Novos paradigmas da responsabilidade civil e administrativa dos notários e registradores – Por Arthur Zeger

*Arthur Zeger

Iniciamos a reflexão sobre os novos paradigmas da responsabilidade civil dos notários e registradores esclarecendo que não devem prevalecer leituras isoladas e injustificadas de posições doutrinário-jurisprudenciais conhecidas por estarmos convencidos que a matéria em enfoque merece uma releitura que não permite a aceitação da doutrina e jurisprudência atuais sob pena de ignorar-se os avanços legislativos a serem aqui tratados, relativizando-os pela leitura antiga e superada pelos recentíssimos movimentos legislativos. Adiantamos, portanto, que a discussão (e divergência) doutrinário-jurisprudencial atualmente existente sobre a natureza jurídica da responsabilidade civil (e administrativa) dos tabeliães de notas ou registro ser objetiva ou subjetiva perdeu relevância com o advento da Lei 13.286, de 10 de maio de 2016 e também com o advento da nova ordem processual civil brasileira, Lei 13.105/2015.

Dado o propósito deste estudo, antes do aprofundamento do tema mediante o estudo de normas específicas cumpre-nos justificar as razões pelas quais não simpatizamos com a aplicação da Lei 8.078/1990 – Código de Defesa do Consumidor –às prestações de serviços dos respectivos tabelionatos na medida em que, se aplicável fosse, a responsabilidade civil em questão seria objetiva (à luz do que determina o Artigo 14 da Norma Consumerista), esvaziando a relevância do estudo que segue.

O diploma consumerista estabeleceu que consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final; por sua vez, delimitou o fornecedor como sendo toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços – entendendo-se por serviços quaisquer atividades fornecidas no mercado de consumo mediante remuneração, exceto pelas relações trabalhistas.

São atributos da prestação de serviços tuteladas pelo Código de Defesa do Consumidor, portanto, a disponibilização de atividades no mercado de consumo mediante remuneração. Estariam, pois, as atividades prestadas pelas serventias extrajudiciais (cartórios de notas, registro de imóveis, registro de títulos e documentos, protesto e registro civil de pessoas naturais) disponibilizadas no mercado de consumo? No âmbito do RESP 625.144-SP, em voto-vista o Min. Humberto Gomes de Barros consignou que que “Não existe um ‘mercado de consumo de serviços notários’, pois, nesse campo, não há liberdade de concorrência e iniciativa. A chamada “mão invisível” da economia, na célebre expressão de Adam Smith, não atua nesta seara, que é cercada de restrições legais, definições de “emolumentos” (com natureza de taxa), delimitações territoriais de atuação, fiscalizações externas etc. Propriamente, não há concorrência de mercado entre os notários, pois a Lei e o Estado (via Poder Judiciário), dirigem e fiscalizam a atividade notarial, impedindo uma livre concorrência entre os cartórios.”

Neste viés, permanece coerente a doutrina de Walter Ceneviva: “Apesar do amplo espectro abarcado pela lei do consumo, meu entendimento é o de que não se aplica aos registradores. Sendo embora delegados do Poder Público e prestadores de serviço, sua relação não os vincula ao “mercado de consumo” ao qual se destinam os serviços definidos pelo Código do Consumidor (art. 3º, §2º). Mercado de consumo é o complexo de negócios realizados no País com vistas ao fornecimento de produtos e serviços adquiridos voluntariamente por quem os considere úteis ou necessários. O serviço registrário, sendo em maior parte compulsório e sempre de predominante interesse geral, de toda sociedade, não se confunde com as condições próprias do contrato de consumo e a natureza do mercado que lhe corresponde” (Lei dos Registros Públicos Comentada, 15ª Ed., Saraiva, 2003, p. 57).

