CASAMENTO. SEPARAÇÃO DE FATO E DIVÓRCIO. NÃO SE PODE PRESUMIR A INCOMUNICABILIDADE DOS BENS. DECISÃO DO JUIZ DA 1ª VRP/SP.

Processo 1025469-37.2014.8.26.0100 – Pedido de Providências – Registro de Imóveis – MARIA JOSÉ LOPES DOS SANTOS e outro – Comunicabilidade de bens – aquisição feita a título oneroso e imóvel adquirido na constância do casamento – separação de fato e de direito em datas distintas – necessidade de comprovação de que o bem ficou exclusivamente para o cônjuge varão – dúvida inversa procedente. Vistos. Primeiramente, anoto que o procedimento adequado para o feito é de DÚVIDA INVERSA, visto que o autor pretende o registro de escritura pública de compra e venda e, para tanto, preferiu formular o pedido diretamente a esta Corregedoria. MARIA JOSÉ LOPES DOS SANTOS e EDIVAL BATISTA DOS SANTOS suscitaram a presente dúvida, diante da negativa do 8º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo em proceder ao registro do bem objeto da matrícula nº 14.594, adquirido pelo casal em 05 de outubro de 2010. Aduz a exordial que os requerentes adquiriram o imóvel de SÉRGIO ROBERTO STANCANELLI e sua mulher MARINES CAETANO DE MELO STANCANELLI, casados em segundas núpcias. Alega a incomunicabilidade do imóvel, pois, à época da aquisição, Sérgio não mais estava formalmente casado com a primeira mulher, ANILDA DE OLIVEIRA. O Oficial justificou que a negativa de ingresso do título no fato de que o imóvel fora adquirido ainda na constância do casamento anterior, sendo Sérgio proprietário apenas de metade ideal, pertencendo a outra parte a Anilda. O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida e manutenção do óbice registral. É o relatório. DECIDO. Com razão o Ministério Público e a Oficial. Conquanto o matrimônio tenha se dissolvido de fato anteriormente à decisão judicial, não se deve admitir a produção imediata de efeitos jurídicos, porquanto o divórcio de direito somente ocorreu em 13 de fevereiro de 2003. Assim, não há como se presumir a incomunicabilidade do bem imóvel. Ademais, não conta o suscitante com formal de partilha lhe atribuindo a totalidade do aludido imóvel, de modo a possibilitar o registro do título sob exame. Necessária se faz a comprovação de que não incidiu a regra da comunicabilidade, decorrente do regime matrimonial. Tal providência não foi tomada, o que torna inviável o registro, pois a situação, tal como se apresenta, configura quebra do princípio da continuidade. Consoante lição da Afrânio de Carvalho, o Oficial tem o dever de proceder ao exame da legalidade do título e apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e sua formalização instrumental (“Registro de Imóveis”, editora Forense, 4ª edição). Deste modo, para ver satisfeita a pretensão dos autores, é necessário atender as exigências formuladas pelo Oficial e trazer para registro: a) a carta de sentença extraída dos autos de divórcio em que sem tenha atribuído a dita metade a Sérgio ou a retificação da escritura para declarar Anilda também como vendedora e a averbação do casamento de Sérgio com Marinês. Por todo o exposto, julgo PROCEDENTE a dúvida inversa suscitada por MARIA JOSÉ LOPES DOS SANTOS e EDIVAL BATISTA DOS SANTOS e mantenho o óbice imposto pelo Oficial do 8º Registro de Imóveis de São Paulo. Não há custas, despesas processuais, nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I. – ADV: RUBENS HARUMY KAMOI (OAB 137700/SP)

Fonte: DJE/SP | 22/07/2014.

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Christiano Cassetari debate multiparentalidade e parentalidade socioafetiva

Professor salienta a importância de uma análise dos efeitos jurídicos das sentenças de multiparentalidade e parentalidade socioafetiva.

Rio de Janeiro (RJ) – O professor Christiano Cassetari, que é doutor e mestre em direito civil, compareceu ao Conarci-2014 para proferir uma das palestras mais aguardadas do evento. Cassetari falou sobre o tema “Multiparentalidade e Parentalidade Socioafetiva”, assunto que vem sendo recorrente e que tem influência direta no registro civil.

“Há muito a parentalidade socioafetiva já faz parte da realidade do nosso país, crescemos ouvindo a frase, pai é quem cria e não quem contribui com o material genético. Esta frase sempre nos perseguiu em nosso cotidiano, mas eu diria que o direito nunca conseguiu dar os regulares efeitos para esta constituição parental que precisa ser estabelecida”, iniciou o professor.

Cassetari debateu principalmente sobre os efeitos jurídicos oriundos das sentenças judiciais de multiparentalidade e de parentalidade socioafetiva. De acordo com o professor, atualmente tem sido comum o debate em torno de ações que buscam avaliar apenas a afetividade. Estas ações debatem se houve ou não afetividade e assim as sentenças são proferidas. No entanto, segundo ele,é importante salientar e pensar sobre os efeitos jurídicos posteriores a esta decisão favorável pela parentalidade socioafetiva.

