Artigo: A anotação do novo casamento no assento do casamento anterior: Possibilidade de aviltar a dignidade da pessoa humana e acarretar onerosidade ao usuário. – Por Maria Luzia da Fonseca

* Maria Luzia da Fonseca

Quando se fala em anotação, fala-se em ato praticado de ofício pelo registrador, por força dos artigos 106 a 108 da Lei dos Registros Públicos (Lei 6.015/1973), a qual tem por objetivo integrar o sistema da publicidade registral em relação aos atos da vida civil da pessoa natural. Ela não altera o assento, apenas informa a ocorrência da prática de um ato posterior, relacionado com a pessoa que figura no registro.

A anotação deve ser feita – ou expedido comunicado ao oficial do registro primitivo no caso de ser de outra serventia – quando são lavrados determinados registros (casamento, óbito, emancipação, interdição, ausência ou morte presumida) ou feitas determinadas averbações (sentença de nulidade ou anulação de casamento, separação, divórcio), conforme determina o artigo 106 da LRP.

Dentre as anotações – feitas de ofício ou por meio de comunicados –, a anotação do novo casamento é o objeto desta reflexão.

Nosso sistema registral é regido pela Lei 6.015, de 1973, a qual teve três anos de vacatio legis, por ter introduzido profundas alterações no ordenamento jurídico. Quando entrou em vigor ainda convivíamos o instituto do desquite, pois o divórcio só foi institucionalizado com o advento da Lei 6.515, de dezembro de 1977. Antes do divórcio, as anotações à margem do termo de casamento se resumiam a eventual interdição ou ausência de um ou de ambos os cônjuges, ao óbito e o novo casamento do viúvo.

O sistema foi idealizado para uma época em que o novo casamento só era possível em caso de declaração de nulidade ou de anulação por sentença judicial, ou de viuvez, quando então o vínculo conjugal era rompido.

Há de se considerar que certidão do registro civil (de nascimento ou casamento) é o documento mais importante para a pessoa, pois dá suporte à emissão de todos os demais. Assim, o cônjuge supérstite, enquanto conservava a condição de viúvo, utilizava a certidão do casamento com a anotação do óbito.

Nossa realidade, todavia, em virtude do divórcio, é outra: a multiplicidade de casamentos – e com a Emenda Constitucional 66/2010 ficou ainda mais célere romper o vínculo matrimonial –, pois é da natureza humana a busca pela felicidade. Aqui surge a primeira questão.

Desfeito o vínculo conjugal pelo divórcio os ex-cônjuges compartilham o mesmo documento, qual seja: a certidão do casamento com a averbação do divórcio até que, querendo, contraiam novas núpcias.

Quando se registra o casamento de uma pessoa divorciada o Oficial deve anotar (ou expedir comunicado) o novo casamento à margem do assento de casamento anterior. Esta anotação trás a informação de que aquela pessoa não ostenta mais o estado civil de divorciada, amarrando desta forma o sistema em relação ao que se casou.

Mas o ex-cônjuge enquanto não contrair novas núpcias (e depende do querer) terá que utilizar como documento pessoal a certidão do casamento desfeito. E, na práxis registral, ao se anotar o novo casamento, é incluído o nome da pessoa com quem o divorciado se casou. Aqui tem início o burburinho!

Vejamos: para aquele que se casou o documento passa a ser a certidão do novo casamento. Mas a pessoa que conserva a condição de divorciada tem que usar como documento pessoal a certidão do casamento desfeito, com a respectiva averbação do divórcio. Na certidão consta também a anotação do novo casamento do ex-cônjuge, vindo de contrapeso, o nome da pessoa com quem o “ex” casou-se.

Sabe-se que são raros os casos em que um casamento termina sem rancores. Imagine o seguinte: uma pessoa se divorcia em razão da quebra do dever conjugal de fidelidade. Em regra o infiel logo se casa, pois apaixonado. A outra pessoa que se mantém divorciada já está com o amor próprio ferido, e ainda assim, necessitando da certidão de casamento atualizada, percebe que nela consta o nome da pessoa com quem o infiel se casou. O constrangimento é notório e dispensa comentários.

