ARTIGO: O REGISTRO TARDIO NO REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS – POR LETÍCIA FRANCO MACULAN ASSUMPÇÃO

*Letícia Franco Maculan Assumpção

A Lei nº 11.790, de 2 de outubro de 2008, alterou o art. 46 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, a Lei de Registros Públicos, transferindo para o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais a atribuição de apreciar os pedidos de registro de nascimento feitos fora do prazo legal (os chamados registros tardios).

Assim, conforme a referida lei, para que seja realizado o registro tardio de nascimento não mais será necessária autorização do Juiz competente para Registros Públicos, cabendo ao Oficial do Registro analisar o pedido do declarante de que seja feito o registro, sendo o requerimento de registro assinado pelo declarante e também por duas testemunhas.

O Oficial de Registro Civil deve exigir prova suficiente caso suspeite da falsidade da declaração. Apresentadas as provas, o próprio Oficial as examinará e, considerando verdadeira a declaração, fará o registro.

Somente nos casos em que o Oficial continuar suspeitando da falsidade da declaração, mesmo após apresentação de provas, deverá encaminhar os autos ao juízo competente, que é o Juiz da Vara de Registros Públicos, nas Comarcas onde houver, ou o Juiz de Direito, nas demais Comarcas, para que ele decida se o registro deverá ser feito ou não.

Para melhor compreensão, apresenta-se abaixo paralelo entre a redação antiga e a redação atual da Lei de Registros Públicos,art. 46:

Redação anterior da LRP Redação atual
Art. 46. As declarações de nascimento feitas após o decurso do prazo legal somente serão registradas mediante despacho do juiz competente do lugar da residência do interessado. (Redação dada pela Lei nº 10.215, de 2001)        § 1º Será dispensado o despacho do Juiz, se o registrando tiver menos de doze anos de idade.

§ 2º Será dispensada de pagamento de multa a parte pobre (art. 30). (Revogado pela Lei nº 10.215, de 2001)

§ 3º O Juiz somente deverá exigir justificação ou outra prova suficiente se suspeitar da falsidade da declaração.

§ 4º Os assentos de que trata este artigo serão lavrados no cartório do lugar da residência do interessado. No mesmo cartório serão arquivadas as petições com os despachos que mandarem lavrá-los.

Art. 46.  As declarações de nascimento feitas após o decurso do prazo legal serão registradas no lugar de residência do interessado. (Redação dada pela Lei nº 11.790, de 2008).§ 1o  O requerimento de registro será assinado por 2 (duas) testemunhas, sob as penas da lei. (Redação dada pela Lei nº 11.790, de 2008).

§ 2º (Revogado pela Lei nº 10.215, de 2001)

§ 3o  O oficial do Registro Civil, se suspeitar da falsidade da declaração, poderá exigir prova suficiente. (Redação dada pela Lei nº 11.790, de 2008).

§ 4o  Persistindo a suspeita, o oficial encaminhará os autos ao juízo competente. (Redação dada pela Lei nº 11.790, de 2008).

§ 5º Se o Juiz não fixar prazo menor, o oficial deverá lavrar o assento dentro em cinco (5) dias, sob pena de pagar multa correspondente a um salário mínimo da região.

A referida lei trouxe inovações, mas também problemas, posto que passou a exigir duas testemunhas para qualquer registro fora do prazo legal, lembrando-se de que o prazo legal atualmente é de 60 (sessenta) dias para o pai ou a mãe e de 15 (quinze) dias para os demais declarantes, nos termos do disposto na Lei nº 13.112, de 30 de março de 2015, que alterou a redação do art. 52, da Lei de Registros Públicos. Além disso, a falta de um procedimento para o registro tardio, trazia diversas incertezas e também poderia deixar de garantir que fraudes fossem afastadas.

Em razão disso, o Conselho Nacional de Justiça -CNJ publicou o Provimento nº 28, de 5 de fevereiro de 2013, que trouxe diversas inovações, tanto sobre registro tardio quanto sobre outras questões, como abaixo se esclarece:

  1. a) Sobre o registro tardio, o que mudou:

1) Foi esclarecido que o novo procedimento de registro tardio não se aplica aos indígenas – tudo a respeito do indígena está hoje regulamentado pela Resolução Conjunta CNJ/CNMP nº 03, de 19/04/2012, DJ de 26/10/2012.

2) Foi analisada a competência do Oficial para os casos de ausência de residência fixa: será competente o Oficial do local onde se encontrar o interessado (ex.: moradores de rua).

3) Foram criados dois procedimentos distintos:

3.1) para o registro do menor de 12 anos, nos casos em que apresentada a DNV: foi simplificado o procedimento, ficando dispensado o requerimento do registro tardio e as testemunhas, sendo o registro feito como se no prazo estivesse, exceto no que se refere à competência do Oficial que, como determina a Lei de Registros Públicos, é o da residência do interessado;

3.2) para o menor de 12 anos, em que não seja apresentada a DNV, e para o maior de 12 anos: procedimento complexo, sendo obrigatório o requerimento, o comparecimento de duas testemunhas que conheçam o registrando, entrevista que deverá ser tomada a termo, certidão expedida pelo Oficial referente às provas apresentadas, despacho fundamentado do Oficial sobre a possibilidade ou não de ser feito o registro, entre outras exigências. O procedimento será melhor analisado abaixo.

4) Foram determinados requisitos para o requerimento do registro tardio do maior de 12 anos ou menor de 12, sem DNV:

4.1) O requerimento deverá conter: data e local do nascimento, sexo, nome, fato de ser gêmeo ou não, qualificação dos pais e dos avós, atestação de duas testemunhas com qualificação completa que serão entrevistadas, fotografia e impressão digital do registrando (vide modelo sugerido ao final). Não sendo possível a obtenção de tais informações ou a coleta de digital e ou recebimento da fotografia, ainda assim o registro poderá ser feito, mas a impossibilidade tem que ser justificada.

4.2) No requerimento de registro tardio é dispensado o reconhecimento de firma do interessado ou de seu representante legal, mas é obrigatório que o Oficial de Registro ou seu preposto certifique que as assinaturas do interessado, de seus pais, se presentes, e das testemunhas foram apostas em sua presença.

4.3) Nos casos da ausência dos dados dos pais, o registrando (ou pelo requerente do registro, caso o registrando não possa se manifestar) deverá indicar sobrenome para constar do registro (sobrenome esse que deve corresponder às afirmações por ele feitas sobre a sua família, se for o caso).

