10 MOTIVOS para PASSAR ESCRITURA pelo VALOR REAL DO NEGÓCIO

Você já dever ter ouvido falar que as pessoas costumam passar escritura por valor abaixo do real, especialmente para economizar na escritura e registro, e pagar menos imposto. Você deve ter ouvido falar que não há problemas nessa prática ou que muitos já fizeram negócios dessa forma. No entanto, você tem o direito de saber antecipadamente quais são de fato os problemas que poderão ser enfrentados por aquele que abraçar essa simulação.

No Livro Como Comprar Imóvel com Segurança- O Guia Prático do Comprador (Editora Crono, 2017, Autor Luís Ramon Alvares)”, consta a seguinte abordagem do tema, relativamente à correta indicação do valor da venda.

Esta é uma pergunta que muita gente faz: Posso fazer (passar) escritura por valor inferior ao valor real da venda (p. ex., pelo valor venal indicado pela Prefeitura)?

Não! Porque, se a escritura for passada por valor inferior ao valor real acordado pelas partes, todo mundo poderá ter problemas, inclusive o Tabelião.

Haverá as seguintes implicações:

  • Recolhimento a menor de tributo, pois o imposto de transmissão do bem (ITBI ou ITCMD) e o recolhimento das custas cartorárias devem levar em conta o valor real do negócio, se este for superior ao valor venal. Sobre a diferença não recolhida incide multa, juros e correção monetária.
  • Há possibilidade de ação penal em face das partes e dos envolvidos (corretor, tabelião, intermediários etc.) por sonegação fiscal (recolhimento inferior do imposto de transmissão e das taxas pagas), falsidade ideológica etc.
  • Se houver algum problema no imóvel ou execução contra o vendedor, com questionamento do negócio realizado, o valor declarado pelas partes (valor inferior) será levado em conta na fixação da indenização. Imagina-se, por exemplo, que um prédio de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), com escritura “passada” por R$ 100.000,00 (cem mil reais), caia, desmorone. O valor de indenização será que R$ 100.000 (cem mil reais)? Ou o comprador pedirá indenização por valor maior e confessará que sonegou tributos e demais taxas na transferência do imóvel?!
  • Se o imóvel estiver locado e o vendedor e o comprador não locatário acordarem um valor inferior ao valor real, o locatário, que tem direito de preferência, poderá adquirir o imóvel pelo preço (menor) indicado na escritura.
  • O comprador poderá pleitear judicialmente a devolução da quantia paga que for superior à aquela quantia declarada na escritura [vide Acórdão Proferido no Agravo Interno na Apelação Cível n. 230130-87.2012.8.09.0051 (201292301309) – TJGO].
  • Se a aquisição do bem se dá por valor inferior ao valor real, na posterior venda desse bem pelo valor real (p.ex.: por exigência do novo comprador, especialmente para obtenção de financiamento bancário), o vendedor (anterior comprador) deverá pagar Imposto de Renda sobre o Ganho de Capital (pelo menos 15%) sobre a diferença entre o preço de aquisição e de venda (o barato sai caro, pois terá trocado uma “economia” (ilegal) de 2% ou 4%, para depois pagar à Receita Federal pelo menos 15% de lucro imobiliário, acrescidos de multa, juros e correção monetária).
  • O ato é nulo (art. 167, § 1º, inciso II, do Código Civil).
  • Possibilidade de perda do imóvel em favor do Município, que tem o direito de preferência na aquisição pelo mesmo valor declarado na escritura (artigo 25 da Lei n. 10.257/2001).
  • Se o comprador devolver o imóvel por vícios ou defeitos ocultos (artigos 441 e 442 do Código Civil), receberá, apenas, a quantia declarada como preço na escritura.
  • Gastos desnecessários com processos judiciais e advogados. OBS.: Atualmente, os órgãos fazendários têm muitos instrumentos para verificar (in)consistência entre o valor (irreal) declarado pelas partes e o valor efetivo da negociação, uma vez que: (1) o Poder Público recebe informação de toda transação bancária a partir de R$ 2.000,00 (art. 7º, inciso I, da Instrução Normativa RFB n. 1.571/2015); (2) as imobiliárias emitem a DIMOB- Declaração de Informações sobre Atividades Imobiliárias, com indicação do valor da transmissão do imóvel; (3) os cartórios de imóveis e de notas são obrigados a emitir a DOI – Declaração sobre Operações Imobiliárias, com indicação do valor declarado de cada a transação lavrada ou registrada.

