiu a intelecção no sentido de ser originária a natureza jurídica da aquisição de imóvel mediante arrematação judicial.

Portanto, daí decorrem as seguintes conclusões: a) a arrematação, forma de alienação forçada do bem e de aquisição derivada da propriedade, pode ser levada a cabo e registrada não obstante a indisponibilidade (essa impede, apenas, a alienação voluntária); b) registrada a carta de arrematação, ocorre o cancelamento indireto das penhoras e, portanto, afasta-se a indisponibilidade; c) tornando-se o bem disponível, ele pode ser alienado pelo arrematante, razão pela qual a escritura de venda e compra posterior pode ser registrada; d) cabe ao proprietário, se assim o desejar, providenciar o cancelamento direto das penhoras, perante os Juízos de onde elas provieram.

Diante disso, mesmo diante do cancelamento indireto, não cabe determinação de ordem para o cancelamento das inscrições, as quais devem ser deduzidas perante os Juízos e repartição administrativa de onde provieram; pelas razões já expostas.

A declaração do cancelamento indireto ultrapassa as atribuições deste processo administrativo, mormente pela eventual possibilidade de ineficácia da alienação forçada perante credores não notificados, nos termos do artigo 698 do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época da expedição da carta de adjudicação.

Enfim, não cabe a declaração de situação sem repercussão concreta no registro imobiliário, especialmente pela não expedição de ordem de cancelamento das inscrições.

Não é relevante para a questão ora posta, a validade da carta de adjudicação ante seu ingresso no registro imobiliário e a decorrente presunção (relativa) de validade do registro.

Ante o exposto, o parecer que, respeitosamente, submete-se à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de que a apelação interposta pelo recorrente seja recebida como recurso administrativo, na forma do artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo e, a ele, rejeitada a preliminar, seja negado provimento.

Sub censura.

São Paulo, 12 de março de 2018.

Marcelo Benacchio
Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO

Aprovo o parecer do MM Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, recebo a apelação como recurso administrativo, rejeito a preliminar e a ele nego provimento.

Publique-se.

São Paulo, 13 de março de 2018.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO
Corregedor Geral da Justiça

Fonte: IRIB | 28/03/2018.

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TJ/DFT: Inscrição indevida em cadastro de inadimplentes gera dever de indenizar

Juíza titular do 3º Juizado Especial Cível de Brasília condenou o Banco Cetelem S/A e a B2W – Companhia Digital, em caráter solidário, a pagarem ao autor o valor de R$ 3 mil, a título de danos morais. O Banco Cetelem também terá que excluir o nome do autor dos cadastros de inadimplentes no prazo de 10 dias, em razão de cobrança indevida de tarifa de anuidade de cartão.

A magistrada explica que, no presente caso, os documentos são suficientes para demonstrar a oferta de anuidade gratuita do cartão de crédito, bem como o cumprimento de todas as exigências pelo autor, o que torna indevida a cobrança da tarifa e inscrição do nome do requerente nos cadastros de inadimplentes.

Ademais, a julgadora verificou que os requeridos (Banco Cetelem S/A e a B2W – Companhia Digital) não comprovaram a efetiva entrega do cartão de crédito ao autor, ônus que lhes incumbia por força do art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil – CPC, o que por si só afasta a possibilidade de cobrança da anuidade. E ainda esclareceu que, tendo em vista a responsabilidade objetiva prevista no art. 20 do Código de Defesa do Consumidor – CDC, o fornecedor de serviços deve responder pelos danos causados ao consumidor independentemente da demonstração da culpa.

Assim, para a magistrada, a inscrição do nome do autor em órgãos de proteção ao crédito ultrapassou a esfera do mero aborrecimento do cotidiano, já que motivou a restrição de crédito no mercado e repercutiu negativamente perante terceiros. Neste entendimento, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – STJ tem se posicionado no sentido de que em casos de inscrição indevida em órgãos de proteção ao crédito faz-se desnecessária a prova do prejuízo experimentado pelo autor da ação, pois o dano moral é presumido, e decorre da mera inclusão do nome no cadastro de inadimplentes.

Desta forma, levando em conta que o valor da condenação deve servir de desestímulo para esse tipo de conduta praticada pelos réus, sem que, todavia, isso implique em enriquecimento indevido do autor, a juíza fixou a indenização no montante de R$ 3 mil. Ademais, de acordo com a magistrada, a exclusão do nome do requerente dos cadastros de inadimplentes é medida que se impõe, tendo em vista a evidente falha na prestação dos serviços.

Diante disso, a juíza julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para: 1) condenar os requeridos, em caráter solidário, a pagarem ao autor o valor de R$ 3 mil, a título de danos morais, corrigido monetariamente pelo INPC desde a sentença e acrescida de juros de 1% ao mês a partir de 16/10/2017; 2) condenar o Banco Cetelem S/A a excluir o nome do autor dos cadastros de inadimplentes no prazo de 10 dias, contados do trânsito em julgado, sob pena de multa diária no valor de R$ 100,00, até o limite de R$ 1 mil.

Cabe recurso.
Número do processo (PJe): 0748038-89.2017.8.07.0016

Fonte: Anoreg/BR – TJDFT | 28/03/2018.

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