4.4) Na entrevista para o registro tardio deverá ser indagado, ao menos:

– Nacionalidade (se o registrando se expressa em português)
– Residência (se o registrando conhece os arredores)
– Razão para o registro ser tardio (representante legal)
– Veracidade das informações prestadas pelas testemunhas, se realmente conhecem o registrando, se tem idade compatível com os fatos narrados (devem ser preferidas as mais velhas que o registrando)
– Escolas e Postos de Saúde pelos quais o registrando passou
– Informações sobre os irmãos, se houver, e em que cartório foram registrados; Informações sobre casamento, se for casado, e em que cartório foi registrado; documentos de identidade, batismo, entre outros, para serem apresentados
OBS.: Outros documentos além dos exigidos podem ser juntados para reforçar o corpo de provas.

4.5) As entrevistas devem ser feitas em separado, tudo reduzido a termo, sendo ao fim assinado pelo Oficial (ou preposto) e pelo entrevistado. Sugere-se que as entrevistas sejam feitas com todo o cuidado, sendo preferencialmente realizadas pelo próprio Oficial.

5) Nos casos de suspeita do Oficial em relação à autenticidade do requerimento de registro, assim como de todas as declarações prestadas, poderá aquele exigir outras provas para seu convencimento.

6) Persistindo a suspeita, o Oficial promoverá os autos ao Juízo da Vara de Registros Públicos ou Vara Cível, onde não houver vara especializada, para que o Juiz determine seja feito o registro ou não.

7) Foi criada nova certidão: certidão de especificação das provas apresentadas, a ser expedida pelo Oficial do RCPN (art. 11, § 2º, do Provimento 28 do CNJ), ao fim do procedimento, devendo o Oficial certificar minuciosamente o ocorrido, decidindo pela lavratura ou não do registro tardio (espécie de despacho fundamentado).

8) Sendo feito o registro, o Oficial deve anotar no procedimento respectivo os dados do assento lavrado.

9) No caso de registro tardio de pessoa incapaz internada em hospital psiquiátrico, hospital de custódia e tratamento psiquiátrico (HCTP), instituição de longa permanência (ILPI), hospital de retaguarda ou instituições, poderá o Ministério Público requerer o registro tardio diretamente ao Oficial de Registro competente, fornecendo os elementos necessários ao registro.

  1. b) Sobre o registro de nascimento ocorrido sem assistência de médico ou de parteira, em que não seja, pois apresentada a DNV ao Oficial, o que mudou:

1) Sendo apresentado pedido de registro de nascimento de criança com menos de 3 anos de idade, nascida SEM ASSISTÊNCIA MÉDICA ou de PARTEIRA, a DNV, havendo demanda das Secretarias Estaduais ou Municipais de Saúde, deve ser preenchida pelo Oficial.

  • CAUTELA!
– Lei 12.662/2012 – Lei da DNV: alterou art.54 da 6.015/73•       Nos nascimentos fruto de parto sem assistência de profissionais da saúde ou Parteiras tradicionais, a DNV será emitida pelos oficiais de registro civil que lavrarem o registro de nascimento, sempre que haja demanda das Secretarias Estaduais ou Municipais de Saúde para que realizem tais omissões.

•       O que se entende por “demanda”? (determinação da autoridade competente, em Minas Gerais não existe)

Havendo demanda das Secretarias de Saúde, a DNV será assinada pelo Oficial e pelo declarante, sendo obrigatória a presença de duas testemunhas. Sugere-se que seja utilizado o mesmo procedimento previsto para o registro tardio (entrevista, coleta de provas, pedido de digital e foto da criança, submeter ao juiz se houver dúvida etc).

2) Deverá ser expedida comunicação em 5 dias para o Ministério Público com os dados do registro do nascimento ocorrido sem a assistência de médico ou parteira e sem apresentação da DNV. Criado, pois, um novo relatório.

  1. c) Sobre o registro de nascimento em geral, o que mudou:

1) Foi esclarecido que a filiação materna poderá ser estabelecida com o que constar da Declaração de Nascido Vivo – DNV, tendo em vista a aplicação da máxima de que a maternidade é sempre certa.

2) Não havendo DNV, a filiação materna será estabelecida somente com o comparecimento da mãe.

3) A filiação paterna constará do registro mediante reconhecimento expresso ou presunção legal. Para que haja a presunção legal de filiação, a certidão de casamento a ser apresentada deverá ter sido expedida depois do nascimento do registrando.

4) Para afastar a presunção de paternidade em relação ao marido, basta a declaração da mãe de que estava separada de fato do cônjuge ao tempo da concepção.

5) Duplicidade de registro – Art. 16 – cancelar o último registro, a requerimento do Juiz, MP ou qualquer interessado, dando-se ciência ao atingido

________________________________________________________________

MODELO DE PROCESSO DE REGISTRO TARDIO COMPLETO

Ilma. Sra. Oficial do Registro Civil do Cartório do Registro Civil e Notas do Distrito do Barreiro, BH/MG

Eu, xxxxxx, identidade , CPF, de profissão xxx, com endereço xxxxxxxxxxx, venho requerer seja feito  REGISTRO DE NASCIMENTO EM MEU NOME, tendo em vista que eu tinha minha certidão de nascimento, fornecida pelo Cartório de Registro Civil de xxxxxxxxxxxx, mas, quando fui solicitar a segunda via da certidão, foi declarado pelo Cartório, conforme certidão anexa, que NÃO HÁ REGISTRO DE NASCIMENTO CORRESPONDENTE À MINHA CERTIDÃO. Tenho todos os meus documentos, mas não tenho o meu registro e estou precisando de segunda via da certidão.

Informo que resido em xxxxxxxxxxxxxxx, razão pela qual o novo registro seja feito nesta Cidade. Meus telefones são os seguintes xxxxxxxxxxxxxx

Para os devidos fins, declaro que sou do sexo feminino, nascida em xxxxxxx, às xxxxxxxxxx horas, em xxxxxxxxxxxxxxxx. Não possuo DNV.

Sou filha de xxxxxxxxx e de xxxxx, sendo avós paternos xxxxxxxxx e de xxxxx e são avós maternos xxxxxxxxx e de xxxxx.

Minha mãe era brasileira, casada, do lar, natural de xxxxxxxxxxx, e já é falecida.

Meu pai era brasileiro, casado, de profissão xxxxxxxxxxxxxx e também já é falecido.