Considere toda implicação (legal, jurídica, ética) exposta anteriormente. Não passe ou pare de passar escritura pelo menor valor, se for diferente do valor da venda! Não passe ou pare de passar escritura pelo valor venal!

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Luís Ramon Alvares é tabelião/registrador em Mogi das Cruzes/ SP (Tabelionato de Notas e Registro Civil das Pessoas Naturais do Distrito de Taiaçupeba, Município e Comarca de Mogi das Cruzes/SP – www.cartorioMOGI.com.br). É especialista em Direito Notarial e Registral e em Direito Civil. É autor de Como Comprar Imóvel com Segurança- O Guia Prático do Comprador(Editora Crono, 2017), O que você precisa saber sobre o Cartório de Nota (Editora Crono, 2016) e do Manual do Registro de Imóveis: Aspectos Práticos da Qualificação Registral (Editora Crono, 2015). É idealizador e organizador do Portal do RI- Registro de Imóveis (www.PORTALdoRI.com.br) e editor e colunista do Boletim Eletrônico, diário e gratuito, do Portal do RI. É autor de diversos artigos publicados em revistas especializadas, especialmente em direito notarial e registral.

Como citar este artigo: ALVARES, Luís Ramon. 10 MOTIVOS para PASSAR ESCRITURA pelo VALOR REAL DO NEGÓCIO. Boletim Eletrônico – Portal do RI nº. 117/2016 | 24 de Janeiro (sexta-feira). Disponível em https://www.portaldori.com.br/2016/06/24/10-motivos-para-passar-escritura-pelo-valor-real-do-negocio. Acesso em XX/XX/XX, às XX:XX.


PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. PROVIMENTO CGJ/SC 12/2010. ATRIBUIÇÃO DE NOTÁRIOS. AFERIÇÃO DO VALOR REAL OU DE MERCADO DO IMÓVEL. ILEGALIDADE

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO Nº 0005165-04.2013.2.00.0000

RELATOR: CONSELHEIRO GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA

REQUERENTE: FRANCISCO PIERRE PEREIRA ALVES

REQUERIDO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA

EMENTA

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. PROVIMENTO CGJ/SC 12/2010. ATRIBUIÇÃO DE NOTÁRIOS. AFERIÇÃO DO VALOR REAL OU DE MERCADO DO IMÓVEL. ILEGALIDADE

1. Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) instaurado em face do o Provimento nº 12 da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Santa Catarina (CGJ/SC), que incluiu os artigos 522-A e 522-B ao Código de Normas da CGJ/SC, que disciplina as atividades das serventias extrajudiciais.

2. A Lei Complementar nº.  156, de 15 de maio de 1997, ao dispor sobre o Regimento de Custas e Emolumentos no Estado de Santa Catarina, determina que, na ausência de indicadores ou na hipótese de dissonância dos valores estimados pelo interessado com o valor real ou de mercado do bem ou do negócio, poderá ser impugnado pelo titular da serventia, por petição escrita dirigida ao juiz com jurisdição sobre registros públicos, se houver juiz corregedor, ou ao diretor do foro, que atribuirá o valor do ato ou do serviço, baseando-se, preferencialmente, em laudo do avaliador judicial, arcando o vencido com as custas e despesas do incidente.

3. Aos notários compete; (i) formalizar juridicamente a vontade das partes, (ii) intervir nos atos e negócios jurídicos a que as partes devam ou queiram de forma legal ou autenticidade, autorizando a redação ou redigindo os instrumentos adequados, conservando os originais e expedindo cópias fidedignas de seu conteúdo e (iii) autenticar fatos (Lei nº. 8.935/94).

4. Dentre as atribuições legais impostas aos notários não se insere a de, por dever de ofício, fazer constar em item próprio o valor real ou de mercado do bem ou do negócio, para fins de cobrança de emolumentos e FRJ, dispensada a impugnação administrativo-judicial, como consta no ato impugnado, porque assim não está previsto na lei estadual. 

 5. Procedência parcial do pedido para anular a alínea “a”, inc. I, art. 522-A do Provimento 12 CGJ/SC.

RELATÓRIO

1. Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) instaurado por Francisco Pierre Pereira Alves em face do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC), em que requer, liminarmente, a suspensão do Provimento nº 12 da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Santa Catarina (CGJ/SC).

