Informativo STF – Resolução do CNJ e avaliação de títulos – Concurso público de provas e títulos para outorga de delegações de atividades notariais e/ou registrais do Estado do Rio de Janeiro.

A Primeira Turma iniciou o julgamento de mandado de segurança em que se pretende a cassação de decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio da qual foi alterada a contagem de títulos realizada por comissão de concurso público de provas e títulos para outorga de delegações de atividades notariais e/ou registrais do Estado do Rio de Janeiro.

No caso, discute-se a adequada interpretação dos incisos I e II do item 16.3 do edital, os quais reproduzem integralmente os incisos I e II do item 7.1 da minuta que acompanha a Resolução 81/2009 do CNJ (1). Os impetrantes argumentam que a autoridade coatora, ao fixar entendimento no sentido da impossibilidade de contabilizar o exercício de atividade notarial e registral por bacharel em Direito, teria violado o princípio da isonomia. Destacam o acerto da óptica adotada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, sublinhando que o citado preceito sempre foi interpretado de forma a abranger o cômputo de pontos em três situações: o exercício a) da advocacia; b) de delegação de notas e de registro e c) de cargo, emprego ou função privativa de bacharel em Direito.

O ministro Marco Aurélio (relator) deferiu a ordem para afastar, em relação aos impetrantes, os efeitos da decisão do CNJ. Asseverou que o órgão impetrado conferiu ao edital interpretação incompatível com os arts. 14, V, e 15, § 2º, da Lei 8.935/1994 (2), ao distinguir situações que a lei não diferencia. Os preceitos legais admitem a delegação da atividade notarial e de registro tanto a bacharéis em Direito quanto àqueles que, embora sem formação jurídica, tenham completado, até a data da primeira publicação do edital do concurso, dez anos de exercício em serviço notarial ou de registro.

Salientou que a manutenção do ato impugnado, além de contrariar o diploma que regulamenta o art. 236 da CF (3), revela inadmissível tratamento discriminatório aos candidatos com formação jurídica, que, excluídos da contagem de títulos com fundamento no inciso I, também não poderiam ser beneficiados pela previsão do inciso II, em razão da associação com o § 2º do art. 15 da Lei 8.935/2004.

Ademais, ressaltou que, ao se inscreverem para participar da seleção, os candidatos tomaram conhecimento das normas, as quais não podem ser alteradas no curso do processo sem ofensa ao princípio da vinculação ao instrumento convocatório nos concursos públicos, o que implica desrespeito à segurança jurídica, consubstanciada na frustração das expectativas criadas.

O ministro Alexandre de Moraes, em divergência, indeferiu a ordem. Salientou que o CNJ, assim como o próprio Poder Judiciário, na atividade jurisdicional, não pode fazer uma substituição à banca na questão valorativa, na questão de correção, mas pode substituir, anular ou reformar decisões que firmam razoabilidade, igualdade, legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade.

Pontuou que a interpretação conferida pelo CNJ à Resolução 81/2009 é anterior ao edital do concurso público em discussão. Nesse contexto, os candidatos já sabiam previamente como os títulos seriam avaliados. Não há ilegalidade porque não foi uma mudança que quebrou a impessoalidade. Portanto, a segurança jurídica estaria na observância à interpretação do CNJ.

Em seguida, o ministro Luiz Fux pediu vista.

(1) Resolução 81/2009 do CNJ: “7. TÍTULOS 7.1. O exame de títulos valerá, no máximo, 10 (dez) pontos, com peso 2 (dois), observado o seguinte: I – exercício da advocacia ou de delegação, cargo, emprego ou função pública privativa de bacharel em Direito, por um mínimo de três anos até a data da primeira publicação do edital do concurso (2,0); II – exercício de serviço notarial ou de registro, por não bacharel em direito, por um mínimo de dez anos até a data da publicação do primeiro edital do concurso (art. 15, § 2º, da Lei n. 8.935/1994) (2,0).”
(2) Lei 8.935/1994: “Art. 14. A delegação para o exercício da atividade notarial e de registro depende dos seguintes requisitos: (…) V – diploma de bacharel em direito; (…) Art. 15. Os concursos serão realizados pelo Poder Judiciário, com a participação, em todas as suas fases, da Ordem dos Advogados do Brasil, do Ministério Público, de um notário e de um registrador. (…) § 2º Ao concurso público poderão concorrer candidatos não bacharéis em direito que tenham completado, até a data da primeira publicação do edital do concurso de provas e títulos, dez anos de exercício em serviço notarial ou de registro.”
(3) CF/1988: “Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.”

MS 33527/RJ, rel. Min. Marco Aurélio julgamento em 25.4.2017. (MS-33527)

Fonte: INR Publicações – STF | 10/05/2017.

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CNJ: Procedimento de controle administrativo – Pedido parcialmente concedido – Divergência suscitada – Interesse meramente individual – Não cabimento de atuação do CNJ – Atendimento dos requisitos previstos na Resolução CNJ nº 81 – Revisão do mérito de ato administrativo – Impossibilidade – 1. O interesse nitidamente pessoal não se presta, por si só, para justificar a atuação fiscalizadora constitucional do Conselho Nacional de Justiça – 2. Atendidos os requisitos previstos na Resolução CNJ nº 81, o modus operandi dos concursos para preenchimento de serventias extrajudiciais, incluída a realização das provas orais, é prerrogativa que se insere no poder discricionário do tribunal – 3. Pedido desprovido.