Havendo legislação específica regulamentando a atividade notarial, ainda que se defenda a aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos notários e registradores, as disposições específicas da legislação especial (Lei 8.935/94 e 9.492/97) deverão prevalecer naquilo que conflitarem com a lei geral. e neste sentido, observada a existência de regramento próprio e expresso quanto ao regime jurídico da responsabilidade civil de notários e registradores, a lei geral (CDC) sucumbirá aos preceitos da lei específica sob o risco de, não se reconhecendo tal subsunção, admitir-se a existência de normas inócuas (na medida em que ignorar-se-ia a vigência da lei especial por considerar que a lei consumerista – que reconhece a responsabilidade objetiva do prestador de serviço – se aplicaria a toda e qualquer relação entre uma tabeliães e usuários das serventias extrajudiciais, tornando sem efeito o regramento específico da legislação especial). A hermenêutica impõe, neste caso (responsabilidade civil de notários e registradores), observância aos princípios pacificadores de antinomias normativas, dos quais, neste caso, destacam-se o da especialidade (a norma especial prevalece sobre a genérica no que conflitarem) e o cronológico (a lei mais nova prevalece sobre a mais antiga, quando incompatíveis entre si, ainda que não se trate de revogação da mais antiga pela mais nova).

Não desconhecemos a existência de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça em sentido contrário (REsp 1163652 / PE, 2ª Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, J. 01/06/2010), que reconhece a aplicação do CDC à atividade notarial; todavia, registramos que o referido precedente não fundamentou a aplicabilidade da norma consumerista, limitando-se a constar, apenas da ementa, que “O Código de Defesa do Consumidor aplica-se à atividade notarial”. De outra banda (afastando a aplicação do CDC) tem-se o AgRg no Ag 1155677 / PR (3ª Turma, Rel. Massami Uyeda, V.U. 07/10/2009) e o REsp 625144 / SP (3ª Turma, Rel. Nancy Andrighi, J. 14/03/2006) nos quais houve efetiva fundamentação jurídica que, ao nosso ver, legitima a posição adotada.

Superada discussão acerca da incidência do Código de Defesa do Consumidor aos serviços notariais/registrais, defendemos que, pelos fundamentos já declinados, mesmo que a norma protetiva venha a ser aplicada o regime jurídico da responsabilidade civil a ser seguido deverá ser o da lei específica em detrimento da lei geral do consumidor (neste sentido: STJ, REsp 1413192/RJ, AgRg no Ag 363679/MG e REsp 539077/MS) e quanto à responsabilidade administrativo-disciplinar, nenhuma dúvida resta senão a aplicação pura e simples da norma específica.

É de sabença que a Constituição Federal de 1988 (Artigo 236 §1º) delegou ao Poder Legislativo Federal a competência para legislar a respeito da responsabilidade civil dos notários e registradores.

Passaram-se seis anos entre a vigência da Constituição Federal de 1988 e a edição, em 18 de novembro de 1994, da Lei 8.935 (Lei dos Cartórios). Até então a responsabilidade civil de notários e registradores seguia a disciplina da Lei de Registros Públicos (6.015 de 31 de dezembro de 1973), que no Artigo 28, inalterado até os dias de hoje, assim dispõe: “além dos casos expressamente consignados, os oficiais são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que, pessoalmente, ou pelos prepostos ou substitutos que indicarem, causarem, por culpa ou dolo, aos interessados no registro”.

Pela expressão culpa ou dolo entende-se que a Lei 6.015/73 trata de responsabilidade subjetiva.

Não obstante, ao regulamentar o Artigo 236 §1º da Constituição Federal, a Lei 8.935/94 trouxe, no Artigo 22, o seguinte preceito: “os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causarem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros o direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos”.

Inverteu-se, pois, o regime jurídico da responsabilidade civil dos notários e registradores, passando a sê-la de natureza objetiva na pessoa do notário/registrador que, por sua vez, teria direito de regresso em relação ao seu preposto caso lograsse êxito em fazer prova da culpa ou dolo de seu funcionário (ônus da prova que competia ao tabelião/registrador). A esse respeito, Rui Stoco esclarece em seu Tratado de Responsabilidade Civil que “Partiu-se do suposto de que se o elemento culpa foi ali previsto somente na parte final do artigo e apenas para assegurar a ação regressiva do titular da serventia, em face do preposto causador do dano, e somente quando este tiver agido (ou se omitido) com dolo ou culpa”. Daí resulta, por exclusão, que omitindo-se o preceito quanto a referir-se ao elemento subjetivo com relação àqueles (os titulares), teria a norma estabelecido que esses agentes devem reparar o dano mesmo sem culpa, em qualquer caso. A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça reconheceu (REsp 1.027.925/RJ) que “a responsabilidade do notário registrador somente passou a ser objetiva com a regulamentação da previsão constitucional por meio da edição da Lei 8.935/1994”.