Alega que, no dia 25/5/2010, foi publicado o provimento nº 12 da CGJ/SC, alterando a redação do artigo 522 e incluindo os artigos 522-A e 522-B no Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Santa Catarina.

Sustenta que tal ato normativo contrariou todas as normas, decisões e resoluções emanadas por este Conselho, uma vez que atribuiu ao notário o dever de fazer constar o valor real ou de mercado para fins de cobrança dos seus próprios emolumentos e do Fundo de Reaparelhamento do Judiciário, dispensada a impugnação judicial, conforme letra b, do inciso I, do artigo 522-A do Código de Normas da CGJ/SC.

Aduz que, dessa forma, o notário passou a decidir, de forma livre, majorada e abusiva, a respeito do valor que deseja receber para a prática do ato, sem qualquer participação ou discussão feita pelo usuário, eliminada de forma arbitrária a possibilidade de impugnação judicial.

Ao final, requer, liminarmente, seja suspenso o Provimento nº 12 da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Santa Catarina para cessar a prática da cobrança indevida e abusiva dos emolumentos praticados no Estado. No mérito, requer a cassação do Provimento nº 12 ou, alternativamente, caso o entendimento seja pela manutenção do ato vergastado, sejam estabelecidos critérios para avaliação dos imóveis feitas pelos próprios notários e registradores catarinenses (REQINIC1).

2. No evento 3, a Secretaria Processual certificou a ausência dos documentos de identificação, CPF e comprovante de endereço exigidos pela Portaria nº 174 da Presidência do CNJ.

3. O pedido de concessão de medida liminar foi indeferido, tendo em vista que o requerente não teve êxito em comprovar a existência dos requisitos do periculum in mora e do fumus boni iuris (DEC2).

4. Intimado a se manifestar, o Tribunal prestou informações no evento 11 (INF3).

5. No evento 12, o requerente anexou a cópia de identificação, CPF e comprovante de endereço (DOC4, DOC5 e DOC6).

É o relatório.

VOTO

1. No presente procedimento questiona-se a validade e higidez do Provimento CGJ/SC nº 12/2010, quanto à inclusão dos artigos 522-A e 522-B a Terceira Parte, Capítulo I, Seção I, do Código de Normas da CGJ/SC, que disciplina as atividades das serventias extrajudiciais, com aplicação subsidiária às disposições da legislação pertinente em vigor . 

2. Nas informações solicitadas, o requerido informa que o dispositivo ora impugnado foi editado em razão de decisão proferida nos autos CGJ-E 1601/2009, com o objetivo de consolidar uma situação que já estava pacificada no estado catarinense por meio dos instrumentos normativos internos daquela Corte (Resolução nº 4/2004 do Conselho da Magistratura, Provimento n. 14/1999 da CGJ e Ofício-Circular CGJ n. 142/2009), regulamentando a dispensa de impugnação judicial no caso de concordância dos interessados em ajustar o valor declarado do negócio jurídico, uma vez apontada discrepância em notas de exigência pelo registrador quando da qualificação do título. 

3. A Lei Complementar nº.  156, de 15 de maio de 1997, ao dispor sobre o Regimento de Custas e Emolumentos no Estado de Santa Catarina, determina o seguinte:

Art. 16. Nos atos e serviços praticados pelos notários ou oficiais dos registros públicos, com valor declarado ou com expressão econômica mensurável é considerado, para efeito de cobrança dos emolumentos, o maior valor apurado entre o valor declarado pelas partes no negócio; o valor venal atribuído pelo órgão fiscal competente para fins de imposto predial e territorial ou do imposto de transmissão.

§ 2º O valor estimado pela parte, na ausência de indicadores referidos no caput deste artigo, ou na hipótese de encontrarem-se esses indicadores em flagrante dissonância com o valor real ou de mercado do bem ou do negócio, poderá ser impugnado pelo titular da serventia, por petição escrita dirigida ao juiz com jurisdição sobre registros públicos, havendo privativo, ou ao diretor do foro, que atribuirá o valor do ato ou do serviço, baseando-se, preferencialmente, em laudo do avaliador judicial, arcando o vencido com as custas e despesas do incidente.  

