CSM/SP: Registro de Imóveis – Dúvida inversa – Escritura de Doação – Desqualificação – Manutenção da exigência pelo MM. Juiz Corregedor Permanente – Discussão a respeito da base de cálculo a ser utilizada no cálculo do ITCMD – Atuação que extrapola as atribuições do registrador – Dever de fiscalização que se limita ao recolhimento do tributo – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida e determinar o registro do título.

Apelação nº 0031287-16.2015.8.26.0564

Espécie: APELAÇÃO
Número: 0031287-16.2015.8.26.0564
Comarca: SÃO BERNARDO DO CAMPO

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 0031287-16.2015.8.26.0564

Registro: 2017.0000390098

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 0031287-16.2015.8.26.0564, da Comarca de São Bernardo do Campo, em que são partes são apelantes BENEDITO COELHO SIEBRA e NICHOLAS RONCALLY MARQUES SIEBRA, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SÃO BERNARDO DO CAMPO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso, determinando o registro do título. V. U. Vencido em parte o Desembargador Ricardo Dip, que declarará voto.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E PÉRICLES PIZA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 24 de maio de 2017.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 0031287-16.2015.8.26.0564

Apelantes: Benedito Coelho Siebra e Nicholas Roncally Marques Siebra

Apelado: 1º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de São Bernardo do Campo

VOTO Nº 29.744

Registro de Imóveis – Dúvida inversa – Escritura de Doação – Desqualificação – Manutenção da exigência pelo MM. Juiz Corregedor Permanente – Discussão a respeito da base de cálculo a ser utilizada no cálculo do ITCMD – Atuação que extrapola as atribuições do registrador – Dever de fiscalização que se limita ao recolhimento do tributo – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida e determinar o registro do título.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Benedito Coelho Siebra e Nicholas Roncally Marques Siebra contra a sentença de fls. 44/45, que manteve a recusa ao registro de escritura de doação com reserva de usufruto, lavrada no Tabelionato de Notas do Distrito de Riacho Grande.

Sustenta o apelante, em resumo, que a Lei do Município de São Bernardo do Campo nº 3.317/1989, com a redação dada pela Lei nº 6.388/2014, não se aplica ao ITCMD; e que a Lei Estadual nº 10.705/2000 estabelece que a base de cálculo para o cálculo do ITCMD é o valor do lançamento do IPTU. Pede, for fim, a reforma da sentença de primeiro grau (fls. 51/55).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 78/79).

É o relatório.

Ao ser apresentada a registro, a escritura de doação de fls. 17/18 foi desqualificada. Nas notas devolutivas (fls. 13/14) e nas razões da dúvida (fls. 34/39), sustentou o registrador: a) que o valor venal do IPTU não poderia ser utilizado como base para o cálculo do ITCMD; b) que a base de cálculo correta é o valor de referência do ITBI; c) que não cabe a ele, registrador, analisar a constitucionalidade de norma; e d) que uma de suas funções é verificar o recolhimento dos tributos incidentes sobre os atos registrados.

A sentença prolatada em primeiro grau ratificou o teor da exigência.

O caso é de se dar provimento à apelação.

Como já decidiu esse Conselho Superior, no julgamento da apelação 0002604-73.2011.8.26.0025, em voto da lavra do então Excelentíssimo Corregedor Geral da Justiça, Desembargador José Renato Nalini:

“A falha apontada pelo Oficial envolve questão de questionamento no âmbito do direito material.

Não foi atacada a regularidade formal do título nem mesmo a temporalidade do recolhimento ou o ato em si. Ao contrário, a exigência envolve exame substancial do montante do pagamento do imposto devido, que é atribuição dos órgãos fazendários competentes, sendo que seu questionamento mereceria a participação da Fazenda Pública, principal interessada.

Ao Oficial cabe fiscalizar, sob pena de responsabilização pessoal, a existência da arrecadação do imposto previsto e a oportunidade em que foi efetuada. O montante, desde que não seja flagrantemente equivocado, extrapola a sua função.

Neste sentido é o parecer da D Procuradora de Justiça, citando precedente deste E. Conselho Superior da Magistratura (Apelação Cível 996-6/6, de 09/12/2088).”

É o que ocorre no caso em tela.

