Desapropriação amigável – jurisprudência selecionada

O tema da desapropriação amigável gera incontáveis controvérsias. A jurisprudência oscila e faltava uma abordagem aprofundada do tema – seja no âmbito doutrinário, seja, mesmo, no âmbito da jurisprudência especializada.

O voto que publicamos nesta edição projeta a tradição do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo no trato aprofundado da matéria.

A questão cingiu-se ao seguinte: lavrado um instrumento notarial de “desapropriação amigável” o título remanesceria sem registro por mais de dez anos. No interregno, o proprietário deu o imóvel em hipoteca e alienou uma fração ideal do mesmo bem dado em desapropriação ao município.

Aferrado à ideia de que a desapropriação ostentaria a nota característica de representar um modo originário de aquisição, o município pretendeu o acesso do título, malgrado o fato de sucessivas alienação e oneração.

Neste cenário se movimentou o voto do eminente relator, des. Ricardo Dip. Fugindo da falsa questão – sobre ser a desapropriação um modo originário ouderivado de aquisição – o relator se fixará no aspecto formal da legitimação registral e do preenchimento dos requisitos legais da perda de propriedade imobiliária. A aquisição estatal de um bem, pela via expropriatória, exigirá a audiência processual dos expropriados ou seu consenso na via extrajudicial.

Para o registro da escritura seria necessário que se desse audiência às pessoas que, secundum tabulas, ostentem a legitimação de titularidade dominial plena (ou primária) ou aos que tenham titularidade in itinerē. Dirá que a “ideia de umadesapropriação oculta − vale dizer, fora do sistema formalizado de publicidade imobiliária − conjura contra a segurança jurídica”.

Vale a pena ler o excelente voto, cuja ementa é esta:

DÚVIDA REGISTRÁRIA. ESCRITURA DE AJUSTE DE PREÇO EM EXPROPRIAÇÃO. REGISTROS INTERCORRENTES DE HIPOTECA E DE PARCIAL ALIENAÇÃO DO IMÓVEL OBJETO. RECUSA DO REGISTRO DO TÍTULO AQUISITIVO.

1. O debate sobre ter a desapropriação caráter de modo originário de perda e aquisição dominial ou caráter derivado (entendimento este acolhido por SEABRA FAGUNDES e, atualmente, entre nós, quanto à “desapropriação amigável”, por Luis Paulo ALIENDE RIBEIRO) não é tema relevante para solver o caso dos autos.

2. É que, modo originário ou derivado, não importa, a expropriação é uma espécie regrada pela Constituição federal brasileira e por normas subconstitucionais, é modo de perdimento e aquisição dominial submetido a meios regulares (i.e., modo conformado a regras), o que é uma garantia dos expropriados, nota esta de regularidade, enfim, que permite distinguir, de um lado, a desapropriação, e, de outro, o mero confisco de bens. Dizer “aquisição regular” é dizer aquisição secundum regulam.

3. Ainda que se suponha (datum, neque concessum) que a expropriação seja modo originário aquisitivo, já o título, sobre o qual a aquisição predial se estriba, não frui de alforria quanto à correspondente situação jurídico-real inscrita.

4. O problema, pois, não está no modo aquisitivo, mas na morfologia do título. Em outras palavras, a matéria, para determinar-se pela forma, deve dispor-se adequadamente a esta, da mesma sorte que o fim exige sempre a reta ordenação dos meios que a ele podem conduzir.

5. Para que se efetive a regular aquisição estatal de um bem, por meio do modo expropriatório, exigem-se a audiência processual dos expropriados ou seu consenso (o que se chama, impropriamente, de “desapropriação amigável”).

6. O sistema jurídico de ordenação da propriedade predial está cifrado à dação formal de segurança, que, no caso brasileiro contemporâneo, corresponde à legitimação registral (art. 252 da Lei n. 6.015/1973, de 31-12: “O registro, enquanto não cancelado, produz todos os efeitos legais ainda que, por outra maneira, se prove que o título está desfeito, anulado, extinto ou rescindido”).

7. São titulares inscritos a que se deve dar audiência na expropriação as pessoas que, secundum tabulas, ostentem a legitimação de (i) titularidade dominial plena (ou primária); (ii) titularidade dominial secundária, equivale a dizer, os que tenham titularidade in itinerē ; (iii) titularidade de outros direitos reais menores.