Uma anotação é mera notícia da prática de outro ato. Portanto, nela basta que se identifique o ato praticado, no caso em tela o casamento, a data, a serventia que em lavrado, o livro, folha e número do assento.

Se alguém quiser saber mais detalhes sobre o ato noticiado, que peça uma certidão do assento. O que não é justo é que a pessoa divorciada carregue em sua certidão de casamento o nome da pessoa que se casou com o ex-cônjuge.

O fundamento para não se incluir nomes nesse tipo de anotação é a interpretação teleológica da parte final do §1º do artigo 107 da LRP, observando-se que as disposições legais são da época em que apenas a mulher adotava o sobrenome do marido.

O dispositivo em comento determina que se anote no assento de nascimento da mulher (e naquela conjuntura era apenas no assento de nascimento dela) a mudança de nome. Ou seja, o nome que ela adotou em virtude do casamento, sendo tal anotação fundamental para a segurança jurídica. Mas tal informação tem pertinência apenas para o registro de nascimento da pessoa que alterou o nome em virtude do casamento.

Entretanto em pleno século XXI, por falta de uma normatividade mínima, algumas anotações são feitas de forma “equivocada” pelos serviços registrais. Basta cotejar os livros para ver anotações em assentos de nascimento do homem informando o nome de solteira de sua mulher e o que ela adotou ao se casar.

Pergunta-se: Qual é a repercussão desta informação no assento de nascimento do marido? Resposta: nenhuma. Logo não é informação necessária, bem como não há previsão legal que a ampare.

Nesse norte, os registradores civis das pessoas naturais, incumbidos que são da nobre função de zelar para dignidade da pessoa humana, devem, ao anotar o novo casamento à margem do assento de casamento anterior, observar para que sejam lançados apenas os dados essenciais, isto é: a data do registro (e a da celebração, conforme o caso), o livro, a folha, o número do termo e o serviço registral em que lavrado, pois assim estarão resguardando a dignidade da pessoa que se mantém divorciada e precisa utilizar a certidão do casamento desfeito pelo divórcio.

Vista a questão pelo lado financeiro, atualmente é cogente se estabelecer um limite para as anotações dos novos casamentos. É que na expedição de uma certidão, as averbações e as anotações, em regra, são acrescidas ao preço e cobradas do usuário. No Estado de São Paulo, para se ter uma noção, cada anotação ou averbação corresponde a 50% do valor de uma certidão em breve relatório.

Neste ponto é pertinente ainda saber se da mesma forma que se faz a anotação do novo casamento à margem do assento de casamento anterior deve ser anotada eventual separação, reconciliação ou divórcio das partes que figuram no casamento atual.

Pelo princípio da continuidade a resposta é afirmativa. Assim teremos à margem do registro do primeiro casamento, onde já pode constar uma separação, a reconciliação, o divórcio e o novo casamento de cada um dos então contraentes, também constarão eventuais separações, reconciliações e divórcios de cada um deles contraentes com terceiras pessoas.

Deve-se considerar que desde o advento do divórcio uma pessoa pode convolar quantas núpcias quiser. O assento de nascimento e os dos casamentos anteriores irão se tornar uma “história em quadrinhos” com esse “casa e separa” se for seguida a letra fria da lei.

As Normas de Serviço da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo em seu item 138.2 relativizaram a obrigação, ao dispor que a anotação (ou a comunicação) obrigatória restringe-se ao último assento de casamento.

Contudo a normativa bandeirante não enfrentou o problema da anotação relativa à averbação da separação e do divórcio referente às novas núpcias.

Dispõe apenas que para que o novo casamento seja anotado nos casamentos anteriores e no nascimento, os nubentes deverão informar os dados dos referidos assentos no procedimento de habilitação.