Solicito, respeitosamente, a V.Sa. que registre o nascimento, para o que oferece as testemunhas abaixo qualificadas que confirmam, sob responsabilidade civil e criminal, a veracidade das informações acima prestadas.

Termos em que pede e espera deferimento.

Local e data.

ASSINATURA DO DECLARANTE/REGISTRANDO E DIGITAL – JUNTAR FOTO

TOMAR TAMBÉM DEPOIMENTO DE DUAS TESTEMUNHAS (SE PESSOA MAIOR DE 12 ANOS OU SEM DNV)

E, AO FINAL, FAZER CONSTAR:

NOME COMPLETO DA 1ª TESTEMUNHA: xxxxxxxxxxxx

Identidade: xxxxxxxxxxx

CPF xxxxxxxxxxxxxx

Profissão xxxxxxxxxxx

Estado civil xxxxxxxxxxxx

endereço: XXXXXXXXXX

Data de nascimento: xxxxxxxxxxxx

Nacionalidade: brasileira

ASSINATURA DA 1ª TESTEMUNHA

NOME COMPLETO DA 2ª TESTEMUNHA: xxxxxxxxxxxx

Identidade: xxxxxxxxxxx

CPF xxxxxxxxxxxxxx

Profissão xxxxxxxxxxx

Estado civil xxxxxxxxxxxx

endereço: XXXXXXXXXX

Data de nascimento: xxxxxxxxxxxx

Nacionalidade: brasileira

ASSINATURA DA 2ª TESTEMUNHA

_____________________________________________________________________________

DESPACHO DA OFICIAL Certifico a autenticidade das firmas do(a) declarante e das testemunhas, que foram lançadas em minha presença.

Tendo em vista os documentos apresentados, bem como os depoimentos do declarante e das testemunhas, ENTENDO QUE DEVE SER FEITO O REGISTRO DE xxxxxxxxxxxxxxxx

Esclareço que a registranda prefere ser registrado em Belo Horizonte, MG, cidade onde reside, mesmo para facilitar o acesso às segundas-vias de certidão de que precise no futuro.

Loca e data

NOME E ASSINATURA DO REGISTRADOR

_______________________________________________________________________ 

 CERTIDÃO DE ENTREVISTA PARA REGISTRO TARDIO, NOS TERMOS DETERMINADOS PELO PROVIMENTO Nº 28/CNJ

Certifico, nos termos do determinado expressamente pelo Provimento nº 28/CNJ, que entrevistei em XXXXXXXXXXXXXXXX o registrando e as testemunhas abaixo, nos termos seguintes:

1) ENTREVISTA COM A REGISTRANDA: CERTIFICO QUE EM XXXXXXXXXXX, COMPARECEU AO CARTÓRIO SOB MINHA RESPONSABILIDADE A REGISTRANDA XXXXXXXXXXXXXX, sexo feminino, que informou não ser gêmea. Informou, ainda, que reside na XXXXXXXXXXXX, telefones XXXXXXXXXXXXXXXX. Para os devidos fins, declarou ser do sexo feminino, nascida em 14 XXXXXXXXXX, às xxx horas, em xxxxxxxxxxxxxx. Não possui DNV.

É filha de XXXXX e XXXXXXXXX, sendo avós paternos de XXXXX e XXXXXXXXX e são avós maternos de XXXXX e XXXXXXXXX.

Foi verificado que a registranda consegue se expressar perfeitamente no idioma nacional, como brasileira, e que não conhece bem a localidade informada como de seu nascimento, por já ter saído de lá há muito tempo, mas conhece a localidade declarada como de sua residência, ruas principais, prédios públicos, bairros, peculiaridades etc. Foi indagado se a registranda sabe ler ou escrever, tendo sido informado que sim. Foi questionado sobre quais escolas o registrando já frequentou, tendo informado que quando pequena estudou em xxxxxxxxxx, em escola xxxxxxxxxxxxx, escola pública; em que unidades de saúde busca atendimento médico quando precisa, tendo sido respondido que usava o Posto de Saúde nos lugares onde residia, sendo que mudava muito. Declarou, ainda, que, quando veio para Belo Horizonte há aproximadamente xxxxxxxxx anos e aqui não mais estudou.

Foi a registranda questionada se tem irmãos e, se positivo, em que cartório eles estão registrados, tendo sido informado que sim, tem xxxxxxxxirmãos, sendo que não tem certeza, mas acha que foram registrados no Cartório xxxxxxxxxxxxxxxx.

Foi questionado se a registranda já se casou e ela informou que não, mas que viveu em união estável com xxxxxxxxxxx por aproximadamente xx anos, agora já falecido.

Foi indagado se a registranda tem filhos e respondeu que sim, tem xxxxxxxxxx. Um dos filhos vai ser testemunha deste registro tardio.

Foi a registranda indagada sobre o fato de já ter portado algum documento, como carteira de trabalho, título de eleitor, documento de identidade, certificado de batismo, e foi solicitada a apresentação desses documentos, tendo sido informado que possui todos os documentos, cuja cópia está anexa à presente.

A registranda apresentou a foto anexa, pela qual é possível reconhecê-la e que confere com as fotos constantes nos documentos de identidade apresentados.

Foi retirada a digital da registranda.

A Oficial entende, após entrevista, que a registranda está falando a verdade, os dados informados são verossímeis e foram apresentados documentos suficientes para dar segurança jurídica ao registro tardio.

ENTREVISTA COM DUAS TESTEMUNHAS

1ª TESTEMUNHA

CERTIFICO QUE EM xxxxxxxxxxx, COMPARECEU AO CARTÓRIO SOB MINHA A TESTEMUNHA             xxxxxxxxxxxxxx, Identidade: xxxxxxxx, CPF xxxxxxxxxxxx, Profissão Motorista, Estado civil Divorciado, endereço: xxxxxxxxxxxxxx, Data de nascimento: xxxxxxxxxxxxxxx, Nacionalidade: brasileira, que declarou conhecer a registranda desde que nasceu, por ser seu filho mais velho.

A testemunha confirmou as informações quanto à data de nascimento da registranda. Confirmou, ainda, o endereço da registranda.

Confirmou os nomes dos avós.

A testemunha deu as seguintes explicações a respeito da não realização do registro: disse que em xxxxxxxxxxxxx é comum ocorrer desaparecimento de registros.

