Artigo: Famílias mútuas – Por JONES FIGUEIRÊDO ALVES

A troca de bebês em maternidades, nascidos em mesmo dia, decorrente da ineficiência da administração hospitalar, tem provocado que famílias assumam como filhos os que são de outras, tendo-os, todavia, como verdadeiros filhos, ao fim e ao cabo da convivência familiar prolongada, em manifesta parentalidade socioafetiva.

As primeiras repercussões fáticas são danosas, quando a não semelhança física com os pais, permite "inconvenientes desconfianças" do cônjuge varão, que levam, em alguns casos, à separação judicial, ou à compreensão social do "filho de criação"; culminando, outrossim, com a realização de exames genéticos para a verificação da paternidade e, ao depois, a procura e identificação do filho biológico trocado.

As soluções subsequentes são a destroca dos filhos (em medida do possível) a retificação dos registros civis pessoais (com mudança dos prenomes) e as indenizações por danos morais (de caráter compensatório); quando, em bom rigor, as sequelas psicológicas são profundas, os fatos da vida se tornaram inexoráveis pelos danos existenciais causados, valendo, anotar, por essencial, os vínculos socioafetivos que jamais se desfazem.

A propósito, notável julgado da 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Pernambuco, onde relator o desembargador Erik de Sousa Dantas Simões, juiz decisor de primeiro grau o magistrado Glacidelson Antonio da Silva (1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Garanhuns; sentença em DJe. nº 123/2011, de 07.07.2011, pp. 1.182-1.185) e patrono dos autores o advogado Ivonaldo de Albuquerque Porto, confirmou a responsabilização civil estatal por troca de bebês, com o significativo de que ambas as famílias e os menores impúberes ajuizando, em conjunto, a ação indenizatória, permaneceram aqueles em companhia dos seus pais registrais, civis e sociafetivos, por inarredável situação consolidada de amor paterno-filial entre eles. (TJPE – DJe. nº 45/2014, de 10.03.2014, pp. 167-168). 

"Bem que fartos em amor, como natural, puderam ter em J.R.B.S.J., a satisfação de tê-lo amado como filho e continuarão a ama-lo como tal", disseram os primeiros pais na petição inicial da ação proposta, o mesmo repetindo os segundos, em relação a L.F. de S.

Os bebês nasceram no mesmo dia (30.05.1998), no mesmo hospital, com uma diferença de apenas oito minutos, trocados na primeira hora, e somente sete anos depois (25.04.2005), tiveram, por exame genético, suas verdadeiras origens biológicas reveladas.

As decisões recíprocas dos pais afetivos, uns e outros, de mantê-los no lar original de cada um, onde foram criados e amados, ao tempo que exaltam a paternidade e maternidade socioafetivas fazem, em ato instante, uma cumplicidade inevitável com o destino deles, mormente quando, na hipótese, tudo evidencia uma desigualdade econômica das famílias envolvidas. Essa singularidade mais enaltece o triunfo do amor, cuja prevalência tem seguido precedentes dignificantes: (i) o caso "Stanley e Jobson", em Cruzeiro do Sul, no Acre, quando somente quinze anos depois (05.2013)  foi  descoberta a troca, mantiveram-se os jovens com suas genitoras afetivas, decidindo ambas as famílias estabelecer encontros para a dinâmica de convivência entre os filhos e as mães biológicas Maria Lúcia Bezerra e Ana Cláudia Ramos;  (ii) o caso "Franciele e Danielle", em Foz do Iguaçu, no Paraná, quando trocadas em maternidade (23.10.1995), o que somente constatado sete depois, decidiram também as famílias em não desfazer a troca, morarem próximas, tornando-se duas famílias unidas.

Em situações que tais, recolhem-se esses fatos da vida como elementos indutores ao surgimento determinante do que ora se denomina de "famílias mútuas". Famílias mútuas serão aquelas, portanto, que se apresentam formadas por mães e pais que assumindo, efetivamente, a socioafetividade parental de seus filhos, que lhes foram remetidos pelo destino, desde o berço trocado, não deixam, todavia, de proteger o vinculo biológico com os seus filhos consanguíneos em poder de outra família, cuja permanência ali se oferece como ditame da mesma socioafetividade preordenada.