Embora zelosa, a atitude do registrador vai além de suas atribuições normais, pois não lhe cabe aferir se o montante do tributo recolhido está correto, devendo apenas zelar pela existência de recolhimento – ou ocorrência de isenção, como ocorre no caso dos autos (fls. 20/23) – e pela razoabilidade da base de cálculo utilizada.

Na hipótese, a escritura de doação de 50% do apartamento nº 21 do Edifício Columbia foi lavrada em 28 de julho de 2015 (fls. 17) e o valor utilizado para o cálculo do ITCMD (R$47.421,90 – fls. 20 e 17, verso) foi o correspondente à metade do valor do lançamento para fins de IPTU do exercício de 2015 (R$94.843,80 fls. 17, verso).

Utilizado esse valor, a doação realizada foi considerada isenta do recolhimento de ITCMD (fls. 20/23).

Pode-se questionar se o cálculo do tributo não deveria ter levado em conta valor venal de referência do ITBI (fls. 38), nos termos do artigo 16 do Regulamento do ITCMD (Decreto n° 46.655/2002, com a redação dada pelo Decreto nº 55.002/2009[1]) e do artigo 8º da Lei do Município de São Bernardo do Campo nº 3.317/1989, com a redação dada pela Lei nº 6.388/2014[2]. Trata-se, todavia, de base de cálculo que vem sendo sistematicamente rechaçada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo:

Mandado de Segurança Recolhimento de ITCMD Imposto de transmissão causa mortis e Doação Base de cálculo Valor venal do IPTU lançado no exercício Sentença ratificada, nos termos do artigo 252 do Regimento Interno desta E. Corte Recursos não providos” (Apelação n.º 0035140-24.2009.8.26.0053, 11ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Aliende Ribeiro, j. 21/11/2011).

MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO DE QUAISQUER BENS OU DIREITOS (ITCMD). Base de cálculo. ITBI. Inadmissibilidade. A base de cálculo do ITCMD é o valor venal do bem ou direito transmitido. Concessão da segurança mantida. Recursos não providos” (Apelação n.º 0033279-32.2011.8.26.0053, 2ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Vera Angrisani, j. 21/08/2012).

Agravo de Instrumento Inventário Decisão que defere o pagamento do ITCMD com base no valor venal do bem para fins de IPTU Alegação de que o pagamento do ITCMD deve ter como base de cálculo o valor venal de referência do ITBI A base de cálculo do ITCMD, no caso em apreço, deve ser o valor venal do imóvel lançado para fins de IPTU, em razão da ilegalidade do Decreto 55.002/09 Inteligência do art. 97, inciso II, §1º, do CTN e da Lei 10.705/2000 Decisão mantida. Recurso desprovido” (Agravo de Instrumento n.º 2138183-58.2016.8.26.0000, 11ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Oscild de Lima Júnior, j. 9/8/2016).

De todo modo, ainda que a Fazenda possa questionar a base de cálculo utilizada, fato é que o contribuinte valeu-se de valor razoável (valor do lançamento do IPTU de 2015 – fls. 17, verso), sendo esse fato suficiente para o Oficial, sem maiores questionamentos, permitir o ingresso do título.

Caso entenda que há tributo a ser recolhido, deve a Fazenda do Estado se valer dos meios adequados para tanto, administrativa ou judicialmente, não podendo utilizar a desqualificação do título para indiretamente coagir o contribuinte ao pagamento.

Nesse mesmo sentido, apelação nº 1006725-68.2015.8.26.0161, de minha relatoria:

Registro de Imóveis Apelação interposta pela Fazenda do Estado de São Paulo Legitimidade reconhecida Terceira prejudicada Escritura de Doação Desqualificação Discussão a respeito da base de cálculo a ser utilizada no cálculo do ITCMD Atuação que extrapola as atribuições do Oficial Dever de fiscalização que se limita ao recolhimento do tributo Discussão que deve ser travada em processo administrativo tributário ou em execução fiscal Sentença de improcedência da dúvida mantida” (j. em 14/10/2016, votação unânime).

Ante o exposto, dou provimento à apelação para determinar o registro do título.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

Conselho Superior da Magistratura

Apelação 0031287-16.2015.8.26.0564 SEMA

Dúvida de registro

VOTO 47.599 (com divergência)

1. Registro, à partida, adotar o relatório lançado pelo insigne Relator da espécie.

2. Permito-me, da veniam, lançar um reparo.

3. Já é tempo de deixar de admitir o que se convencionou chamar dúvida “inversa”, ou seja, aquela levantada pelo próprio interessado, diretamente ao juízo corregedor.

