Prisão civil dos avós por dívida alimentar não é consenso na comunidade jurídica

Não existe consenso quando o tema é a prisão civil dos avós por dívida alimentar. A juíza Ana Louzada, presidente da Comissão de Direito de Família e Arte do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), por exemplo, caso os avós sejam devedores de alimentos, é a favor da determinação de prisão sim. “Em sua grande maioria, assim que determinada a prisão do devedor, o dinheiro aparece. Além disso, a obrigação alimentar é recíproca entre pais e filhos, avós e netos, é dizer, quem necessita deve buscar auxílio naquele familiar que possua condições para tanto. A obrigação avoenga é subsidiária e complementar. Se os avós restaram obrigados a pagar pensão aos netos, é porque os pais não tiveram condições para mantê-los”, disse.

Magistrada no Distrito Federal, Ana Louzada já decretou, por uma única vez, a prisão de uma avó. “E naquele caso específico, como a avó devedora estava adoentada, decretei prisão domiciliar”, garantiu. Segundo ela, o decreto de prisão do devedor é um ato delicado, mas necessário. “Retira-se a liberdade de um, e outorga-se a dignidade a outro. A responsabilidade, o dever de cuidado deve estar ínsito nas relações de famílias. É uma lástima que tenhamos que decretar prisão de devedores de alimentos, sejam eles  quem forem. Mas isso só acontece quando o afeto cede espaço ao descaso”, disse.

Já para a jurista Tânia da Silva Pereira, presidente da Comissão Nacional do Idoso do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a obrigação de prestar alimentos fundamenta-se na solidariedade familiar, a ser invocada prioritariamente às pessoas de maior proximidade afetiva. Segundo ela, nesse contexto, a obrigação dos avós de prestar alimentos aos netos já se consolidou no sistema jurídico brasileiro, ficando restrita às circunstâncias fáticas de lhes faltarem os pais ou em que esses não possam lhes fornecer toda a quantia necessária para a sua subsistência, aplicando-se o disposto no art. 1.696 do CC/02. “Assim, pode-se afirmar que a obrigação dos alimentos prestados por avós é subsidiária e complementar, ou seja, os avós apenas irão complementar a pensão já alcançada pelos pais e que se revelou insuficiente.”

Tânia da Silva Pereira explica que o STJ pacificou o entendimento nesse sentido, com o consenso de que “a responsabilidade dos avós de prestar alimentos é subsidiária e complementar à responsabilidade dos pais, só sendo exigível em caso de impossibilidade de cumprimento da prestação – ou de cumprimento insuficiente – pelos genitores”. No mesmo sentido, a 3ª Turma já decidiu que “a responsabilidade dos avós de prestar alimentos aos netos não é apenas sucessiva, mas também complementar, quando demonstrada a insuficiência de recursos do genitor”.

Ela destaca que é preciso observar, inicialmente, que, assim como todos os casos que envolvem pensão alimentícia, é imprescindível a análise do trinômio necessidade-possibilidade-proporcionalidade para a fixação da pensão devida pelos avós, de acordo com as circunstâncias do caso concreto. “Nota-se que o art. 230 da Constituição Federal de 1988 prevê como dever de todos – Estado, Família e Sociedade – zelar pela dignidade humana dos idosos, o que também é previsto pelo § 3º do art. 10 da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso), devendo-se colocá-los a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”.

Assim, ela justifica, em se tratando de idoso devedor de alimentos, deve-se primar pela solução que melhor contemple sua dignidade, sem descurar da necessidade e da efetividade da medida que visa ao cumprimento da prestação. De acordo com Tânia, em 2013, a 3ª Turma do STJ concedeu habeas corpus a uma mulher de 77 anos, para lhe garantir o direito a cumprir, no próprio domicílio, a pena de prisão civil que lhe foi imposta por inadimplemento de pensão alimentícia. A decisão, em caráter excepcional, amparada no princípio da dignidade da pessoa humana, levou em conta que se tratava de pessoa com idade avançada e portadora de cardiopatia grave. “Diante das vulnerabilidades e peculiaridades que permeiam a vida dos idosos, é inegável a necessidade de se conferir um olhar diferenciado nos casos em que são os avós, com idade avançada, os devedores de alimentos. Neste sentido, nota-se que o novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/15 traz mecanismos para a efetivação da obrigação alimentar diversos da prisão civil, como a possibilidade do desconto em folha de pagamento do devedor (art. 912 e art. 529), a execução por meio de penhora (art. 913) e até mesmo o protesto da dívida (art. 528, na forma do art. 517)”, afirma.

