Apelação – Pedido de providências – Negativa de averbação de contrato de locação em registro imobiliário – Sentença de improcedência – Existência de duplicidade de garantias prestadas no contrato de locação – Vedação pelo artigo 37, parágrafo único, da Lei n° 8.245/91 – Negativa de averbação pelo oficial de registro correta – Contrato de locação que deve ser aditado para excluir uma das garantias adequando-se à Lei de Locações – Oficial de registro que agiu corretamente, vez que não poderia ignorar a nulidade existente – Sentença mantida – Recurso não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1039777-60.2015.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos, em que é apelante J L B ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÃO LTDA., é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE GUARULHOS – SP.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores COSTA NETTO (Presidente sem voto), ANGELA LOPES E JOSÉ APARÍCIO COELHO PRADO NETO.

São Paulo, 16 de fevereiro de 2018.

Edson Luiz de Queiroz

Relator

Assinatura Eletrônica

VOTO Nº 20434

APELAÇÃO nº 1039777-60.2015.8.26.0224

APELANTE: J L B ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÃO LTDA.

APELADO: 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE GUARULHOS – SP

COMARCA: GUARULHOS

JUIZ (A): RICARDO FELICIO SCAFF

Apelação. Pedido de providências. Negativa de averbação de contrato de locação em registro imobiliário. Sentença de improcedência.

Existência de duplicidade de garantias prestadas no contrato de locação. Vedação pelo artigo 37, parágrafo único, da Lei n° 8.245/91. Negativa de averbação pelo Oficial de Registro correta. Contrato de locação que deve ser aditado para excluir uma das garantias adequando-se à Lei de Locações. Oficial de Registro que agiu corretamente, vez que não poderia ignorar a nulidade existente. Sentença mantida.

Recurso não provido.

Vistos.

Adotado o relatório da decisão de primeiro grau, acrescentese tratar de pedido de providências formulado contra indeferimento de averbação de contrato de locação em registro imobiliário. O pedido foi julgado improcedente. Não houve condenação nos ônus da sucumbência ou fixação de honorários advocatícios de sucumbência.

A autora interpôs recurso de apelação, arguindo que a simples utilização do termo “solidariedade” na redação das cláusulas 25ª e 35ª do Contrato de Locação não caracteriza a existência da fiança e não se pode concluir pela existência da dupla garantia. Sustenta que a garantia prestada não se confunde com garantia fidejussória que não se presume. Argumenta que embora declarada a solidariedade dos caucionantes, prevalece a caução, vez que foi a garantia constituída contratualmente, ficando evidente que a solidariedade ocorra apenas até o limite do valor do bem caucionado. Requer a reforma da r. sentença.

O recurso foi devidamente processado, sem apresentação de contrarrazões e parecer da Douta Procuradoria Geral de Justiça pelo não provimento do recurso.

É o relatório do essencial.

APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL NO TEMPO

Inicialmente, anote-se que o julgamento é feito com base nas disposições do Código de Processo Civil de 2015 e não aquelas referentes ao CPC/1973tendo em vista que foi em sua vigência que a decisão foi proferida e o recurso foi interposto. Aplica-se o princípio “tempus regit actum”, corolário do sistema de isolamento dos atos processuais.

FATOS

A autora afirma que enviou ao Cartório, por meio da sua administradora, para averbação, o Contrato de Locação em questão. No entanto, o Oficial do Registro Imobiliário devolveu o contrato sem a devida averbação, com a anotação de que o mesmo deveria ser retificado para constar somente uma modalidade de garantia.

Diante destes fatos e argumentando que o contrato apresentado para averbação possui os requisitos formais ingressou com a presente ação a qual foi julgada improcedente, ensejando a interposição do recurso de apelação.

O recurso, de início, foi remetido para 30ª Câmara de Direito Privado desta C. Corte, porém não foi conhecido, sendo determinada sua redistribuição para uma das R. Câmaras da Subseção de Direito Privado I deste Tribunal (fls. 135/138).