À luz dos princípios que orientam a atividade registral, em se tratando de casamento e da dissolução do vínculo conjugal, a anotação tem por fim amarrar o sistema por meio do princípio da publicidade e propiciar segurança jurídica.

Este objetivo é alcançado se o primeiro casamento, a separação e o divórcio forem anotados nos assentos de nascimento dos contraentes. Com tais informações fica preservada a segurança jurídica, pois a certidão do assento de nascimento noticia o estado civil do registrado: casado, separado ou divorciado. Mas não serve para embasar a prática de nenhum ato da vida civil. Só faz prova da existência dos atos nela mencionados. O documento oficial passa a ser a certidão do casamento.

O próximo casamento deve ser anotado apenas no casamento anterior. Feita esta anotação fica amarrado o sistema, valendo, para fins de utilização, apenas a certidão do casamento atual, o qual estará noticiado no casamento anterior. A separação ou o divórcio das partes que contraíram este novo casamento não tem pertinência com o assento de casamento anterior. O rompimento do vínculo conjugal aqui só diz respeito às partes que figuram neste assento. Destarte não pode ser objeto de anotação naquele.

Assim, no casamento anterior deve constar apenas a averbação do ato que pôs fim ao vínculo conjugal e a anotação do novo casamento contraído pelos divorciados, ressalvando-se as averbações e anotações de outra natureza.

Forçoso considerar, ainda, o espaço destinado às anotações e averbações. Se não houver um limite, haja transportes, transformando um registro em verdadeira “colcha de retalhos”.

O fato é que a legislação de regência data da época em que o casamento se dissolvia apenas por sentença judicial de nulidade ou de anulação, ou por óbito, relembrando que não existia o divórcio.

Esta é, certamente, a razão da determinação para se fazer anotações, com remissões recíprocas, nos assentos anteriores quando o oficial praticar atos de registro ou de averbação (art. 106 da LRP).

Dentre os atos anotados, à época, à margem de um assento de casamento, podíamos ter a interdição ou ausência de um ou ambos os cônjuges, o óbito e o novo casamento do viúvo. Não havia ato de averbação que ensejasse anotação, pois quanto praticados, era à margem do próprio assento.

No que tange ao teor, a Lei dos Registros Públicos dispõe sobre o conteúdo da averbação (art. 99), mas não o faz em relação ao da anotação. Ficou por conta da prática registral a sua formatação. Por falta de um conteúdo mínimo predeterminado cada oficial inclui na anotação o que julga necessário.

Certo é que existem anotações que são verdadeiras averbações. Reproduz-se nela (anotação) todo o conteúdo da averbação, diga-se, sem necessidade e utilidade, pois não tem eficácia. Mas para as anotações referentes aos atos de registro falta padronização, notadamente a anotação do novo casamento, que é o tema desta reflexão.

Como uma das funções das Corregedorias Gerais da Justiça e do Conselho Nacional de Justiça é a expedição de normas, poderiam disciplinar o conteúdo da anotação, em especial a do novo casamento, visando preservar a dignidade da pessoa divorciada, bem como estabelecer o limite dessas anotações nos assentos dos casamentos anteriores, para dar efetividade ao princípio da modicidade dos emolumentos.

* A autora é a Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Sede da Comarca de General Salgado, Estado de São Paulo.

Fonte: Arpen – SP | 23/04/2015.

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Artigo: A prorrogação do prazo para inscrição no Cadastro Ambiental Rural (CAR): uma opção pela efetividade das normas ambientais – Por Rafael Antonietti Matthes

*Rafael Antonietti Matthes

CAR é o primeiro passo que deve ser dado pelo proprietário ou possuidor rural para alcançar tais incentivos, conforme veremos em outros artigos nos próximos dias.

Em 25 de maio de 2012, com a publicação da Lei 12.651/12, foram inseridas no ordenamento jurídico nacional novas diretrizes para a tutela do patrimônio florestal brasileiro. Dentre as novidades, é possível citar a criação de uma base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento.

