CSM/SP: Registro de Imóveis – Loteamento – Negativa de registro – Artigo 18, III, “c”, e § 2°, da Lei n.º 6.766/1979 – Existência de ação penal em curso contra um dos sócios da loteadora por crime contra a administração – Fato que, por si só, obsta o registro – Impossibilidade de controle de constitucionalidade em sede administrativa – Dúvida procedente – Recurso não provido.


  
 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 9000001-12.2015.8.26.0063

Registro: 2016.0000196883

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 9000001-12.2015.8.26.0063, da Comarca de Barra Bonita, em que são partes é apelante RIO LENÇÓIS EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE BARRA BONITA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão:“Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente sem voto), PAULO DIMAS MASCARETTI (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA), ADEMIR BENEDITO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), LUIZ ANTONIO DE GODOY (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E SALLES ABREU (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 15 de março de 2016.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação n.º 9000001-12.2015.8.26.0063

Apelante: Rio Lençóis Empreendimentos Imobiliários Ltda

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Barra Bonita

VOTO N.º 29.123

Registro de Imóveis – Loteamento – Negativa de registro – Artigo 18, III, “c”, e § 2°, da Lei n.º 6.766/1979 – Existência de ação penal em curso contra um dos sócios da loteadora por crime contra a administração – Fato que, por si só, obsta o registro – Impossibilidade de controle de constitucionalidade em sede administrativa – Dúvida procedente – Recurso não provido.

RIO LENÇÓIS EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA. interpôs recurso de apelação contra a sentença de fls. 22/24, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Barra Bonita e manteve a recusa do registro do loteamento Vista Alegre na matrícula n.º 25.960, por força da existência de ação penal em curso, por crime contra a Administração Pública, contra um dos sócios da loteadora.

Sustenta a apelante a ausência de risco para os futuros adquirentes; que a existência da ação penal não é causa que obsta o registro do loteamento; a aplicabilidade do princípio da presunção de inocência; e que é inconstitucional o tratamento mais severo dos réus em processos por crime contra o patrimônio ou contra a administração (fls. 29/51).

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento da apelação para afastamento do óbice (fls. 68/70).

É o relatório.

Respeitado o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, o caso é não provimento do recurso.

Guilherme Fernandes, um dos sócios da empresa loteadora denominada Rio Lençóis Empreendimentos Imobiliários Ltda. (fls. 22/24), responde a processo na Justiça Federal por coação no curso do processo (fls. 163/166 do pedido de registro de loteamento).

Sobre o tema, dispõe a Lei n.º 6.766/79:

Art. 18. Aprovado o projeto de loteamento ou de desmembramento, o loteador deverá submetê-lo ao registro imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de caducidade da aprovação, acompanhado dos seguintes documentos:

(…)

III – certidões negativas:

(…)

c) de ações penais com respeito ao crime contra o patrimônio e contra a Administração Pública.

()

§ 2º – A existência de protestos, de ações pessoais ou de ações penais, exceto as referentes a crime contra o patrimônio e contra a administração, não impedirá o registro do loteamento se o requerente comprovar que esses protestos ou ações não poderão prejudicar os adquirentes dos lotes. Se o Oficial do Registro de Imóveis julgar insuficiente a comprovação feita, suscitará a dúvida perante o juiz competente” (grifei).

A certidão de objeto e pé acostada a fls. 166 do pedido de registro de loteamento dá conta de que o processo criminal contra o sócio Guilherme Fernandes tramita perante a 1ª Vara Federal de Jaú e está na fase de oitiva de testemunhas.

Não há dúvida de que o delito de coação no curso do processo, previsto no artigo 344 do Código Penal, é um crime contra a administração. Isso porque referido delito está inserido no capítulo do Código Penal que trata dos crimes contra a administração da justiça, o qual, por sua vez, encontra-se no título denominado “Dos Crimes Contra a Administração Pública”.

E a redação do § 2º do artigo 18 da Lei n.º 6.766/76 é clara a respeito da impossibilidade de se registrar loteamento na hipótese de um dos sócios da loteadora estar sendo processado por crime contra a administração.

O legislador separa duas hipóteses em relação às ações penais contra o loteador: a) crimes contra a administração e contra o patrimônio impedem o registro do loteamento; b) processos por outros delitos, em regra, não obstam o registro, desde que o requerente comprove que tais demandas não prejudicarão os adquirentes dos lotes.

Desse modo, em se tratando de processo por crime contra a administração, não há espaço para que o requerente comprove a ausência de prejuízo. No caso, o prejuízo aos adquirentes é presumido até que o loteador processado seja absolvido ou reabilitado.

Note-se que o fato de o registro ser obstado por processo criminal em curso não infringe o princípio da presunção de inocência, uma vez que a lei, inspirada em interesse maior, apenas condiciona o registro do loteamento à absolvição do loteador.

Sobre o tema, recente julgado do Conselho Superior da Magistratura: “Registro de Imóveis – Loteamento urbano – Negativa de registro – Artigo 18, III, “a” e “c”, e §§ 1º e 2°, da lei nº 6.766/1979 – Existência de ação penal em curso contra um dos sócios da loteadora que, por si só, obsta o registro – Presunção constitucional de não culpabilidade que é insuficiente para afastar o óbice – desqualificação mantida – Dúvida procedente – Recurso não provido” (Ap. n.º 000556-37.2013.8.26.0408, Rel. Des. Elliot Akel, j. em 28/4/2015, v.u.).

Nesse mesmo sentido: Apelação Cível n.° 439-6/5, relator Desembargador José Mário Antônio Cardinale, julgado em 06.12.2005; e Apelação Cível n.° 856-6/8, relator Desembargador Ruy Camilo, julgado em 11.11.2008. No mesmo sentido, há outros precedentes do Conselho Superior da Magistratura, abordando a questão da existência de ações penais, podendo-se citar os seguintes: Apelação Cível n.º 0008191-43.2012.8.26.0445 (Relator e Corregedor Desembargador José Renato Nalini), Apelação Cível n.º 0078848-38.2009.8.26.0114 (Relator e Corregedor Desembargador Maurício Vidigal) e Apelação Cível n.º 1.114-6/0 (Relator e Corregedor Desembargador Ruy Camilo).

Consigne-se, por fim, que a inconstitucionalidade ou eventual não recepção de dispositivo legal não pode ser reconhecida nesta via administrativa. Esse é o posicionamento sedimentado da Corregedoria de São Paulo. Nesse sentido, parecer elaborado pela Juíza Assessora Ana Luiza Villa Nova aprovado pelo Corregedor-Geral da Justiça Hamilton Elliot Akel:

A recorrente defende a inconstitucionalidade desta Lei Federal, pelo fato de a União não ter competência para conceder isenção em relação a tributo que não é de sua competência instituir, porém, não é possível neste âmbito administrativo adentrar nesta questão (…) (Processo CG 127.850/2014).

Posto isso, nego provimento ao recurso.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: INR Publicações – DJE/SP | 12/05/2016.

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