A prática, com efeito, não está prevista nem autorizada em lei, o que já é razão bastante para repeli-la, por ofensa à cláusula do devido processo (inc. LIV do art. 5º da Constituição), com a qual não pode coadunar-se permissão ou tolerância (jurisprudencial, nota) para que os interessados disponham sobre a forma e o rito de processo administrativo, dispensando aquele previsto no estatuto de regência (Lei n. 6.015, de 31-12-1973, arts. 198 et seqq.).

Se o que basta não bastara, ainda há considerar que ao longo de anos a dúvida inversa tem constituído risco para a segurança dos serviços e mesmo para as justas expectativas dos interessados. É que, não rara vez, o instrumento vem sendo manejado sem respeito aos mais elementares preceitos de processo registral (o primeiro deles, a existência de prenotação válida e eficaz), de modo que termina sem bom sucesso, levando a delongas que o paciente respeito ao iter legal teriam evitado.

4. Superada a preliminar, entretanto, voto pelo provimento do recurso, porque, segundo o entendimento estável deste Conselho, tendo sido adimplido o tributo de transmissão com base em critério razoável (e esse é o caso dos auto), não toca ao oficial, no exercício do poder que lhe confere o art. 289 da Lei de Registros Públicos, pôr empeço ao registro pretendido, a pretexto de que exista erro ou imprecisão.

DO EXPOSTO, por meu voto preliminar, julgava extinto o processo, sem resolução de mérito, prejudicado o recurso de apelação interposto por Benedito Coelho Siebra e Nicholas Roncally Marques Siebra.

No mérito, dou provimento ao recurso, para o fim de que, reformado o r. decisum da inferior instância, se faça o rogado registro stricto sensu.

É como voto.

Des. RICARDO DIP

Presidente da Seção de Direito Público


Notas:

[1] Parágrafo único – Poderá ser adotado, em se tratando de imóvel:

(…)

2 – urbano, o valor venal de referência do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI divulgado ou utilizado pelo município, vigente à data da ocorrência do fato gerador, nos termos da respectiva legislação, desde que não inferior ao valor referido na alínea “a” do inciso I, sem prejuízo da instauração de procedimento administrativo de arbitramento da base de cálculo, se for o caso.” .

[2] Art. 8º A base de cálculo não poderá ser inferior ao valor mensalmente apurado pela Secretaria de Finanças, por meio de processos matemáticos e estatísticos empregados para avaliação dos preços praticados no mercado imobiliário.

§ 1º A base de cálculo apurada nos termos deste artigo deverá refletir o valor do bem colocado à venda no mercado imobiliário, de maneira consciente e voluntária, em condições normais e de livre negociação. (DJe de 23.08.2017 – SP)

Fonte: INR Publicações | 28/08/2017.

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Arrolamento de bens – Formal de Partilha – Recusa do registro em razão da exclusão de nora dos falecidos, que, à época da morte de um deles, era casada pelo regime da comunhão universal com um dos herdeiros filhos – Tema que vai além dos limites da qualificação registral – Mérito de decisão judicial transitado em julgado que não pode ser revisto na via administrativa – Exigência feita pelo Oficial, ademais, que não terá efeito prático algum – Dúvida julgada improcedente – Recurso provido.

Apelação nº 1000291-81.2015.8.26.0252

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1000291-81.2015.8.26.0252
Comarca: IPAUÇU

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1000291-81.2015.8.26.0252

Registro: 2017.0000403269

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação n.º 1000291-81.2015.8.26.0252, da Comarca de Ipauçu, em que são partes é apelanteJOSÉ QUINTILIANO FILHO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE IPAUÇU.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida e determinar o registro do título, v.u. Declarará voto convergente o Desembargador Ricardo Dip.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E PÉRICLES PIZA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 24 de maio de 2017.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1000291-81.2015.8.26.0252

Apelante: José Quintiliano Filho

VOTO N.º 29.753

Registro de Imóveis – Arrolamento de bens – Formal de Partilha – Recusa do registro em razão da exclusão de nora dos falecidos, que, à época da morte de um deles, era casada pelo regime da comunhão universal com um dos herdeiros filhos – Tema que vai além dos limites da qualificação registral – Mérito de decisão judicial transitado em julgado que não pode ser revisto na via administrativa – Exigência feita pelo Oficial, ademais, que não terá efeito prático algum – Dúvida julgada improcedente – Recurso provido.