Há um outro dignificante exemplo, no caso russo da família Belyaeva, quando sua filha Anya foi trocada por Irina, filha de uma família muçulmana, a do tadjique Naimat Iskanderov, tendo o tribunal de Kopeisk, nos montes Urais, condenado o hospital a uma indenização de U$ 100 mil (2011). As duas famílias, independente de tradições, costumes e religião diferentes, decidiram utilizar a indenização para possibilitar residências próximas ou até uma moradia multifamiliar, para as crianças crescerem juntas com todos os pais.

Anota-se que a troca de bebês em maternidades, notadamente públicas, tem sido um fenômeno crescente, não obstante medidas de segurança, normas internas ou municipais e a tímida tipificação penal referida pelo art. 229 do Estatuto da Criança e do Adolescente, no atinente à correta identificação do neonato e da parturiente, por ocasião do parto. Os julgamentos dos tribunais brasileiros, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, têm sido frequentes, a assinalar a responsabilização civil por ilicitudes dessa espécie.

No caso mais recente, anota-se com louvor que, para além da condenação do Estado de Pernambuco à indenização no valor de R$ 300 mil por danos morais para todos os autores (pais e filhos), foi acrescida a obrigação de o Estado fornecer tratamento psicológico a todos eles, pelo prazo de dois anos.

No ponto, tenha-se por refletir da impostergável construção jurídica do instituto do "pensionamento por dano existencial", de prazo determinado ou permanente, em moldura jurídica equipotente à do "pensionamento por morte", do art. 948, I, do Código Civil; ou seja, uma "pensão civil por dano" destinada a suprir não apenas as despesas necessárias de tratamento psicológico de suporte às situações de adequação supervenientes ao ilícito mas, sobremodo, as despesas advenientes e dirigidas à uma dinâmica de convivência dos pais com os filhos biológicos que permaneçam na família socioafetiva preestabelecida.

De efeito, há que se incluir na doutrina e na jurisprudência, o abrigo jurídico mais apropriado a reger as situações de vida onde as famílias mútuas, surgidas pela prevalência do afeto, edificam presença eloquente de dignidade. São exemplos de multiparentalidade, no entrelace de fatos, que a ordem jurídica, por certo, também haverá de, sem submissão a dogmas, necessariamente contemplar.  Quando separadas por troca, em Rio Verde (Goiás), há vinte e seis anos atrás, as gêmeas Kátia Sousa e Juliana Flausina, descobriram-se irmãs, em ocasião que foram trabalhar na mesma loja de sapatos, o destino orienta que o direito deve compreender melhor a vida.

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* O autor do artigo é desembargador decano do Tribunal de Justiça de Pernambuco. Diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), coordena a Comissão de Magistratura de Família. Autor de obras jurídicas de direito civil e processo civil. Integra a Academia Pernambucana de Letras Jurídicas (APLJ).

Fonte: TJ/PE | 14/04/2014.

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TRT/3ª Região: Juiz considera lícito desconto de aviso prévio não trabalhado quando empregado se demite

Na Vara do Trabalho de Itaúna, o juiz Valmir Inácio Vieira analisou a reclamação de um vendedor que não concordava em não receber qualquer valor pela rescisão contratual. Ele pedia o pagamento das verbas que entendia devidas, assim como as guias pertinentes e aplicação das sanções previstas nos artigos 467 e 477 da CLT. O vendedor também pretendia receber indenização por danos morais, alegando que estaria devendo na praça por culpa da reclamada, um comércio de celulares.

Mas o julgador não viu nada de errado no procedimento adotado pela ré. É que o reclamante pediu demissão e não cumpriu o aviso prévio. Embora o trabalhador tenha negado que a assinatura constante do pedido de demissão fosse dele, a perícia grafotécnica concluiu pela autenticidade gráfica do documento.