Confirmou que a registranda é solteira, mas viveu em união estável com xxxxxxxxxx, que faleceu há aproximadamente 6 (seis) anos.

Confirmou que o registrando tem todos os documentos, mas que, quando foi pedir a segunda-via da certidão, não localizou o registro.

Foi verificado se a testemunha realmente conhece o registrando, se dispõe de informações concretas e se têm idade compatível com a efetiva ciência dos fatos declarados no requerimento, tendo sido constatado que sim.

A Oficial entende, após entrevista, que a testemunha está falando a verdade, os dados informados são verossímeis e foram apresentados documentos suficientes para dar segurança jurídica ao registro tardio.

2ª TESTEMUNHA

CERTIFICO QUE EM xxxxxxxxxxx, COMPARECEU AO CARTÓRIO SOB MINHA A TESTEMUNHA             xxxxxxxxxxxxxx, Identidade: xxxxxxxx, CPF xxxxxxxxxxxx, Profissão xxxxxxx, Estado civil xxxxxx, endereço: xxxxxxxxxxxxxx, Data de nascimento: xxxxxxxxxxxxxxx, Nacionalidade: brasileira, que declarou conhecer a registranda desde que nasceu, por ser seu filho mais velho.

A testemunha confirmou as informações quanto à data de nascimento da registranda. Confirmou, ainda, o endereço da registranda.

Confirmou os nomes dos avós.

A testemunha deu as seguintes explicações a respeito da não realização do registro: disse que em xxxxxxxxxxxxx é comum ocorrer desaparecimento de registros.

Confirmou que a registranda é solteira, mas viveu em união estável com xxxxxxxxxx, que faleceu há aproximadamente 6 (seis) anos.

Confirmou que o registrando tem todos os documentos, mas que, quando foi pedir a segunda-via da certidão, não localizou o registro.

Foi verificado se a testemunha realmente conhece o registrando, se dispõe de informações concretas e se têm idade compatível com a efetiva ciência dos fatos declarados no requerimento, tendo sido constatado que sim.

Oficial entende, após entrevista, que a testemunha está falando a verdade, os dados informados são verossímeis e foram apresentados documentos suficientes para dar segurança jurídica ao registro tardio.

RELAÇÃO DOS DOCUMENTOS APRESENTADOS (ANEXOS À PRESENTE):

1) DOCUMENTOS DO REGISTRANDO:

– certidão de nascimento nº xxxxxxxxx, expedida pelo Cartório xxxxxxxxxxx, em péssimo estado de conservação, mas legível.

– carteira de trabalho

– identidade e cpf

– cartão do PIS

– certidão negativa de registro da registranda expedida pelo Cartório do Distrito de xxxxxxxx

– certidões negativas de todos os cartórios de registro civil das pessoas naturais de Belo Horizonte

2) DOCUMENTOS DAS TESTEMUNHAS:

– carteira de habilitação

– carteira de identidade

Todo o acima exposto é verdade, do que dou fé.

Local e data

NOME E ASSINATURA DO REGISTRADOR

*Letícia Franco Maculan Assumpção é graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (1991), pós-graduada e mestre em Direito Público. Foi Procuradora do Município de Belo Horizonte e Procuradora da Fazenda Nacional. Aprovada em concurso, desde 1º de agosto de 2007 é Oficial do Cartório do Registro Civil e Notas do Distrito de Barreiro, em Belo Horizonte, MG. É autora de diversos artigos na área de Direito Tributário, Direito Administrativo, Direito Civil e Direito Notarial, publicados em revistas jurídicas, e dos livros “Função Notarial e de Registro” e “Casamento e Divórcio em Cartórios Extrajudiciais do Brasil”. É professora e coordenadora da pós-graduação em Direito Notarial e Registral do Centro de Direito e Negócios – CEDIN.

Fonte: CNB/CF | 28/08/2017.

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TJSP: UNIÃO ESTÁVEL ENTRE PESSOAS DE 28 ANOS E 92 ANOS – DIFERENÇA DE IDADE OU IDADE LONGEVA DE UM DOS DECLARANTES QUE NÃO CONSTITUI MOTIVO LEGAL PARA A RECUSA DO ATO – RECURSO PROVIDO PARA JULGAR IMPROCEDENTE O PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR

TJ|SP: Recurso administrativo – Processo administrativo – Processo administrativo disciplinar instaurado por determinação do E. Corregedor Geral de Justiça, após arquivamento sumário pelo Corregedor Permanente – Absolvição inicial cassada pelo Corregedor Geral de Justiça, após avocação do feito – Reconhecimento de infração disciplinar prevista no art. 31, I e II, da Lei nº 8.935/1994 e imposição de multa ao Tabelião – Autorização de lavratura de escritura pública declaratória de união estável entre pessoas de 28 anos e 92 anos, no regime da comunhão universal de bens –  Apuração por órgão administrativo previdenciário da falsidade ideológica da declaração – Simulação subjetiva dos declarantes que não poderia ser apurada previamente pelo notário – Limitação do poder da apuração de fraude a seu aspecto objetivo, não podendo o notário se responsabilizar por eventual reserva mental ou declaração ideologicamente falsa dos declarantes – Diferença de idade ou idade longeva de um dos declarantes que não constitui motivo legal para a recusa do ato, por não impedir a existência de união estável – Critério etário que não pode significar impedimento ao ato, sob pena de ofensa do art. 5º, CF – Culpa não configurada – Ausência de quebra de dever de agir ou de não agir, considerando as particularidades do caso – Recusa pelo simples critério etário que poderia caracterizar fato típico pelo notário, conforme o Estatuto do Idoso – Limites da fé pública da declaração feita ao notário quanto à sua existência e não quanto à sua veracidade ideológica – Inexistente comportamento caracterizador de culpa pelo descumprimento de dever funcional, não cabe a imposição de sanção disciplinar administrativa – Recurso provido para julgar improcedente o processo administrativo disciplinar.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2017.0000579969

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Recurso Administrativo nº 0048142-07.2015.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é recorrente PAULO AUGUSTO RODRIGUES CRUZ, é recorrido CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “DERAM PROVIMENTO ao recurso para julgar improcedente o processo administrativo disciplinar. V.U. Com declaração de voto convergente do 3º Juiz.

Sustentou oralmente o advogado Dr. Antonio Jorge Marques.

Não se manifestou a procuradora Dra. Luciana Pinsdorf Barth.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ADEMIR BENEDITO (VICE PRESIDENTE) (Presidente) e XAVIER DE AQUINO (DECANO).