Posteriormente, com o advento da Lei 9.492 de 10 de setembro de 1997 – que define competência, regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida e dá outras providências –, o legislador positivou (Artigo 38) que a responsabilidade civil dos tabeliães de protestos seria subjetiva: “os Tabeliães de Protesto de Títulos são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou Escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso”.

Em suma, a Constituição Federal de 1988 delegou ao legislador ordinário competência para legislar acerca da responsabilidade civil dos tabeliães. Enquanto a norma constitucional não estava regulamentada prevalecia a norma geral da Lei de Registros Públicos (6.015/73, Art. 28) que fixava a responsabilidade subjetiva das serventias extrajudiciais. Posteriormente, com o advento da Lei dos Cartórios (Lei 8.935/94), fixou-se aos tabeliães de notas e registros o regime da responsabilidade objetiva enquanto que a Lei dos Tabeliães de Protesto (Lei 9.492/97) os submeteu ao regime da responsabilidade subjetiva.

Dada a coexistência de distintos regimes de responsabilidade civil aplicáveis aos tabeliães, instalou-se na doutrina e jurisprudência forte dissenso quanto ao regime prevalecente em contrariedade à interpretação literal dos dispositivos invocados. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça manteve entendimento quanto à responsabilidade objetiva dos tabeliães e notários (AgRg no REsp 1377074 / RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, J. 16/02/2016; AgRg nos EDcl no RMS 29243/RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, J. 17/09/2015; AgRg no AREsp 474524/PE, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, J. 06/05/2014; AgRg no REsp 1027925/RJ, 4ª Turma, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, J. 11/04/2013) ao passo que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo reúne precedentes pela responsabilidade subjetiva dos tabeliães e notários (Apelação 9195496-33.2008.8.26.0000, 9ª Câm. Dir. Privado, Rel. Des. Grava Brasil, J. 04/10/2011; Apelação 9215805-46.2006.8.26.0000, 1ª Câm. Dir. Privado, Rel. Des. Guimarães e Souza, J. 20/12/2006).

Em 10 de maio de 2016 foi publicada a Lei 13.286 em cujo projeto constou a seguinte justificativa: “O projeto de lei ora apresentado tem, pois, o objetivo de altear o art. 22 da Lei nº 8.935/94, para definir a responsabilidade civil de notários e registradores nos mesmos termos em que foi delimitada a responsabilidade civil dos tabeliães de protestos”. O novo texto do Artigo 22 da Lei 8.935/94 passou a ser: “Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso”. Com a alteração da Lei 8.935/94 fica superada a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que vinha reconhecendo a responsabilidade objetiva dos tabeliães de notas e de registro, na medida em que a lei ora em vigor deixou extreme de dúvida que a responsabilidade civil dos tabeliães de registro e notas passou a ser subjetiva. Em homenagem à segurança jurídica e ao princípio da irretroatividade, a nova disciplina deverá ser aplicada para eventos ocorridos a partir de sua vigência, não retroagindo no tempo consoante Artigo 5º, XXXVI da Constituição Federal e Artigo 6º da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro.

Até este ponto, discutiu-se exclusivamente a responsabilidade civil dos tabeliães, se objetiva ou subjetiva, mas a despeito de tratar-se de atividade delegada do Poder Público, não se explorou se o Estado seria responsável solidário, subsidiário ou se não seria responsável ao lado dos tabeliãs pelos atos praticados no âmbito da delegação constitucional. Sérgio Cavalieri Filho esclarece que “Há controvérsia quanto à responsabilidade civil pelos atos praticados por tabeliães e notários. O Supremo Tribunal Federal, em mais de uma oportunidade (RE 175.739-SP. RTJ 169/364, e RE 212.724-MG, RTJ 170/341), decidiu que a responsabilidade é do Estado, ao entendimento de que ‘os cargos notariais são criados por lei, providos mediante concurso público, e os atos de seus agentes, sujeitos à fiscalização estatal, são dotados de fé pública, prerrogativa esta inerente à ideia de poder delegado pelo Estado’. Uma segunda corrente entende, com base no art. 22 da Lei nº 8.935/1994, que a obrigação de reparar o dano decorrente de atividade notarial é objetiva e pessoal do oficial (tabelião ou notário) e que a serventia ou o cartório são partes passivas ilegítimas para responder, por serem desprovidos de personalidade jurídica. Uma terceira corrente, minoritária, sustenta que a responsabilidade é do tabelião ou notário, mas subjetiva, com base no art. 38 da Lei nº 9.492/1997” (Programa de Responsabilidade Civil, Ed. Atlas, 10ª Ed., 2012, p. 277).