4. Neste sentido, inclusive, previu o Provimento ora impugnado com relação ao registrador:

Art. 522-A Se o valor declarado pelo interessado e os indicadores mencionados no caput do art. 16 da Lei Complementar Estadual nº 156, de 15 de maio de 1997, estiverem em flagrante dissonância com o valor real ou de mercado do bem ou do negócio da época, o notário ou registrador adotarão as seguintes providências preliminares:

II – quanto ao registrador de imóveis, protocolizará o título que lhe for apresentado a registro, observando o seguinte:

a) apresentadas a registro escrituras públicas, instrumentos particulares ou títulos judiciais que tenham conteúdo econômico, cujos valores estejam em flagrante dissonância com o valor real ou de mercado do bem ou do negócio, deverá esclarecer ao apresentante sobre a necessidade de declarar o valor real ou de mercado do bem ou do negócio, tendo em vista que cabe ao registrador exigir e fiscalizar o recolhimento do FRJ (agente arrecadador da taxas de serviço);

b) sendo acolhida a recomendação, deverá, por dever de ofício, emitir o boleto para que o interessado providencie recolhimento do valor total ou da complementação do FRJ devido, conforme o caso, fazendo constar do corpo do registro o novo valor declarado do bem ou do negócio, para fins de cobrança de emolumentos e FRJ, dispensada a impugnação judicial;

c) em caso de discordância por parte do apresentante, fica autorizado o registrador a impugnar judicialmente o valor apresentado.

5. Para tanto, nos autos da impugnação judicial há a designação de avaliador judicial para apresentar laudo fixando o valor do imóvel, sobre o qual se pronuncia o Ministério Público e, ato contínuo, a prolação da sentença pelo magistrado competente, que não é obrigado a observar o critério de legalidade estrita, podendo adotar em cada caso a solução mais conveniente ou oportuna, nos termos do art. 1109 do Código de Processo Civil c/c art. 522-B do Provimento impugnado.

6. Por outro lado constata-se que os termos do Provimento não foram os mesmos com relação aos notários:  

Art. 522-A Se o valor declarado pelo interessado e os indicadores mencionados no caput do art. 16 da Lei Complementar Estadual nº 156, de 15 de maio de 1997, estiverem em flagrante dissonância com o valor real ou de mercado do bem ou do negócio da época, o notário ou registrador adotarão as seguintes providências preliminares:

I – quanto ao notário:

a)            deverá esclarecer às partes sobre a necessidade de indicação correta do valor real ou de mercado do bem ou do negócio;

b)           não sendo acolhida a recomendação pelas partes, por dever de ofício (agente arrecadador das taxas de serviço), deverá fazer constar do corpo da escritura pública em item próprio o valor real ou de mercado do bem ou do negócio, para fins de cobrança de emolumentos e FRJ, dispensada a impugnação judicial.

7. Sabe-se que aos notários compete; (i) formalizar juridicamente a vontade das partes, (ii) intervir nos atos e negócios jurídicos a que as partes devam ou queiram dar forma legal ou autenticidade, autorizando a redação ou redigindo os instrumentos adequados, conservando os originais e expedindo cópias fidedignas de seu conteúdo e (iii) autenticar fatos (Lei nº. 8.935/94).

8. Dentre as atribuições legais impostas aos notários não se insere a de, por dever de ofício, fazer constar em item próprio o valor real ou de mercado do bem ou do negócio, para fins de cobrança de emolumentos e FRJ, dispensada a impugnação judicial, como consta no ato impugnado, porque assim não está previsto na lei estadual.

9. Neste sentido procede a alegação do requerente de dissonância do referido dispositivo com o texto legal aplicável à espécie, em afronta o princípio da legalidade estabelecido no art. 37 da Constituição Federal.

10. Em situação análoga, o Egrégio STJ entendeu que o Provimento nº 5/2002 da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado da Paraíba afrontou o princípio da legalidade, avançando em competência restrita ao Município, ao impor que os agentes cartorários desconsiderassem o valor venal do imóvel indicado em avaliação administrativa (RMS 36.966/PB – DJ 06/12/2012).

11. Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a pretensão para anular os termos da alínea b, inc. II, art. 522-A do Provimento CGJ/SC nº 12/2010, nos termos da fundamentação supra e, assim, extirpar do ordenamento jurídico o preceito contido na referida regra. 

É como voto.

Brasília, 17 de outubro de 2013.

GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA

Conselheiro Relator

Fonte: CNJ I 17/10/2013.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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