São Paulo, 7 de agosto de 2017.

Salles Abreu (Pres. Seção de Direito Criminal) RELATOR

Assinatura Eletrônica

RECURSO ADMINISTRATIVO Nº 0048142-07.2015.8.26.0100- SÃO PAULO RECORRENTE: PAULO AUGUSTO RODRIGUES CRUZ

RECORRIDO: CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO VOTO N.º: 41.700

Recurso administrativo – Processo administrativo – Processo administrativo disciplinar instaurado por determinação do E. Corregedor Geral de Justiça, após arquivamento sumário pelo Corregedor Permanente – Absolvição inicial cassada pelo Corregedor Geral de Justiça, após avocação do feito – Reconhecimento de infração disciplinar prevista no art. 31, I e II, da Lei nº 8.935/1994 e imposição de multa ao Tabelião – Autorização de lavratura de escritura pública declaratória de união estável entre pessoas de 28 anos e 92 anos, no regime da comunhão universal de bens Apuração por órgão administrativo previdenciário da falsidade ideológica da declaração Simulação subjetiva dos declarantes que não poderia ser apurada previamente pelo notário Limitação  do poder da apuração de fraude a seu aspecto objetivo, não podendo o notário se responsabilizar por eventual reserva mental ou declaração ideologicamente falsa dos declarantes Diferença de idade ou idade longeva de um dos declarantes que não constitui motivo legal para a recusa do ato, por não impedir a existência de união estável Critério etário que não pode significar  impedimento ao ato, sob pena de ofensa do art. 5º, CF – Culpa não configurada – Ausência de quebra de dever de agir ou de não agir, considerando as particularidades do caso – Recusa pelo simples critério etário que poderia caracterizar fato típico pelo notário, conforme o Estatuto do Idoso – Limites da fé pública da declaração feita ao notário quanto à sua existência e não quanto à sua veracidade ideológica – Inexistente comportamento caracterizador de culpa pelo descumprimento de dever funcional, não cabe a imposição de sanção disciplinar administrativa – Recurso provido para julgar improcedente o processo administrativo disciplinar.

Trata-se de recurso administrativo interposto contra a r. decisão proferida pelo Excelentíssimo Desembargador Corregedor Geral da Justiça do Estado de São Paulo que, em processo  administrativo disciplinar instaurado pela Corregedoria Permanente, por ordem da Corregedoria Geral, avocou o feito, julgando-o procedente, cassando a absolvição decretada, aplicando multa a Paulo Augusto Rodrigues Cruz, 11º Tabelião de Notas da Capital, com fundamento no art. 32, II, da Lei nº 8.935/94, fixada no valor de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais), pelo cometimento das infrações previstas no art. 31, I e II, da Lei nº 8.935/94.

Sustenta o apelante que a escritura de reconhecimento de união estável foi lavrada sem nenhuma irregularidade, tendo a Escrevente Elisangela Alves Batista, ao se deparar com a expressiva discrepância entre a idade dos requerentes Marcos Godoy Pereira e Cecília Serventi, após solicitar prévia orientação ao Tabelião, constatado que ambos tinham plena capacidade e total discernimento para praticarem o ato pretendido. Em seguida outra questão foi suscitada, porquanto os interessados queriam fazer constar da escritura, que entre eles iria vigorar o regime da comunhão universal de bens, tendo a escrevente, após nova consulta ao Tabelião, os advertido de que o regime de bens poderia ser contestado judicialmente e, diante da concordância dos mesmos, a lavratura do ato foi autorizada pelo Tabelião. Sustenta ainda o apelante que o MM. Juiz Assessor firmou seu parecer, servindo-se de provas supervenientes, colhidas após a construção de todo o procedimento investigatório, levado a efeito pela Procuradoria do Estado, face ao pedido de pensão formulado por Marcos, em decorrência do falecimento de Cecília. Finalmente, aduz que não restaram caracterizadas as infrações, nem conduta negligente ou dolosa, tendo sido constatada a plena capacidade civil das partes e a inexistência de vícios na manifestação de vontade. Postula a anulação da decisão de fls. 252 ou sua reforma. Subsidiariamente, em caso de manutenção da sanção administrativa, pretende a redução a redução do valor da penalidade aplicada (fls. 277/306).

Recebido o recurso, a decisão foi mantida pelo Senhor Corregedor Geral da Justiça (fls. 311).

É O RELATÓRIO

Conheço do recurso, eis que presentes seus requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

É dos autos que o processo administrativo disciplinar tem por objeto a conduta do 11º Tabelião de Notas da Capital que, em 28 de abril de 2014, autorizou a lavratura de escritura pública de declaração de união estável entre Marcos Godoy Pereira, à época com vinte e oito anos de idade, e Cecília Serventi, com noventa e dois anos de idade, sem que fossem tomados os devidos cuidados.

Objetivamente, consta da escritura declaração dos interessados de que as partes conviviam há mais de dez anos, e que pretendiam, para a união estável, o regime de comunhão universal de bens. (fls. 19/20).

Menos de um ano da lavratura da escritura pública, em 14 de março de 2015, Cecília Serventi faleceu (fls. 26), sendo que, em maio de 2015, Marcos se utilizou da escritura pública de união estável para arguir sua condição de ex-companheiro de Cecília, requerendo complementação da pensão por morte dela, que era funcionária aposentada do Banco Nossa Caixa S.A. (fls. 7).

Foram realizadas diligências no procedimento administrativo de solicitação de complementação da pensão por morte, apurando-se que eram parentes (Cecília era tia-avó de Marcos). Além disso, apurou-se por informações obtidas na rede social denominada “Facebook”, que Marcos mantém convivência pública e duradoura, desde 2012, com Verônica Moraes, com quem teve dois filhos.

Tais fatos comprovam que a declaração feita pelas partes, por ocasião da lavratura da escritura de união estável, era uma simulação, o que caracterizaria sua nulidade absoluta.