8. É preciso distinguir entre, de um lado, a perda do domínio por meio da expropriação, e, de outro, a aquisição posterior do domínio pelo expropriante ou terceiro a quem a desapropriação aproveite.

9. A ideia de uma “desapropriação oculta” −vale dizer, fora do sistema formalizado de publicidade imobiliária− conjura contra a segurança jurídica.

10. Tratando-se de bem imóvel, a aquisição, que pode não acontecer ainda após a transcrição (se o bem for desapropriado para ser bem de todos), só se opera com a transcrição [agora: registro −vidē art. 168 da Lei n. 6.015/1973]” (PONTES DE MIRANDA).

Não provimento da apelação.

Clique aqui e leia na íntegra.

Fonte: Observatório de Registro | 27/07/2016.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.


CGJ/SP: Registro de Imóveis – Decisão do Corregedor Permanente que afastou óbice para a averbação de cisão – Recurso administrativo interposto por Registrador – Inteligência do artigo 202 da Lei n° 6.015/73 e dos itens 41.6 e 41.7 do Capítulo XX das Normas de Serviço – Ilegitimidade recursal – Recurso não conhecido.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 2016/11890
(36/2016-E)

Registro de Imóveis – Decisão do Corregedor Permanente que afastou óbice para a averbação de cisão – Recurso administrativo interposto por Registrador – Inteligência do artigo 202 da Lei n° 6.015/73 e dos itens 41.6 e 41.7 do Capítulo XX das Normas de Serviço – Ilegitimidade recursal – Recurso não conhecido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso interposto pelo Oficial do 14° Registro de Imóveis da Capital contra a sentença de fls. 254/258, que, em pedido de providências, afastou a necessidade de apresentação de Certidões Negativas de Débito para a averbação da cisão da empresa titular de domínio das matrículas n° 86.343 e 86.344 do 14° RI.

O recorrente sustenta, em síntese, que o artigo 47, I, “b”, da Lei n° 8.212/91 determina a apresentação de Certidão Negativa de Débito na alienação ou oneração de bem imóvel (fls. 265/268).

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 127/129).

É o relatório.

Opino.

Ao tratar do procedimento de dúvida, preceitua o artigo 202 da Lei n° 6.015/73:

“Da sentença, poderão interpor apelação, com os efeitos devolutivo e suspensivo, o interessado, o Ministério Público e o terceiro prejudicado'”.

Com pequena alteração na redação, assim também dispõe item 41.6 do Capítulo XX das Normas de Serviço. Especificamente sobre o artigo 202 da Lei de Registros Públicos, ensina Ricardo Henry Marques Dip:

“Da sentença, no processo de dúvida, podem apelar – e contra-arrazoar recursos – o interessado (rectius: o apresentante), o Ministério Público (ver art. 199, LRP) e o terceiro prejudicado (cf. art. 499, CPP). Quanto a este último, que não pode intervir nesse processo administrativo antes da esfera recursal – e nela só se admite à vista da expressa previsão do art. 202, LRP –, deve indicar e, quodammodo, provar seus cogitáveis interesse jurídico e prejuízo, para que se admita o processamento de sua apelação (…).

O registrador não é parte nem tem interesse no processo de dúvida, de sorte que não pode, sequer como título de terceiro, apelar da sentença de improcedência” (Lei de Registros Públicos Comentada, coord. José Manuel de Arruda Alvim Neto e outros, Forense, página 1.078, comentários ao art. 202).

O trecho acima explicita o que já é intuitivo, ou seja, o registrador não pode recorrer da sentença prolatada no procedimento de dúvida.

Interessado é o apresentante e terceiro prejudicado é aquele que tem interesse jurídico na questão decidida pelo Permanente.

Em nenhuma dessas duas categorias o Registrador se enquadra.

Embora suscite a dúvida, cujo objeto é a avaliação dos óbices apresentados pelo próprio registrador para o ingresso de um título, a este último cabe apenas aguardar a decisão do Corregedor Permanente – ou do Conselho Superior da Magistratura, se houver recurso – e cumpri-la.