Trata-se de recurso de apelação interposto por José Quintiliano Filho contra a sentença de fls. 142/143, que julgou procedente a dúvida inversa suscitada pelo apelante e impediu o registro do formal de partilha extraído dos autos de arrolamento de bens deixados por José Gonçalves Quintiliano e Ana Cassemira Quintiliano.

Sustenta o apelante, em resumo, que Augusta Vicente Gonçalves, ao falecer, deixou como único herdeiro seu marido, Benedito Gonçalves Quintiliano; e que as exigências feitas pelo registrador não podem ser satisfeitas (fls. 146/154).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 182/186).

É o relatório.

Perante a Vara Única da Comarca de Ipaussu, tramitou o arrolamento dos bens deixados pelo casal José Gonçalves Quintiliano e Ana Cassemira Quintiliano (autos nº 0003539-77.2012.8.26.0252).

Os falecidos tiveram seis filhos (José, Sebastiana, Aparecida, Gabriel, Vitor e Benedito fls. 94/95), sendo que um deles (Benedito) já havia morrido por ocasião da abertura do arrolamento (fls. 57).

Os cinco filhos vivos cederam a Simone Barbosa Quintiliano Cavalini e a Rodrigo de Oliveira Cavalini os quinhões que lhes cabiam (5/6) no único imóvel deixado pelos falecidos, matriculado no Registro de Imóveis de Ipaussu sob o nº 1.374 (fls. 97). Já o quinhão de Benedito (1/6), que faleceu depois de seus pais (fls. 36, 37 e 57), foi transferido a seu espólio (fls. 97), para futura partilha, juntamente com outro bem de sua propriedade, em novo processo de arrolamento (fls. 91).

A partilha amigável levada a efeito foi homologada judicialmente (fls. 116).

Apresentado o formal de partilha a registro, sobreveio a recusa do Oficial, sob o argumento de que na época do falecimento de José Gonçalves Quintiliano (1979, cf. fls. 36), o herdeiro Benedito era casado, sob o regime da comunhão universal, com Augusta Vicente Gonçalves, de modo que ela também era herdeira. Com base nisso, o Oficial exigiu a retificação do formal, com a inclusão de Augusta e correção das cotas hereditárias, assim como a apresentação de cópia autenticada do RG e CPF dela.

Na hipótese, nota-se que o registrador foi além do que lhe é permitido no exame de qualificação de um título. Isso porque, na esfera administrativa, tentou rediscutir questão já decidida judicialmente e transitada em julgado (fls. 118).

E evidentemente não se pode admitir que o registrador, em exame de qualificação, questione o mérito ou, pior, reforme decisão judicial transitada em julgado.

Nesse sentido, decisão da 1ª Vara de Registros Públicos, proferida pelo então MM. Juiz Narciso Orlandi Neto:

Não compete ao Oficial discutir as questões decididas no processo de inventário, incluindo a obediência ou não às disposições do Código Civil, relativas à ordem da vocação hereditária (artº 1.603). No processo de dúvida, de natureza administrativa, tais questões também não podem ser discutidas. Apresentado o título, incumbe ao Oficial verificar a satisfação dos requisitos do registro, examinando os aspectos extrínsecos do título e a observância das regras existentes na Lei de Registros Públicos. Para usar as palavras do eminente Desembargador Adriano Marrey, ao relatar a Apelação Cível 87-0, de São Bernardo do Campo, “Não cabe ao Serventuário questionar ponto decidido pelo Juiz, mas lhe compete o exame do título à luz dos princípios normativos do Registro de Imóveis, um dos quais o da continuidade mencionada no art. 195 da Lei de Registros Públicos. Assim, não cabe ao Oficial exigir que este ou aquele seja excluído da partilha, assim como não pode exigir que outro seja nela incluído. Tais questões, presume-se, foram já examinadas no processo judicial de inventário.” (Processo nº 973/81)

Em caso muito semelhante, decidiu este Conselho Superior:

No caso em exame, o Oficial recusou o ingresso do formal de partilha, pois da análise do formal de partilha percebe-se que quando do óbito de Basílio Ferreira o interessado Basílio Ferreira Filho era casado pelo regime da comunhão universal de bens com Eliane Fernandes Ferreira. Por outro lado, quando do óbito de Antonia Madureira Ferreira, Basilio Ferreira Filho já era separado judicialmente. Portanto, o auto de partilha deve refletir as consequências patrimoniais decorrentes da Saisini relativamente ao estado civil do herdeiro (fls. 09).