Não obstante as três correntes acima ventiladas pela doutrina de Cavalieri Filho, a alteração do Artigo 22 da Lei 8.935/94 tira de cena a segunda corrente (da responsabilidade objetiva), passando a ganhar maior relevância a terceira corrente (da responsabilidade subjetiva) pari passu com a primeira corrente (responsabilidade objetiva do Estado com direito de regresso contra os tabeliãs em caso de dolo ou culpa), consoante remansosa jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, última das quais registrada pelo Ag.Reg. no RE 518.894-SP, de relatoria do ministro Ayres Britto: “o Supremo Tribunal Federal já firmou o entendimento de que ‘o Estado responde, objetivamente, pelos atos dos notários que causem danos a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa (C.F., art. 37, 6º)’ (RE 209.354-AgR, da relatoria do ministro Carlos Velloso)”. Podemos afirmar, tranquilamente, que em vista da atual legislação o Estado responde objetivamente pelos atos dos notários que responderão, por ação de regresso (se comprovado o nexo causal e a culpa ou dolo da serventia extrajudicial), o que não significa que os tabeliães não teriam legitimidade passiva para responder a referidos processos. Cabe, pois, jurisdicionado optar se pretenderá obter reparação do Estado no regime da responsabilidade objetiva ou se demandará contra o tabelião/notário assumindo o ônus de comprovar a culpa ou dolo – em vista da responsabilidade subjetiva ou, ainda, se litigará diretamente contra ambos, em litisconsórcio passivo facultativo.

Inauguramos agora uma nova reflexão para a de determinação da responsabilidade civil dos tabeliães. Trata-se do reconhecimento de uma série de aproximações entre os serviços notariais/registrais às funções jurisdicionais que permitem a aplicação para tabeliães do regime jurídico da responsabilidade civil dos juízes na medida em que: (i) pelo princípio do rogatório, o notário não deve agir de ofício, devendo sempre de provocação pelas partes interessadas da mesma forma como ocorre com o princípio da inércia da jurisdição; (ii) quando instados, tanto o magistrado como o notário não poderão se negar a agir, estando obrigados a prestarem cada qual suas funções com estrita observância da lei sob pena de serem pessoalmente responsabilizados, inclusive na via administrativa; (iii) princípio da imparcialidade, segundo o qual deve-se agir sem causar privilégios indevidos, aplica-se tanto à atividade notarial como à atividade jurisdicional; e (iv) atribuições tipicamente jurisdicionais vêm sendo delegadas, por lei, às serventias extrajudiciais, razão pela qual o tabelião/registrador assumiu funções outrora privativas da magistratura; neste sentido, vejam-se que o notário recebeu a atribuição para homologar a partilha em razão do regime de bens e, junto com a atribuição, a confiança de sacramentar, neste mister, matéria controvertida no Poder Judiciário quanto à correta interpretação do Artigo 1.829, I do Código Civil. No mesmo sentido, a nova disciplina do usucapião extrajudicial introduzido pelo Artigo 1.071 do Novo Código de Processo Civil que acresceu o Artigo 216-A à Lei de Registros Públicos (6.015/73), permitindo ao registrador de imóveis com delegação sobre o local do imóvel usucapiendo para processar (e ‘julgar’) o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião (em todo o caso, ressalvado o direito de recurso ao procedimento de dúvida). Outros exemplos dessa desjudicialização podem ser notados na retificação de registro e as apurações de remanescente de imóveis, escrituras de separação e divórcio, regularizações fundiárias e execuções de devedores fiduciantes.