Trata-se do Cadastro Ambiental Rural (CAR), um “registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais”, conforme preceitua o artigo 29 da referida norma.

Apesar do Novo Código Florestal estar em vigor desde maio de 2012, o cadastramento das propriedades e posses rurais no CAR passou a ser ato obrigatório apenas em 6 de maio de 2014. Isso porque, o parágrafo 3º do artigo 29 determina que a inscrição deverá ser cumprida no prazo de 1 ano contado da sua implantação, prorrogável, uma única vez, por igual período por ato do Chefe do Poder Executivo (parágrafo 3º do artigo 29).

A sua implantação se deu com a publicação no Diário Oficial da Instrução Normativa nº 2, em 6 de maio de 2014, que, dentre outras disposições, trata dos procedimentos para a integração, execução e compatibilização do sistema e define os procedimentos gerais do CAR.

Em que pesem as tentativas do Poder Público federal e estadual em difundir a informação para as 5.181.645 propriedades rurais existentes no país (segundo levantamento da Diretoria de Ordenamento da Estrutura Fundiária do Incra – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), certo é que até o dia 7 de abril de 2015, a situação era a seguinte, conforme dados obtidos no Portal do Ministério do Meio Ambiente em 30 de abril de 20151 :

Região e Percentual de propriedades rurais inscritas no CAR

Norte 66,06%

Nordeste 11,77%

Centro-oeste 48,11%

Sudeste 25,58%

Sul 8,38%

Apesar da baixa adesão até abril de 2015, por ser um importante aliado dos proprietários rurais para a consecução de suas obrigações ambientais, o número é superior ao de propriedades cuja reserva legal havia sido averbada na matrícula do imóvel (obrigação constante no Código Florestal anterior e substituída pela inscrição no CAR).

De certo, as dimensões continentais do país dificultaram a proliferação das informações relativas à legislação, especialmente no tocante aos compromissos ambientais. A prorrogação do prazo para inscrição, por mais um ano, portanto, poderá garantir maior adesão e, consequentemente, um melhor e mais detalhado diagnóstico da situação rural brasileira.

O Direito Ambiental é um ramo autônomo composto por princípios próprios, como do desenvolvimento sustentável, da informação e do protetor-recebedor, que se aplicam a seara florestal, especialmente, com o advento do Novo Código Florestal.

A novel legislação garante aos proprietários rurais o prosseguimento e o desenvolvimento de suas atividades agrícolas, desde que cumpridas algumas obrigações ambientais, permitindo, com isso, equilíbrio entre os pilares da sustentabilidade (econômico, social e ambiental).

A reunião de informações atualizadas sobre as propriedades rurais poderão embasar políticas ambientais apropriadas para todas as regiões do país, conferindo ampla publicidade ao Poder Público e aos cidadãos e efetiva promoção do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado conforme descrito no artigo 225 da Constituição Federal.

O equilíbrio do desenvolvimento econômico e social com a proteção ambiental aliado ao mapeamento nacional garantirá, ainda, que as ações protetivas ao meio ambiente sejam incentivadas por meio de instrumentos econômicos, como a redução da base de cálculo de tributos, concessão de crédito agrícola com melhores condições entre outros.

Este é o espírito que norteia a Lei 12.651/12: deixar para um segundo plano a aplicação de multas e outras penas, juridicamente chamadas de normas de comando e controle, para incentivar condutas protetivas ao meio ambiente.

O CAR é o primeiro passo que deve ser dado pelo proprietário ou possuidor rural para alcançar tais incentivos, conforme veremos em outros artigos nos próximos dias.

Restringir esse direito ao cidadão, que depende da mais ampla e irrestrita informação sobre os procedimentos legais, é ferir o próprio espírito promocional da Lei 12.651/12. Não se pode negar efetividade a uma norma efetiva.

Aguardamos, ansiosamente, o desfecho desta história.

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1 In: http://www.mma.gov.br/mma-em-numeros/cadastro-ambiental-rural – acesso realizado em 30/4/2015.

