CGJ/SP: Há dispensa de testemunhas no Instrumento Particular. Art. 221 C.C.

Acórdão – DJ nº 0025431-76.2013.8.26.0100 – Apelação Cível 

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0025431-76.2013.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante ANTONIO PEREIRA DE MELO, é apelado 12º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "PREJUDICADA A DÚVIDA, NÃO CONHECERAM DO RECURSO, COM DETERMINAÇÃO, V.U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores RENATO NALINI (Presidente), EROS PICELI, GUERRIERI REZENDE, ARTUR MARQUES, PINHEIRO FRANCO E RICARDO ANAFE.

São Paulo, 18 de março de 2014.      

ELLIOT AKEL

RELATOR

Apelação Cível nº 0025431-76.2013.8.26.0100

Apelante: Antonio Pereira de Melo

Apelado: 12 º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

Voto nº 33.997

REGISTRO DE IMÓVEIS – dúvida prejudicada – ausência da via original do título – cópia autenticada que não supre a necessidade da apresentação da via original – falta de prenotação – exame em tese da exigência – instrumento particular de compromisso de compra e venda sem o reconhecimento da firma de uma das testemunhasexigência prescindível diante do teor do art. 221, do Código Civil – Precedente do Conselho Superior da Magistratura – recurso não conhecido com determinação.

Trata-se de apelação interposta por Antonio Pereira de Melo, objetivando a reforma da r. decisão de fls. 38/39, que manteve a recusa do 12º Oficial de Registro de Imóveis da Capital relativa ao registro do instrumento particular de compromisso de compra e venda por meio da qual Levi de Souza de Andrade e sua esposa Adelaide Venturoza de Lima de Andrade promete à venda ao apelante o imóvel descrito na matrícula nº 101.143.

Alega, em suma, que a testemunha cujo reconhecimento de firma é exigido pelo Oficial de Registro de Imóveis é falecida de modo que o óbice imposto pelo Oficial não tem como ser atendido, exceto pela via judicial.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não conhecimento do recurso e, caso superada a preliminar, por seu provimento (fls. 52/54).

É o relatório.

A jurisprudência do Conselho Superior da Magistratura é pacífica no sentido de que a não apresentação da via original do título que se pretende registrar prejudica a dúvida, seja por conta do comando previsto no art. 203, II, da Lei nº 6.015/73 [1], seja pela necessidade de se examinar a sua autenticidade:

Este Conselho, já por inúmeras vezes decidiu que o título deve ser apresentado em seu original e não por cópias, ainda que autenticadas (Ap. Cív. 2.177-0, 4.258-0, 4.283-0, 12.439-0/6, 13.820-0/2,16.680-0/4 e 17.542-0/2). Ora, sem a apresentação do título original, não admite a discussão do quanto mais se venha a deduzir nos autos, porque o registro, em hipótese alguma, poderá ser autorizado, nos termos do artigo 203, II, da Lei 6.015/73. Não é demasiado observar que, no tocante à exigência de autenticidade, o requisito da exibição imediata do original diz respeito ao direito obtido com a prenotação do título, direito que não enseja prazo reflexo de saneamento extrajudicial de deficiências da documentação apresentada. Por conseguinte, não há como apreciar o fundamento da recusa, face à questão prejudicial. (Ap. Cível nº 30728-0/7, Rel. Des. Márcio Martins Bonilha).

No mesmo sentido, as Apelações Cíveis nºs 2.177-0, 4.258-0, 4.283-0, 12.439-0/6, 13.820-0/2,16.680-0/4 e 17.542-0/2.

No caso em exame, consta do autos apenas a cópia autenticada do do instrumento particular de compromisso de compra e venda por meio da qual Levi de Souza de Andrade e sua esposa Adelaide Venturoza de Lima de Andrade promete à venda ao apelante o imóvel descrito na matrícula nº 101.143 (fls. 05/08).