Se atividades tipicamente jurisdicionais vêm sendo delegadas às serventias extrajudiciais (a cujos notários/registradores passou-se a confiar procedimentos anteriormente privativos de magistrados), se a atividade jurisdicional do Estado é desempenhadas por juízes escolhidos pelo Estado por concurso público (Art. 93, I) e se os serviços notariais e de registro receberam do Estado, por delegação, fé-pública para, com base em rígidos procedimentos previstos nas leis especiais, garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos também mediante concurso público (Constituição Federal, Art. 236 §3º), não se pode olvidar que eventuais prejuízos causados ao usuário de serviços notariais/registrais deva ser reparado objetivamente pelo Estado (até por eventual culpa in eligendo), como ocorre na responsabilidade civil dos magistrados, que respondem de forma subsidiária (ao Estado) e subjetiva (apenas se concorrerem com dolo, fraude ou recusarem, omitirem ou retardarem, sem justo motivo, providência que devam ordenar de ofício ou a requerimento da parte), nos termos do Artigo 143 da Lei 13.105/2015 (novo Código de Processo Civil). A nova ordem processual inovou em relação ao Código de 1973 consignado expressamente no preceito legal outrora vigente pelo Artigo 133 do Código Buzaid, que a responsabilidade civil do magistrado é, além de subjetiva, subsidiária.

Concluímos, portanto, que o atual paradigma da responsabilidade civil dos notários e registradores impõe a observância de sua responsabilidade civil subsidiária (ao Estado), em linha com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e com a aplicação por equidade do regime de responsabilidade civil implementado pela nova ordem processual civil aos magistrados que, tanto quanto os notários e registradores, também são escolhidos pelo Estado por concurso público para desempenharem função que visa à segurança jurídica e à pacificação social, observado que o Estado tem transferido aos notários e registradores atribuições outrora privativas dos magistrados. Sem embargo, reforça esse nosso posicionamento a promulgação da Lei 13.286/2016 que alterou o Artigo 22 da Lei 8.935/94 equalizando sua redação com o Artigo 28 da Lei 6.015/73 e 38 da Lei 9.492/97 que expressamente dispõem que a responsabilidade civil do tabelião é subjetiva.

Quanto à responsabilidade administrativo-disciplinar dos tabeliães, a despeito de o Artigo 37 §6º da Constituição Federal dispor que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”, não concordamos com a classificação da atividade notarial como sendo um serviço público até porque a norma constitucional esclareceu, no Artigo 236, que “os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado”. Ora, a responsabilidade objetiva prevista no Artigo 37 §6º da Constituição Federal aplica-se apenas às pessoas jurídicas de direito publicou ou de direito privado prestadoras de serviços públicos e não ao particular que, por delegação do Estado, exerce função jurídica – ou seja, de cunho intelectual e não material como ocorre nas concessões e permissões.

Luiz Guilherme Loureiro assim tratou da responsabilidade administrativa dos notários e registradores: “Ao nosso ver, a responsabilidade do registrador é objetiva, diante do disposto no art. 22 da Lei 8.935/1994. A norma é clara ao dispor que este profissional do direito responderá pelos danos que eles e seus prepostos causarem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, sem estabelecer a necessidade de conduta culposa ou dolosa”. Corolário lógico da reforma na Lei dos Cartórios, acreditamos que para a doutrina que encampou a responsabilidade administrativa objetiva em razão da literalidade legal deverá curvar-se à nova realidade que pressupõe comprovação de culpa ou dolo.

Não obstante, para nós não haveria razão para considerar a responsabilidade dos tabeliães e notários como objetiva mesmo durante a vigência da original redação do Artigo 22 da Lei 8.953/1994 sob o risco de pretender-se responsabilizar disciplinarmente uma serventia extrajudicial sem apurar a existência de culpa ou do dolo do oficial. Esse entendimento encontra amparo na recente jurisprudência da Corregedoria Geral de Justiça do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (CGJSP Processo 84.855/2015, Rel. Des. Elliot Akel, J. 25/06/2015): “Ocorre que a responsabilidade objetiva gera o dever de indenizar a vítima em razão do ato ilícito praticado e que lhe trouxe dano, desde que comprovado o ilícito praticado, o dano e o nexo de causalidade entre ambos, o que deve ser objeto de ação própria e adequada a ser proposta pela vítima ao juízo competente, e não se confunde com a responsabilidade no âmbito disciplinar de natureza administrativa e correcional.” Ademais, os precedentes em sentido contrário perdem força na medida em que seu embasamento encontra-se impactado pela evolução legislativa da Lei dos Cartórios; veja-se precedente da 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo, Processo 0027752-89.2010.8.26.0100 em cuja sentença registrou-se que a responsabilidade administrativa dos tabeliães seria objetiva em razão do que dispunha o Artigo 22 da Lei 8.935/94:“Releva destacar que o referido artigo 22, prevê responsabilidade objetiva do titular da delegação, ou seja, independente de culpa” (Processo CG 123/07, grifou-se). Destarte, respondendo de forma objetiva pelos atos de seus prepostos (sem distinção entre os que estão sob sua vigilância fática e jurídica), a alegação do requerido de que não agiu com dolo ou culpa em nada lhe favorece porque aqui não se discute culpa.”