Estes os fatos, objetivamente, pelos quais a decisão do E. Corregedor Geral entendeu pela existência de conduta negligente, responsabilizando o notário disciplinarmente, com fundamento no art. 31, I e II, da Lei nº 8.935/1994, que assim dispõe:

“Art. 31. São infrações disciplinares que sujeitam os notários e os oficiais de registro às penalidades previstas nesta lei:

I – a inobservância das prescrições legais ou normativas;

II – a conduta atentatória às instituições notariais e de registro;

(…).”
Também fundamenta a condenação imposta no item 1.3, do Capítulo XIV, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, com a seguinte redação:

“1.3. É seu dever recusar, motivadamente, por escrito, a prática de atos contrários ao ordenamento jurídico e sempre que presentes fundados indícios de fraude à lei, de prejuízos às partes ou dúvidas sobre a manifestação de vontade.”
Com a devida vênia à posição adotada pelo E. Corregedor Geral de Justiça, tenho que deva prevalecer a absolvição levada a cabo pelo MM Juiz Corregedor permanente, por não vislumbrar no ato do notário conduta culposa ou contrária à dignidade do instituto do notariado.

Pelo princípio da rogação ou demanda, uma vez manifestado pelas partes a intenção de efetivarem o ato notarial sob a responsabilidade legal do notário, passa este a ter o dever legal de atuação, somente podendo recusar-se em casos de impedimento legal, físico ou ético, dúvida quanto à identidade ou capacidade das partes, dentre outros. Não se mostra, ao notário, uma opção entre realizar ou não o ato notarial estando ausentes impedimentos legais, cabendo a ele a penas o exercício da qualificação do ato pretendido e a orientação das partes quanto a eventual eficácia ou ineficácia do ato. Mas recusar-se a fazê-lo, sem que haja impedimento legal absoluto, não lhe será lícito.

É doutrina clássica a de que a função notarial, por ser pública, não comporta discricionariedade quanto à sua prestação.

Isto corresponde ao direito de escolha do notário pelo cliente, assim como se molda pelo fato de o liame da confiança e o notário ser assimétrico, ou seja, basta que o cliente confie no notário.

Assim, a prestação notarial é de caráter obrigatório, e não a pode recusar o notário escolhido, ressalvadas as hipóteses legais de impedimento subjetivo, nulidade (incluindo o quadro dos delitos) e impossibilidade física. Neste sentido, por brevidade de causa: GOMÁ SALCEDO. Derecho notarial. 2ª ed., Barcelona: Bosch, 2011, p. 54.

A recusa à lavratura do ato tão somente em função da idade ou da diferença de idade entre os postulantes ao ato, poderia caracterizar indevida distinção de tratamento com base exclusivamente no critério de idade de um dos atuantes, violando-se o  art. 5º, CF. Afinal, não há previsão legal de idade máxima para constituição de união estável, ou fixação de diferença mínima ou máxima de idade entre os conviventes, não se justificando o não acolhimento das declarações de vontade exclusivamente com base no critério etário.

Qual seriam os limites objetivos a serem observados pelo notário para que a lavratura de escritura de união estável entre pessoas de grande diferença de idade, para que se afastasse sua responsabilidade disciplinar? Cinco anos de diferença? Dez, vinte, trinta? Qual seria a idade mínima para se “desconfiar” da declaração de pessoas maiores e capazes? 70 anos? 80 anos? 90 anos?

Qualquer escolha, não fundada em critérios previstas na lei em sentido estrito, significariam, aos olhos do declarante, diferenciação injustificada e inconstitucional.

A recusa, se realizada apenas e tão somente sobre tal base fática, caracterizaria o tipo penal do art. 96, do Estatuto do Idoso, pois haveria indevida limitação ao exercício de um direito de cidadania da pessoa idosa, “considerando a cidadania como resultante de todos os direitos, liberdades e prerrogativas conferidas por lei ou pela Constituição a qualquer pessoa.”1

E a ausência de critério legal para a recusa é que retira a culpa do ato do notário ou mesmo a existência de ato contrário à normatização correicional, constante do já citado item 1.3. Afinal, se o pedido não fosse de lavratura de escritura declaratória de união estável, mas sim de pedido de habilitação para celebração de casamento, não haveria qualquer espaço legal ou hermenêutico para a recusa ou o condicionamento do exercício do direito potestativo.

Ausente impedimento legal para o ato que se realizava, ou seja, ausente a ilicitude absoluta do objeto em si união estável entre pessoas com grande diferença de idade -, eventual responsabilidade administrativa do notário pela lavratura do ato caracterizaria o reconhecimento da culpa pela falta de consideração de elementos que, em linhas finais, se ligam à eficácia legal do ato, seja por nulidade absoluta (simulação), seja por nulidade relativa (erro, dolo). Exigir-se-ia do notário a prévia apuração da veracidade das declarações dos comparecentes, a fim de se verificar a existência ou não de ato simulado ou anulável por erro ou dolo, o que, no sistema brasileiro, não se admite.

Ou seja, não poderia o notário afirmar fraude à lei ou vício na manifestação de vontade tão somente com base na diferença de idade entre os declarantes, ou mesmo com base na idade de uma das partes, sem que ultrapassasse os limites legais de sua atuação como notário. Deve ele limitar-se, no aspecto da legalidade, verificar se o ato é possível.

Eventual pesquisa, apuração ou questionamento da ineficácia do ato por simulação, realizada por interessado que venha de qualquer forma a sofrer os efeitos jurídicos da declaração fixada no ato notarial, e que indique a ocorrência de tal nulidade, não significa o reconhecimento de culpa do notário. Não se exige deste a investigação da veracidade das declarações, nem de eventual ineficácia por conta de nulidade a ser arguida e demonstrada por terceiro interessado.

Desta forma, o fato de se indicar a simulação do ato declarado a partir de apuração de órgão administrativo ao qual se impunha a eficácia do ato declarado na escritura não caracteriza a quebra de um dever do notário, eis que limitada sua atuação preventiva à verificação da capacidade e legitimidade para o ato, bem como sua licitude objetiva.

A possível existência de fraude, quando vinculada ao aspecto subjetivo da manifestação de vontade, como no caso de reserva mental, não permite a interferência do notário, por significar um julgamento da vontade final e dissimulada pela vontade declarada. A fraude apta à recusa de lavratura do ato é objetiva, verificável entre o objeto da declaração e o ordenamento jurídico, e não em relação à causa ou intenção das partes, isentos da investigação pessoal do notário.

Nem se diga, em complemento, que a escolha do regime de bens para a união estável que seja vedado ao cônjuge idoso, aceita pelo notário no ato declaratório, caracterizaria sua culpa administrativa a justificar a punição impugnada.