Além disso, como bem destacou a Procuradoria Geral de Justiça, o título não foi prenotado, o que também prejudica a dúvida porque, sem a prenotação, não há como saber se já houve o registro de outro título – contraditório ao ora apresentado – de sorte que eventual improcedência da dúvida, com a subsequente determinação de registro do título, colocaria em risco a segurança jurídica da qual os registros públicos não podem prescindir.

A prenotação, mesmo na dúvida inversa, é de rigor como determina o item 30.1, do Capítulo XX, das Normas de Serviço:

Ocorrendo suscitação diretamente pelo interessado (Dúvida Inversa), assim que o Oficial a receber do Juízo para informações, deverá prenotar o título, e observar, o disposto nas letras “b” e “c” do item 30.

No caso em exame, não há qualquer notícia de que o Oficial tenha cumprido o item 30.1 acima, fato que deverá ser apurado pelo MM. Juiz Corregedor Permanente em expediente próprio.

A prejudicialidade da dúvida não obsta o exame – em tese – da exigência formulada a fim de orientar futura prenotação.

Nos autos da Apelação Cível n.º 0018645-08.2012.8.26.0114, este C. Conselho Superior da Magistratura, ao interpretar a redação do art. 221, do Código Civil, conclui pela prescindibilidade de o instrumento particular estar assinado por duas testemunhas para poder ingressar no registro de imóveis:

Apesar das referências alusivas à subscrição por testemunhas, tanto no inciso III do artigo 169 como no inciso II do artigo 221 da Lei n.º 6.015/1973, a exigência não mais se justifica, em razão do texto do artigo 221, caput, do Código Civil [2] que, em confronto com seu par no Código de 1916 (artigo 135, caput [3]), suprimiu a necessidade de duas testemunhas assinarem o instrumento contratual.

Pouca importa que o contrato tenha sido firmado antes do atual Código Civil porque o título se sujeita aos requisitos da lei vigente ao tempo de sua apresentação a registro (“tempus regit actum”). Nesse sentido, as Apelações Cíveis nºs, 115-6/7, rel. José Mário Antonio Cardinale, 777-6/7, rel. Ruy Camilo, 530-6/0, rel. Gilberto Passos de Freitas, e, mais recentemente, 0004535-52.2011.8.26.0562, rel. José Renato Nalini.

Assim, não estivesse a dúvida prejudicada, a hipótese seria de provimento ao recurso, como bem frisou a Procuradoria Geral de Justiça.

Ante o exposto, prejudicada a dúvida, não conheço do recurso.

Determino ao MM. Juiz Corregedor Permanente que apure, em expediente próprio, os motivos pelos quais o 12º Oficial de Registro de Imóveis não prenotou o título.

Com cópia deste acórdão, forme a DICOGE expediente de acompanhamento, solicitando informações ao MM. Juiz Corregedor Permanente em 15 dias.

HAMILTON ELLIOT AKEL

Corregedor Geral da Justiça e Relator

___________

[1]  Art. 203 – Transitada em julgado a decisão da dúvida, proceder-se-á do seguinte modo:

[1]                  …

[1]                  II – se for julgada improcedente, o interessado apresentará, de novo, os seus documentos, com o respectivo mandado, ou certidão da sentença, que ficarão arquivados, para que, desde logo, se proceda ao registro, declarando o oficial o fato na coluna de anotações do Protocolo.

[2] Artigo 221. O instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por quem esteja na livre disposição e administração de seus bens, prova as obrigações convencionais de qualquer valor; mas os seus efeitos, bem como os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros, antes de registrado no registro público.

[3] Artigo 135. O instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por quem esteja na disposição e administração livre de seus bens, sendo subscrito por duas testemunhas, prova as obrigações convencionais de qualquer valor. Mas os seus efeitos, bem como os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros (art. 1.067), antes de transcrito no registro público. (grifei)

___________

Fonte: TJ/SP | 25/03/2014.

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CSM|SP: Registro de Imóveis – Doação – Cláusulas de incomunicabilidade e impenhorabilidade – Reserva de Usufruto – Não configuração de encargos, nem a reserva de usufruto a torna modal – Recurso provido.