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Rafael Antonietti Matthes é advogado de Furlanetto Bertogna – Sociedade de Advogados, professor e consultor em Direito Ambiental, Doutorando em Direito Ambiental pela PUC/SP, Mestre em Direito Ambiental pela Universidade Católica de Santos e Consultor voluntário em sustentabilidade pelo PNUD/ONU na Rio+20.

Fonte: Migalhas | 06/05/2015.

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CSM: A retificação da escritura de doação para inclusão de novo donatário é possível enquanto não registrado o título de transmissão.

Coordenadoria de Correições, Organização e Controle das Unidades Extrajudiciais

Despachos/Pareceres/Decisões 58361/2006

ACÓRDÃO _ DJ 583-6/1
A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 583-6/1, da Comarca de IBITINGA, em que é apelante o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO e apelado TADEU ANTONIO TICIANELI.

ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em dar parcial provimento ao recurso, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.

Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores CELSO LUIZ LIMONGI, Presidente do Tribunal de Justiça e CAIO EDUARDO CANGUÇU DE ALMEIDA, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.

São Paulo, 30 de novembro de 2006.

(a) GILBERTO PASSOS DE FREITAS, Corregedor Geral da Justiça e Relator

V O T O

REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida improcedente – Escritura pública de instituição de usufruto, doação com reserva de usufruto e outras avenças, re-ratificada por outra escritura pública, com inclusão de novo donatário e divisão de imóvel rural – Doação de vários imóveis re-ratificada para inclusão de donatário nascido após a doação é admissível, salvo para o bem que já saiu da esfera de domínio da doadora, por falta de disponibilidade – Cindibilidade de título que conduz a procedência parcial da dúvida – Recurso parcialmente provido.

1. Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, representado pelo Curador de Registros Públicos da Comarca de Ibitinga, contra r. sentença que julgou improcedente a dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis, Títulos, Documentos e Registro Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Ibitinga, afastando o óbice ao registro de escritura pública de instituição de usufruto, doação com reserva de usufruto e outras avenças, re-ratificada.

Sustenta o apelante, em suma, a inadequação da escritura de re-ratificação para a divisão do imóvel rural com extinção de condomínio, diante de interesse de menores e incapazes, bem como a necessidade de novo ato (doação), pelos atuais proprietários, uma vez que alterada a titularidade dos imóveis pelo registro já efetivado, reafirmando, ainda, ser inviável a inclusão de novo donatário na escritura de re-ratificação. Pede, assim, o provimento do recurso.

Apresentadas contra-razões (fls. 90/95).

O feito, inicialmente encaminhado à Corregedoria Geral da Justiça, veio, posteriormente, para o Conselho Superior da Magistratura, órgão competente para o julgamento da apelação (fls. 100/102).

A Procuradoria Geral de Justiça opina pelo provimento parcial do recurso (fls. 107/111).

É o relatório.

2. Pretende-se, em fase recursal de dúvida registrária, a reforma da r. sentença que admitiu o registro de escritura pública de instituição de usufruto, doação com reserva de usufruto e outras avenças, re-ratificada.

O cerne da questão está na possibilidade, ou não, de inclusão, na escritura de re-ratificação, de novo donatário (neto da doadora, nascido um ano após a escritura de doação re-ratificada), bem como de divisão de um dos imóveis alienados (o rural, denominado Fazenda São Luiz, objeto da matrícula nº 4.766, que após retificação judicial deu origem a duas glebas, matrículas nºs 28.349 e 28350, todas da mencionada Serventia Predial), com a conseqüente extinção de condomínio.