A uma porque a declaração de como desde o passado teriam os companheiros estabelecido o regime de bens não estaria impedido pela existência de um regime legal. É que, diversamente do casamento, o regime de bens declarado na escritura declaratória de união estável tem efeito ex tunc, refletindo algo que já é quanto à relação patrimonial escolhida pelos companheiros, desde quando iniciada a convivência, enquanto no casamento o regime de bens tem efeitos ex nunc. Não caberia ao notário, assim, questionar algo que já é, conforme a declaração dos interessados, embora orientando-os quanto à possível ineficácia da escolha dos companheiros.

A duas porque de duvidosa constitucionalidade o dispositivo que impõe regime legal de bens aos cônjuges maiores de 70 anos (art. 1.641, II, CC) autorizando a pretensão ao afastamento pelos companheiros, os quais poderiam buscar a manutenção da eficácia externa em caso de questionamentos por terceiros.

Por tais ângulos, não se vê, por parte do apelante, cometimento de ilícito administrativo culposo, seja pela inevitabilidade do ato pretendido pelos declarantes, seja pela ausência de quebra de um dever legal a caracterizar conduta culposa.

E sem tal conduta culposa, não há que se falar em responsabilidade disciplinar.

A responsabilidade disciplinar administrativa do notário ou do registrador não pode prescindir da verificação de conduta dolosa ou culposa do imputado. No dizer da doutrina,

“Em ambos os quadros [dolo e culpa em sentido estrito], a culpa é um mal, porque sempre implica uma desordenação voluntária relativa aos fins exigíveis da conduta humana. É exatamente porque se poderia e deveria agir de outro modo, para assim cumprir os fins a que se tinham por devidos, que alguém pode dizer-se culpado em dada situação concreta. Se, pois, a culpa pressupõe a possibilidade de ter agido de outra maneira, são seus pressupostos indispensáveis (i) a contingência da ação e (ii) a liberdade de agir ou não agir, bem como a liberdade de agir de um modo ou de outro. Assim sendo, não há culpabilidade possível quanto não haja contingência na conduta e liberdade no exercício (a de agir ou não agir) e de especificação (a de eleger os meios de agir).”2
Há de se observar a concorrência de elementos objetivo e subjetivo para a caracterização da infração disciplinar do notário. Ou seja, a conduta havida por infração disciplinar ou funcional, deve-se observar uma conduta dolosa ou culposa do notário ou seu preposto, observando-se, neste último caso, uma falha no dever de cuidado na verificação da legalidade e legitimidade do ato.

Mais que isto, a responsabilidade administrativa somente surge com a existência de uma conduta ilícita no aspecto dos deveres administrativos, sendo certo que tal qualificação da ilicitude não pode ser irrazoável ou mesmo fugir ao princípio da legalidade. Não se pode considerar ilícito administrativo a conduta que, em seu aspecto material e legal, não comporta nenhuma ilicitude conhecível de ofício, mas que tem seu regime de confronto vinculado à questão da eficácia ou ineficácia privada do ato, ou mesmo da aferição da divergência entre a vontade declarada e a vontade real do declarante.

Embora a configuração do ilícito administrativo não se sujeite objetivamente ao princípio da tipicidade, não se pode esvaziar o conceito formal de culpa para se configurar a conduta culposa punível no âmbito administrativo.

O elemento subjetivo, aqui, não pode ser relegado a um segundo plano, certo que “o agente deve ter praticado o ato tido por ilícito com a intenção de realizar a conduta ou, ao menos, faltando com o dever de cuidado na vigilância dos atos praticados por seus funcionários ou mesmo por ter dado orientações errada ou incompatíveis com a boa e leal prestação da função pública.”3

E, no caso, não há como se imputar ao notário a responsabilidade pela verificação de eventual fraude ou simulação na declaração de vontade feita pelos interessados, concernente à existência de união estável entre ambos.

A fé pública do instrumento notarial não diz respeito ao conteúdo da vontade declarada pelas partes, mas sim quanto à existência da declaração em si e, naturalmente, seus efeitos.

A qualificação, como ato de ciência do notário e do registrador, ao analisar os aspectos subjetivos e objetivos do ato a ser realizado, não pode significar um juízo de valor do fato em si retratado pelas partes, mas apenas a análise da situação jurídica das partes e a melhor forma jurídica de concretizar tal vontade, desde que presentes a legalidade objetiva do ato, a capacidade das partes e sua legitimidade. Não lhe cabe alterar a vontade declarada, ou a situação fática descrita, mas apenas adequá-la à melhor fattispecie prevista no ordenamento jurídico.

De dois modos seria possível cogitar do instrumento notarial quanto à união estável: (i) sob o modo de escritura declarativa; (ii) sob o de ata de notoriedade.

Naquela, na escritura de declaração, o notário recolhe apenas o que declaram os clientes, sem que haja fé pública sobre o ato-conteúdo. É o que se tem feito ordinariamente no Brasil.

A ata de notoriedade exigiria diligências que, sem previsão legal na normativa brasileira, não parece possam admitir-se. De toda a sorte, a ata de notoriedade não empola a fé pública quanto a seu conteúdo, porque essa ata não tem o fim de provar a existência de um fato notório, mas apenas o objeto de recolher o que alguns tenham por certo em determinado círculo social.

Tendo a escritura declaratória de união estável natureza algo similar à da ata notarial, tem-se na declaração das partes o limite da presunção decorrente da fé pública. É que “a ata não acredita a veracidade de tais declarações, mas sim do fato de que determinada pessoa faz tais declarações em determinado momento. O que se acredita, portanto, não é o conteúdo da declaração, mas sim a declaração como tal (…), devendo o declarante assumir os efeitos de sua declaração, o que o notário advertira de modo conveniente”.4

Assim, em conclusão, tem-se que o ato notarial realizado, apesar da diferença de idade entre os declarantes, a idade longeva da declarada companheira, e a descoberta posterior de que um dos declarantes vivia em união estável com outra mulher, e que seria parente (sobrinho-neto) da companheira, não pode ser qualificado como culposo. Nem se observa, pelo caráter subjetivo da fraude, falha no cumprimento de dever legal previsto em lei ou em norma administrativa, pois tal verificação demandaria investigação prévia da vida pessoal e da divergência entre a vontade declarada e a vontade querida dos declarantes, eis que, em linhas finais, proibição da existência de união estável entre pessoas de grande diferença de idade ou de idade longeva.

