Entrevista – Eduardo Arruda Alvim: “É PRECISO QUE HAJA A CONGREGAÇÃO DE ESFORÇOS EM PROL DO EQUILÍBRIO NA CONCESSÃO DE GRATUIDADES”

Presidente da Comissão Permanente de Estudos de Processo Constitucional do Instituto de Advogados de São Paulo (IASP), Eduardo Arruda Alvim, sócio do escritório Arruda Alvim e Thereza Alvim Advocacia, em entrevista para a Associação de Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo (ARPEN-SP), fala sobre a recorrente previsão de gratuidades que inclui registradores e notários e sobre a concessão que o Estado oferece de benefícios que são custeados por essa classe.

O jurista, que também foi um dos palestrantes do “Seminário Nacional: Gratuidade no Extrajudicial e a Consequência de sua Política”, realizado no dia 19 de agosto e organizado pela Academia Paulista de Direito (APD), destacou ainda que há uma grande incoerência entre a gratuidade e a prestação de serviços na esfera privada.

“Não há dúvidas de que a atividade dos registradores e notários, muito embora se revista de função pública, é exercida sob o regime privado”.
Abaixo a entrevista na íntegra.

Arpen-SP: Qual a importância deste Seminário em debater a política de gratuidade que incide sobre as atividades registrais e notariais no Brasil?

Eduardo Arruda Alvim: A questão da gratuidade das atividades registrais e notarias no Brasil não tem sido muito discutida e é algo que tem grande impacto na atividade dos cartórios. Por essa razão é que vejo grande mérito na realização do Seminário, pois é preciso ampliar o debate, permitindo que mais pessoas tomem conhecimento do problema causado pela política de gratuidade e, principalmente, das consequências disso para a própria sociedade.

Arpen-SP: O excesso de gratuidade delegada pelo Poder Público é coerente com a prestação de um serviço privado?

Eduardo Arruda Alvim: Sem dúvida há uma grande incoerência entre a gratuidade e a prestação de serviços na esfera privada. Não há dúvidas de que a atividade dos registradores e notários, muito embora se revista de função pública, é exercida sob o regime privado, o que torna imprescindível que se preserve o equilíbrio econômico-financeiro. A recorrente previsão de gratuidades, sem o devido debate com todos os envolvidos – incluídos os registradores e notários –, significa que o Estado concede um benefício, mas quem suporta o custo disso são os notários e registradores.

Arpen-SP: Quais os impactos que o excesso de gratuidade pode vir a causar para a prestação destes serviços? Como isso afeta o usuário dos serviços?

Eduardo Arruda Alvim: Certamente a excessiva concessão dessa benesse comprometerá a qualidade dos serviços prestados. Os atos que devem ser praticados gratuitamente geram gastos aos delegatórios, tanto quanto aqueles que são remunerados, então não há dúvidas de que a atividade registral e notarial se tornará cada vez mais custosa ao registrador ou notário, o que acarretará o corte de pessoal e perda em infraestrutura, por exemplo, o que obviamente redunda na perda da qualidade do serviço prestado à sociedade.

Arpen-SP: Quais os reflexos para o Poder Público na inviabilidade da prestação notarial em razão do excesso de gratuidade?

Eduardo Arruda Alvim: É recorrente, sobretudo em cidades menos abastadas, em que a quantidade de atos gratuitos é muito grande, que haja falta de interessados em assumir os cartórios extrajudiciais, justamente porque nestes locais costuma-se “pagar para trabalhar”. Isso certamente acarreta um prejuízo ao Poder Público, na medida em que não logra obter interessados em assumir os cartórios, que exercem importantíssima função em prol da segurança jurídica das relações sociais.

Arpen-SP: Como o Poder Judiciário pode colaborar com a padronização da concessão de gratuidade nos serviços delegados? Como avalia a importância da atividade notarial e registral para a sociedade?

Eduardo Arruda Alvim: É preciso que haja a congregação de esforços em prol do equilíbrio na concessão de gratuidades. Não se pode negar que grande parcela da sociedade realmente não tem condições de arcar com diversos emolumentos. Contudo, a garantia de que essa grande parcela possa exercer com plenitude os seus direitos recai sobre o Estado, não sendo possível que este atribua esse custo, com exclusividade, à iniciativa privada. É preciso que seja ampliado o sistema de compensação e que ele efetivamente funcione, inclusive com a participação do Estado, a quem compete garantir o pleno exercício dos direitos pelos cidadãos. De outro lado, é preciso que o Poder Judiciário continue a fiscalizar se aqueles que pleiteiam a gratuidade, que se aplica também aos atos extrajudiciais, realmente fazem jus à benesse, e principalmente se houve, no curso do processo, mudança das condições financeiras do beneficiário.
Tudo isso se mostra importante para garantir que a qualidade do serviço seja sempre mantida, o que é imprescindível para garantir a segurança jurídica das relações sociais.

Arpen-SP: Quais os prejuízos que a ausência de definição do status de pobreza causa à prestação dos serviços por notários e registradores?

Eduardo Arruda Alvim: A falta de definição de pobreza acarreta a crescente prática de atos gratuitos pelos notários e registradores, pois sem essa definição não se estabelece um critério objetivo para delimitação dos sujeitos que fazem jus ao benefício. Por consequência, recai sobre os notários e registradores a obrigação de custear, já que os serviços são prestados e geram custos, a prática de atos em benefício daqueles que muitas vezes não teriam direito à benesse, caso houvesse uma real definição do conceito de pobreza.

Fonte: Arpen SP | 10/10/2016.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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