Ora, considerando que a escritura pública de doação com reserva de usufruto e outras avenças ainda não está registrada em relação à Fazenda São Luiz (matrículas nºs 28.349 e 28.350) e em relação ao Barracão situado na Av. Rui Barbosa nº 363, antigo nº 161 (matrícula nº 4.765), bem como que todos os partícipes do título original (doação) também participaram da escritura de re-ratificação, concordando com a inclusão do donatário superveniente (Natan Ticianeli) e, ainda, com a divisão extintiva do condomínio, é admissível o ingresso desse título re-ratificado no registro predial, em relação a tais bens. Saliente-se que a doadora Jacyra Prearo Ticianeli (titular de 5/6), ainda conserva a disponibilidade desses bens na parte ideal que lhe toca, bem como que ela (doadora), os demais interessados, inclusive a co-proprietária Tadeusa Marci Ticianeli Miglioni (titular de 1/6) e seu esposo, também emitiram suas vontades concordes nos dois atos notariais (escritura original e escritura de re-ratificação).

O registro anterior da escritura em foco operou-se apenas em relação ao imóvel objeto da matrícula nº 170 (prédio nº 456, antigo nº 276, situado na Av. Rui Barbosa); não, repita-se, para os demais imóveis (objeto das matrículas nºs 4.765, 28.349 e 28.350), dentre eles o mencionado imóvel rural denominado Fazenda São Luiz (matrícula nº 4.766, que, com as retificações judiciais, deram origem as matrículas nºs 28.349 e 28.350).

Esse registro, obviamente, não teve efeito de mutação de domínio além daquele referente ao imóvel da matrícula nº 170, nada interferindo, pois, no domínio e na disponibilidade dos demais imóveis.

Logo, atento à cindibilidade do título e ao único registro que dele se operou (matrícula nº 170), forçosa a conclusão que apenas em relação ao imóvel objeto da matrícula nº 170 – para o qual a doadora não tem mais disponibilidade alguma, uma vez que o respectivo bem não mais integra seu patrimônio desde o tal registro (R.14/170) -, é ineficaz a inclusão do novo donatário e, daí, truncado o registro correspondente.

Preservada, no entanto, para o imóvel rural e para o barracão, a disponibilidade da doadora, é lícita a inclusão do novo donatário (neto superveniente) por via de escritura de re-ratificação, que, ressalte-se, contou com a concordância de todos os demais interessados.

Outrossim, a reengenharia física das glebas rurais (matrículas nº 28.349 e 28.350), com extinção do condomínio originário, tudo resultando, no processo final da divisão, em quatro novas unidades imobiliárias rurais – porções certas, localizadas e especificadas, quantitativa e qualitativamente -, com destinação aos donatários segundo o quinhão de cada um, também contou com a manifestação de vontade de todos os interessados, não havendo motivo algum para argüir óbice de registro.

O argumento de que a divisão não se pode operar porque há donatários menores e incapazes, observando-se que o alvará judicial admitiu apenas a lavratura da escritura de inclusão do novo donatário, também não vinga, pois sem o registro do título original nas matrículas das glebas rurais (matrículas nºs 28.349 e 28.350) eles (donatários menores e incapazes) não são titulares de direito real algum. Não são condôminos, não são eles que dividem o bem comum; são, isso sim, apenas donatários de quinhões de bem dividido pela donatária e por sua co-proprietária.

Deste modo, razão assiste à Procuradoria Geral de Justiça, ao pugnar pelo provimento parcial do recurso, que resultará em dúvida procedente apenas em parte, não se devendo estranhar essa solução parcial da dúvida, pois, “admitida a cisão do título, é possível cindir o juízo de qualificação e, da mesma sorte, a dúvida comporta, conforme o caso, procedência parcial” (Benedito Silvério Ribeiro e Ricardo Dip, in Algumas linhas sobre a dúvida no registro de imóveis, Revista de Direito Imobiliário (RDI), Ed. RT, janeiro-junho de 1989, vol. 23, p. 15).

Pelo exposto, conheço e dou provimento parcial ao recurso, para julgar procedente em parte a dúvida, admitindo o registro dos títulos em questão apenas nas matrículas nºs 4.765, 28349 e 28.350, permanecendo, por conseqüência, o óbice de registro na matrícula nº 170.

(a) GILBERTO PASSOS DE FREITAS, Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: TJ – SP.

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