Para o juiz sentenciante, a situação autoriza a dedução do aviso prévio do valor final do acerto. O fundamento está no artigo 487, parágrafo 2º da CLT, segundo o qual a demissão sem cumprimento do aviso prévio dá ao empregador o direito de descontar os salários correspondentes ao prazo respectivo. Pelo entendimento expresso na sentença, o dispositivo legal se refere ao valor do aviso prévio, sendo correto o desconto realizado pela ré.

Ainda de acordo com as ponderações do julgador, o saldo rescisório zerado torna indevidas as sanções previstas nos artigos 467 e 477 da CLT. Afinal, não foram deferidas parcelas rescisórias incontroversas e o reclamante trabalhou menos de um ano, não havendo que se falar em homologação da rescisão contratual neste caso. Ademais, o saque do FGTS e o recebimento do seguro-desemprego são indevidos no caso.

Com relação aos danos morais, o pedido foi julgado improcedente porque a situação alegada pelo reclamante simplesmente não ocorreu. De todo modo, na visão do juiz, a indenização não seria devida, pois o empregado fez uso dos meios legais e judiciais para enfrentar a situação. Segundo o juiz, mesmo que fossem reconhecidos direitos ao reclamante, isto não ensejaria, por si só, a indenização por danos morais, na forma pretendida. "A reparação do dano moral deve ser reservada para casos que apresentam gravidade, razoável duração e que, de fato, tenham relevante repercussão na vida da vítima, sob pena de se criar verdadeira banalização do dano moral", destacou o magistrado na sentença, citando jurisprudência no mesmo sentido.

Por tudo isso, baseado no entendimento de que o desconto do aviso prévio foi lícito, os pedidos foram julgados improcedentes, o que foi confirmado pelo TRT de Minas.

A notícia refere-se ao seguinte processo: 0001020-11.2012.5.03.0062 RO.

Fonte: TRT/3ª Região | 28/03/2014.

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STJ: Negativa de concessão de financiamento não obriga banco a pagar danos morais

Uma empresa que teve pedido de financiamento para aquisição de sede própria negado pelo banco Bradesco não receberá indenização por danos morais em decorrência dessa negativa. A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a simples rejeição do pedido não implica obrigação de indenizar por parte da instituição financeira. 

A decisão foi tomada no julgamento de recurso especial interposto pelo banco a fim de excluir das obrigações de pagamento os valores referentes a danos morais, fixados pela Justiça paranaense em R$ 30 mil. Condenado também a pagar indenização por danos materiais, o Bradesco não contestou essa obrigação no STJ. 

O banco alegou que a negativa de concessão de financiamento não resultou na depreciação da reputação da empresa. Já a empresa alegava que a conduta do banco foi lesiva, por ter sido levada ao descrédito após a circulação da notícia da existência de uma sede própria, bem como à perda de confiança perante fornecedores, causada pela falta de recursos para pagamento. 

O relator, ministro Marco Buzzi, lembrou que o negócio não foi concluído "em vista de constatação da existência de inviabilidade técnica, em face do não cumprimento das condições básicas de financiamento e do devido enquadramento técnico". 

Análise de crédito 

Buzzi reiterou em seu voto que três etapas devem ser observadas para a concessão de crédito: análise retrospectiva (histórico do potencial do tomador, identificando fatores de risco e como foram atenuados no passado), análise de tendências (projeção segura da condição financeira futura do tomador) e capacidade creditícia (decorrente das duas etapas anteriores, com avaliação do grau atual e de provável risco futuro, sempre preservando a proteção ao emprestador contra eventuais perdas). 

Portanto, para a Turma, a simples negativa de concessão de financiamento, após procedimento administrativo interno da instituição financeira, não leva ao dever de indenizar. Sobretudo quando as instâncias ordinárias aludem à mera “quebra de expectativa” de conclusão da operação, sem indicação de ofensa à honra da empresa. 

A empresa apresentou embargos de declaração contra essa decisão, mas eles foram rejeitados pela Quarta Turma. 

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 1329927.

Fonte: STJ | 27/03/2014.

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