APELAÇÃO CÍVEL: 005452-0/86
Vencidos em pretensão de registro de escritura de doação de unidade autônoma condominial com reserva de usufruto e imposição de cláusulas e impenhorabilidade e incomunicabilidade, Josué de Maia e sua mulher, D. Nivia Afonso de Maia, recorrem da r. sentença do MM. Juízo da Comarca de Santos que não lhes atendeu o pedido veiculado em procedimento de dúvida inversa.
Os interessados exibiram ao 2º Cartório do Registro Predial de Santos traslado de escritura pública de doação de apartamento em favor de seus filhos, um dos quais menor impúbere dilatando-se a aceitação da transferência, em relação ao último, para até seis meses após sua maioridade (fl. 8). Ademais, houve imposição de cláusulas de impenhorabilidade e incomunicabilidade, gravando o imóvel, e reserva de usufruto vitalício em favor dos doadores. Entendeu a Serventia Imobiliária que a doação se perfazia com encargos, de sorte que reclamada a intervenção de curador especial para a representação do menor impúbere.
A r. sentença manteve a denegação do registro, afastando a incidência da regra do art. 1.166, Cód. Civ., com o argumento de que a norma pressupõe justamente a capacidade faltante ao donatário impúbere. Ademais, as cláusulas impostas e a reserva de usufruto demonstram, consoante a decisão de que se apela, restrição ainda mais grave do que o encargo, a ensejar exigência de intervenção de curador especial. Por fim, o MM Juízo a quo esposou o entendimento da Curadoria de Registros Públicos local, no sentido de que aplicável à espécie o disposto no art. 857, n.º III, Cód. Civ., diferindo-se o registro para época posterior à maioridade do destinatário que ainda não aceitou a transferência (fls. 19/21).
Apelaram tempestivamente os interessados (fls. 25/31), insistentes nas razões iniciais.
Os pareceres do Ministério Público, em ambas as Instâncias, são pelo desprovimento do apelo (fls. 38/39 e 43/47).
É o relatório do necessário.
1. Não configuram propriamente encargos da doação as imposições que não beneficiarem o doador, terceiro ou a coletividade, aproveitando apenas ao donatário (arg. do art. 1.180, Cód. Civ.).
A lei civil não obriga o donatário ao cumprimento de imposição que lhe favoreça e que, por isso mesmo, não constitua verdadeiro encargo, reduzindo-se a mero conselho, recomendação ou exortação (Clóvis Beviláqua, “Código Civil dos Estados Unidos do Brasil”, observação n.º 1 ao art. 128; Carvalho Santos, “Código Civil Brasileiro Interpretado”, comentário ao art. 128, n.º 1; Agostinho Alvim, “Da Doação”, comentário ao art. 1.180, n.º 14).
Esse encargo impróprio, beneficiando o donatário, não corresponde a direito de exigir seu cumprimento, não se contrapondo a qualquer dever jurídico do favorecido (L. Enneccerus, “Tratado de Derecho Civil – Derecho de Obligaciones”, § 125, n.º III; C. A. Mota Pinto, “Teoria Geral do Direito Civil”, Coimbra, 1976, pág. 466; Guillermo Borda, “Manual de Obligaciones”, Buenos Aires, 1975, pág. 287). Por isso, as imposições que prestam proveito ao próprio donatário não tornam modais as doações em que emerjam (Clóvis Beviláqua, o.c., comentário ao art. 1.180).
Em particular, as cláusulas de incomunicabilidade e impenhorabilidade, impostas em contrato de doação, nisso que beneficiam o donatário, não transformam em modal a doação pura (Vicente Ráo, “Ato Jurídico”, São Paulo, 1979, pág. 450; Agostinho Alvim, o.c., comentário ao art. 1.180, n.º 18).
Tampouco é doação sub modo a que se perfaz com reserva de usufruto, não se revelando prestação a cumprir pelo donatário em favor do doador, de terceiro ou da coletividade. Esse é o entendimento de Washington de Barros Monteiro, apoiado em jurisprudência que menciona (“Curso de Direito Civil”, vol. 5, 6ª edição, São Paulo, 1969, pág. 132), perfilhado também pelo Egrégio Conselho Superior da Magistratura paulista, no julgamento da Apelação Cível n.º 608-0, Capital, em 28.12.81 (apud Narciso Orlandi Neto, “Registro de Imóveis”, edição de 1984, págs. 81-84).