Deve-se priorizar, assim, ela defende, medidas de cunho patrimonial, em detrimento da prisão civil, que apresenta uma restrição da liberdade que pode, muitas vezes, ser incompatível e desproporcional diante da idade do alimentante. “Assim, no caso, por exemplo, de estar o avô ou avó passando por problemas de saúde diversos ou não possuindo condição financeira para suprir sequer suas necessidades básicas, como alimentação e remédios, a decretação da prisão feriria sua dignidade e sua integridade física e psíquica, violando o Estatuto do Idoso e a própria Constituição. Além disso, iria de encontro à proporcionalidade que permeia a possibilidade do alimentante e a necessidade do alimentando”, destacou. A prisão civil dos avós, para ela, deve ser medida excepcional, “devendo-se optar, sempre que possível, por mecanismos de coerção de cunho patrimonial, e, não sendo possível, a medida de restrição da liberdade deve ser efetivada de modo a resguardar a dignidade e a integridade física e psíquica do idoso, consideradas as peculiaridades e vulnerabilidades atinentes a esta fase da vida”.

Fonte: IBDFAM | 13/07/2016.

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Escritura Pública de inventário e partilha – Ofensa ao princípio da especialidade objetiva – CCIR do imóvel rural – Exigência pertinente – Insuficiência do CCIR da fração ideal partilhada – Dúvida procedente – Recurso desprovido com observação.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 9000002-83.2015.8.26.0099

Registro: 2016.0000412183

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 9000002-83.2015.8.26.0099, da Comarca de Bragança Paulista, em que são partes são apelantes ADAIR FERNANDA CAVALCANTI e MATEUS CAVALCANTI IZZO, é apeladoOFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE BRAGANÇA PAULISTA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão:“Negaram provimento ao recurso, com observação, V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP E SALLES ABREU.

São Paulo, 9 de junho de 2016.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 9000002-83.2015.8.26.0099

Apelantes: Adair Fernanda Cavalcanti e Mateus Cavalcanti Izzo

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Bragança Paulista

VOTO Nº 29.243

Registro de Imóveis – Escritura Pública de inventário e partilha – Ofensa ao princípio da especialidade objetiva – CCIR do imóvel rural – Exigência pertinente – Insuficiência do CCIR da fração ideal partilhada – Dúvida procedente – Recurso desprovido com observação.

Ao suscitar dúvida, o Oficial de Registro justificou a necessidade do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural CCIR, então indispensável para o registro da escritura pública de inventário e partilha. Acrescentou, no mais, que não basta o CCIR relativo à parte ideal objeto da sucessão causa mortis, porque inafastável o referente à área total do imóvel. [1]

Certificado o decurso do prazo para impugnação [2], e após parecer do Ministério Público [3], a dúvida foi julgada procedente [4], motivo por que os suscitados, afirmando ser suficiente o CCIR da fração ideal do imóvel rural contemplada na partilha, interpuseram apelação [5], recebida no seu duplo efeito [6].

Por fim, a Procuradoria Geral da Justiça propôs o provimento do recurso [7].

É o relatório.

O dissenso versa sobre a registrabilidade da escritura de inventário e partilha do espólio de José Fernando Izzo [8]. Seu ingresso no fólio real foi recusado pelo Oficial porque ausente o CCIR do bem imóvel rural identificado na mat. n.º 7.565 do RI de Bragança Paulista, com área equivalente a 107.200,00 m² [9].