“Eu comecei a perceber que as decisões judiciais nesse sentido só se preocupavam em discutir se havia ou não havia afetividade em certas relações. Muitas sentenças começaram até a ser poéticas neste sentido, e poucas delas se preocupavam com os efeitos jurídicos disso, as consequências desta decisão. Então o propósito do meu estudo foi, partindo do pressuposto de que a parentalidade socioafetiva existe, que o afeto já foi bem debatido, discutir quais são os regulares efeitos disso”, disse Christiano.

De acordo com o professor, este tipo de debate tem efeitos diretos no trabalho do registrador civil. Após a decisão judicial a sentença vai para o cartório e são os registradores que deverão cumprir aquela ordem e perceber os efeitos jurídicos dessas decisões.

“A sociedade vai começar a perceber que esta questão da parentalidade socioafetiva não termina com a sentença judicial. Existem efeitos jurídicos posteriores a isso. Eu não consigo conceber uma parentalidade socioafetiva reconhecida judicialmente sem estar registrada no registro civil. É o registro civil o local competente para receber esta informação. Ela não pode ficar perdida e não pode ficar apenas no âmbito processual. E, infelizmente, percebemos que muitos juízes não se preocupam com essa premissa. Reconhecem a parentalidade socioafetiva e não determinam um mandado de averbação no Registro Civil”, disse o palestrante.

O professor salientou que, com isto, o Judiciário começou a se deparar com demandas oportunistas, demandas com cunho patrimonial, em que as pessoas querem uma herança, ou uma pensão alimentícia, alicerçada numa parentalidade socioafetiva que não é reconhecida com a finalidade parental.

“Eu fico pensando, se há uma parentalidade socioafetiva, e se esta possui os mesmos efeitos da parentalidade biológica, pergunto: Não poderia o pai socioafetivo que vai pagar pensão alimentícia por um bom tempo para esta enteada, lá na frente, na velhice, pleitear que ela agora pague pra ele? No entanto, sem a averbação no registro civil, cadê a prova da parentalidade para isso? Não vai ter. Terá que se discutir novamente socioafetividade. E se a socioafetividade tiver acabado com o tempo? Esta moça terá sua defesa em detrimento desse pai. E esta é apenas a ponta do iceberg”, indagou Christiano.

Ele citou ainda outro debate que se inicia com estas decisões. Nos casos de parentalidade socioafetiva, a existência ou não de irmãos socioafetivos, de avós socioafetivos. E com isso efeitos sucessórios também, dentre outros.

“É triste ver uma demanda judicial, exclusivamente de cunho patrimonial, excluindo o registro civil por completo desta situação. Entendo que, se há o reconhecimento de uma parentalidade socioafetiva, se esta parentalidade existe, é o registro civil o local competente para receber esta demanda”, declarou.

Cassetari explicou que com as definições de parentalidades socioafetivas, encaminhadas para o Registro Civil, se começa a deparar no Brasil com casos de multiparentalidade, quando se acresce o nome de um pai socioafetivo ou de uma mãe no registro de nascimento, sem se retirar os biológicos.

“Esta questão da multiparentalidade hoje ganha um papel primordial, porque o Judiciário já começa a aceitar essa situação, e confesso a vocês, a doutrina civilista sempre encontrou muita resistência. Mas o registro civil hoje está preparado para este tipo de demanda. Há várias decisões reconhecendo a multiparentalidade no país”, acrescentou Cassetari.

De acordo com o professor, alguns estados estão avançando muito neste sentido. “O Tribunal de Justiça de Pernambuco deu a ideia de se ter um provimento para reconhecer voluntariamente a parentalidade socioafetiva no registro civil, claro que se tiver menor envolvido, com a anuência materna. O Ceará também segue na mesma linha, e eu acredito que isso é algo que deva acontecer em todo o país”.

Cassetari salientou sobre a importância da anuência entre as partes para a definição de afetividade.  “A concordância vai ser uma prova irrefutável da afetividade. É preciso ser mais criterioso para reconhecer a parentalidade socioafetiva para evitar estas demandas oportunistas”, disse ele, e completou. “Dizer que a parentalidade socioafetiva tem que prevalecer sobre a biológica nem sempre é o correto. Eu conheço casos que a socioafetiva tem que prevalecer sobre a biológica. Noutros a biológica tem que prevalecer sobre a socioafetiva e noutros elas têm que coexistir, que são os casos de multiparentalidade”, encerrou Christiano.

Professor lança livro sobre o tema e incentiva o debate sobre os efeitos jurídicos

Após a palestra sobre a Multiparentalidade e a Parentalidade Socioafetiva, Chistiano Cassetari lançou um livro sobre o mesmo tema, onde expõe seu estudo de doutorado. Os registradores aproveitaram o evento para pegar o autógrafo do autor e debater mais sobre o assunto. O livro “ Multiparentalidade e Parentalidade Socioafetiva” foi publicado pela editora Atlas.

Fonte: Recivil | 14/04/2014.

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