Em típica atividade administrativa, o Corregedor Permanente requalifica o título apresentado, não sendo dado ao Registrador questionar a decisão daquele cuja função é justamente avaliar o cabimento da nota devolutiva apresentada.

Sobre o tema, valem transcrição a ementa e trecho do voto proferido pelo Desembargador José Renato Nalini na apelação n° 0052045-13.2012.8.26.0405:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Recurso de apelação – Recurso de apelação requerido pelo ex-interventor do 2º Tabelião de Notas de Osasco – Ilegitimidade recursal – Precedentes – Recurso não conhecido”

“De início, destaque-se que o recorrente, na qualidade de interventor, não tem legitimidade e interesse – tal como os Tabeliães e interinos –, para suscitar dúvida nem para recorrer da decisão nela proferida.” (Conselho Superior da Magistratura de São Paulo – v.u. – j. em 6/11/13).

E nem se argumente que aqui se trata de pedido de providências, e não de dúvida, uma vez que o item 41.7 das Normas de Serviço assim estabelece:

Aplicam-se ao procedimento administrativo comum em matéria de registro de imóveis, de competência recursal da Corregedoria Geral da Justiça, com base no artigo 246 do Código Judiciário do Estado, as disposições previstas nestas normas para o procedimento da dúvida registral, a eletrônica inclusive”.

Desse modo, se o registrador não pode recorrer das decisões prolatadas em procedimentos de dúvida, que tratam de atos de registro em sentido estrito, pelas mesmas razões não o pode fazer nos pedidos de providência, nos quais são examinados os atos de averbação.

Nesses termos, o parecer que se submete à elevada consideração de Vossa Excelência é pelo não conhecimento do recurso interposto.

Sub censura.

São Paulo, 5 de fevereiro de 2016.

Carlos Henrique André Lisboa

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, não conheço do recurso interposto pelo 14º Oficial de Registro de Imóveis da Capital. Publique-se. São Paulo, 11.02.2016. – (a) – MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS – Corregedor Geral da Justiça.

Diário da Justiça Eletrônico de 19.02.2016
Decisão reproduzida na página 19 do Classificador II – 2016

Fonte: INR Publicações | 26/07/2016.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.


2ª VRP/SP: Retificação ou Suprimento ou Restauração de Registro Civil – Retificação de Nome

Processo 1017321-66.2016.8.26.0100 – Retificação ou Suprimento ou Restauração de Registro Civil – Retificação de Nome – W.O.M. – Vistos.Fls. 87 e ss.: O mandado de retificação foi corretamente cumprido pelo RCPN, averbando-se à margem do assento de nascimento a alteração do prenome decretada na sentença proferida no feito.Da leitura da certidão de nascimento expedida à luz do assento retificado, consta a seguinte redação: “Averbação: o presente termo envolve averbação de alteração de nome decretada por sentença (…)” (fls. 88).Apesar de constar na certidão que “o presente termo envolve averbação de alteração de nome”, no caso específico dos autos, não denoto rigorosamente nenhum elemento, nenhuma palavra, passível de ensejar situação constrangedora ou discriminatória à parte autora.Note-se que na averbação consta “alteração de nome” e não de prenome. Ora, “alteração de nome” é expressão genérica que compreende diversas causas possíveis para alteração do registro público, podendo referir-se a alteração de quaisquer dos elementos que compõem o nome, tais como: inclusão ou supressão de patronímico, inclusão de apelido público notório, correção de grafia de prenome ou patronímico. Enfim, a expressão genérica “alteração de nome” não abarca nenhuma interpretação capaz de constranger ou discriminar.A esse respeito, oportuno ponderar que diversa seria a situação hipotética em que o RCPN houvesse consignado na certidão “o presente termo envolve averbação de alteração do prenome de Mário para Maria”. Nesse caso elucidativo, hipotético, vislumbro sim situação constrangedora/discriminatória, e que justificaria ordem do Juízo para expedição de mandado visando corrigir a averbação e salvaguardar a dignidade do registrado.Em resumo, no caso específico dos autos, não extraio, minimamente, nenhum elemento passível de ensejar situação constrangedora e discriminatória à parte autora e, por conseguinte, indefiro o pedido.No mais, ao arquivo.Intimem-se. – ADV: KAREN SCHWACH (OAB 265768/SP)

Fonte: DJE/SP | 27/07/2016.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.