2. Inaplicável à espécie a regra do art. 1.166, Cód. Civ., que supõe exatamente a plena capacidade de fato do donatário, invoca-se o preceito do art. 1.170 do mesmo Código, para considerar implícita a aceitação de doação pura pelo incapaz, nada obstante a assinação de prazo para o placet, cláusula que deve reputar-se inócua.
Essa orientação, que não é isenta de dissídio doutrinal, foi esposada pelo Colendo Conselho Superior da Magistratura de São Paulo no julgamento da Apelação Cível n.º 608-0, citada, e já se prenunciara em precedente acórdão para o Agravo de Petição n.º 251.603, 21.6.76 (apud Francisco de Paula Sena Rebouças, “Registros Públicos”, São Paulo, 1978, págs. 92-94).
Incumbindo aos pais a representação dos filhos absolutamente incapazes (arts. 384, n.º V, e 5º, n.º I, Cód. Civ.), demasiado não é, como quer que seja, considerar suplementada a aceitação do representado pelo simples fato da instância do ato registral, grifada, na espécie, até mesmo pela circunstância de os doadores requererem suscitação de dúvida para superar os óbices levantados pelo registrador. Aliás, justamente o exame da rogação do procedimento registrário presta-se a remover o obstáculo que se entreviu no inciso III, art. 857, Cód. Civ.
3. Merece, assim, provimento o recurso, reproduzindo-se a observação lançada no venerando acórdão para a Apelação Cível n.º 608-0, Relator Desembargador Affonso de André: “… não se pode determinar, a um só tempo, o registro – considerando-se aceita a doação, ou produzindo efeitos – e a averbação da circunstância de aceitação, pela donatária, no momento fixado”.
DO EXPOSTO, o parecer é pelo provimento da apelação, registrando-se o título exibido, admitida já aceita a doação pelo incapaz, observando-se que do registro não deverá constar, por incompatível com a aceitação atual, a dilação de prazo para o consentimento do menor impúbere.
São Paulo, 4 de abril de 1986
RICARDO HENRY MARQUES DIP
Juiz de Direito Corregedor
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL N.º 5.452-0, da Comarca de SANTOS, em que é apelante JOSUÉ DE MAIA e s/mulher NIVIA AFONSO DE MAIA e apelado o OFICIAL DO 2º CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS,
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em dar provimento à apelação. Custas na forma da lei.
Assim decidem de conformidade com o parecer do M. Juiz Corregedor, que adotam como razão de decidir.
O caso não é de doação com encargos, que exigisse nomeação de curador especial para o menor impúbere, pois a impenhorabilidade, a inalienabilidade e a reserva de usufruto são restrições que a doutrina, como bem demonstra o parecer, não classifica como encargos impostos ao doador. Nesse sentido definiu também a jurisprudência deste e do Supremo Tribunal Federal, bem como deste Conselho (v. Jurispr. STF, Lex, 17/12, RJTJ 36/330, Agr. instr. 39.925, 2ª Câmara Cível deste Tribunal, além de diversos outros acórdãos invocados por este último julgado).
Tratando-se de doação pura, que nenhum encargo impõe ao donatário, a aceitação pelo menor impúbere considera-se implícita, nos termos do art. 1.170 do Código Civil, independentemente portanto da manifestação posterior à maioridade, prevista na escritura. De qualquer modo, como observa o parecer, o certo é que no caso a aceitação está inequivocamente manifestada pelo menor, através de seu representante legal, com o pedido de registro da escritura e a aprovação da dúvida e o recurso ora manifestado contra a decisão judicial contrária.
São Paulo, 5 de Maio de 1986.
NELSON PINHEIRO FRANCO
Presidente do Tribunal de Justiça
SYLVIO DO AMARAL
Corregedor Geral da Justiça e Relator
J. P. PRESTES BARRA
Vice-Presidente do Tribunal de Justiça