Clique aqui e leia o inteiro teor.

Dados do processo:

CNJ – Procedimento de Controle Administrativo nº 0004791-80.2016.2.00.0000 – Minas Gerais – Rel. Cons. Bruno Ronchetti de Castro – DJ 06.04.2017

Fonte: INR Publicações.

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Transexuais têm direito à alteração do registro civil sem realização de cirurgia

Independentemente da realização de cirurgia de adequação sexual, é possível a alteração do sexo constante no registro civil de transexual que comprove judicialmente a mudança de gênero. Nesses casos, a averbação deve ser realizada no assentamento de nascimento original com a indicação da determinação judicial, proibida a inclusão, ainda que sigilosa, da expressão “transexual”, do sexo biológico ou dos motivos das modificações registrais.

O entendimento foi firmado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao acolher pedido de modificação de prenome e de gênero de transexual que apresentou avaliação psicológica pericial para demonstrar identificação social como mulher. Para o colegiado, o direito dos transexuais à retificação do registro não pode ser condicionado à realização de cirurgia, que pode inclusive ser inviável do ponto de vista financeiro ou por impedimento médico.

No pedido de retificação de registro, a autora afirmou que, apesar de não ter se submetido à operação de transgenitalização, realizou intervenções hormonais e cirúrgicas para adequar sua aparência física à realidade psíquica, o que gerou dissonância evidente entre sua imagem e os dados constantes do assentamento civil.

Sexo psicológico

O relator do recurso especial da transexual, ministro Luis Felipe Salomão, lembrou inicialmente que, como Tribunal da Cidadania, cabe ao STJ levar em consideração as modificações de hábitos e costumes sociais no julgamento de questões relevantes, observados os princípios constitucionais e a legislação vigente.

Para julgamento do caso, o ministro resgatou conceitos essenciais como sexo, identidade de gênero e orientação sexual. Segundo o ministro, as pessoas caracterizadas como transexuais, via de regra, não aceitam o seu gênero, vivendo em desconexão psíquico-emocional com o seu sexo biológico e, de um modo geral, buscando formas de adequação a seu sexo psicológico.

O relator também lembrou que, apesar da existência de princípios como a imutabilidade do nome, dispositivos legais como a Lei de Registros Públicos preveem a possibilidade de alteração do nome que cause situação vexatória ou de degradação social, a exemplo das denominações que destoem da aparência física do indivíduo.

Direito à felicidade

Na hipótese específica dos transexuais, o ministro Salomão entendeu que a simples modificação de nome não seria suficiente para a concretização do princípio da dignidade da pessoa humana. Para o relator, também seriam violados o direito à identidade, o direito à não discriminação e o direito fundamental à felicidade.

“Se a mudança do prenome configura alteração de gênero (masculino para feminino ou vice-versa), a manutenção do sexo constante do registro civil preservará a incongruência entre os dados assentados e a identidade de gênero da pessoa, a qual continuará suscetível a toda sorte de constrangimentos na vida civil, configurando-se, a meu juízo, flagrante atentado a direito existencial inerente à personalidade”, ressaltou o relator.

Exemplos internacionais

O ministro também citou exemplos de países que têm admitido a alteração de dados registrais sem o condicionamento à cirurgia. No Reino Unido, por exemplo, é possível obter a certidão de reconhecimento de gênero, documento que altera a certidão de nascimento e atesta legalmente a troca de identidade da pessoa. Iniciativas semelhantes foram adotadas na Espanha, na Argentina, em Portugal e na Noruega.

“Assim, a exigência de cirurgia de transgenitalização para viabilizar a mudança do sexo registral dos transexuais vai de encontro à defesa dos direitos humanos internacionalmente reconhecidos – máxime diante dos custos e da impossibilidade física desta cirurgia para alguns –, por condicionar o exercício do direito à personalidade à realização de mutilação física, extremamente traumática, sujeita a potenciais sequelas (como necrose e incontinência urinária, entre outras) e riscos (inclusive de perda completa da estrutura genital)”, destacou o relator.

Acompanhando o voto do relator, a Quarta Turma concluiu que o chamado “sexo jurídico” – constante do registro civil com base em informação morfológica ou cromossômica – não poderia desconsiderar o aspecto psicossocial advindo da identidade de gênero autodefinida pelo indivíduo, “o qual, tendo em vista a ratio essendi dos registros públicos, é o critério que deve, na hipótese, reger as relações do indivíduo perante a sociedade”.

Complexidades jurídicas

O ministro Salomão também apontou que as complexidades jurídicas geradas pelo reconhecimento dos direitos dos transexuais não operados já são perceptíveis no universo das pessoas que decidiram se submeter à cirurgia.

“Ademais, impende relembrar que o princípio geral da presunção de boa-fé vigora no ordenamento jurídico. Assim, eventuais questões novas (sequer cogitáveis por ora) deverão ser sopesadas, futuramente, em cada caso concreto aportado ao Poder Judiciário, não podendo ser invocados receios ou medos fundados meramente em conjecturas dissociadas da realidade concreta”, concluiu o ministro ao acolher o recurso especial da mulher.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ | 09/05/2017.

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