A qualificação do Oficial de Registro de Imóveis, ao questionar o título judicial, ingressou no mérito e no acerto da r. sentença proferida no âmbito jurisdicional, o que se situa fora do alcance da qualificação registral por se tratar de elemento intrínseco do título. Assim não fosse, estar-se-ia permitindo que a via administrativa reformasse o mérito da jurisdicional. (Ap. Cível nº 0001717-77.2013.8.26.0071, Rel. José Renato Nalini).

Neste mesmo sentido, Apelações nº 1025290-06.2014.8.26.0100 e 0006128-03.2012.8.26.0362, ambas de relatoria do então Corregedor Geral de Justiça, Desembargador Elliot Akel.

E se não bastasse tudo que já foi dito para autorizar o ingresso do formal de partilha, a exigência feita pelo Oficial não terá efeito prático algum. Com efeito, Augusta faleceu, no ano de 1991 (fl. 156), deixando Benedito, seu marido, como único herdeiro (fls. 157/164). Assim, a fração de 1/24 do imóvel, que Augusta obteve em 1979 com o falecimento de José Gonçalves Quintiliano, foi, em 1991, ano de sua morte (fls. 156), transferida a Benedito, seu único herdeiro.

Nesse sentido, o parecer apresentado pelo Procurador de Justiça Sebastião Silvio de Brito:

Muitas vezes a preocupação com o respeito a determinados princípios dos registros públicos não tem a menor razão de ser. É o caso dos autos em que a Augusta veio a falecer sem deixar qualquer outro herdeiro, senão o próprio marido com o qual se casou no regime da comunhão universal que era o regime legal da época. Nas circunstâncias, o fato de Augusta não ter sido contemplada na partilha do bem deixado pelo seu sogro, o falecido José Gonçalves Quintiliano, não teve qualquer influência prejudicial na divisão das cotas hereditárias. A situação embora distinta, assemelha-se à hipótese em que Augusta teria se casado com o herdeiro Benedito no regime da separação parcial” (fls. 184).

E como ambas as exigências formuladas pelo Oficial se referem à inclusão de Augusta como herdeira (fls. 10), o caso é de se determinar o afastamento delas, com o registro do formal tal como apresentado.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida e determinar o registro do título.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

Conselho Superior da Magistratura

Apelação 1000291-81.2015.8.26.0252 SEMA

Dúvida de registro

VOTO CONVERGENTE (Voto n. 47.600)

1. Registro, à partida, adotar o relatório oferecido pelo eminente Relator da espécie.

2. Itaque casus est.

José faleceu em 1979 (fls. 36-37).

Na data da abertura da sucessão de José, um dos herdeiros, de nome Benedito, era casado em regime da comunhão universal de bens com Augusta (fls. 58).

Augusta faleceu em 1991, e todos os bens que deixou couberam a seu marido Benedito.

Benedito faleceu em 2012 (fls. 57).

Em 2012, foi feita a partilha dos bens deixados por José, mas no relativo processo não figurou Augusta a qual, repita-se, era casada com Benedito, um dos herdeiros de José, na data da abertura da sucessão deste.

Por força desta omissão, o ofício de registro de imóveis exige que se retifique a partilha dos bens de José, para que Augusta também conste dela e, assim, fique respeitado o princípio da saisine (fls. 10) rectius: do trato consecutivo.

Quid inde?

3. A solução mais correta, mais ortodoxa, é, não se discute, aquela apontada pelo ofício de registro de imóveis: a bem do princípio do trato sucessivo que em tal ponto e para tal fim não conhece exceção, no direito brasileiro seria realmente necessário fazer com que da partilha dos bens deixados por José também constasse Augusta, que (permita-se repeti-lo) ao tempo da abertura da sucessão era casado em regime da comunhão universal com Benedito, um dos filhos herdeiros de José.

