CGJ/SP: Registro de Imóveis – Alienação fiduciária de bem imóvel – Consolidação da propriedade em nome da credora fiduciária, em face da regular intimação e da mora dos devedores fiduciantes – Averbações de indisponibilidades contra os fiduciantes, que impedem a consolidação – Necessidade de levantamento mediante ordem dos juízos de onde emanaram – Recurso desprovido.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 2015/154498
(448/2015-E)

Registro de Imóveis – Alienação fiduciária de bem imóvel – Consolidação da propriedade em nome da credora fiduciária, em face da regular intimação e da mora dos devedores fiduciantes – Averbações de indisponibilidades contra os fiduciantes, que impedem a consolidação – Necessidade de levantamento mediante ordem dos juízos de onde emanaram – Recurso desprovido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso administrativo tirado em face da r. decisão que manteve a negativa do Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital em averbar a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, após regular intimação do devedor fiduciante e não purgação da mora, em contrato de alienação fiduciária de imóvel.

A recusa deveu-se ao fato de os bens do devedor fiduciante estarem indisponíveis.

O recorrente alega, em preliminar, falta de citação; no mérito, que adquiriu a propriedade fiduciária em data anterior à da indisponibilidade de bens do devedor fiduciante e à da distribuição da cautelar fiscal.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso.

Opino.

Observe-se, de início, que a apelação deve ser conhecida como recurso administrativo, na forma do art. 246 do Decreto-lei Complementar Estadual n° 3/69, aplicando-se o princípio da fungibilidade.

A preliminar de ausência de citação não procede.

O 4º Registro de Imóveis da Capital, a pedido do ora recorrente, formulou pedido de providências ao Juízo Corregedor Permanente e o notificou para, querendo, apresentar impugnação no prazo de 15 dias (fl. 147). O recorrente, porém, não se manifestou, fato este que constou da certidão de fls. 148.

Os autos seguiram, em seguida, ao Ministério Público para parecer e, após, ao juiz para prolação de decisão.

O procedimento está de acordo com o previsto nos arts. 198/202 da Lei n° 6.015/73, que se aplicam também aos pedidos de providências por força do item 41.7[1], do Capítulo XX, das NSCGJ.

Além da notificação para se manifestar na forma do art. 198, III, da Lei n° 6.015/73, não há previsão legal de qualquer ato processual que demande manifestação do recorrente até a prolação da decisão recorrida. E, uma vez proferida a decisão recorrida, dela o recorrente foi regularmente intimado e apresentou recurso no prazo legal.

Inviável, portanto, qualquer alegação de nulidade por falta de intimação ou cerceamento de defesa.

No mais, o recurso não procede.

A questão foi recentemente enfrentada nos autos do processo CG n° 2015/00167424, em que se decidiu que:

“O art. 22 da Lei nº 9.514/97 define a alienação fiduciária de coisa imóvel:

Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.

Já o artigo 23 aponta a forma de constituição da propriedade fiduciária, e o parágrafo único, seus efeitos:

Art. 23. Constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título.

Parágrafo único. Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel.

Portanto, ao credor fiduciário é conferida a propriedade resolúvel e a posse indireta. Ao devedor fiduciante, a posse direta – com todos os desdobramentos que daí decorrem – e, também, um direito real de reaquisição.

Nas palavras de Melhim Namem Chalhub, “ao ser registrado o contrato de alienação fiduciária, considera-se transmitida a propriedade ao credor-fiduciário, em caráter resolúvel; de outra parte, o devedor-fiduciante é demitido de sua propriedade e investido de direito real de reaquisição, sob condição suspensiva, podendo tornar-se novamente titular da propriedade plena ao implementar o pagamento da dívida que constitui objeto do contrato garantido pela propriedade fiduciária.” (Negócio Fiduciário, Renovar, 4º Ed., p. 239).

Logo, embora a propriedade seja, não obstante resolúvel, do credor fiduciário, é certo que o devedor fiduciante tem direitos. E tais direitos são economicamente relevantes e, por isso, consideram-se bens. Se são bens, podem ser atingidos pelo decreto de indisponibilidade.

A conclusão, assim, é de que a indisponibilidade averbada incide não sobre a propriedade – nem poderia –, mas sobre os bens dos devedores fiduciantes: a posse direta e o direito real de reaquisição.

A consolidação da propriedade, se averbada, faria, extinguir os direitos dos devedores fiduciários. Porém, por força de determinação judicial, decretou-se a indisponibilidade de tais bens ou direitos.

Permitir a averbação da consolidação da propriedade implicaria, por via reflexa, tornar sem efeito a indisponibilidade. Dito de outro modo, traduziria revisão de determinação judicial pela via administrativa, o que não se admite.

Como se sabe, no sistema jurídico constitucional brasileiro, admite-se que os atos dos demais Poderes do Estado – legislativos e administrativos – sejam revistos pelos juízes, no exercício da jurisdição, mas o contrário, ou seja, a revisão dos atos jurisdicionais dos juízes pelas autoridades legislativas ou administrativas, isso não se admite (Cândido Rangel Dinamarca, Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo: Malheiros, 2001, vol. 1, p. 310).

É preciso, dessa maneira, que, antes de averbar a consolidação, o recorrente promova o levantamento das constrições perante os Juízos de onde elas partiram.”

Some-se aos argumentos trazidos pelo precedente citado a ressalva da r. decisão recorrida no sentido de que a certidão de decurso de prazo sem a purgação da mora pelo devedor não é suficiente para consolidar o domínio em nome do credor fiduciário, sendo de rigor o ato de averbação na matrícula, o que não há. Assim, não há que se falar que o domínio já havia sido consolidado em nome do recorrente.

Pelo exposto, o parecer que submeto a Vossa Excelência, respeitosamente, é no sentido de negar provimento ao recurso.

Sub censura.

São Paulo, 26 de novembro de 2015.

Gustavo Henrique Bretas Marzagão

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso. Publique-se. São Paulo, 04.12.2015. – (a) – JOSÉ CARLOS GONÇALVES XAVIER DE AQUINO – Corregedor Geral da Justiça.

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Nota:

[1] 41.7. Aplicam-se ao procedimento administrativo comum em matéria de registro de imóveis, de competência recursal da Corregedoria Geral da Justiça, com base no artigo 246 do Código Judiciário do Estado, as disposições previstas nestas normas para o procedimento da dúvida registral, a eletrônica inclusive.

Diário da Justiça Eletrônico de 17.12.2015
Decisão reproduzida na página 243 do Classificador II – 2015

Fonte: INR Publicações | 19/05/2016.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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