Dessa forma, ainda que se aceitasse, antes da reforma à Lei dos Cartórios a responsabilidade objetiva do tabelião, tal deveria se dar apenas para fins de reparação civil (ao usuário de seus serviços), devendo a responsabilidadeadministrativo-disciplinar basear-se na verificação da culpa ou dolo do oficial, discussão que resta superada em vista da agora expressa e inequívoca responsabilidade subjetiva prevista no Artigo 22 da Lei dos Cartórios. Portanto, ainda que alguns julgados isolados reconhecessem a responsabilidade objetiva para fins de punição administrativo-disciplinar, sua fundamentação no Artigo 22 da legislação alterada faz cair por terra a utilidade dos referidos precedentes que perdem vigência já que, se aplicados no caso concreto, não terão como ter sua aplicação justificada na medida em que o Artigo 489 §1º inciso V do novo Código de Processo Civil não reconhece a fundamentação que se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos (hipótese que, conforme demonstrado, deixou de existir).

Fonte: iRegistradores | 18/01/2017.

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TJBA: Corregedor geral pede aos novos notários serviço de excelência aos jurisdicionados

Os corregedores Osvaldo de Almeida Bomfim, das Corregedorias Geral da Justiça, e Cynthia Maria Pina Resende, das Comarcas do Interior, saudaram, na manhã desta segunda-feira (30), os delegatários aprovados no concurso público realizado pelo Tribunal de Justiça para privatização dos cartórios extrajudiciais do estado.

A saudação foi feita pelos dois desembargadores durante a abertura do 1º Encontro de Capacitação dos novos delegatários, no auditório do Tribunal de Justiça, em Salvador, quando, também, esteve presente a juíza coordenadora dos Cartórios Extrajudiciais, Andréa Paula Matos Rodrigues de Miranda.

Compuseram ainda a mesa de abertura dos trabalhos os representantes da Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg), Marli Trindade; do Colégio Notarial, Paulo Roberto Ferreira; Instituto de Registro Civil e Pessoas Naturais (Irpen), Emanuelle Perrota; e Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil (Ieptb), Edem Márcio.

O corregedor Osvaldo Bonfim disse aos novos delegatários que esperava de todos, que saíssem do curso “mais preparados do que estão, para o cumprimento da delegação que lhes foi outorgada, e prestem um excelente serviço aos nossos jurisdicionados”.

“O curso vai levar a todos vocês, noções de informática, justiça aberta, sistema nacional e informação de registro civil, fiscalização, base legal de atuação, seleção das serventias para fiscalização, formas de fiscalização das serventias, selos digitais, selo de autenticidade, observação sobre sistema de selo e outros”, disse o corregedor.

As dúvidas, acrescentou a corregedora Cynthia Maria Pina Resende, “poderão ser dirimidas neste momento, quando vocês terão oportunidade de adquirir mais conhecimento práticos a respeito da atividade dos delegatários”.

Ela lembrou que as Corregedorias editaram alguns provimentos e instruções a respeito da etapa final do concurso, na fase da investidura e do exercício, que certamente vão sanar a maioria das dúvidas. “Leia esses provimentos, essas instruções, isso vai ajudar muito a vocês”.

A desembargadora pediu aos novos delegatários que, no caso de orientações ou dúvidas, as solicitações sejam feitas por escrito, para que, ao responder, a corregedoria possa prestar orientação a todos os delegatários.

O 1º Encontro de Capacitação para os novos delegatários, promovido pelas duas corregedorias, e ministrado pela Universidade Corporativa (Unicorp) do Tribunal de Justiça, conta com apoio da Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg), Instituto de Registro Civil e Pessoas Naturais (Irpen), Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (Irib) e Fundo Especial de Compensação (Fecom).

As atividades prosseguem nesta terça-feira (31).

Fonte: TJBA | 30/01/2017.