Fonte: Blog do 26.

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Jurisprudência mineira – Apelação cível – Registro de óbito tardio – Jurisdição voluntária – Rigorismo formal desnecessário

Apelação Cível – Registro de Óbito Tardio

APELAÇÃO CÍVEL – REGISTRO DE ÓBITO TARDIO – JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA – RIGORISMO FORMAL DESNECESSÁRIO – ART. 1.109 DO CPC E ART. 5º DA LINDB – SENTENÇA MANTIDA

– Diante da possibilidade de, nos procedimentos de jurisdição voluntária, proceder-se ao julgamento com base no princípio da equidade, desconsiderando a legalidade estrita e atentando-se ao disposto no art. 5º da LINDB, impõe-se a manutenção de sentença que permite o registro de óbito tardio, sendo desarrazoada a extinção do feito com amparo em rigorismo formal, mormente considerando-se que o registro de óbito é imprescindível para a ordem pública.

Apelação Cível nº 1.0016.13.005034-3/001 – Comarca de Alfenas – Apelante: Ministério Público do Estado de Minas Gerais – Apelados: Oficial do Registro Civil de Pessoas Naturais da Comarca de Alfenas, Walkíria de Fátima Pereira Oliveira – Relator: Des. Peixoto Henriques

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e à unanimidade, em negar provimento.

Belo Horizonte, 11 de março de 2014. – Peixoto Henriques – Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES. PEIXOTO HENRIQUES – Por via de apelação (f. 15/19), insurge-se o Ministério Público do Estado de Minas Gerais contra a sentença (f. 11/13) que reconheceu o direito ao assentamento tardio de óbito.

Em suma, aduz o apelante: que o Oficial de Registro de Pessoas Naturais não possui legitimidade para requerer o registro de óbito, nos termos dos arts. 77 a 79 da Lei nº 6.015/73; e que, "ainda que fosse a genitora do falecido a requerente, esta não possui capacidade postulatória para estar em juízo, razão pela qual deveria constar contar com a assistência de um advogado".

Requer o provimento do recurso para reformar a sentença.

Dispensado o preparo.

A d. PGJ/MG, no judicioso parecer do i. Procurador de Justiça Paulo Cançado, opina pelo desprovimento do recurso (f. 31/32).

Fiel ao breve, dou por relatado.

Conquanto admissível, improcedente o apelo.

A Lei nº 6.015/73, conhecida como Lei de Registros Públicos, assim dispõe acerca do registro de óbito: 

"Art. 77 – Nenhum sepultamento será feito sem certidão, do oficial de registro do lugar do falecimento, extraída após a lavratura do assento de óbito, em vista do atestado de médico, se houver no lugar, ou em caso contrário, de duas pessoas qualificadas que tiverem presenciado ou verificado a morte.

Art. 78. Na impossibilidade de ser feito o registro dentro de 24 (vinte e quatro) horas do falecimento, pela distância ou qualquer outro motivo relevante, o assento será lavrado depois, com a maior urgência, e dentro dos prazos fixados no artigo 50.

Art. 79. São obrigados a fazer declaração de óbitos:

1°) o chefe de família, a respeito de sua mulher, filhos, hóspedes, agregados e fâmulos;

2º) a viúva, a respeito de seu marido, e de cada uma das pessoas indicadas no número antecedente;

3°) o filho, a respeito do pai ou da mãe; o irmão, a respeito dos irmãos e demais pessoas de casa, indicadas no nº 1; o parente mais próximo maior e presente;

4º) o administrador, diretor ou gerente de qualquer estabelecimento público ou particular, a respeito dos que nele faleceram, salvo se estiver presente algum parente em grau acima indicado;

5º) na falta de pessoa competente, nos termos dos números anteriores, a que tiver assistido aos últimos momentos do finado, o médico, o sacerdote ou vizinho que do falecimento tiver notícia;

6°) a autoridade policial, a respeito de pessoas encontradas mortas.