Por estes fundamentos, DOU PROVIMENTO ao recurso para julgar improcedente o processo administrativo disciplinar movido em face de Paulo Augusto Rodrigues Cruz, 11º Tabelião de Notas da Capital.

SALLES ABREU

Presidente da Seção de Direito Criminal Relator

__________________

1 BONINI, Paulo Rogério; LAVORENTI, Wilson; BALDAN, Edson Luís. Leis penais especiais anotadas. 13ª ed., Campinas: Millenium, 2016, p. 341.

2 DIP, Ricardo. Conceito e natureza da responsabilidade disciplinar dos registradores públicos. São Paulo: Quartier Latin, 2017.

3 LOUREIRO, Luiz Guilherme. Manual de direito notarial. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 246.

4 LOUREIRO, Luiz Guilherme. Manual de direito notarial. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 530.

Fonte: CNB/SP – TJSP | 29/08/2017.

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Provimento CG nº 40/2017 dispõe sobre gratuidade em averbação referente à reconhecimento de paternidade

DICOGE 5.1

PROCESSO Nº 2017/113083 – SÃO PAULO – CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. 308/2017-E

Registro Civil – Reconhecimento de Paternidade – Vigência da Lei 13.257/2016, com alteração de dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente – Gratuidade de toda averbação referente ao reconhecimento de paternidade no assento de nascimento, bem como da correspondente certidão – Revogação do Provimento CNJ 19/2012 – Necessidade de adequação do texto do item 124 do Capítulo XVII das Normas de Serviço.

Vistos.

Trata-se de pedido de providências instaurado em razão de consulta formalizada pelo Conselho Nacional de Justiça tendo em vista a entrada em vigor da Lei 13.257/2016.

A Corregedoria Geral de Justiça prestou informações (fls. 13/15).

Após a consulta realizada, o Conselho Nacional de Justiça revogou o Provimento 19/2012 (fls. 114/115).

É o relatório.

Opino.

Preceitua o item 124 do Capítulo XVII das NSCGJ:

124. Nos casos de averbação de reconhecimento de filho serão observadas as diretrizes previstas nos Provimentos nº 16 e nº 19 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.

124.1. Submete-se à égide do Provimento nº 16 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, o reconhecimento espontâneo de filho realizado junto às Defensorias Públicas e os Ministérios Públicos dos Estados e aquele em que a assinatura tenha sido abonada pelo diretor do presídio ou autoridade policial, quando se tratar de pai preso.

124.2. Se não for requerida a gratuidade e o reconhecimento se realizar em Registro Civil das Pessoas Naturais diverso daquele em que lavrado o assento de nascimento, o Oficial preparará a documentação e a entregará à parte para o encaminhamento necessário.

124.3. No caso do subitem anterior, é vedada a intermediação da arrecadação e repasse dos emolumentos devidos.

124.4. Depois de averbado o reconhecimento de filho no registro de nascimento, a averbação correspondente no registro de casamento da pessoa reconhecida ou no registro de nascimento de seus filhos será feita por este mesmo procedimento, independentemente de manifestação do Ministério Público, ou de decisão judicial.

Com a entrada em vigor da lei 13.257/2016, houve a alteração do texto dos parágrafos 5º e 6º do artigo 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que passaram a ter a seguinte redação:

“§5º Os registros e certidões necessários à inclusão, a qualquer tempo, do nome do pai no assento de nascimento são isentos de multas, custas e emolumentos, gozando de absoluta prioridade.
§6º São gratuitas, a qualquer tempo, a averbação requerida do reconhecimento de paternidade no assento de nascimento e a certidão correspondente.”

A nova legislação estabeleceu a gratuidade de toda e qualquer averbação referente ao reconhecimento de paternidade no assento de nascimento, bem como da correspondente certidão, sem qualquer ressalva ou restrição.

Com a modificação da legislação federal, as normas de hierarquia inferior devem ser modificadas, como é o caso do Provimento CNJ 19/2012 e do item 124 das NSCGJ.

Por essas razões e tendo sido revogado o Provimento CNJ 19/2012, as NSCGJ devem ser alteradas, conforme minuta que segue.

Sub censura.

São Paulo, 17 de agosto de 2017.

(a) Paula Lopes Gomes
Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo, pelas razões expostas, a edição do Provimento sugerido, conforme minuta apresentada, a ser publicado, juntamente com o parecer, no DJE. Publique-se. São Paulo, 18 de agosto de 2017. (a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça.

PROVIMENTO CG N.º 40/2017

Altera a redação do item 124 do Capítulo XVII das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.

O DESEMBARGADOR MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA, NO USO DE SUAS ATRIBUIÇÕES LEGAIS,

CONSIDERANDO a necessidade de adequação do texto das Normas de Serviço à legislação em vigor;

CONSIDERANDO a entrada em vigor da Lei 13.257/2016 e a alteração de dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente;

CONSIDERANDO a revogação do Provimento CNJ 19/2012;

RESOLVE:

Artigo 1º – O item 124 do Capítulo XVII das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça passa a ter a seguinte redação:

124. Nos casos de averbação de reconhecimento de filho serão observadas as diretrizes previstas no Provimento nº 16 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.

124.1. Submete-se à égide do Provimento nº 16 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, o reconhecimento espontâneo de filho realizado junto às Defensorias Públicas e os Ministérios Públicos dos Estados e aquele em que a assinatura tenha sido abonada pelo diretor do presídio ou autoridade policial, quando se tratar de pai preso.

124.2. Se o reconhecimento se realizar em Registro Civil das Pessoas Naturais diverso daquele em que lavrado o assento de nascimento, o Oficial preparará a documentação e a entregará à parte para o encaminhamento necessário.

124.3. Os registros e certidões necessários à inclusão, a qualquer tempo, do nome do pai no assento de nascimento são isentos de custas e emolumentos, gozando de absoluta prioridade.

124.4. São gratuitas, a qualquer tempo, a averbação requerida do reconhecimento de paternidade no assento de nascimento e a certidão correspondente.

124.5. Depois de averbado o reconhecimento de filho no registro de nascimento, a averbação correspondente no registro de casamento da pessoa reconhecida ou no registro de nascimento de seus filhos será feita por este mesmo procedimento, independentemente de manifestação do Ministério Público, ou de decisão judicial.

Artigo 2º – Este provimento entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições contrárias.

São Paulo, 18 de agosto de 2017
(a) MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS
Corregedor Geral da Justiça

Fonte: Anoreg/SP – DJE/SP | 29/08/2017.

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