Para os recorrentes, entretanto, é suficiente o CCIR relativo à fração ideal partilhada, correspondente a 23,23041% do todo, que é indicado no título e restou documentalmente comprovado [10]. Nada obstante, porém, o esforço argumentativo, os interessados não têm razão.

Por força do princípio da unitariedade, a cada imóvel deve corresponder uma única matrícula. E a identificação do imóvel, por força do princípio da especialidade objetiva e, particularmente, da regra do art. 176, II, 3, a, da Lei n.º 6.015/1973, supõe os dados constantes do CCIR.

Esse, portanto, o Certificado de Cadastro de Imóvel Rural, deve referir-se a sua área total, de modo a singularizá-lo, e não, sob essa ótica, reportar-se a fração ideal da coisa. Assim sendo, se a sucessão causa mortis contempla bem imóvel rural, exige-se o CCIR correspondente, não atendendo o rigor legal alusão a certificado de parte ideal do todo.

Convém lembrar que a exigência de apresentação do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) expedido pelo INCRA, previsto no Estatuto da Terra (Lei n.º 4.504/1964 [11]), não é nova: consta do art. 22 da Lei n.º 4.947/1966, que faz expressa menção a sua exibição por ocasião da sucessão causa mortis [12], e, mais recentemente, do art. 1.º do Decreto n.º 4.449/2002, que regulamentou a Lei n.º 10.267/2001, diploma legal que, entre outras, promoveu alterações no art. 176 da Lei n.º 6.015/1973 para fazer constar a necessidade da identificação do bem imóvel rural contemplar seu código e os dados constantes do CCIR.

Dentro desse contexto, a deficiente identificação do imóvel rural impede a inscrição pretendida, pois em desconformidade com os princípios da legalidade e da especialidade objetiva. A exigência questionada, em suma, encontra respaldo nas disposições legais acima especificadas, bem como nos itens 59, a.1, 65, a, 115, c, do Cap. XIV, 59, II, e 59.1, do Cap. XX das NSCGJ.

Em arremate, constata-se, na matrícula, a ocorrência de diversas (e antigas) alienações de partes ideais com metragens certas, indicativas, assim, de parcelamento irregular do solo, o que, também, está a desautorizar a inscrição pretendida.

Aliás, essa situação reclama apuração pelo MM Juiz Corregedor Permanente, a quem caberá, nessa linha, em expediente próprio, cuja abertura deverá ser informada à CGJ, apurar a necessidade de regularização e do acautelatório bloqueio da matrícula.

Isto posto, pelo meu voto, nego provimento à apelação, com observação.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Notas:

[1] Fls. 2-6.

[2] Fls. 88.

[3] Fls. 89-91.

[4] Fls. 93-94.

[5] Fls. 102-105.

[6] Fls. 107.

[7] Fls. 116-118.

[8] Fls. 21-31.

[9] Fls. 76-77.

[10] Fls. 23, cláusula 5.1, e 61.

[11] Cf. art. 46.

[12] Cf. § 2.º do art. 22 da Lei n.º 4.947/1966. (DJe de 08.07.2016 – SP)

Fonte: INR Publicações | 13/07/2016.

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STJ nega guarda compartilhada para pais que moram em cidades diferentes

Tribunal avaliou que a dificuldade geográfica constitui impedimento

Na última semana, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu ser inviável a implementação de guarda compartilhada em caso de pais que moram em cidades diferentes. Para o colegiado, a dificuldade geográfica impede a realização do princípio do melhor interesse dos menores às filhas do casal.

Segundo o ministro Villas Bôas Cueva, relator, a guarda compartilhada tem preferência no ordenamento jurídico brasileiro e sua implementação não se condiciona à boa convivência entre os pais, mas as peculiaridades do caso concreto demonstram a existência de impedimento insuperável.

“Na hipótese, a modificação da rotina das crianças, ou até mesmo a possível alternância de residência, impactaria drasticamente a vida das menores. Por exemplo, não é factível vislumbrar que as crianças, porventura, estudassem alternativamente em colégios distintos a cada semana ou que frequentassem cursos a cada 15 dias quando estivessem com o pai ou com a mãe. Tal impasse é insuperável na via judicial”, explicou o ministro.