Para esse fim (i. e., para a preservação da continuidade) poder-se-ia até cogitar, quiçá, da técnica do trato abreviado (ou comprimido): é dizer, poderiam constar de uma única inscrição (no caso, de um único registro stricto sensu) os títulos causais que levaram à aquisição causa mortis em favor de Augusta (na sucessão de José, por estar casada em comunhão universal com um dos herdeiros) e, depois, aquele outro que fez a fração ideal assim adquirida passar a Benedito (aquando do falecimento de Augusta, que não deixou outros sucessores senão seu cônjuge).

Para que se procedesse dessa forma seria entretanto necessário que estivessem à disposição os títulos formais relativos àqueles dois títulos causais e para o segundo caso (o da aquisição, por Benedito, do que antes coubera a seu cônjuge Augusta), entretanto, não no há, como bem fez notar o registrador, de maneira que mesmo a solução do trato abreviado não está adequada à facti species em discussão.

4. Porém, ainda que do trato sucessivo não seja possível a observância, ortodoxa ou comprimida, nem por isso, a bem ver, se pode denegar o registro pretendido.

Como salientou o douto voto de Relatoria, não obstante o salto na continuidade, claro está que o mero respeito ao disposto nos arts. 195 e 237 da Lei n. 6.015, de 31 de janeiro de 1973, não tem, no caso, nenhuma eficácia registral – e inutilitates in tabula illicita sunt. É contraeconômico, para logo, em todos os aspectos (economia de esforços, de tempo e de custos), efetivar-se uma inscrição registrária destituída de toda eficácia atual, in actu: está patente, afinal, que a falta de menção a Augusta, no inventário de José, não causou nem causará risco à segurança das situações jurídicas de ninguém, razão pela qual, excepcionalmente para o caso concreto, se defere deferir o pretendido registro stricto sensu, tal como foi rogado.

TERMOS EM QUE, dou provimento à apelação, para reformar a r. sentença de origem e determinar que se faça o registro, como solicitara a parte (autos 1000291-81.2015.8.26.0252).

É como voto.

Des. RICARDO DIP

Presidente da Seção de Direito Público (DJe de 23.08.2017 – SP)

Fonte: INR Publicações | 28/08/2017.

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CNJ julgará caso sobre possíveis títulos falsos apresentados em concurso de cartório de PE

Anoreg/PE afirma que TJ segue realizando os procedimentos finais para nomeação dos aprovados se a observância das irregularidades apontadas.

Está na pauta do plenário do CNJ na terça-feira, 29, caso que trata de concurso público de cartórios em Pernambuco.

O pedido de providências é da Anoreg/PE – Associação dos Notários e Registradores do Estado de Pernambuco, que afirma que o TJ/PE segue realizando os procedimentos finais para nomeação dos aprovados no concurso público de provas e títulos para outorga de delegação de notas e de registro 1/2012 sem a observância das irregularidades apontadas.

A Associação alega que o certame, além de ser objeto de investigação em inquérito, está sob avaliação do MP/PE, que solicitou informações à Comissão responsável pelo concurso acerca da apresentação de documentos falsos para subsidiar a classificação na etapa de análise de títulos.

A requerente afirma existir laudo pericial de falsidade ideológica que comprova a apresentação de títulos inidôneos por parte de candidatos aprovados entre as primeiras colocações, o que coloca em risco toda a lisura do concurso.

Indícios

O ministro João Otávio de Noronha, corregedor nacional de Justiça, deferiu liminar dia 15/8 suspendendo o concurso, por entender que há indícios das irregularidades.

“A quantidade de títulos apresentados por determinadas pessoas correspondentes a um curto espaço de tempo reflete o caráter indiciário da prova ora apresentada, argumento este que não foi analisado nos procedimentos anteriores ligados ao mesmo certame.”

Explicou o ministro que, no caso dos autos, relata-se fato novo, correspondente ao oferecimento de queixa-crime com intuito de demonstrar indícios suficientes de autoria e materialidade da prática de ilícito penal ante a apresentação de títulos falsos.

“A matéria, por si só, reclama maior prudência na análise, inclusive com a necessidade de manifestação dos demais órgãos envolvidos, de modo a assegurar que o concurso público, que se arrasta desde 2012, não seja objeto de anulação peremptória por parte deste Conselho Nacional de Justiça.”

Fonte: Migalhas | 25/08/2017.

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