MÉRITO

No caso a averbação do contrato de locação não foi realizada pelos motivos elencados na nota de devolução do Primeiro Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Guarulhos (fls. 18/21) pelas seguintes razões:

“I QUANTO À MODALIDADE DE GARANTIA:

Retificar o título para que dele conste apenas uma modalidade de garantia (CAUÇÃO), tendo em vista que a cláusula 25ª e o §1º da cláusula 35ª evidenciam a mistura de duas formas de garantia, vez que consigam:

Cláusula 25ª As obrigações assumidas neste contrato são indivisíveis e as partes, Locatário (s) e Caucionante (s), são solidárias entre si. (grifo nosso).

§1º da Cláusula 35ª Durante o período em que o imóvel estiver sem seguro pela falta de atendimento dessas exigências, o locatório e seus caucionantes será os únicos responsáveis pelas perdas e danos e por qualquer outro prejuízo, até a efetiva devolução das chaves do imóvel devidamente reconstituído. (grifo nosso).

Tal falha com relação ao conteúdo do instrumento (instituto da fiança garantia pessoal, e ao mesmo tempo, dá o móvel em garantia da dívida caução garantia real), referente às duas modalidades de garantia (fiança e a caução), impede a prática do ato registrário (…).”

No caso, compulsando os autos, realmente verifica-se a existência de duplicidade de garantias prestadas no contrato de locação: garantia pessoal e real, consistente em fiança e caução (fls. 29/39). A atenta leitura do contrato leva à conclusão de que as cláusulas 25ª e 35ª contêm cláusula que se caracteriza como garantia pessoal (fiança). Acerca da matéria, confira-se NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA A. NERY, em “Código Civil Comentado”, 11ª edição, Editora Revista dos Tribunais, 2014, pág. 1114:

A fiança é exemplo típico de garantia pessoal. Diferentemente da garantia real, a garantia pessoal se verifica quando ‘outra ou outras pessoas, além do devedor, estão adstritas a realizar a prestação no caso de ele a não efectuar’ Galvão Telles, Obrigações, p. 48)”.

Entretanto, o artigo 37, parágrafo único, da Lei n° 8.245/91 dispõe:

“é vedada sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo contrato de locação”.

Na lição de MARIA HELENA DINIZ:

“Só será permitida uma garantia em cada avença locatícia; logo, não poderá haver cláusula que ofereça ao locador mais de uma garantia. A lei proíbe a cumulação de mais de uma garantia num mesmo contrato de locação, sob pena de nulidade (RT, 601:161). E, além disso, constituirá contravenção penal, punível com prisão simples de cinco dias a seis meses ou multa de três a doze meses do valor do último aluguel atualizado, revertida em favor do inquilino, a exigência de mais de uma modalidade de garantia locatícia num mesmo contrato de locação (Lei n. 8.245/91, art. 43, II)” (“Lei de locações de imóveis urbanos comentada”. São Paulo: Saraiva, 2ª ed., p. 151).

SYLVIO CAPANEMA DE SOUZA assim dispõe:

“Já fomos consultados, de certa vez, se seria lícito garantir a obrigação de pagamento pontual do aluguel através de caução em dinheiro, e a de conservar o imóvel, por meio de fiança.

A resposta é negativa, já que a lei veda a duplicidade ‘num mesmo contrato’. Estabelecendo o contrato dupla garantia, a cláusula que assim dispõe, como se viu, é nula, o que, entretanto, não afetará o restante do contrato” (“A Lei do Inquilinato Comentada”, Rio de Janeiro: GZ, 7ª ed, p. 164-5).

Nessas condições, é vedada a dupla garantia, estando correto o Oficial de Registro ao negar a averbação, vez que o contrato de locação deve ser aditado para excluir uma das garantias adequando-se à Lei de Locações.

Isso porque, o Oficial de Registro não pode ao realizar sua atividade de verificação da legalidade do contrato levado à averbação ignorar a nulidade existente.

Dessa forma, a r. sentença fica mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos.

Finalizando, as demais questões arguidas pelas partes ficam prejudicadas, segundo orientação do Superior Tribunal de Justiça, perfilhada pela Ministra Diva Malerbi, no julgamento dos EDcl no MS 21.315/DF, proferido em 08/06/2016, já na vigência CPC/2015: “o julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão (…), sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida“.

Pelo exposto, NEGA-SE provimento ao recurso.

Edson Luiz de Queiroz

RELATOR

(documento assinado digitalmente)

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1039777-60.2015.8.26.0224 – Guarulhos – 9ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Edson Luiz de Queiroz – DJ 26.03.2018

Fonte: INR Publicações.

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