Parágrafo único. A declaração poderá ser feita por meio de preposto, autorizando-o o declarante em escrito, de que constem os elementos necessários ao assento de óbito".

Ao exame dos artigos supratranscritos, verifica-se que, de fato, o Oficial de Registro de Pessoas Naturais não está incluído entre os obrigados a fazer a declaração de óbito.

Todavia, no caso em apreço, deve-se atentar para o fato de que o pedido foi feito pelo Oficial, atendendo à solicitação feita pela genitora do falecido, a, qual, como deixa certo o art. 79, § 1º, da Lei nº 6.015/73, está obrigada a declarar o óbito.

E, em que pese a mãe do falecido não possuir procurador, injustificável reformar-se a sentença por conta disso.

Não se deve olvidar que o registro de óbito é necessário à ordem pública, pois confere segurança jurídica às relações sociais, sendo imperiosa a observância do disposto no art. 5ª da LINDB, segundo o qual:

"Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum".

Além disso, por se tratar de procedimento de jurisdição voluntária, tem-se que, a teor do art. 1.109 do CPC, o juiz não é obrigado "a observar critério de legalidade estrita, podendo adotar em cada caso a solução que reputar mais conveniente ou oportuna".

Trata-se, portanto, da possibilidade de decisão por equidade.

Sobre o tema, lecionam os renomados Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery:

"A lei processual concede ao juiz a oportunidade de aplicação de princípios de equidade, ao arrepio da legalidade estrita, podendo decidir escorado na conveniência e oportunidade, critérios próprios do poder discricionário, portanto inquisitorial, bem como de acordo com o bem comum" (Código de Processo Civil comentado. 9. ed. São Paulo: RT, p. 1.061. Em comentário de nº 1 ao art. 1.109).

"Equidade. Na concepção aristotélica, equidade não é o legalmente justo, mas sim a correção da justiça legal. O equitativo é justo. O CPC/39 114 mandava o juiz, ao decidir por equidade, aplicar a norma que estabeleceria se fosse o legislador. Na classificação de Alípio Silveira (Conceitos e funções da equidade, p. 60-62), há três acepções para o conceito de equidade: a) em sentido amplíssimo, é o princípio universal de ordem normativa relacionada a toda conduta humana, do ponto de vista religioso, moral, social e jurídico, a que todo homem deve obedecer porque se constitui em suprema regra de justiça; b) em sentido amplo, confunde-se com os conceitos de justiça absoluta ou ideal, com os princípios de direito e com a ideia de direito natural; e, c) em sentido estrito, equidade é a justiça no caso concreto" (ob. cit., p. 336 – Em comentário de nº 1 ao art. 127). No caso em apreço, ocorrido o falecimento do filho menor por afogamento, conforme declaração subscrita por médico do IML (f. 4), impõe-se a manutenção da sentença que autoriza o extemporâneo registro do óbito, sendo desarrazoada a extinção do processo conforme rigorismo formal exigido pelo d. Promotor, fato este que somente prolongaria desnecessariamente o sofrimento da mãe e benefício algum traria à coletividade. 

A propósito, eis a jurisprudência:

"O art. 1.109 do CPC abre a possibilidade de não se obrigar o juiz, nos procedimentos de jurisdição voluntária, à observância do critério de legalidade estrita, abertura essa, contudo, limitada ao ato de decidir, por exemplo, com base na equidade e na adoção da solução mais conveniente e oportuna à situação concreta" (REsp nº 623.047/RJ, 3ª T./STJ, Rel.ª Min.ª Nancy Andrighi, DJ de 14.12.2004, ementa parcial).

Isso posto, contando com o sempre reconfortante aval da d. PGJ/MG, nego provimento à apelação.

Sem custas recursais (LE nº 14.939/03).

É como voto.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Oliveira Firmo e Wander Marotta.

Súmula – NEGARAM PROVIMENTO.

Fonte: Arpen/Brasil – DJE/MG | 24/04/2014.

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