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Regulamentação do modelo de propriedade compartilhada de bens está em análise na CCJ

Dois projetos que regulamentam a multipropriedade serão analisados pela Comissão Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). Essa denominação é atribuída ao sistema de propriedade compartilhada de bens móveis ou imóveis. Pelo modelo, que vem ganhando espaço no país, cada proprietário se transforma em dono de fração de tempo no qual poderá usar o bem de modo exclusivo e contínuo.

De acordo com essa modalidade, cada comprador usa sua cota de tempo para usufruir da propriedade durante determinado período do mês ou do ano, em rodízio. Usual nos Estados Unidos e na Europa, o modelo também é conhecido como “propriedade fracionada”. Normalmente, investindo bem menos do que precisariam para ter o bem apenas para si, os sócios dividem bens de luxo, como imóveis em destinos turísticos exclusivos, iates e aeronaves. O sistema pode incluir bens mais utilitários, como escritórios e máquinas.

Os projetos (PLS 463/2016 e PLS 469/2016) foram apresentados ao final de 2016 pelos senadores Jorge Viana (PT-AC) e Deca (PSDB-PB), respectivamente. As propostas aguardam a escolha de relator na CCJ.

Os autores dos projetos apontam a necessidade de atualizar a legislação nacional para dar amparo jurídico a contratos de compra e uso compartilhado.

“A urgência na obtenção de uma arquitetura jurídica para a multipropriedade é notável diante do fato de que inúmeros brasileiros vêm adquirindo bens em regime de multipropriedade sem o devido respaldo jurídico”, argumenta Viana.

Para Deca, que apresentou o projeto quando no exercício do mandato de senador como suplente de Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), o modelo de negócio é ainda incipiente no Brasil sobretudo pela inexistência de um marco legal que regule de maneira clara as relações jurídicas decorrentes.

Unidade periódica

O projeto de Jorge Viana introduz dois capítulos na parte especial do Código Civil (Lei 10.406/2002), um deles destinado a regular a existência de “condomínio multiproprietário imobiliário”. O multiproprietário é definido não como dono de fração do imóvel, mas de uma “unidade periódica de propriedade exclusiva”.

Pelo texto, o condomínio será registrado em cartório, devendo constar do ato a discriminação do imóvel e o fim a que se destinam as unidades periódicas, a individualização de cada uma (nomeação do dono), a correspondente fração ideal, assim como o período certo de tempo (dias, semanas ou meses do ano) durante o qual o bem poderá ser usado por cada condômino.

A convenção que constituir o condomínio será subscrita pelos titulares de, no mínimo, dois terços das frações ideais.  Esse pacto deve definir a quota e o modo de pagamento das contribuições para as despesas ordinárias e extraordinárias. Por voto da maioria, a administração poderá ser delegada a um síndico contratado.

Ainda pelo texto, será nula cláusula que proibir o condômino de vender seu direito real de propriedade no condomínio ou que condicione essa alienação ao prévio consentimento do usufrutuário.

Bens móveis

Outro capítulo trata do “condomínio multiproprietário em móveis”, com previsão de que se aplicam a essa modalidade, no que couber, as mesmas regras referentes ao “condomínio multiproprietário imobiliário”. Ainda pelo texto, o condômino não responderá por obrigações civis, tributárias e administrativas decorrentes das demais unidades nem por danos causados a terceiros devido ao uso do bem em período que não o seu.

Inquilinato

Um dos artigos do projeto de Viana altera a Lei do Inquilinato (Lei 8.245/1991) para regular as condições gerais para a locação residencial ou não residencial “por turno de aproveitamento”, que se aplica a unidades de tempo em condomínio multiproprietário imobiliário. Pelo texto, exceto por ressalva formal em contrato, o locatário poderá ceder seu direito de uso a outra pessoa, de modo gratuito ou em troca de qualquer outra prestação ou serviço.

Administração

Em três artigos, o projeto de Deca define o conceito de multipropriedade e sugere regras gerais para regular a relação jurídica de aproveitamento econômico de bem repartido em “unidades fixas de tempo”.

Pelo texto, a administração do bem se dará com base em normas fixadas por deliberação da maioria dos proprietários, calculada de acordo com quantidade de unidades fixas de tempo a que cada um tenha direito. O administrador poderá ou não ser titular do bem, e a renúncia à fração ideal somente poderá ser realizada a título gratuito e em favor do administrador, a quem caberá administrar ou vender a fração.

Fonte: Agência Senado | 30/01/2017.

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