Villas Bôas Cueva observou, contudo, que “o fato de não se permitir a guarda compartilhada por absoluta impossibilidade física não quer dizer que as partes não devam tentar superar o distanciamento e eventuais desentendimentos pessoais em prol do bem-estar das filhas. A forte litigiosidade afirmada no acórdão deve ser superada para permitir a conformação mínima dos interesses legítimos de todos os membros da família”.

Para o professor Waldyr Grisard Filho, presidente da Comissão de Ensino Jurídico de Família do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a distância entre as moradias não condiciona a implementação da guarda compartilhada.

O professor explica que na guarda unilateral o seu detentor exerce, com exclusividade, a plenitude de todos os atributos do poder familiar, reservando ao não guardião “parca” convivência com os filhos. “Por isso sua inconveniência”, diz. Na guarda compartilhada, entretanto, “o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns, o são de forma conjunta, na mesma medida e intensidade”.

Segundo Grisard, ao atribuir a guarda unilateral à mãe, a decisão do STJ, confirmando o acórdão do TJ recorrido, reduz ao pai o exercício do poder familiar, contribuindo para fortificar a confusão que se estabelece entre guarda e poder familiar.

“Poder familiar, como continente, é o exercício de uma função, a função de pai e a função de mãe, decorrente da paternidade e da maternidade. Simples”, esclarece.“Guarda, como conteúdo, são os atributos que a lei confere aos pais para bem exercerem suas funções. Guarda corresponde à convivência, companhia, proximidade física de uma pessoa (pai ou mãe) em relação a outra (filho). Decisões importantes como educação (escolha da escola, atividades complementares, livros para estudos) decorrem do poder familiar, não da guarda; cuidados com a saúde, viagens, amigos, frequência a certos lugares, também; conceder ou não consentimento para casar, nomear tutor, representar e assistir, idem, restando à guarda a disciplinação da companhia, do convívio entre pais e filhos”, explica.

Ele destaca a diferença entre os dois institutos. “Na guarda unilateral, o guardião tem a companhia, o convívio, além da tomada de decisões com exclusividade, e o não guardião o consolo das visitas. Na guarda compartilhada, a companhia e o convívio do não guardião é mais intenso e ultrapassa os limites da simples visita, além da tomada de decisões conjuntas em benefício dos filhos”, afirma. Ele ressalta que a decisão do STJ além de não diferenciar os conceitos, alimentou a confusão.

“Quebrando paradigmas, disse a ministra Nancy Andrighi ao tempo da Lei n. 11.698/2008 no REsp 1.251.000/MG, que a guarda compartilhada física (custódia física conjunta) é o ideal a ser buscado no estabelecimento da guarda, sujeita, contudo, às peculiaridades fáticas que envolvem pais e filhos, mas jamais sob o fundamento da distância entre as moradias dos pais, questão hoje minorada por diversos meios de comunicação, de modo instantâneo pela rede mundial de computadores (internet, e-mail, vídeo de imagem e som, Skype, Google Talk, celulares permitindo que pessoas se vejam enquanto falam, WhatsApp), disponibilizados como ‘visitas virtuais’ ou ‘encontros online’. Mesmo entre cidades ou países distantes pais e filhos podem manter uma adequada e frequente comunicação, assegurando presença contínua do pai na vida do filho, sem diminuição dos demais deveres que integram o rol dos atributos do poder familiar”, reflete.

Por fim, o professor conclui que não se pode negar atribuição da guarda compartilhada ao argumento de mediar relativa distância entre as residências de pais e filhos, “diante de ferramentas capazes de assegurar adequada convivência entre eles, nem suprimir o exercício do poder familiar pela atribuição de guarda exclusiva, unilateral”.

A juíza Ana Florinda Dantas, vice-presidente da Comissão de Gênero e Violência Doméstica do IBDFAM também comenta a decisão. Acesse.

Fonte: IBDFAM | 13/07/2016.

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